DISCRIMINAÇÃO RELIGIOSA COMO CRIME DE ÓDIO: ANÁLISE À LUZ DO DIREITO PENAL BRASILEIRO 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11522551


Sâmya Corrêa Gentil1


RESUMO 

A importância de apresentar um tema tão recorrente na sociedade como a  intolerância religiosa e sua discriminação, uma vez que tem uma influência  profunda e multifacetada na cultura de uma sociedade. Impactando visivelmente em valores, ética e até mesmo em normas sociais. Uma vez que interagem  diretamente com comportamento social, além de atingir até mesmo o modo que  deve ser sucedido e realizadas festas comemorativas, cerimônias, relação  entre família, sexualidade, educação, alimentação e vestimenta. Por se existir  uma extensa diversidade de religiões no solo brasileiro, a intolerância e  discriminação se faz presente na sociedade acometendo a vida de inúmeras pessoas. Então discutir a questão da intolerância religiosa no entendimento do  direito brasileiro, bem como através desta pesquisa avaliar suas subdivisões e  possíveis impactos sociais. Se faz necessário demonstrar os danos causados às  vítimas, dando ênfase nas circunstâncias humilhantes na qual são submetidas  a optar por outras religiões. Além de verificar a eficiência jurídica brasileira  acerca da intolerância religiosa e discutir a relevância do direito penal brasileiro  para a diminuição em massa da intolerância religiosa. 

PALAVRAS-CHAVE: Intolerância Religiosa. Discriminação Religiosa. Cristianismo. Religião de Matriz Africana. Espiritismo. 

ABSTRACT 

The importance of presenting such a recurring theme in society as religious  intolerance and discrimination, as it has a profound and multifaceted influence on  the culture of a society. Visibly impacting values, ethics and even social norms.  Since the interaction directly with social behavior, in addition to reaching even the  way that celebratory parties, ceremonies, relationships between family, sexuality,  education, food and clothing should be carried out. Because there is an extensive  diversity of religions on Brazilian soil, intolerance and discrimination are present  in society and affect the lives of countless people. Then discuss the issue of  religious intolerance in the understanding of Brazilian law, as well as through this  research evaluate its subdivisions and possible social impacts. It is necessary to  demonstrate the damage caused to victims, emphasizing the humiliating  situations they are subjected to as a result of choosing other religions. In addition  to verifying Brazilian legal efficiency on religious intolerance and discussing the relevance of Brazilian criminal law for the mass reduction of religious intolerance. 

KEYWORDS: Religious intolerance. Religious Discrimination. Christianity. African Matrix Religion. Spiritism. 

1. INTRODUÇÃO  

É sabido que a religião no Brasil é marcada por uma enorme diversidade  e pelo sincretismo, refletindo a complexa interação entre as culturas indígena,  africana e europeia ao longo da história do país.  

O catolicismo romano é a religião que predomina no país, uma vez que  por volta do século XVI, com a colonização, os portugueses trouxeram consigo  o catolicismo – dando então início a religião no Brasil. É interessante saber que  a primeira missa celebrada no Brasil foi em 26 de abril de 1500, feita pelo frei  Henrique de Coimbra, marcando simbolicamente o início da religião cristã no  território brasileiro. 

Com isso, em 1549, os jesuítas desempenharam um papel crucial na  evangelização dos povos indígenas e na educação, fundando colégios e  missões. Os mesmos criaram missões (também chamadas de “reduções”) para  converter os indígenas ao cristianismo, ensinando-lhes o português e os  costumes europeus. Essas missões eram centros de catequese e educação,  mas também serviam aos interesses coloniais de pacificação e controle da  população indígena. 

As práticas religiosas indígenas eram reprimidas e consideradas pagãs.  No entanto, muitos indígenas adaptaram suas crenças e práticas para se  encaixarem na nova realidade, resultando em um sincretismo religioso. 

A partir do século XVI, com a importação massiva de africanos  escravizados, o Brasil viu a introdução das religiões africanas. Os africanos  trouxeram suas próprias tradições religiosas, como o candomblé, que foi  adaptado e sincretizado com elementos do catolicismo e, em alguns casos, das  religiões indígenas. 

Essa integração deu origem a religiões sincréticas como a Umbanda, que  incorpora elementos do espiritismo, do catolicismo, e das tradições religiosas  africanas e indígenas. 

