DIREITOS HUMANOS DAS MULAS DO TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11262509


Marina Yuka Tanaka
Orientador: Prof. Herbert Bruno Magalhães Assis


RESUMO

Em contexto do tráfico internacional de entorpecentes, as chamadas “mulas” é o termo utilizado para se referir aos indivíduos que tranportam substâncias ilícitas de um país para o outro, muitas vezes tentando esconder em suas bagagens ou até mesmo em seus corpos, o que representa grande perigo a sua integridade física. As mulas são normalmente recrutadas por organizações criminosas para realizar esse transporte devido à capacidade dessas pessoas passarem despecebidas em fronteiras de seguranças, pois muitas vezes o indivíduo não possui nenhum tipo de histórico registrado. Para fazer tal recrutamento são analisadas a situação financeira e o aspecto social do indivíduo, uma vez que o sistema de tráfico de drogas procuram principalmente pessoas vulneráveis e mais facilmente convencíveis por se tratar de um dinheiro relativamente facil de ganhar, se aproveitando também de sua ignorância.

Atualmente não existe lei específica que proteja o direitos das “mulas”. No entanto, as leis variam de país para país, contudo, na moioria destes países o tráfico de drogas é considerado como um crime grave e o indivíduo é sujeitado a penas severas. Como exemplo, de legislação existente pelo mundo, há disposições que podem permitir certas formas de atenuação das penas ou assistência legal para tais indivíduos como por exemplo a lei de redução de danos, que é uma política onde o objetivo principal é a redução de danos e pode ser aplicada a esses indivíduos envolvidos no tráfico internacional de drogas visando priorizar a saúde pública e a segurança dos envolvidos, em vez de punições meramente punitivas. A cooperação entre autoridades também é de suma importancia para o combate ao tráfico de entorpecentes em âmbito mundial pois dessa forma existe a troca de informações  com o objetivo de acabar com essa cadeia de crimes relacionados, podendo o indivíduo que coopera com tais investigações receber algum tipo de redução de pena.

Palavras-chave: Mula.Tráfico Internacional. Política. Crimes. Direitos Humanos.

ABSTRACT

In the context of international drug trafficking, the so-called “mules” is the term used to refer to individuals who transport illicit substances from one country to another, often trying to hide it in their luggage or even on their bodies, which represents great danger to their physical integrity. Mules are normally recruited by criminal organizations to carry out this transport due to the ability of these people to desperately cross security borders, as the individual often does not have any type of recorded history. To carry out such recruitment, evidence of the financial situation and social aspect of the individual is required, since the drug trafficking system mainly seeks vulnerable and more convenient people in order to deal with relatively easy money to earn, also taking advantage of your ignorance. Currently there is no specific law that protects the rights of “mules”. However, according to laws from country to country, in most countries drug trafficking is considered a serious crime and the individual is subject to severe penalties. For example, in existing legislation around the world, there are provisions that may allow certain forms of sentence mitigation or legal assistance for such individuals, such as the harm reduction law, which is a policy where the main objective is the reduction of harm. and can be applied to these individuals involved in international drug trafficking, prioritizing public health and safety of those involved, rather than merely punitive punishments. Cooperation between authorities is also extremely important to combat drug trafficking worldwide, as in this way there is an exchange of information with the aim of putting an end to this chain of related crimes, and the individual who cooperates with such investigations may receive some type of sentence reduction.

Keywords: Mule. International Traffic. Policy. Crimes. Human Rights.

INTRODUÇÃO

Em nosso ordenamento, a lei de drogas lei n 11.343/2006, tem como objeto instituir o sistema nacional de políticas públicas sobre drogas, prescrever medidas de prevenção ao uso indevido e medidas para atenção e reinserção social dos usuários e dependentes além de estabelecer normas para repreensão à produção não autorizada. No Brasil, ela é considerada uma lei penal em branco, pois depende de outra norma para ser completamente compreendida e aplicada. No caso da lei n° 11.343/2006, que faz referencia à tabela de substancias proibidas, que está definida por meio de regulamentos específicos, como portarias e resoluções da ANVISA, que é a autoridade competente.

