LEGAL DISCUSSION ON THE POSSIBILITY OF ACCUMULATION OF UNHEALTHY AND DANGEROUS WORK ALLOWANCES IN THE EMPLOYMENT CONTRACT
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202501291159
Tasso José Silva e Silva1
Helson Filipe dos Santos Pereira2
Orientadora: Ana Carolina Barros e Silva3
Eulane Coelho Batista4
Joelma Danniely Cavalcanti Meireles5
Luiz Carlos Carvalho de Oliveira6
Jane Karla de Oliveira Santos7
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo examinar as atividades laborais insalubres e perigosas previstas na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e protegidas pelo contrato de trabalho dos empregados que as desempenham. Especificamente, busca-se analisar a possibilidade de cumulação dos adicionais relativos às atividades consideradas de risco pelo Direito do Trabalho. No contexto social, a escolha do tema fundamenta-se na teoria de que o direito tem o ser humano como seu foco principal, acompanhando os avanços da sociedade. O trabalho começa interpretando as normas da Consolidação das Leis do Trabalho à luz dos preceitos constitucionais, além de analisar doutrinas, jurisprudências (incluindo legislações, súmulas e Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego) e decisões dos Tribunais Regionais do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho. Em seguida, avalia-se a possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade. Por fim, são descritos os benefícios, malefícios e os impactos sociais e econômicos dessa cumulação no contrato de trabalho. A metodologia baseia-se em pesquisa bibliográfica com uma abordagem qualitativa, buscando compreender as posições históricas dos juristas e as evoluções sobre o tema. Além disso, o estudo se fundamenta em autores como Martins e Delgado. Conclui-se que, embora o entendimento jurisprudencial e doutrinário seja majoritariamente contrário à possibilidade de cumulação dos adicionais, há avanços significativos em favor dessa cumulatividade. Essa nova perspectiva, ainda que de forma tímida, está se consolidando na jurisdição brasileira.
Palavras-chave: Atividades insalubres e perigosas, Cumulação de adicionais, Direito do Trabalho, Normas trabalhista, Impactos socioeconômicos.
ABSTRACT
This paper aims to examine the unhealthy and dangerous work activities provided for in the CLT (Consolidation of Labor Laws) and protected by the employment contract of the employees who perform them. Specifically, it seeks to analyze the possibility of cumulating additional payments related to activities considered risky by Labor Law. In the social context, the choice of the theme is based on the theory that the law has the human being as its main focus, following the advances of society. The paper begins by interpreting the rules of the Consolidation of Labor Laws in light of constitutional precepts, in addition to analyzing doctrines, jurisprudence (including legislation, summaries and Regulatory Norms of the Ministry of Labor and Employment) and decisions of the Regional Labor Courts and the Superior Labor Court. Next, the possibility of culminating additional payments for unhealthy and dangerous conditions is assessed. Finally, the benefits, disadvantages, and social and economic impacts of this cumulation in the employment contract are described. The methodology is based on bibliographical research with a qualitative approach, seeking to understand the historical positions of jurists and the developments on the subject. In addition, the study is based on authors such as Martins and Delgado. It is concluded that, although the jurisprudential and doctrinal understanding is mostly against the possibility of cumulating additional payments, there are significant advances in favor of this cumulation. This new perspective, albeit timidly, is consolidating itself in the Brazilian jurisdiction.
Keywords: Hazardous and dangerous activities, Cumulative allowances, Labor Law, Labor regulations, Socioeconomic impacts.
1. INTRODUÇÃO
Os direitos trabalhistas tomaram força com a chegada da evolução industrial. Atualmente norteado pela CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas, o direito trabalhista rege aspectos fundamentais do trabalhador, regularizando seus direitos e deveres e garantindo de maneira fundamental a sua segurança, mais precisamente nas atividades periculosas e insalubres.
Os adicionais de periculosidade e insalubridade são benefícios concedidos para compensar os trabalhadores que desempenham funções consideradas perigosas ou prejudiciais à saúde. O adicional de periculosidade é destinado àqueles que atuam em condições que apresentam riscos elevados à vida ou à integridade física. Já o adicional de insalubridade é voltado para quem trabalha exposto a agentes que podem comprometer a saúde. Esses adicionais representam importantes mecanismos criados pelo legislador para assegurar a proteção e a qualidade de vida dos trabalhadores brasileiros que enfrentam atividades de risco no dia a dia.
A problematização advém da possibilidade do mesmo trabalhador ser exposto a um local insalubre e periculoso, já que a própria legislação vigente obriga o empregado a optar por um dos adicionais, não admitindo de forma expressa a sua cumulação. Entretanto diante dos avanços sociais, surgem questionamentos importantes tais como: Quem deve optar pelo adicional a ser recebido? Quando e como admite-se a cumulação do adicional de periculosidade e insalubridade no contrato de trabalho? Quais os impactos sociais e econômicos caso esta cumulação venha a ser devidamente regularizada? Tais questionamentos dão origem a um debate e sobre a viabilidade da obtenção mútua dos adicionais, apresentando novos pensamentos dos doutrinadores e jurisprudências sobre o caso.
Tem-se, então, como objetivo geral analisar a possibilidade da cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, contemplando os trabalhadores que exercem atividades de forma simultânea à ação de dois ou mais agentes que possam refletir em danos à saúde e risco à vida, bem como verifica-se os benefícios, malefícios e impactos econômicos e sociais, com base em interpretações as normas da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho de acordo com os preceitos constitucionais, analisando-se posicionamentos doutrinários, jurisprudenciais (verificando legislação, súmulas e Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego) e decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunais Superior do Trabalho.
