É POSSÍVEL REDUZIR A CARGA TRIBUTÁRIA SEM DESCUMPRIR A LEGISLAÇÃO E CONSIDERANDO APENAS O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE?

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411182320


Sérgio Henrique Barroso de Brito1


RESUMO

A redução da carga tributária respeitando as normas legais, é possível por meio de um planejamento tributário eficaz, que se baseia no princípio da legalidade. Permite aos contribuintes a organização de suas atividades de modo a reduzir o peso dos tributos. As principais estratégias para a redução lícita da carga tributária estão a elisão fiscal e o uso de incentivos fiscais, o que proporciona uma segurança jurídica ao fisco e ao contribuinte. O Código Tributário Nacional permite que contribuintes organizem suas atividades com o objetivo de reduzir o pagamento de tributos. É essencial que esse planejamento seja transparente e bem documentado, pois práticas que possam ocultar abuso ou evasão podem ser penalizadas. O presente artigo analisa, no ordenamento jurídico brasileiro, a existência de normas que atendam a necessidade do contribuinte em relação a sua segurança e proteção jurídica nas relações fiscais. Demonstra o princípio basilar nas relações tributárias. Explica os direitos básicos e fundamentais do contribuinte. Neste sentido, buscou-se o método de pesquisa através do estudo das normas, jurisprudência e doutrina para um melhor alcance de resultados. Este artigo visa a possibilidade de reduzir a carga tributária no Brasil respeitando o princípio da legalidade e sem violar a legislação tributária. Aborda-se como a interpretação da legislação, o planejamento tributário e a otimização da estrutura empresarial podem contribuir para a redução lícita da carga tributária. A análise é embasada nas teorias de autores renomados no direito tributário e em estudos de casos que ilustram estratégias efetivas de elisão fiscal.

Palavras-chave: Carga tributária, Princípio da legalidade, Elisão fiscal, Planejamento tributário, Isenção fiscal.

ABSTRACT

Reducing the tax burden while respecting legal norms is possible through effective tax planning based on the principle of legality. This principle allows taxpayers to organize their activities in a way that minimizes tax liabilities. Key strategies for lawful tax reduction include tax avoidance and the use of tax incentives, providing legal security for both the tax authorities and taxpayers. The Brazilian Tax Code allows taxpayers to structure their activities with the goal of reducing tax payments. However, it is essential that this planning is transparent and well-documented, as practices that conceal abuse or evasion may be penalized. This article examines the existence of norms within the Brazilian legal framework that meet taxpayers’ needs for security and legal protection in tax relations. It highlights the foundational principles in tax relations and explains the basic and fundamental rights of taxpayers. The research method involves studying relevant norms, jurisprudence, and doctrine for better results. The article aims to demonstrate how it is possible to reduce the tax burden in Brazil while respecting the principle of legality and without violating tax legislation. It discusses how interpreting the law, tax planning, and optimizing business structures can contribute to lawful tax reduction. The analysis is based on the theories of renowned authors in tax law and case studies that illustrate effective tax avoidance strategies.

Keywords: Tax burden, Principle of legality, Tax avoidance, Tax planning. 

1. INTRODUÇÃO 

A redução da carga tributária é uma questão fundamental no debate sobre a eficiência econômica e a justiça fiscal de um país. No entanto, para que essa redução seja feita de maneira legal e eficaz, é imprescindível que o princípio da legalidade seja respeitado. Esse princípio estabelece que nenhum tributo pode ser exigido sem uma lei que o autorize, conforme a Constituição Federal de 1988. O processo de diminuir a carga tributária, sem violar a legislação vigente, envolve uma análise cuidadosa, que deve respeitar o ordenamento jurídico e as normas constitucionais, ao mesmo tempo em que preserva a sustentabilidade fiscal e a equidade do sistema tributário.

O princípio da legalidade tributária está consagrado no artigo 150, inciso I, da Constituição, que veda a cobrança de tributos sem que haja uma base legal que a justifique. Isso impede que o Poder Executivo altere a carga tributária sem uma norma legislativa que o autorize. O objetivo desse princípio é proteger o contribuinte contra o abuso do poder do Fisco, garantindo que a tributação seja clara, previsível e justa.