Segundo o entendimento de Fernando Capez (2023), em sua obra sobre a legislação penal especial, o recolhimento obrigatório ao cárcere, sem a existência do periculum in mora, neste caso, sem que estejam presentes os motivos que autorizam a prisão preventiva, implica ofensa ao princípio do estado de inocência, de modo que o juíz deverá, sempre, fundamentar se o condenado pode ou não apelar em liberdade, desta forma, não existindo recolhimento obrigatório.

O sujeito ativo do tráfico de drogas é qualquer pessoa, tratando-se de um crime comum, assim não se exige nenhuma capacidade especial por parte do agente. Admitindo-se o concurso de agentes, tanto na modalidade de coautoria quanto na de participação. Desta forma podendo estar envolvidos no esquema de tráfico internacional de drogas sujeitos como o traficante, os transportadores, ou “mulas”, os facilitadores entre outros.

As “mulas” que são as pessoas responsáveis pelo transporte de substâncias ilícitas de um país para o outro, utilizam-se de diversas formas e meios de transportes, visando driblar as autoridades, podendo variar dependendo das circunstâncias e estratégias específicas de cada organização e situação. São geralmente pessoas em situações de extrema vulnerabilidade financeira e social que são recrutadas para este trabalho, de forma que, sabendo disso, os recrutadores de dentro das organizações criminosas se utilizam desta vulnerabilidade com a proposta de dinheiro fácil, mas também se utilizando da ignorância.

São na maioria das vezes, indivíduos que enfrentam dificuldades financeiras, desta forma também tendo pouca perspectiva de emprego ou educação, também de desespero, como por exemplo o acúmulo de dívidas, problemas familiares, etc. Os indivíduos com baixo nível de educação e conhecimento sobre os riscos desta atividade que está sendo proposta torna mais fácil o convencimento. A falta de antecendentes criminais é um aspecto importante a fim de minimizar as chances de serem detectados pelas autoridades. No entanto, também há casos onde as pessoas são influenciadas por amigos ou familiares envolvidos no tráfico de entorpecentes, situação que se utilizam da confiança por ser um ente próximo o que aumenta a sua vulnerabilidade.

Desta forma, como qualquer indivíduo, têm os direitos e garantias fundamentais que devem ser protegidos, mesmo que envolvidas em tais atividades ilegais, uma vez que tais garantias estão atreladas ao ser humano, assim sendo cada país responsável de garantir que tais direitos estejam sendo protegidos em seus ordenamentos internos.

Não existem tratados específicos que abordem exclusivamente os direitos das “mulas” do tráfico internacional de drogas, porém, existem tratados de direitos humanos assinados pelo Brasil que garantem proteções gerais como, por exemplo, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, que protege uma série de direitos políticos incluindo o direito a vida, liberdade e a segurança pessoal, a Convenção contra Tortura e Outros Tratamentos Cruéis ou Penas Cruéis Desumanas ou Degradantes, Convenção Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Descriminação Racial, Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica). Embora esses tratados não abordem diretamente o direitos dessas pessoas, eles garantem proteções básicas que se aplicam a todas as pessoas independentemente de sua situação legal ou envolvimento em atividades criminosas.

No cenário nacional, encontramos proteções constitucionais que também visam proteger os direitos e garantias básicas em sua Constituição, dispondo de mecanismos que visam o devido processo legal e a dignidade humana.

A presunção de inocência decorre da consideração de que o indivíduo é inocente até que a sua culpa seja comprovada além de qualquer dúvida razoável por meio de um julgamento justo, o que nos traz tambem o direito a assistência jurídica onde as “mulas” tem o direito de receber assitência jurídica adequada durante todas as fases do processo, como a investigação, julgamento e a execução de sentença.

O direito a integridade física e mental vem do direitos destas pessoas de serem tratadas com dignidade e respeito, desta forma deve ser levada em consideração a proteção aos maus tratos físicos, psicológicos e emocionais durante o processo. O princício e o direito ao devido processo legal se refere a um processo legal adequado, com oportunidades de apresentação de provas, questionar testemunhas, razoável duração do processo e direito a ampla defesa.