Em relação aos aspectos metodológicos, utiliza-se de pesquisa bibliográfica, valendo-se de informações e conhecimentos acerca do tema abordado, partindo de variadas doutrinas, da Constituição Federal, da Consolidação das Leis do Trabalho, das Normas Regulamentadoras, tal como de artigos jurídicos e decisões atualizadas, objetiva-se esclarecer esse conflito e insegurança que afligem os que atuam em atividades de risco. Quanto à utilização da pesquisa, esta é pura, haja vista propor-se à ampliação dos conhecimentos acerca do tema. No que diz respeito aos objetivos, dá-se mediante caráter exploratório, uma vez que tem como intuito principal a obtenção de informações a respeito do assunto, bem como descritiva.
Na primeira seção, discorre-se sobre as noções históricas, analisa-se os objetivos da segurança e medicina do trabalho; medidas preventivas da medicina do trabalho, abrangendo o exame médico e a importância dos equipamentos de proteção individual; órgão de segurança e medicina do trabalho nas empresas; e definições de locais insalubres relatando os critérios para detectar os graus de insalubridade.
Na segunda seção demonstra-se as definições dos adicionais de insalubridade e periculosidade, conceituando-os com seus critérios e remunerações, tal como suas bases de cálculo, natureza jurídica, perícia técnica e possibilidades de eliminação ou neutralização das condições insalubres.
Na terceira seção apresenta-se o impasse acerca da cumulação dos adicionais, verifica-se a legislação em vigor; visões majoritárias, comparando os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, antigos e atuais; e os fundamentos para cumulação dos adicionais, salienta-se os fatos geradores distintos, princípios do Direito do Trabalho, Constituição Federal e suas normas, e as Convenções da OIT – Organização Internacional do Trabalho.
Ante o exposto, busca-se apresentar uma dentre as diversas evoluções sociais que geram divergências e têm impacto direto no Direito Trabalhista. Considera-se que o direito deve acompanhar as evoluções humanas e moldar-se diante do ser humano. O tema torna-se importante para a sociedade visto que os trabalhadores são expostos cada vez mais a diversas atividades de risco, muitas configurando-se como insalubre e periculosa, simultaneamente.
Portanto, faz-se necessário que a sociedade conheça um posicionamento distinto daquele que já é de domínio público, vez que o assunto abordado tem divergências e justificativas doutrinárias recentes. Ressalta-se que a Consolidação das Leis Trabalhistas impõe ao trabalhador a escolha de um dos dois adicionais, ainda que a atividade laboral configure recebimento de ambos os adicionais. Economicamente, há de considerar-se a melhoria na qualidade de vida do trabalhador que põe sua vida em risco para o exercício de sua atividade laboral, ainda que apenas de viés financeiro.
2. MEIO AMBIENTE DE TRABALHO
Com o advento da revolução industrial, os direitos trabalhistas tomaram cada vez mais força, culminando com a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, que por sua vez regulariza aspectos fundamentais das relações de emprego, organizando os direitos e deveres de empregadores e empregados. O meio ambiente a qual o trabalhador está exposto tem impacto direto nestas relações trabalhistas.
Reconhecido pela Constituição Federal/88, com previsões nos artigos 7º, inciso XXII; artigo 200, inciso VIII e artigo 225 da referida legislação, o meio ambiente de trabalho é uma dimensão do meio ambiente que condiciona a saúde e qualidade de vida das pessoas (Brasil, 1988). Considera-se como meio ambiente de trabalho o local onde desenvolve-se as atividades laborais, devendo ser adequado e sadio para o trabalhador. Entretanto, existem funções que exigem exposição a riscos e agentes nocivos, que quando se configura é necessário que haja condições e condutas especiais para tais atividades.
Conforme Delgado (2020), o meio ambiente de trabalho representa muito mais do que um simples local de desempenho profissional; ele é um espaço essencial para a obtenção dos recursos que sustentam a vida humana. Seja em um estabelecimento fixo, nas ruas e áreas urbanas quando as atividades exigem deslocamento, ou mesmo no lar do trabalhador, especialmente com o crescimento do trabalho remoto, esse ambiente torna-se uma extensão da vida cotidiana, influenciando tanto a saúde quanto o bem-estar. Essa percepção amplia o entendimento de que o trabalho não se limita ao cumprimento de tarefas, mas envolve também condições que afetam diretamente a qualidade de vida e a dignidade do trabalhador.
É evidente que as questões relacionadas ao ambiente de trabalho vão muito além dos adicionais de insalubridade e periculosidade. No entanto, neste estudo, o foco será especificamente a análise desses dois temas.
3. DOS ADICIONAIS
Os adicionais trabalhistas são um acréscimo no salário que o trabalhador tem por direito assegurado na Consolidação das Leis Trabalhistas, como meio de reparar algum desgaste na saúde, que possa existir em decorrência da sua atividade laboral. Os mais comuns são os adicionais de insalubridade e periculosidade, sendo o primeiro relativo às funções das quais coloca-se em risco a saúde do trabalhador, e o segundo àqueles empregos que colocam o próprio trabalhador em risco.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, inciso XXII, garante aos trabalhadores “urbanos e rurais, um adicional de remuneração para as atividades penosas, na forma da lei”. (Brasil, 1998). Visa-se além da redução dos riscos inerentes ao trabalho, a melhoria de sua condição social.