Dentro desse princípio, a redução da carga tributária pode ser realizada de várias formas, desde que respeite os limites estabelecidos pela legislação. Uma maneira comum de implementar essa redução é por meio da alteração das alíquotas dos impostos, criação de isenções fiscais ou revisões fiscais sempre dentro das normas legais. Essas mudanças podem ser feitas por leis ordinárias, que ajustam os valores ou as condições de cobrança dos tributos, ou por alterações constitucionais, quando a reforma tributária exigir mudanças mais profundas no sistema fiscal do país.

Além disso, a redução pode ocorrer também por meio de modificações na base de cálculo dos tributos. A base de cálculo é a quantia sobre a qual o imposto incide, e sua alteração pode resultar em uma redução da carga tributária sem violar o princípio da legalidade. Por exemplo, o aumento das deduções permitidas no Imposto de Renda pode diminuir o valor devido pelo contribuinte, mantendo-se dentro dos limites legais que autorizam essas deduções.

Contudo, para que a redução da carga tributária seja considerada legal, é fundamental que ela esteja em conformidade com o princípio da legalidade e com a exigência de que as mudanças tributárias sejam realizadas por meio de lei. A reserva de lei exige que alterações na tributação sejam feitas por meio de uma lei formal, aprovada pelo Congresso Nacional, e não por decretos ou outras regulamentações inferiores. Alterações tributárias que não sigam esse processo legislativo podem ser julgadas inconstitucionais.

É relevante destacar que, mesmo dentro dos limites da legalidade, a redução da carga tributária deve ser realizada de forma a manter o equilíbrio fiscal e garantir que o Estado consiga financiar seus serviços essenciais, como saúde, educação e segurança. Reduções descontroladas ou mal planejadas podem enfraquecer a administração pública e prejudicar a arrecadação necessária para a manutenção de políticas públicas essenciais.

Além disso, o princípio da legalidade se relaciona com o princípio da isonomia, que exige que a carga tributária seja distribuída de maneira justa entre os cidadãos. A redução da carga tributária não pode favorecer desproporcionalmente um grupo específico sem que isso seja estabelecido de acordo com a lei. A tributação deve ser tratada de forma equânime, respeitando os princípios constitucionais e evitando privilégios ou discriminações ilegais.

Por fim, embora a redução da carga tributária seja um objetivo desejável para estimular o crescimento econômico e aliviar a pressão sobre os contribuintes, ela deve ser cuidadosamente planejada, levando em consideração os efeitos de longo prazo. Isso garante que a legalidade e a justiça tributária sejam preservadas. O respeito ao princípio da legalidade é, portanto, essencial para que a redução tributária seja realizada de forma legítima e eficaz, sem comprometer a estabilidade fiscal do país.

2. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA

Baleeiro (2011, p. 39), um dos mais respeitados juristas brasileiros em direito tributário, aborda o Bill of Rights de 1689 como um marco no estabelecimento do princípio da legalidade tributária. Em sua obra Direito Tributário Brasileiro, o autor enfatiza:

O Bill of Rights inglês, de 1689, é o primeiro grande documento que estabelece o princípio de que nenhum tributo poderá ser exigido sem o consentimento da representação popular, consagrando, assim, a legalidade tributária, que deve ser entendida como a sujeição do poder tributante à manifestação expressa da lei. 

Essa citação de Baleeiro reflete como o Bill of Rights foi um marco na limitação do poder do monarca, estabelecendo que o poder tributário não poderia ser exercido sem a autorização do Parlamento, consolidando, portanto, a ideia de que os tributos devem ser criados ou alterados apenas por lei, princípio fundamental da legalidade tributária.

O ponto fundamental do planejamento tributário gira em torno do princípio da Legalidade, um dos pilares do Direito Tributário brasileiro, previsto pelo artigo 150, inciso I, da Constituição Federal de 1988. Esse princípio exige que o Poder Público não pode exigir ou aumentar um tributo sem previsão em lei, ou seja, só poderá instituir e cobrar estes quando estiverem expressamente em uma norma jurídica.

Segundo Paulsen (2020), ‘’a legalidade tributária impõe que o legislador descreva de forma completa e exaustiva os elementos essenciais do tributo; sujeito passivo, fato gerador, base de cálculo e alíquota’’. 

Portanto, o contribuinte que deseja realizar um planejamento tributário, pode se orientar pelos pontos previstos em lei, buscando caminhos dentro das margens legais para reduzir sua carga tributária. 