Com a Proclamação da República em 1889, o Brasil passou a ser um  Estado laico, separando a Igreja do Estado. Essa mudança legal permitiu maior liberdade religiosa e a entrada de outras denominações cristãs, como os  protestantes, além de religiões não cristãs, como o espiritismo, que ganhou  popularidade no início do século XX. A imigração europeia e asiática no final do  século XIX e início do século XX também trouxe novas tradições religiosas, como  o judaísmo, o islamismo e o budismo. 

2. O INGRESSO DE ALGUMAS RELIGIÕES NO BRASIL 

2.1 Religiões de Matrizes Africanas 

As religiões de matrizes africanas chegaram ao Brasil principalmente  através do tráfico transatlântico de escravos, que trouxe milhões de africanos  para trabalhar nas plantações de açúcar, café e outras atividades coloniais. Os  africanos trazidos para o Brasil eram originários de diversas regiões da África,  especialmente do Golfo da Guiné (atual Nigéria, Benim, Togo) e da região de  Angola e Congo. Esses povos incluíam iorubás, jejes, bantus, entre outros, cada  um com suas próprias práticas religiosas. 

Ao chegar ao Brasil, os africanos encontraram uma sociedade católica e  repressiva em relação às suas práticas religiosas. Para sobreviverem, muitas  vezes integraram elementos do catolicismo às suas religiões originais,  resultando em um sincretismo religioso. Por exemplo, orixás (divindades  africanas) foram associados a santos católicos. Dando início a quatro religiões sendo elas: 

2.1.1 Candomblé 

Originado principalmente das tradições religiosas dos iorubás, jejes e bantus.  Cada grupo contribuiu com suas divindades e práticas específicas, formando um  panteão diverso de orixás, voduns e inquices. 

2.1.2 Umbanda 

Uma religião sincrética que combina elementos das religiões africanas,  espiritismo, catolicismo e religiões indígenas brasileiras. Surgiu no início do  século XX. 

2.1.3 Quimbanda 

Originalmente parte da Umbanda, desenvolveu-se como uma prática separada focada em rituais e entidades específicas. 

2.1.4 Tambor de Mina 

Presente principalmente no Maranhão, combina elementos das tradições  jeje e nagô. 

Durante o período colonial e parte do período republicano, as religiões de  matrizes africanas foram alvo de intensa perseguição, sendo muitas vezes  criminalizadas. 

No Brasil, com a primeira constituição republicana de 1891, o Estado  afirmou sua laicidade, porém, religiões afro-brasileiras, como Umbanda e  Candomblé continuaram sujeitas a perseguições políticas e sociais, e foram severamente reprimidas. Além de ser geralmente considerada uma religião  satânica, o ritualismo também fora associado à magia negra e feitiçaria, após  inúmeros boicotes, em 1988 a Constituição Federal trouxe garantias fundamentais para o culto religioso e seus praticantes, visando fortalecer o apoio  estatal à inviolabilidade dos locais sagrados e da liturgia. Botelho, B. D., Diniz, D.  G., Ferreira, M. T., & Gonçalves, E. O. S. (2023).  

As religiões de matrizes africanas são parte fundamental da cultura e identidade brasileira, refletindo a resistência e resiliência dos africanos e seus  descendentes no país. 

2.2 Espiritismo 

O espiritismo é hoje uma das principais correntes religiosas no Brasil, com  milhões de adeptos e uma presença significativa na sociedade através de suas  obras sociais e culturais. 

O Brasil possui o maior número de seguidores espíritas do mundo, os  espíritas ocupam a terceira posição entre os grupos religiosos mais  significativos, contando com 2,3 milhões de fiéis, de acordo com dados do IBGE.  A chegada da doutrina no país se deu em 1860, quando o responsável e diretor  do Colégio Francês no Rio de Janeiro divulgou a versão em português das obras  “Os tempos estão chegando” (“Les Temps sont arrivés”) e “O Espiritismo em sua  forma mais simples” (“Le Spiritisme à sa plus simple expression”). 

Uma vez que a garantia da liberdade religiosa já estava estabelecida no início do século, o espiritismo não enfrentou muita oposição ao chegar ao Brasil.  Por tratar de um tema presente no imaginário popular (forças sobrenaturais,  almas), a fusão com o kardecismo foi bastante significativa, apesar de ser uma  crença relativamente recente no território brasileiro. Houve uma grande  influência de elementos do candomblé e de algumas correntes do  protestantismo; este tema será explorado em detalhes nas próximas seções. 