É válido ressaltar que os adicionais trabalhistas possuem natureza salarial, consequentemente devem ser levados em conta para os cálculos a título de verbas trabalhistas. Ao mencionar adicionais, não há de se falar em direito adquirido, ou seja, pode-se perder o direito ao recebimento dos valores referente aos adicionais em geral. Tal possibilidade não é ponto negativo para ambos os pólos, há de enfatizar que quando não mais houver o recebimento de adicionais é equivalente a ausência de exposições às atividades de risco ou perigosas, ou seja, a vida do trabalhador não está mais exposta a riscos inerentes da atividade laboral.
3.1 Adicional de Insalubridade
Caracteriza-se por atividade insalubre, o trabalho executado perante a contato direto ou indireto, continuamente ou intermitente, com agentes nocivos à saúde do trabalhador, os chamados agentes insalubres. Resumidamente, a insalubridade pode ser entendida como a exposição do trabalhador a determinados agentes físicos, químicos ou biológicos em circunstâncias prejudiciais à saúde, que porventura possa existir no ambiente de trabalho.
Como mencionado, os adicionais estão dispostos no artigo 7º, inciso XXIII da Constituição Federal de 1988, sendo o adicional de insalubridade regulamentado pelo artigo 189 e seguintes da Consolidação das Leis Trabalhistas (Brasil, 1943). O Ministério do Trabalho e Emprego, através da Norma Reguladora – NR, nº 15 listou taxativamente as atividades, operações e agentes insalubres que ensejam o recebimento de algum tipo de benefício em virtude do contato do trabalhador com a insalubridade. O adicional de insalubridade é uma quantia adicionada simbolicamente ao salário fixo mensal do trabalhador a fim de compor sua remuneração e que compensá-lo economicamente pelo contato com agentes insalubres. Tal valor varia segundo o grau de exposição, de 10% a 40% (Brasil, 1978).
O artigo 189 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, conceitua “atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes noviços à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente” (Brasil, 1943) e do tempo de exposição aos seus efeitos.
Julga-se o adicional de insalubridade como uma espécie de indenização para os riscos tolerados pelo empregado, dos quais objetiva-se em manter a qualidade de vida do trabalhador. Entretanto, observa-se que a atividade ou operação insalubre, por si só não dá ao empregado a prerrogativa de receber o adicional, faz-se necessário que o trabalhador seja exposto ao agente insalubre e que esta exposição esteja acima da limitação de tempo e/ou intensidade regulamentadas pela legislação em vigor. Vale ressaltar que um mesmo empregado pode submeter-se a mais de um agente insalubre.
Com o advento da reforma trabalhista, algumas mudanças foram feitas quanto às atividades insalubres. A norma antiga trazia por exemplo que a realização de serviços em atividades caracterizadas como insalubre, em horário extraordinário, só poderia ocorrer com autorização prévia da autoridade competente, com a reforma trabalhista há o surgimento de uma exceção para aqueles trabalhadores que prestam serviços em jornada de 12×36, trabalham doze horas e folgam trinta e seis horas. Especificamente para o trabalhador com esta jornada, a nova Consolidação das Leis Trabalhistas rege que não há necessidade de autorização prévia de autoridade competente.
Outra modificação relevante e polêmica trazida pela reforma, foi a respeito de empregadas gestantes e lactantes. Anteriormente a legislação proibia empregadas gestantes ou lactantes de exercer funções insalubres durante toda a gestação, independente do grau, objetivando a proteção da saúde da mulher e do feto seguindo princípios da Constituição Federal, normas internacionais e de direitos humanos, que preveem a preservação da saúde da gestante, nascituro e recém-nascido. A nova legislação alterou o texto do artigo 394-A, estabelecendo que grávidas com funções insalubres só serão afastadas imediatamente quando configurada insalubridade de grau máximo, concedendo o afastamento pertinente ao grau médio e mínimo quando da apresentação de atestado médico emitido por médico de confiança da trabalhadora, que recomende o afastamento durante a gestação. No que tange às empregadas lactantes, independente do grau qualificado, o afastamento dá-se tal qual as gestantes de grau médio e mínimo, apresentando atestado médico emitido por médico de confiança da mulher (Brasil, 2017).
A alteração deu origem a um novo debate que originou a propositura de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI perante o STF, na qual resultou em decisão positiva do STF declarando inconstitucional o dispositivo 394-A, incisos II e III da Lei nº 13.467/2017 (Brasil, 2017). O Superior Tribunal Federal considerou de maneira majoritária que gestantes e lactantes não podem desempenhar atividades em locais insalubres independente do grau, assim como são obrigadas a apresentar atestado médico para o afastamento.
Levando em conta a proteção à maternidade e a integral proteção a criança como direitos fundamentais, a ADI 5938 modifica o que a reforma trabalhista trazia e passa a normatizar que a empregada gestante deverá ser afastada das atividades consideradas insalubres em grau máximo, durante o período gestacional e se tratando de grau médio e mínimo o afastamento ocorrerá quando recomendado. No que diz respeito a lactantes, o afastamento passa a ser considerado em qualquer grau, quando considerado necessário.