  Além disso, o princípio em questão, permite ao contribuinte planejar sua estrutura financeira com segurança, uma vez que ele tem conhecimento que novos tributos ou alterações só poderão ser exigidos mediante lei. Essa previsibilidade é bastante relevante para o contribuinte ter êxito no seu planejamento tributário de longo prazo.

O direito de organização que o contribuinte possui para gerenciar a tributação de sua empresa têm garantia na legislação pátria, obedecendo o princípio da legalidade. 

‘’A liberdade do contribuinte para organizar sua atividade econômica e jurídica é garantida pela própria ordem constitucional, desde que não infrinja a legislação vigente’’. (Oliveira, 2007).    

Ou seja, a lei além de limitar o poder de tributação do Estado, na qual garante previsibilidade e segurança jurídica ao contribuinte, ela estabelece também, as limitações para que o sujeito passivo planeje suas operações sem violar normas fiscais.

A legalidade também está prevista no art.5º, inc.II da Constituição Federal sendo considerado cláusula pétrea, pois não pode ser abolida ou suprimida nem mesmo por emenda constitucional, conforme estabelece o artigo 60, §4º da CF/88.

Defende, Silva (1998, p. 72) “o princípio da legalidade geral de ação, objeto fundamental no estudo do Planejamento Tributário, que a administração pública só pode atuar conforme a lei, ou seja, o poder público só pode realizar ações que estejam expressamente autorizadas em lei e que os indivíduos podem fazer tudo o que a lei não proíbe, ligado ao exercício da liberdade”.

Assim, qualquer pessoa pode agir livremente, bem como tomar decisões legais. E ao Estado, busca assegurar a liberdade e direitos dos cidadãos sem praticar atividades arbitrárias.

2.1 Tipicidade Tributária

Segundo Sabbag (2022):

O princípio da tipicidade tem como finalidade garantir que o tributo seja instituído apenas nos exatos termos previstos em lei, evitando-se que a Administração Pública crie tributos ou amplie seu alcance além do que foi estabelecido pelo legislador.

 A tipicidade tributária é um princípio corolário da legalidade tributária. Decorre da estrita legalidade, na qual exige que as normas que tratam das instituições e cobrança de tributos sejam claras e precisas, detalhando exatamente os elementos que constituem a obrigação tributária.

(Carraza, 2014, p.89) destaca que a tipicidade tributária é uma manifestação específica da legalidade, pois busca evitar a criação de obrigações tributárias a partir das interpretações extensivas ou analógicas: “A tipicidade impede que o estado extrapole os limites legais ao cobrar tributos, exigindo que todas as características do tributo estejam claramente descritas em lei’’.

Dessa forma, a tipicidade visa garantir segurança jurídica ao contribuinte, delimitando a atuação do Estado na imposição de obrigações tributárias.

“A tipicidade tributária exige que a lei descreva, com exatidão e precisão, o fato gerador do tributo e as situações que o tornam devido, de maneira que não reste margem para subjetivismos na aplicação da norma tributária” (Torres, 1999, p. 74).

A tipicidade impõe limitações à discricionariedade do Estado, uma vez que proíbe a aplicação de impostos e outras espécies de forma análoga ou interpretativa em situações não previstas em lei.

Esses conceitos mostram que o referido princípio é essencial para garantir segurança jurídica aos contribuintes, permitindo que saibam exatamente o que é exigido, evitando arbitrariedades e protegendo seus direitos.

3. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E ELISÃO FISCAL

No Brasil, a carga tributária é altíssima e a complexidade do sistema fiscal impõe desafios exponenciais às empresas. Esse cenário adverso faz com que o planejamento tributário se torne uma ferramenta de administração estratégica, voltada para a redução de custos e aumento da competitividade. 

Silva e Araújo (2019), destaca: “O Planejamento Tributário pode ser um diferencial para a sobrevivência e expansão para as pequenas e médias empresas (PMEs) em um mercado competitivo”.

Essa ferramenta vai muito além de uma simples prática de redução de custos fiscais, ela se configura como um instrumento primordial para a saúde financeira das empresas juntamente com o crescimento sustentável. 

Outro ponto já abordado nos tópicos anteriores desse estudo, é a existência de uma similaridade muito forte quanto ao termo elisão e planejamento tributário. A doutrina e a jurisprudência consideram até mesmo como sinônimos. 

Hoffmann (2013, p.1079) conceitua o planejamento tributário da seguinte maneira: “postura estratégica na condução das atividades negociais das empresas, para, de forma lícita, concretizar a organização de negócios e a estruturação de sociedades de maneira mais econômica, com menor carga tributária”. 