A primeira instituição espírita oficialmente estabelecida no Brasil foi o  Grupo Familiar de Espiritismo, criado em 1865 por Luiz Olímpio Teles de  Menezes, em Salvador, Bahia. Esse grupo foi o precursor na organização de  reuniões espíritas e na propagação dos ensinamentos de Kardec. Em 1873, foi  fundado, no Rio de Janeiro, outro centro espírita importante denominado Grupo  Confúcio, que posteriormente se transformaria na Sociedade de Estudos  Espíritas Deus, Cristo e Caridade. 

A FEB, fundada em 1884 no Rio de Janeiro, foi crucial para a organização  e unificação do movimento espírita no Brasil. Ela se tornou a principal entidade  representativa do espiritismo no país, promovendo congressos, eventos e a  publicação de obras espíritas. 

Bem como Francisco Cândido Xavier, conhecido como “Chico Xavier”, foi  uma das figuras mais influentes do espiritismo brasileiro e um grande  colaborador da FEB. Seus livros psicografados e sua atuação mediúnica tiveram  um impacto profundo no movimento espírita. Chico Xavier é uma figura central  no espiritismo, cuja obra e exemplo pessoal deixaram um legado duradouro. Sua  influência vai além da literatura espírita, englobando um compromisso profundo  com a caridade, a ética e a espiritualidade. 

2.3 Islamismo 

A origem do islamismo no Brasil pode ser rastreada até o período colonial,  mas sua presença significativa e estruturada começou a se formar com a  imigração de muçulmanos no final do século 19 e início do século 20. 

Durante o período colonial, muitos dos africanos trazidos como escravos  para o Brasil eram muçulmanos, especialmente aqueles de regiões da África  Ocidental como a atual Nigéria, onde o islamismo já estava bem estabelecido.  Estes escravos, conhecidos como malês (derivado de “imale”, que significa  muçulmano em iorubá), trouxeram suas práticas religiosas para o Brasil. Em 1835, os muçulmanos africanos organizaram a Revolta dos Malês em Salvador,  Bahia. A revolta foi uma das mais significativas rebeliões de escravos no Brasil  e tinha um caráter claramente islâmico, com os líderes inspirando-se em sua fé  e buscando estabelecer uma ordem social conforme seus princípios religiosos. 

Ainda no final do século 19 e início do século 20, o Brasil recebeu um  grande número de imigrantes do Oriente Médio, especialmente da Síria e do  Líbano, muitos dos quais eram muçulmanos. Estes imigrantes estabeleceram  comunidades nas grandes cidades brasileiras, como São Paulo, Rio de Janeiro  e Foz do Iguaçu. 

Tanto é que a primeira mesquita do Brasil, a Mesquita Brasil, foi  inaugurada em 1956 em São Paulo. Ela foi construída justamente por esses  imigrantes sírios e libaneses, tornando-se um importante centro para a  comunidade muçulmana. 

Nos últimos anos, tem havido um aumento no número de brasileiros  convertidos ao islamismo, atraídos pela espiritualidade e pelos ensinamentos da  fé islâmica. A comunidade muçulmana no Brasil é diversa, incluindo não apenas  descendentes de imigrantes do Oriente Médio, mas também brasileiros  convertidos ao islamismo e imigrantes de outras regiões como a África e o  Sudeste Asiático. 

3. O BRASIL ENQUANTO ESTADO LAICO 

O Brasil é consagrado como um estado laico, um princípio fundamental  delineado na Constituição Federal de 1988. A laicidade do Estado representa a  independência em relação a influências religiosas específicas, garantindo que o  governo não favorece nem discrimina qualquer crença religiosa. Esse princípio  é crucial para assegurar a liberdade religiosa e a igualdade de tratamento para  todos os cidadãos, independentemente de suas convicções espirituais. 

A Constituição garante a liberdade de crença e culto, proporcionando aos  cidadãos o direito de seguir sua fé, mudar de religião ou mesmo optar por não  seguir nenhuma. Além disso, o princípio da igualdade perante a lei impede que  questões religiosas influenciam decisões governamentais, garantindo que todos  sejam tratados de maneira justa, independentemente de suas convicções  pessoais.