Dessarte, a regra impede que gestantes e lactantes sejam expostas a atividades de risco, independente do grau de insalubridade e determina que estas sejam realocadas para outras atividades dentro da empresa ou afastadas com recebimento do auxílio maternidade, sem fazer-se necessário apresentação de atestado médico.
3.2 Adicional de periculosidade
O adicional de periculosidade, assim como o adicional de insalubridade, é direito assegurado pela Constituição Federal e normas trabalhistas vigentes, correspondente àqueles trabalhadores em funções laborais que ofereçam algum tipo de risco à vida e integridade física do trabalhador. A periculosidade expõe a vida do trabalhador a risco imediato, como por exemplo em situações de trabalhadores em minas de carvão, exposição a assaltos, dentre outros. A legislação trabalhista considera atividades perigosas aquelas que por sua natureza ou métodos de trabalho impliquem em risco acentuado decorrente da “exposição permanente do trabalhador a inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial” (Brasil, 1943); uso de motocicletas; exposição à radiação ionizante e radioatividade e bombeiros civis.
Segundo Martinez (2021), entende-se por exposição permanente aquela que não pode ser afastada para o exercício da função, é associada diretamente a realização da função laboral e como risco acentuado sendo as situações que expõem os trabalhadores a ambientes suscetíveis a acidentes, possivelmente produtora de incapacitação, invalidez permanente ou morte.
Para que o adicional seja auferido deverá ser constatada a presença de perigo ou risco eminente, nos termos previstos em lei, fazendo-se necessário a atuação de perícia para a caracterização do trabalho perigoso e assim o devido recebimento do adicional. Entretanto, elimina-se a necessidade de avaliação pericial quando o empregador já pagava o adicional, por mera liberalidade ou quando do encerramento das atividades da empresa, podendo neste caso o magistrado utilizar-se de outros meios de prova para a identificação da periculosidade.
O Tribunal Superior do Trabalho decidiu que quando a exposição do empregado a um fator de risco for de maneira permanente, este terá direito ao adicional, bem como exposição de caráter intermitente. Entretanto, tratando-se de exposições eventuais, casos fortuitos, não configura o direito ao recebimento do adicional, assim como exposições habituais que expõem o trabalhador ao risco por tempo determinado e reduzido.
4. DA (IM)POSSIBILIDADE DA CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS
Como visto, dispõe-se o pagamento do adicional de insalubridade destinado aos trabalhadores que, no desempenho de suas funções, estão expostos a condições que podem prejudicar a saúde ou comprometer a integridade física. Já o adicional de periculosidade é voltado para aqueles cujas atividades envolvem exposição permanente a agentes classificados como perigosos pelo Ministério do Trabalho, representando um risco elevado para sua segurança.
Cumpridos os requisitos específicos de cada caso e devidamente estabelecidas as condições, o empregado que desempenha essas funções têm direito ao adicional correspondente. Para atividades insalubres, o valor será determinado pelo grau de exposição enfrentado. Já para funções consideradas perigosas, aplica-se o adicional fixo previsto pela legislação trabalhista.
Os adicionais devem ser entendidos como ferramentas criadas pelo legislador para oferecer maior proteção física e patrimonial aos trabalhadores brasileiros, considerando as circunstâncias inevitáveis que algumas atividades podem impor. Esses adicionais representam um meio de garantir melhores condições de vida para o trabalhador e sua família, funcionando como uma forma de compensação pelo risco à saúde, à integridade física e, em muitos casos, à própria vida. É essencial destacar que esses adicionais possuem natureza salarial, e não indenizatória, pois seu objetivo é recompensar o exercício de atividades perigosas e os riscos associados a elas.
Ocorre que existem funções que expõem os trabalhadores a riscos que justificam a concessão de ambos os adicionais. No entanto, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), vigente em nosso ordenamento, estabelece no artigo 193 que o empregado deve optar por apenas um dos adicionais, vedando o recebimento cumulativo. Apesar dessa previsão legal, a questão tem gerado diferentes interpretações entre doutrinadores e tribunais, suscitando um debate relevante e atual para a sociedade brasileira, que será explorado a seguir.
4.1 Da impossibilidade da cumulação dos adicionais
Conforme previsto na norma vigente, se o empregado tiver direito a dois adicionais, será necessário optar por apenas um, sendo vedada a cumulação. Aqueles que defendem essa proibição baseiam seus argumentos no artigo 193, §2º da CLT, no item 15.3 da NR-15 e no item 16.2.1 da NR-16, que estabelecem:
Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:
[…]
§ 2º. O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Brasil, 1943).
[…]
NR 15. Item 15.3 No caso de incidência de mais de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa. (Brasil, 1978).
[…]
NR 16. Item 16.2.1 O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Brasil, 1978).
De acordo com Santos (2017), tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm entendido que a expressão “poderá optar” deve ser interpretada como “deve optar”. Isso significa que o empregado é obrigado a escolher entre um dos adicionais, caso estejam presentes ambos, pois não é permitido o recebimento simultâneo dos dois.
A ideia predominante entre os doutrinadores e as decisões jurisprudenciais ainda é a de que não é possível acumular os dois adicionais. No entanto, é cada vez mais comum observar o surgimento de novas perspectivas e convicções que ampliam o debate sobre o tema.