Ou seja, um planejamento tributário quando previsto e executado de forma estratégica, desempenha um papel fundamental na proteção dos ativos financeiros das empresas. Nesse sentido, um planejamento tributário bem estruturado é eficiente na preservação das disponibilidades financeiras das organizações.

           Borges (2002, p. 23) enfatiza:

As ideias e planos voltados à economia de tributos pressupõem o emprego de estruturas e formas jurídicas adequadas, normais e típicas à materialização dos respectivos negócios empresariais […] O exercício desse direito à economia de tributos comporta como requisito legal a prática de ações válidas e legítimas.

Para desenvolver um planejamento tributário eficiente, é essencial compreender a legislação, analisá-la detalhadamente e identificar estratégicas que permitam reduzir desembolsos sem infringir as normas legais. 

Oliveira (1998, p.24) ratifica esse entendimento quando assim se expressa: “esta é, portanto, uma atividade que necessita extensos conhecimentos da legislação tributária e sua aplicação prática, e para alcançar êxito nessa atividade”.

Greco (2004, p.182) discorre que o “ Planejamento Tributário é imensamente relevante sob a perspectiva do Direito, pois permite que empresas e indivíduos organizem suas obrigações fiscais de maneira estratégica e dentro dos limites legais”. 

Nesse contexto, observa-se que o planejamento tributário é essencial para as empresas, pois, por meio de estudos e análises comparativas, torna-se possível compreender e ajustar o recolhimento adequado dos impostos.

3.1 Conceito de Elisão

A elisão fiscal, segundo Oliveira (2019, p.9):

É toda atividade lícita de busca e identificação de alternativas que, observados os marcos da ordem jurídica, levam a uma menor carga tributária. Essa atividade, também chamada de planejamento tributário, requer o manejo competente de duas linguagens: a do direito positivo e a dos negócios, e portanto, não se restringe à descoberta de lacunas ou brechas existentes na legislação. O planejamento tributário envolve o manejo inteligente dessa complexidade que é o direito positivo e do mundo dos negócios. 

A conduta descrita é uma prática legal de planejamento tributário que tem como objetivo a redução da carga tributária, através do aproveitamento das lacunas ou disponibilidades previstas na legislação.

De acordo com Xavier (2003), um dos estudiosos do tema, “a elisão fiscal corresponde a operações realizadas antes da ocorrência do fato gerador, através das quais o contribuinte organiza seus negócios de maneira a evitar a incidência de tributos”. 

Essas práticas são constantemente adotadas em pequenas e grandes corporações, onde as empresas buscam maximizar sua rentabilidade, através de uma gestão fiscal estratégica, sendo assegurado pelo princípio da liberdade de planejamento tributário, conferindo ao contribuinte o direito de optar, dentro do que a lei proporciona, menor ônus fiscal.

3.2 Limitação no uso da Elisão Fiscal

Um dos acontecimentos emblemáticos relacionado à elisão fiscal aconteceu nos Estados Unidos, de acordo com Godoy (2010):

Evelyn Gregory, uma senhora que em 1928 detinha todas as ações de uma empresa chamada United Mortgage Corporation. Essa última detinha mil ações de uma outra empresa, Monitor Securities Corporation. Evelyn Gregory criou uma terceira empresa, Averril Corporation. Três dias depois, transferiu as mil ações da Monitor para a Averril. Logo em seguida, Evelyn Gregory dissolveu a Averril, liquidando os ativos dessa nova empresa, transferindo-os para si mesma. Ato contínuo, Evelyn Gregory vendeu a terceiro as ações da Monitor, por cerca de US$ 133 mil. As autoridades fazendárias norte-americanas, quando tomaram conhecimento dos fatos, no processamento das informações de Evelyn Gregory, entenderam que a reorganização empresarial que se informava não se dera efetivamente na vida real. O negócio carecia de substância. Não se manifestava concretamente. Não poderia ser acatado, nada obstante autorizado pela legislação vigente à época dos fatos.

 Esse caso, julgado na Suprema Corte americana, ofereceu muitos entendimentos sobre como aplicar de forma ordenada e limitada juridicamente a elisão fiscal, no qual influenciou debates sobre planejamento tributário em várias esferas jurídicas, sobretudo no Brasil.