Embora o ensino religioso seja permitido nas escolas públicas, a  legislação estabelece que deve ser de natureza não confessional, ou seja, sem  promover uma religião específica. Essa abordagem busca respeitar a  diversidade religiosa presente na sociedade brasileira. 

A laicidade do Estado não impede a expressão das diversas crenças na  esfera pública, mas visa a criação de um ambiente em que as diferentes religiões  coexistem harmoniosamente. Essa abordagem reforça a ideia de uma sociedade  inclusiva, onde a liberdade religiosa é protegida e respeitada como um direito  fundamental de todos os cidadãos brasileiros. 

4. A LAICIDADE ACERCA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1998

A laicidade no contexto da Constituição Federal do Brasil refere-se ao  princípio de separação entre Estado e religião, garantindo a autonomia das  esferas secular e espiritual. Esse princípio está consagrado em diferentes artigos  da Constituição de 1988. Alguns pontos importantes incluem: 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,  à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 
(…)
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; 

Este artigo assegura a liberdade de consciência e de crença, garantindo  a todos o livre exercício dos cultos religiosos e a proteção aos locais de culto.

Artigo 19, I – Liberdade de Manifestação do Pensamento: …] o Estado não professa nem favorece (nem pode professar ou favorecer) nenhuma religião; dessa forma, ele contrapõe-se ao Estado confessional –em que se inclui o assim chamado ‘Estado ateu’, considerando que este assume uma posição caracteristicamente religiosa, mesmo que seja em um sentido negativo. 
Dessa forma, seguindo a laicidade, o Estado não possui doutrina oficial, tendo como consequências adicionais que os cidadãos não precisam filiar-se a igrejas ou associações para terem o status de cidadãos e inexiste o crime de heresia (ou seja, de doutrinas e/ou interpretações discordantes e/ou contrárias à doutrina e à interpretação oficial) – [LACERDA, Gustavo Biscaiade. Sobre as relações entre Igreja e Estado: conceituando a laicidade.In: CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. (Org.). Ministério Público: em defesa do Estado laico. Brasília: CNMP, 2014. v.1. p. 181] 

Este artigo protege a liberdade de expressão, incluindo manifestações de  pensamento, sem qualquer forma de censura, o que contribui para a livre  expressão de diferentes ideias, incluindo aquelas relacionadas à religião. 

Artigo 19, VI – Organização Religiosa: veda aos Estados, Municípios, à União e ao Distrito Federal o estabelecimento de cultos religiosos ou igrejas, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou suas representantes relações de  dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público. 

Garante a inviolabilidade da liberdade de associação para fins religiosos,  permitindo a organização e a prática de atividades próprias de suas finalidades. A laicidade, portanto, está incorporada à Constituição Federal como um  princípio que visa garantir a liberdade religiosa, a igualdade entre diferentes  crenças e a autonomia do Estado em relação a influências religiosas. Essa  abordagem visa criar um ambiente em que a diversidade de convicções possa  coexistir pacificamente, promovendo uma sociedade inclusiva e respeitando os  direitos fundamentais de todos os cidadãos. 

4.1 A intolerância religiosa e a liberdade religiosa  

A intolerância religiosa refere-se à atitude de discriminação, hostilidade ou  falta de aceitação em relação às crenças, práticas ou membros de uma  determinada religião. Esse fenômeno ocorre quando indivíduos ou grupos  mostram uma falta de respeito pelos direitos fundamentais de liberdade de  religião ou crença de outras pessoas. Pode se manifestar de várias maneiras,  incluindo verbalmente, fisicamente, socialmente ou até mesmo legalmente. 

A intolerância religiosa é um conjunto de ideologias e atitudes ofensivas a crenças e práticas religiosas ou a quem não segue uma religião. É um crime de ódio que fere a liberdade e a dignidade humana. O agressor costuma usar palavras agressivas ao se referir ao grupo religioso atacado e aos elementos, deuses e hábitos da religião. Há casos em que o agressor desmoraliza símbolos religiosos, destruindo imagens, roupas e objetos ritualísticos. Em situações extremas, a  intolerância religiosa pode incluir violência física e se tornar uma perseguição. 