4.1.1 Legislação e entendimento doutrinário
A Constituição Federal, juntamente com a CLT e normas regulamentadoras, assegura o direito dos trabalhadores ao recebimento de adicionais, conforme já destacado. Contudo, uma questão que há tempos desperta debates no campo jurídico é a possibilidade de acumular os adicionais de insalubridade e periculosidade, quando o empregado estiver simultaneamente exposto a fatores que envolvam ambos os riscos.
Conforme demonstrado, a CLT e as Normas Regulamentadoras (NRs) sobre adicionais estabelecem que o empregado tem o direito de optar pelo adicional, mas não detalham a possibilidade de acumulação nas situações apresentadas. Nesse contexto, a doutrina brasileira, embora não seja unânime, em sua maioria acompanha o entendimento da norma trabalhista vigente, descartando a possibilidade de acumular os adicionais ao serem recebidos.
Sobre o tema, Garcia (2021) explica que, de acordo com o art. 193, §2.º, da CLT, o empregado tem o direito de escolher entre o adicional de periculosidade e o adicional de insalubridade, mas não pode receber ambos simultaneamente. Assim, o entendimento predominante é que não é possível incluir o adicional de insalubridade no cálculo do adicional de periculosidade, pois o recebimento de um exclui automaticamente o direito ao outro.
De forma similar, Martins (2022) argumenta que a legislação não proíbe o trabalhador de receber o adicional, permitindo-lhe optar pelo benefício mais vantajoso. Essa interpretação está em consonância com o princípio da legalidade, estabelecido no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, que assegura que ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, exceto se for em razão de lei.
De acordo com as análises que serão apresentadas ao longo deste trabalho, há argumentações fundamentadas na Convenção nº 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), especialmente no artigo 11, alínea b. Assim, vamos considerar o seguinte:
Art. 11 — Com a finalidade de tornar efetiva a política referida no artigo 4 da presente Convenção, a autoridade ou às autoridades competentes deverá garantir a realização progressiva das seguintes tarefas:
b) a determinação das operações e processos que serão proibidos, limitados ou sujeitos à autorização ou ao controle da autoridade ou autoridades competentes, assim como a determinação das substâncias e agentes aos quais estará proibida a exposição no trabalho, ou bem limitada ou sujeita à autorização ou ao controle da autoridade ou autoridades competentes; deverão ser levados em consideração os riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes. (Brasil, 1994).
Conforme argumenta Martins (2022), o artigo da Convenção aborda os riscos à saúde decorrentes da exposição simultânea a várias substâncias, e não estabelece que os adicionais de insalubridade e periculosidade devem ser pagos de forma cumulativa. O jurista defende que a Convenção tem como foco principal a proteção da saúde dos trabalhadores brasileiros, e não a forma de pagamento dos adicionais. Ele ressalta que a própria redação da CLT oferece um benefício aos trabalhadores, ao permitir que eles escolham o adicional mais vantajoso, garantindo-lhes maior autonomia sobre essa decisão.
Diante do que foi apresentado, prevalece na doutrina, embora não de forma unânime, o entendimento alinhado ao texto da CLT. Segundo essa interpretação, o empregado que exerce atividades simultaneamente insalubres e perigosas não teria direito ao recebimento cumulativo dos dois adicionais, podendo, entretanto, optar por aquele que lhe seja mais vantajoso.
4.1.2 Jurisprudência brasileira
A doutrina brasileira não apresenta um consenso uniforme em seus entendimentos, e a jurisprudência também enfrenta diversos questionamentos nesse campo. O Tribunal Superior do Trabalho tem debatido essa questão há bastante tempo, com decisões variadas ao longo dos anos. Entretanto, a maioria delas nega a possibilidade de cumulação, alinhando-se ao entendimento predominante na doutrina. O debate ganhou destaque em 2015, quando a 7ª Turma da Corte decidiu, de forma unânime, pela admissibilidade do pagamento de ambos os adicionais, desde que os fatos geradores das verbas fossem distintos (Brasil, 2015).
Com o passar dos anos, tornou-se consenso que o empregado deveria optar por um dos adicionais, considerando as respectivas porcentagens e bases de cálculo, com base na CLT. Dessa forma, o TST e outros tribunais trabalhistas definiram que não seria permitido ao empregado receber ambos os adicionais ao mesmo tempo, mesmo nos casos em que houvesse exposições concomitantes.
Em uma decisão, proferida em março de 2019, no âmbito de um Incidente de Recurso Repetitivo (IRR), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reafirmou a vedação à cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, mesmo quando fundamentados em fatos geradores distintos e autônomos. Essa posição reflete uma linha de entendimento que a jurisprudência brasileira vem sustentando ao longo dos anos, ao negar a possibilidade dessa cumulação. Contudo, é importante destacar que, ao longo do tempo, inúmeras decisões negativas baseadas nos artigos anteriormente mencionados foram proferidas, como será detalhado a seguir:
ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. De acordo com o art. 193, § 2º, da CLT, inviável a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade. Diversamente do entendimento do recorrente, inexiste violação ao disposto no art. 7º, incisos XXII e XXIII, da Carta Magna, na medida em que o referido dispositivo constitucional nada refere a respeito da possibilidade de cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade. Apelo parcialmente provido. (TRT-4 – RO: 00102164120125040332 RS 0010216- 41.2012.5.04.0332, Relator: JURACI GALVÃO JÚNIOR, Data de Julgamento: 29/08/2013, 2ª Vara do Trabalho de São Leopoldo).
RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. 1. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. CUMULAÇÃO INDEVIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que, em atenção aos termos do art. 193, § 2º da CLT, é indevida a percepção cumulada dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, ainda que sejam distintos os fatos geradores. II. Atual decisão da SBDI-1 do TST. III. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (RR-953-44.2014.5.02.0049, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 15/05/2020).
Diante disso, nota-se que não apenas a doutrina, mas também a jurisprudência brasileira, seguindo o raciocínio do texto da legislação vigente, consolidaram entendimentos desfavoráveis à cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade. Tal posicionamento tem como fundamento o artigo 193, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que estabelece a possibilidade de escolha pelo trabalhador do adicional mais vantajoso, vedando o recebimento acumulado.
Essa interpretação jurídica visa evitar o enriquecimento sem causa e respeitar os limites impostos pela legislação trabalhista, além de resguardar o equilíbrio nas relações laborais e o princípio da razoabilidade. Desse modo, a construção doutrinária e jurisprudencial reforça a aplicação restritiva da norma, balizando os direitos dos trabalhadores e os deveres dos empregadores.
4.2 Da possibilidade da cumulação dos adicionais
Como já mencionado, há situações em que o trabalhador é exposto simultaneamente a agentes que caracterizam insalubridade e periculosidade. Embora essa não seja a visão predominante, ao longo dos anos surgiram entendimentos que defendem o direito desses trabalhadores de receber ambos os adicionais de forma cumulativa.
A corrente minoritária apresenta fundamentos diversos em sua argumentação. Defende-se que, por terem origens independentes, os adicionais conferem aos empregados direitos distintos, que podem ser cumulados. Observa-se que o adicional de insalubridade está relacionado à compensação pela exposição do trabalhador a agentes insalubres, quando esses não podem ser eliminados ou neutralizados. Já o adicional de periculosidade visa compensar o risco inerente à própria atividade laboral do empregado. Nesse contexto, há quem considere injusta a impossibilidade de acumulação dos dois adicionais, especialmente quando o trabalhador enfrenta, simultaneamente, múltiplos riscos sem a devida compensação.
Além de terem origens distintas, a fundamentação aborda os princípios trabalhistas, questiona a constitucionalidade do artigo atualmente previsto na CLT e destaca sua revogação com a ratificação da Convenção nº 155 da OIT (Brasil, 1994).
Diante dos argumentos apresentados, é fundamental destacar que a própria Constituição Federal assegura a relevância das Convenções Internacionais, ao prever que os tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil são válidos mesmo quando abordados no texto constitucional. Além disso, merece atenção a Emenda Constitucional nº 45/2004, que trouxe uma importante inovação: os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, quando aprovados por ambas as Casas do Congresso Nacional em dois turnos e com o quórum qualificado de três quintos dos votos dos parlamentares, passam a ter status equivalente ao de emendas constitucionais.
Além disso, o ordenamento jurídico brasileiro incorporou as Convenções nº 148 e nº 155 da Organização Internacional do Trabalho, que reconhecem a possibilidade de cumulação dos adicionais. Veja-se:
CONVENÇÃO Nº 148 da OIT – Art. 8 — 1. A autoridade competente deverá estabelecer os critérios que permitam definir os riscos da exposição à contaminação do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho, e fixar, quando cabível, com base em tais critérios, os limites de exposição. (OIT, 1977).
2. Ao elaborar os critérios e ao determinar os limites de exposição, a autoridade competente deverá tomar em consideração a opinião de pessoas tecnicamente qualificadas, designadas pelas organizações interessadas mais representativas de empregadores e de trabalhadores. (OIT, 1977).
3. Os critérios e limites de exposição deverão ser fixados, completados e revisados a intervalos regulares, de conformidade com os novos conhecimentos e dados nacionais e internacionais, e tendo em conta, na medida do possível, qualquer aumento dos riscos profissionais resultante da exposição simultânea a vários fatores nocivos no local de trabalho. (OIT, 1977).
CONVENÇÃO Nº 155 da OIT – Art. 4 — 1. Todo Membro deverá, em consulta com as organizações mais representativas de empregadores e de trabalhadores, e levando em conta as condições e as práticas nacionais, formular, pôr em prática e reexaminar periodicamente uma política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e o meio-ambiente de trabalho. (Brasil, 1994).
O objetivo principal dessas Convenções vai além de simplesmente compensar os trabalhadores por meio de remuneração. Elas se alinham ao propósito da legislação brasileira, que visa resguardar a dignidade e a segurança humana. Nesse contexto, buscam oferecer ao trabalhador uma proteção mais robusta, incentivando os empregadores a reduzirem, de forma progressiva, os níveis de exposição a condições prejudiciais. Assim, a possibilidade de cumulação dos adicionais surge como um mecanismo para estimular os empregadores a minimizar os riscos inerentes às atividades e os agentes nocivos, contribuindo, ao mesmo tempo, para a melhoria contínua da qualidade do ambiente de trabalho.
Assim, é importante reconhecer que as Convenções Internacionais possuem um status jurídico superior às leis, mas inferior à Constituição. Com isso, elas têm o poder de revogar o disposto no art. 193, §2º, que trata da escolha do adicional pelo empregado, consolidando o entendimento de que é possível acumular os adicionais de insalubridade e periculosidade.
4.2.1 Posicionamento doutrinário
O adicional de insalubridade é diferente do adicional de periculosidade, pois ambos possuem fatores geradores distintos, como já mencionado. Quando o trabalhador está exposto a mais de um risco, decorrente de agentes insalubres e de operações perigosas, parece incoerente negar-lhe o direito de receber compensação pelos dois tipos de danos que enfrenta.