Nesse caso, o contribuinte estruturou uma corporativa complexa que seria tributada como receita ordinária com um ganho de capital mínimo de tributação. Foi criada uma empresa de fachada apenas para fazer a transferência de ações de uma empresa para outra. O governo contestou a façanha, justificando que a estrutura utilizada não tinha o objetivo econômico real, sendo utilizado apenas um artifício para minimizar a carga tributária. 

Esse episódio estabeleceu o Princípio do Propósito Econômico, que permite ao fisco não considerar operações que sejam apenas para reduzir tributos sem um negócio substancial.

O parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, adicionado pela Lei Complementar nº 104/2001, é um dos influenciados quanto ao caso dos Estados Unidos, esse dispositivo impacta a elisão fiscal e prevê que as autoridades fiscais devem desconsiderar atos ou negócios jurídicos que tenham objetivos de dissimular o fato gerador ou diminuir a tributação:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

(…)

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

A legislação brasileira admite a elisão fiscal que como já abordado é uma forma de Planejamento Tributário, desde que esteja nos limites da legalidade e expressamente nas normas antielisivas. Essas diretrizes equilibram o direito do contribuinte ao planejamento tributário e combate os abusos e fraudes. 

4. ISENÇÃO FISCAL – OUTRA FORMA DE REDUÇÃO TRIBUTÁRIA LÍCITA

          Harada (2017), explica:

A isenção fiscal é um benefício concedido pela administração pública, na qual o sujeito passivo do tributo fica dispensado do pagamento de determinado valor, mesmo quando este tributo já esteja previsto na legislação.

Esse conceito destaca o caráter claro e objetivo de isenção fiscal e também a forma como o sujeito passivo é dispensado do pagamento do tributo mesmo estando em conformidade com a legislação vigente.

Do ponto de vista legislativa, o Código Tributário Nacional (CTN), conceitua da seguinte maneira: 

Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de sua duração.

O contribuinte pode reduzir a carga tributária, seja por meio de deduções, isenções, ou outros benefícios fiscais previstos, bastando que todos esses procedimentos estejam estabelecidos em lei.

As isenções fiscais também é uma hipótese de redução, pois ela exclui o crédito tributário, onde a lei exija que em certas situações ou para determinados contribuintes, não precisarão cumprir com a obrigação tributária.

Coêlho (2019, p.75), os incentivos e deduções fiscais são formas de estimular certas atividades econômicas, mas sua aplicação deve sempre observar o que está determinado em lei”.

Quanto a essa temática, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça adotou uma postura cautelosa quanto à ampliação de benefícios fiscais. O STJ reiterou que a ampliação de benefícios fiscais, em prejuízo ao erário, deve ser sempre objeto de interpretação restritiva, sob pena de ferir o princípio da legalidade:

EMENTA: TRIBUTÁRIO. IPVA. ISENÇÃO. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. VEÍCULO OBJETO DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DOS VEÍCULOS OBJETOS DA ISENÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. – Sob a ótica da lei e da jurisprudência consolidada no STJ, “como reza o art. 111, inciso II, do CTN, a legislação que disponha sobre isenção tributária deve ser interpretada literalmente, não cabendo ao intérprete estender os efeitos da norma isentiva, por mais que entenda ser uma solução que traga maior justiça do ponto de vista social. Esse é um papel que cabe ao Poder Legislativo, e não ao Poder Judiciário.”(REsp XXXXX/DF, Rel. Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 24/06/2020, DJe 04/08/2020) – É devida a cobrança de IPVA em relação a veículos cuja alegada apropriação indébita – não se enquadra nas hipóteses de isenção previstas no art. 3º, inciso VIII, da Lei Estadual n. 14.937/2003, a saber, roubo, furto ou extorsão.

(TJ-MG – AC: XXXXX20148130396 Mantena, Relator: Des.(a) Alberto Vilas Boas, Data de Julgamento: 09/08/2022, 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/08/2022)