A intolerância religiosa muitas vezes resulta de preconceitos, estereótipos  e mal-entendidos sobre as práticas, crenças ou identidades religiosas de outros.  Pode ocorrer em diferentes contextos, como entre indivíduos, comunidades,  sociedades ou mesmo em níveis institucionais. Essa forma de intolerância é  prejudicial para a coexistência pacífica e para a diversidade cultural e religiosa  em uma sociedade. 

Já a liberdade religiosa é um alicerce essencial dos direitos humanos,  reconhecido e protegido em diversas declarações, constituições e tratados  internacionais. Este princípio fundamental reflete a convicção de que cada  indivíduo tem o direito intrínseco de escolher, praticar e professar sua própria fé,  ou de optar por não seguir nenhuma religião. 

Desta forma, Jorge Miranda expõe que: 

A liberdade religiosa não consiste apenas em o Estado a ninguém impor qualquer religião ou a ninguém impedir de professar determinada crença. Consiste ainda, por um lado, em o Estado permitir ou propiciar a quem seguir determinada religião o cumprimento dos deveres que dela decorrem (em matéria de culto, de família ou de ensino, por exemplo) em termos razoáveis. E consiste, por outro lado (e sem que haja  qualquer contradição), em o Estado não impor ou não garantir com as leis o cumprimento desses deveres. 

A liberdade religiosa abrange uma variedade de dimensões, desde a  liberdade de crença até a liberdade de culto e expressão religiosa. Isso implica  que cada pessoa tem o direito de abraçar as convicções que ressoam com sua  consciência, de participar de práticas religiosas e de compartilhar suas crenças  com outros, sem receio de represálias ou discriminação. 

Além disso, a liberdade religiosa defende a proteção contra qualquer  forma de discriminação baseada em crenças ou práticas religiosas. Todos  devem desfrutar de oportunidades iguais, independentemente de sua filiação  religiosa, em um esforço para construir sociedades mais inclusivas e respeitosas  da diversidade. 

A liberdade religiosa não apenas fomenta a harmonia social, mas também  promove a compreensão mútua entre pessoas de diferentes tradições religiosas.  Ela desempenha um papel vital na construção de comunidades onde as  diferenças são celebradas e onde a coexistência pacífica é cultivada. 

No mundo cada vez mais interconectado, a promoção da liberdade 

religiosa é crucial para garantir o respeito pelos direitos individuais e para  construir sociedades baseadas na justiça, compaixão e compreensão. Ao  reconhecer e proteger a liberdade religiosa, estamos contribuindo para a  construção de um mundo onde a diversidade de crenças é vista como um ativo  valioso e onde a paz é alcançada através do respeito mútuo. 

4.2 A defesa da liberdade religiosa a luz do direito penal 

A proteção da liberdade religiosa no âmbito do direito penal é um pilar  essencial das sociedades democráticas que buscam salvaguardar a diversidade  de crenças e garantir o exercício desimpedido da fé individual. O direito penal  desempenha um papel crucial na defesa desses direitos fundamentais,  estabelecendo normas e punições para condutas que possam ameaçar ou violar  a liberdade religiosa. 

De acordo com o Código Penal brasileiro, são considerados crimes contra  a liberdade religiosa: 

Art. 208 – Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar base em suas crenças podem ser criminalizados para prevenir a propagação de hostilidade e proteger a coexistência pacífica. 

Ataques a locais religiosos, como igrejas, mesquitas ou sinagogas, são  tipicamente objeto de leis penais que buscam não apenas punir os responsáveis,  mas também proteger a liberdade de culto e preservar a segurança das  comunidades religiosas. 

Além disso, o direito penal reconhece o direito à objeção de consciência,  permitindo que indivíduos recusem participar de atividades que contrariem suas  crenças religiosas profundas, contanto que essa objeção seja equilibrada com  outros. 

O direito à liberdade religiosa é assegurado no Brasil pela Constituição  Federal de 1988, juntamente com outros direitos fundamentais. No entanto,  assim como os demais direitos contemplados na nossa Carta Magna, essa  liberdade não é absoluta e pode sofrer restrições caso entre em conflito com  outras garantias constitucionais. O direito à liberdade de crença, conforme  previsto no artigo 5º, inciso VI da CF/88, garante a inviolabilidade da liberdade  de pensamento e de escolha religiosa, permitindo aos indivíduos escolher sua 

própria religião, aderir a diferentes correntes religiosas, mudar de crença ou até  mesmo ser ateu. 