Conforme Souto Maior (2004), a proteção do ser humano no ambiente de trabalho e a redução dos riscos ocupacionais devem ser prioridades. Nesse sentido, é insustentável a ideia de que o pagamento de um adicional elimine automaticamente a obrigação de pagar outro. Cada elemento insalubre presente no trabalho gera o direito ao respectivo adicional, que pode ser somado ao adicional de periculosidade, caso também seja devido, de forma justa e coerente.
Acompanhando essa linha de pensamento, Martinez (2021) aponta que, independentemente da interpretação que se possa atribuir ao referido dispositivo, a realidade é que ele foi efetivamente revogado pela Convenção nº 155 da OIT. Essa convenção, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro em 1994, possui status de supralegalidade.
Um dos argumentos apresentados pelos doutrinadores em defesa da possibilidade de cumulação dos adicionais baseia-se nos princípios fundamentais do Direito do Trabalho, especialmente no princípio da norma mais favorável ao trabalhador. Nesse sentido, Delgado explica que esse princípio orienta o operador do Direito em três diferentes contextos. Primeiro, durante a criação das normas, servindo como guia para a ação legislativa. Segundo, no confronto entre normas conflitantes, auxiliando no processo de hierarquização das regras trabalhistas. E, por fim, na interpretação das normas jurídicas, orientando a compreensão do sentido mais favorável ao trabalhador.
Com o tempo, os entendimentos vão evoluindo, e, embora a doutrina muitas vezes apresenta resistência, há renomados doutrinadores que defendem que a cumulação dos adicionais pode trazer benefícios tanto para o empregado quanto para o empregador.
4.2.2 Posicionamento jurisprudencial
Como apresentado, a maioria dos tribunais e magistrados entende o §2º do art. 193 da CLT como uma vedação ao recebimento cumulativo dos adicionais de insalubridade e periculosidade. No entanto, também se destaca, entre outros fatores analisados, a existência de uma lacuna na lei, uma vez que ela não proíbe de forma expressa a possibilidade de acumulação desses adicionais.
Em todo o país, os entendimentos variam bastante. Em alguns casos, os tribunais reconhecem a possibilidade de cumulação, enquanto em outros, entendem pela sua impossibilidade. Nesse contexto, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região adotou um posicionamento favorável à cumulação nos casos em que houver exposição simultânea a agentes insalubres e perigosos, conforme demonstrado a seguir:
EMENTA: CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. Importante observar que os tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil gozam de hierarquia supralegal. As disposições contidas na Convenção n. 155 da OIT, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 2, de 17.03.92, ratificada em 18.05.92 e promulgada pelo Decreto n. 1.254, de 29.09.94, devem prevalecer sobre aquelas constantes do parágrafo 2º , do art. 193 da CLT e do item 15.3 da NR-15. A norma constitucional, quando tratou do “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas”, não estabeleceu qualquer impedimento à sua cumulação, até porque os adicionais são devidos por causas e com fundamentos absolutamente diversos. A impossibilidade de percepção cumulada dos adicionais de periculosidade e insalubridade constante do parágrafo 2º, do art. 193 da CLT e do item 15.3 da NR-15 não se mostra compatível com as normas constitucionais mencionadas, notadamente ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho e ao meio ambiente laboral saudável. (SÃO PAULO – TRT-2 – RECURSO ORDINÁRIO RO 00022934620125020064. Relator: Ivete Ribeiro, 2012).
A legislação trabalhista estabelece que a avaliação da insalubridade e da periculosidade deve ser realizada por meio de perícia técnica conduzida por um profissional vinculado ao Ministério Público do Trabalho ou por um engenheiro do trabalho. Atualmente, há decisões favoráveis que permitem a cumulação dos adicionais, com base nessas perícias consideradas oficiais, garantindo o cumprimento das exigências legais.
Embora em menor quantidade, as jurisprudências que defendem a possibilidade de cumulação dos adicionais têm crescido, refletindo decisões que buscam assegurar o direito constitucional do trabalhador brasileiro de recebê-los de forma simultânea.
É importante destacar o crescimento dessa corrente de pensamento, evidenciado em diversos projetos de lei já apresentados. Um dos primeiros exemplos é o Projeto de Lei nº 4983/2013, proposto em fevereiro de 2013 pelo deputado Carlos Bezerra. Esse projeto sugere a modificação do §2º do art. 193 da CLT, com o objetivo de permitir a acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade. O deputado argumenta que não há justificativa razoável para limitar o trabalhador ao recebimento de apenas um dos adicionais quando suas atividades envolvem tanto condições perigosas quanto insalubres. Ele defende que os fatores que geram esses adicionais são independentes, o que reforça a possibilidade de recebimento cumulativo.
Entre os projetos que buscam regulamentar a cumulação dos adicionais, destaca-se o Projeto de Lei nº 1.0679/2018, apresentado em agosto de 2018 pelo deputado mineiro Patrus Ananias. Em sua justificativa, o projeto propõe a alteração do §2º do artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com o objetivo de assegurar a possibilidade de cumular os adicionais. O deputado argumenta que a Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XXIII, foi clara ao garantir de forma ampla e plena o direito ao recebimento desses adicionais, sem impor restrições quanto à sua cumulação. Além disso, defende que os adicionais não podem ser entendidos como pagamentos duplicados, já que cada um deles possui finalidades e naturezas distintas.