A jurisprudência do STF também tem confirmado que as isenções devem estar previstas em lei, até mesmo nos convênios para que o excesso de isenções não comprometa o erário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 268, DE 2 DE ABRIL DE 1990, DO ESTADO DE RONDÔNIA, QUE ACRESCENTOU INCISO AO ARTIGO 4º DA LEI 223/89. INICIATIVA PARLAMENTAR. NÃO-INCIDÊNCIA DO ICMS INSTITUÍDA COMO ISENÇÃO. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA: INEXISTÊNCIA. EXIGÊNCIA DE CONVÊNIO ENTRE OS ESTADOS E O DISTRITO FEDERAL. 1. A reserva de iniciativa do Poder Executivo para tratar de matéria tributária prevista no artigo 61, § 1º, inciso II, letra b, da Constituição Federal, diz respeito apenas aos Territórios Federais. Precedentes. 2. A não-incidência do tributo equivale a todas as situações de fato não contempladas pela regra jurídica da tributação e decorre da abrangência ditada pela própria norma. 3. A isenção é a dispensa do pagamento de um tributo devido em face da ocorrência de seu fato gerador. Constitui exceção instituída por lei à regra jurídica da tributação. 4. A norma legal impugnada concede verdadeira isenção do ICMS, sob o disfarce de não-incidência. 5. O artigo 155, § 2º, inciso XII, alínea g, da Constituição Federal, só admite a concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais por deliberação dos Estados e do Distrito Federal, mediante convênio. Precedentes. Ação julgada procedente, para declarar inconstitucional o inciso VI do artigo 4º da Lei 223, de 02 de abril de 1990, introduzido pela Lei 268, de 02 de abril de 1990, ambas do Estado de Rondônia.

(STF – ADI: 286 RO, Relator: MAURÍCIO CORRÊA, Data de Julgamento: 22/05/2002, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 30-08-2002 PP-00060 EMENT VOL-02080-01 PP-00001)

No Brasil, as isenções fiscais são concedidas geralmente por meio de leis ordinárias ou complementares, e são utilizadas para atrair investimentos e promover o desenvolvimento regional. Um exemplo clássico é a isenção de tributos para produtos da Zona Franca de Manaus, criada para estimular o desenvolvimento econômico da região amazônica e regulamentada por legislação federal. Em algumas situações, como no caso do ICMS para medicamentos ou produtos essenciais, as isenções visam facilitar o acesso a bens de necessidade básica.

A redução da carga tributária, sem descumprir a legislação, exige que o contribuinte conheça bem a legislação vigente e identifique oportunidades de pleitear a um benefício fiscal como a isenção. Estudos de caso mostram que empresas que utilizam práticas de reorganização societária, incentivo fiscal e enquadramento em regimes tributários mais vantajosos conseguem reduzir sua carga tributária sem violar a legalidade.

4.1 Interpretação da Legislação Tributária para melhor implantar a isenção fiscal

No decorrer do desenvolvimento do estudo do Direito Tributário é notório considerar que a interpretação da legislação tributária é um tema central da matéria e até mesmo para nortear a aplicação do planejamento tributário, especialmente, quando se trata da isenção fiscal.

No Brasil, certas empresas e setores podem se beneficiar de isenções fiscais como uma forma de incentivo econômico. Para utilizar essa estratégia de forma adequada, é essencial compreender detalhadamente e interpretar minuciosamente a legislação tributária, garantindo que a isenção seja aplicada corretamente e evitando possíveis riscos e penalidade fiscais. 

Existem três métodos de interpretação mais utilizados nas normas tributárias: (a) o Método Gramatical: na qual prioriza a literalidade das palavras, conforme o próprio Código Tributário Nacional, explica:

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

        I – suspensão ou exclusão do crédito tributário;

        II – outorga de isenção;

        III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.

(b) o Sistêmico: considera o contexto da norma e suas relações com o ordenamento jurídico. Esse método visa evitar o conflito entre as normas e favorece uma visão aprofundada do Direito Tributário. (c) o Teleológico: tem como foco o propósito ou a finalidade das normas tributárias, busca sempre a objetividade na qual o legislador pretende, bem como evita a frustração do poder judiciário fiscal, nos processos de arrecadação.

“A interpretação teleológica no Direito Tributário é vital para evitar a chamada interpretação mecânica, que ignora a finalidade social e econômica das normas fiscais’’. (Machado, 2018, p.134)

Portanto, a interpretação da legislação tributária exige um entendimento restrito e técnico, visto que as normas fiscais impactam diretamente a relação entre Fisco e contribuinte. 