“à religião não é apenas sentimento sagrado puro. Não se realiza na simples contemplação do ente sagrado, não é simples adoração a Deus. Ao contrário, ao lado de um corpo de doutrina sua característica básica se exterioriza na prática dos ritos, no culto, com suas cerimônias, manifestações, reuniões, fidelidades aos hábitos, às tradições, na forma indicada pela religião escolhida” (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito  constitucional positivo. 17ªed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.250). 

No entanto, é importante ressaltar que o artigo VI da constituição é  dividido em duas partes distintas. A primeira parte trata da proteção dos cultos e  suas liturgias, estabelecendo que o exercício da liberdade religiosa deve estar  em conformidade com a lei, os bons costumes e a ordem pública. Já a segunda  parte aborda a proteção dos locais de culto, como templos e construções que  possuem características específicas de cada religião. A constituição federal de  1988 assegura a liberdade de religião como um direito fundamental e humano,  em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos. Esse  direito se estende aos imigrantes e refugiados, conforme o artigo 5º da CRFB/88.  O STF tem reiterado sua posição em garantir a liberdade religiosa no Brasil,  alinhado com a Corte Europeia de Direitos Humanos na interpretação de casos  concretos relacionados a esse direito fundamental. 

Com base no artigo 11§ 1º do acordo Brasil –Santa Sé e na lei 9.394/96  (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), diversas instituições de ensino públicas  oferecem aulas de religião com princípios da Igreja Católica. No entanto, em  oposição a essa prática, o Procurador-Geral da República ingressou com a ação  direta de inconstitucionalidade 4439/DF de 2017 requerendo uma interpretação  em conformidade com a Constituição dos artigos 33, §§ 1º e 2º da Lei 9.394/96  e do artigo 11, § 1º do acordo Brasil-Santa Sé. 

A Procuradoria-Geral da República ressaltou a proibição de oferecer  ensino religioso com viés sectário, visto que a matéria deve abordar a história e  as doutrinas de diferentes religiões, de forma neutra e secular. Ademais, é  necessário que seja lecionada por um docente comum do sistema de educação  e não vinculado a uma instituição religiosa é responsável pelo ensino religioso  nas escolas públicas. Foi decidido pelo STF que esse ensino pode ser 

confessional e rejeitou-se o pedido da PGR. Dessa forma, o STF determinou que  o Estado deve garantir o cumprimento do artigo 210, § 1º da Constituição Federal  de 1988, que prevê a inclusão do ensino religioso como disciplina regular no  horário letivo. Além disso, a oferta deve ser feita de forma equitativa entre as  religiões, seguindo os requisitos estabelecidos pelo Ministério da Educação. 

Conforme o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), a  liberdade de pensamento é o direito de um cidadão decidir por si mesmo quais  os critérios que irá seguir em termos morais ou éticos. Em contrapartida, a  liberdade de fé é o direito de uma pessoa professar ou não uma crença religiosa  sem sofrer consequências, assim como o direito de realizar atividades de  proselitismo religioso, com o objetivo de convencer outros fiéis a aderirem à sua  religião. Já a liberdade de culto é o direito de cada indivíduo ou grupo praticar  ritos de culto externos associados a uma fé específica. (STF, 2016). 

Deste modo, a preservação da liberdade de culto abrange não só a fé,  mas também assegura a execução de outras ações ligadas à espiritualidade,  desde que não excedam os limites da tolerância e não se convertam em  manifestações de intolerância. André Ramos Tavares aborda essa questão em  seus estudos: 

“As religiões, em maior ou menor grau, além de revelarem a sua própria concepção de “verdade” e de mundo, exigindo de seus adeptos a prática de condutas (e, invariavelmente, um modo de vida) relacionadas aos dogmas que lhe são subjacentes, buscam convencer as demais religiões de que é a sua verdade, aquela por ela apregoada, a correta. Não por outro motivo é que a Constituição de 1988, em seu art. 5º, VI, traz, paralelamente, à liberdade de consciência, a liberdade de crença (…)” (TAVARES, André Ramos. O direito fundamental ao discurso religioso: divulgação da fé, proselitismo e evangelização. Revista brasileira de estudos constitucionais, v. 10,2009. p. 35). 