O conceito que sustenta a possibilidade de acumulação dos adicionais tem ganhado cada vez mais força ao longo do tempo, com a jurisprudência e as doutrinas se ajustando a essa ideia. É importante destacar que as leis trabalhistas têm como objetivo orientar as relações de trabalho com base em diversos princípios, sendo um dos principais a aplicação da norma mais favorável ao trabalhador. Nesse sentido, a tendência é que os entendimentos e decisões sejam cada vez mais favoráveis à acumulação dos adicionais, pois essa prática busca promover uma relação de qualidade entre empregado e empregador, em vez de ser um meio de gerar ganhos indevidos.
5. CONCLUSÃO
Este trabalho buscou explorar e apresentar reflexões sobre os adicionais de insalubridade e periculosidade, abordando o histórico dos direitos trabalhistas, destacando as particularidades desses adicionais e examinando os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da possibilidade de cumulação em casos de atividades que envolvam simultaneamente ambos os fatores.
Importante destacar que, assim como o Direito Trabalhista tem como objetivo proteger os direitos dos trabalhadores brasileiros, cuidando também da qualidade de vida, segurança e bem-estar, este diálogo busca identificar qual posicionamento mais se alinha com os ideais desse ramo do Direito no Brasil.
Evidente que, há muito tempo, as normas trabalhistas demonstram uma preocupação em garantir a segurança do trabalhador. Isso ocorre porque, antes de ser um empregado, ele é uma pessoa humana, com direitos fundamentais que precisam ser respeitados e assegurados, independentemente da função laboral que venha a desempenhar. Nesse sentido, os adicionais de insalubridade e periculosidade refletem os princípios estabelecidos pela Constituição Federal, que visam promover a qualidade de vida e o bem-estar do ser humano, adaptados ao contexto do ambiente de trabalho.
Quando se analisa a questão da cumulação dos adicionais, tema central deste trabalho, percebe-se que ainda há um impasse tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Embora a maioria das posições seja contrária à possibilidade de cumulação, a corrente que defende o entendimento oposto vem ganhando espaço, apresentando argumentos e posicionamentos relevantes que merecem ser considerados.
Atualmente, a maioria das doutrinas e jurisprudências segue a regra estabelecida pela legislação trabalhista, que determina que o empregado deve optar por apenas um dos adicionais, seja de insalubridade ou de periculosidade, sem permitir a cumulação. No entanto, é importante refletir sobre os casos em que a norma não considera situações cotidianas do ambiente de trabalho, fortalecendo os argumentos daqueles que defendem a possibilidade de cumulação. Isso se deve, principalmente, ao fato de que muitas funções laborais expõem os trabalhadores simultaneamente a condições insalubres e perigosas, aumentando significativamente os riscos à sua saúde e segurança.
Dessa forma, ao não se admitir a cumulação dos adicionais, desvia-se do princípio de que o Direito Trabalhista deve estar alinhado à Constituição Federal. Essa postura pode ser interpretada como uma omissão diante da proteção ao bem-estar, à saúde e à segurança dos trabalhadores brasileiros, especialmente quando estão sujeitos a condições de trabalho que envolvem riscos significativos.
É inegável que os altos índices de acidentes no ambiente de trabalho reforçam a urgência de repensar as posturas adotadas em relação a essa questão. Afinal, como já destacado, cada um desses fatores prejudiciais afeta a saúde dos trabalhadores e os expõe a riscos significativos, colocando suas vidas em perigo.
É fundamental adotar políticas que busquem, de forma contínua, reduzir ou eliminar os riscos no ambiente de trabalho, tornando-o cada vez mais seguro. Com o passar do tempo, é importante também considerar a possibilidade de acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, como estratégia para minimizar a exposição dos trabalhadores a condições que possam comprometer sua saúde, segurança, bem-estar e integridade física. Afinal, a vida é o bem mais precioso que possuímos. Assim, reforça-se a necessidade de proteger, de maneira coletiva, a integridade física e a saúde dos trabalhadores, um direito garantido pela Constituição Federal e indispensável para a preservação e valorização da vida humana.
REFERÊNCIAS
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1Aluno de bacharelado em Direito da FACULDADE DE TECNOLOGIA DE TERESINA – CET.
2Aluno de bacharelado em Direito da FACULDADE DE TECNOLOGIA DE TERESINA – CET.
3Mestra em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Professora de Direito da Faculdade CET: https://orcid.org/0000-0003-1276-9426 E-mail: professor21@cet.edu.br
4Mestra em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Professora de Direito da Faculdade CET. E-mail:professor11@faculdadecet.edu.br
5Mestra em Direito. Pós-graduada em Contabilidade Fiscal e Tributária. Graduada em Direito. Graduada em Ciências Contábeis. Professora do curso de Direito da Faculdade CET. E-mail: professor15@faculdadecet.edu.br ID Lattes: http://1837081361490207 ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6958-1446
6Doutor em Educação. Mestre em Educação. Graduado em Ciências Sociais. Especialista em Gestão de Sistemas Educacionais. Professor da Faculdade CET. CV: https://lattes.cnpq.br/1647240795355981
7Mestra em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Professora de Direito da Faculdade CET. https://orcid.org/0000-0003-1276-9426. E-mail: professor21@cet.edu.br