 A aplicação dos princípios e interpretação das normas permite que o Direito Tributário alcance seu objetivo de arrecadar recursos sem prejudicar os direitos fundamentais e a segurança jurídica dos contribuintes.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A carga tributária no Brasil é um tema recorrente de discussão entre especialistas, gestores públicos e empresários, devido ao impacto significativo que exerce sobre a competitividade econômica e a eficiência do sistema fiscal. Diante disso, surge a questão central: é possível reduzir a carga tributária sem violar a legislação, levando em consideração o princípio da legalidade? Para responder a essa pergunta, é necessário compreender a estrutura normativa que regula a tributação no Brasil, seus limites e possibilidades. Este trabalho teve como objetivo analisar as alternativas de redução tributária dentro dos limites estabelecidos pelo princípio da legalidade, previsto no artigo 150 da Constituição Federal, e as implicações dessa abordagem.

O princípio da legalidade, consagrado pela Constituição Brasileira, determina que nenhum tributo pode ser exigido sem uma lei que o autorize. Isso implica que qualquer alteração na carga tributária seja para aumentá-la ou reduzi-la só pode ocorrer por meio de uma norma infraconstitucional ou até uma mudança constitucional, quando necessário. Esse princípio reflete uma garantia essencial para os contribuintes, assegurando que a cobrança de tributos seja transparente, previsível e sujeita ao controle legislativo.

Dentro desse contexto, reduzir a carga tributária de forma legítima, sem violar a legalidade, envolve desafios que se concentram principalmente na adaptação às normas legais existentes. A ideia de reduzir os tributos de maneira arbitrária, sem respaldo legal, contraria diretamente o princípio da legalidade. Em outras palavras, qualquer redução tributária sem respaldo nas leis pertinentes implicaria em uma violação da Constituição, o que poderia resultar em ilegalidade e em sanções para os envolvidos.

Porém, a legalidade não impede que o Estado e o contribuinte utilizem mecanismos jurídicos e fiscais para reduzir a carga tributária, desde que esses mecanismos estejam devidamente estabelecidos em lei. Nesse sentido, a utilização de incentivos fiscais, isenções, diferimentos tributários e regimes especiais de tributação são exemplos de formas legítimas de reduzir a carga tributária, desde que sejam previstos em normas infraconstitucionais e respeitem as condições estabelecidas. Tais instrumentos podem ser usados pelo Estado para aliviar a carga tributária de forma legal, visando estimular o desenvolvimento econômico em determinados setores ou regiões.

Exemplos de redução tributária dentro da legalidade incluem as zonas de livre comércio e as áreas de incentivo fiscal, onde benefícios fiscais são oferecidos para atrair investimentos e promover o desenvolvimento regional. Nesse caso, a diminuição da carga tributária é realizada com base em normas específicas que definem claramente as condições para a concessão desses benefícios.

A renúncia fiscal também é um mecanismo que permite a redução da carga tributária de forma legal, quando o Estado concede benefícios fiscais a determinadas empresas ou atividades econômicas. Contudo, para que a renúncia seja válida, ela deve ser formalizada por meio de leis que estabeleçam claramente os benefícios e as condições para sua aplicação.

Além disso, a interpretação das normas fiscais pelos tribunais pode, em algumas situações, gerar uma redução da carga tributária sem a necessidade de alteração legislativa. Isso ocorre quando as cortes superiores reavaliam a aplicação de determinadas normas e oferecem soluções que favorecem o contribuinte. No entanto, a utilização dessa interpretação deve ser cuidadosa, pois mudanças nos entendimentos jurisprudenciais podem gerar instabilidade e insegurança jurídica, prejudicando a confiança dos contribuintes no sistema tributário.

Assim, a conclusão que se pode tirar deste estudo é que, sim, é possível reduzir a carga tributária sem descumprir a legislação, desde que essa redução esteja amparada pela legalidade. A legalidade não impede a redução da carga tributária, mas exige que ela seja realizada por meio de processos formais e transparentes, que respeitem os direitos dos contribuintes e garantam a segurança jurídica.

Em síntese, a redução da carga tributária sem violar a legislação não só é possível, como também é necessária para garantir um sistema tributário mais justo e eficiente. Contudo, essa redução deve ser sempre realizada dentro dos limites legais, para assegurar a previsibilidade e a transparência das ações do Estado. O processo de redução tributária deve ser regulamentado de forma clara e responsável, por meio de alterações legislativas que atendam aos interesses da sociedade, garantindo, assim, a eficácia do sistema tributário e o cumprimento do princípio da legalidade.

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1 Graduando do Direito pelo Centro Universitário FAMETRO. E-mail: sergiohenrique_brito@hotmail.com  ORCID: https://orcid.org/0009-0000-8985-2987.