Retornando ao exemplo específico, é preciso examinar se uma  circunstância real constitui ou não o delito de racismo, considerando-se o  potencial conflito entre liberdade de expressão e religião e a condenação ao  racismo. Foi alegado que a religião do acusado era o catolicismo e que,  juntamente com o judaísmo e o islamismo, eram crenças universais destinadas  a atrair mais seguidores para seguir seus princípios. 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a conclusão desse estudo, é de fácil percepção que o Brasil é uma  fusão de culturas trazidas para cá no momento de sua colonização, nessa fusão se deu abertura para novas culturas surgirem.  

O Brasil é, e deve ser um país laico dado a sua grande diversidade de  cultura introduzida oriunda de outras culturas provenientes de outros países,  com grande influência europeia e africana. 

Não é de se espantar a grande diversidade de religiões presentes em solo  brasileiro, sendo dever não somente do estado, mas também do povo zelar pelo  respeito uns com os outros. 

A liberdade religiosa no Brasil é um direito fundamental de nascença,  sendo ele um direito fundamental. 

Esse estudo notou que com o direito de liberdade religiosa já garantido na  Constituição, tão somente é possível buscar por justiça ou proteção na esfera  penal/criminal. Ficou evidente a restrição enfrentada pelo direito à liberdade  religiosa desde os tempos coloniais até o advento da república brasileira, quando  o país era regido por um Estado confessional marcado pela ligação estreita entre  o Estado e a igreja, e pela imposição de uma religião oficial. A transgressão aos  direitos de culto, crença e organização religiosa tem causado constrangimento à  sociedade, que se vê obrigada a seguir os preceitos de uma religião oficial.  Diante da falta de espiritualidade na sociedade, tornou-se essencial estabelecer  normas que gradualmente ampliassem os direitos ligados à liberdade religiosa. 

Desse modo, ressalta-se a importância de se dedicar esforços para  ultrapassar as penalidades estabelecidas para os delitos citados neste trabalho,  priorizando acima de tudo a conscientização dos intolerantes, além da aplicação  de medidas disciplinares que tenham como objetivo não só a punição, mas  também a educação para indivíduos que persistem na perpetração desses  crimes. 

A expectativa final é que a pesquisa possa contribuir com informações  para futuras pesquisas relacionadas e se torne uma fonte de consulta para a discussão acerca de políticas públicas visando diminuir a intolerância religiosa  no Brasil. 

6. REFERÊNCIAS

AGNER DE BARROS, Diego. A intolerância religiosa presente nos dias atuais e  no contexto escolar. A intolerância religiosa presente nos dias atuais e no  contexto escolar, 2022. 

NOGUEIRA, Sidnei. Intolerância religiosa. Pólen Produção Editorial LTDA, 2020. 

ADRAGÃO, Paulo Pulido. A liberdade religiosa e o estado. Coimbra: Almedina,  2002. 

STECK, Juliana. Intolerância religiosa é crime de ódio e fere a dignidade.   https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/especial-cidadania/intolerancia religiosa-e-crime-de-odio-e-fere-a-dignidadeAcesso em: 28 nov. 2023. 

CUNHA, Maria Helena Lisboa. O conceito de liberdade e suas interfaces. Rio de  Janeiro, Ensaios Filosóficos, Volume III –abril/2011 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.  Acesso em 04 de out. de 2023 

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Institui o Código  Penal. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto lei/Del2848compilado.htmAcesso em 04 out. de 2023 

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito constitucional positivo. 17ªed. São  Paulo: Malheiros, 2000, p.250 

BRASIL. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm 

Botelho, B. D., Diniz, D. G., Ferreira, M. T., & Gonçalves, E. O. S. (2023).  Intolerância Religiosa a Luz do Direito Penal Brasileiro. Revista Multidisciplinar  do Nordeste Mineiro, 5(1). 

RIBEIRO, Josenilda Oliveira. “Sincretismo religioso no Brasil: uma análise  histórica das transformações no catolicismo, evangelismo, candomblé e  espiritismo.” Universidade Federal de Pernambuco. Recife (2012). 

Fernandes, Paulo César da Conceição. “As origens do Espiritismo no Brasil:  razão, cultura e resistência no início de uma experiência (1850-1914).” (2008).


1Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail:  samiiacorreaa@gmail.com. ORCID: 0009-0008-1439-3331