No contexto histórico, analisando a época de meados do século XX, aproximadamente antes dos anos de 1960, os processos penais que haviam como mérito o tráfico internacional de drogas, muitas vezes era deficitário desta visão de direitos e garantias do ser humano, sendo violadas de forma que frequentemente em investigações envolviam práticas coercitivas, como tortura e coerção para obter confissões.

Já analisando as décadas seguintes, em meados dos anos 1960 a 1970, houve um aumento significativo na concientização e na aplicação de direitos humanos em todo o mundo, dessa forma houve um foco maior na necessidade de garantir um julgamento justo e com respeito aos direitos individuais.

A partir do ano de 1980, temos a maior cooperação internacional para o combate ao tráfico de drogas, onde diversos países implementaram leis mais rigorosas e penas mais severas para todos os envolvidos no transporte das substâncias ilícitas, desta forma se iniciando a “guerra contra as drogas”, de onde surgiram também críticas políticas em relação ao impacto desproporcional sobre as comunidades marginalizadas e indivíduos de baixa renda.

Tais evoluções são encontradas a partir da legislação nacional, que fornece uma base legal para entender as mudanças ao longo do tempo nas políticas e nas práticas jurídicas, de forma que é necessário entender como a sociedade evolui e como a visão mudou. Os documentos e relatórios de Organizações Internacionais como por exemplo a ONU ou a OEA também exerce importante função para o monitoramento desse histórico, fazendo relatórios relacionados ao tráfico e os direitos humanos.

É importante ressaltar a responsabilidade do Estado de fazer a concientização dos perigos do tráfico internacional de drogas, informando as consequências tanto jurídica quanto para a saúde pública e individual, desta forma prevenindo o envolvimento e protegendo as comunidades. Ações como campanhas de educação implementadas nas escolas públicas e universidades destacando os riscos físicos, mentais, legais e sociais, além destes programas de prevenção nas instituições de ensino, é importante o maior acesso a informações e recursos, disponibilizando em diferentes formatos, mídias e redes sociais ou vídeos para esclarecer dúvidas e alertar. O treinamento de profissionais em áreas como da saúde e assistência social para reconhecer os sinais de envolvimento no tráfico de drogas e fornecer apoio adequado para as vítimas e suas famílias.

Partindo-se desses pressupostos, estruturou-se a seguinte problemática:            Como os direitos humanos e garantias fundamentais estão sendo aplicados e se estão sendo aplicados de forma correta em nosso ordenamento jurídico?

Qual tipo de ação deve ser feito para a proteção de grupos mais vulneráveis onde possuem uma maior proximidade e motivações para se juntar a tais grupos?

Como melhorar a cooperação internacional para dificultar esse trânsito de entorpecentes entre fronteiras?

O objetivo geral deste trabalho é analisar os direitos das mulas e as consequências que enfrentam perante a sociedade levando em consideração o período atual.

Sendo que os objetivos específicos foram: descrever as formas de protegeer os direitos fundamentais garantidos a todos os seres humanos.

Para melhor entendimento do tema abordado a referida pesquisa utilizou uma metodologia exploratória e descritiva através de uma pesquisa teórica, levantamento bibliográfico em livros, artigos, periódicos e sites do planalto, do Supremo Tribunal Federal (STF) e de outros tribunais a fim de realizar um levantamento de informações e de autores que já pesquisaram sobre o assunto proposto. Utilizando um enfoque qualitativo.

Quanto à apresentação e análise dos resultados, foi realizada uma pesquisa onde os resultados dos dados foram descritos e organizados em tabelas e gráficos os quais serão apresentados ao longo deste trabalho.

1.     MULAS

As “mulas” assim chamadas no tráfico internacional de drogas, são pessoas que são utilizados pelas organizações criminosas para transportar drogas de um lugar para o outro, muitas vezes cruzando fronteiras internacionais. Por muitas das vezes, as pessoas que são recrutadas pelos criminosos são pessoas que estão em níveis econômicos deficitários, permitindo assim uma maior facilidade para o recrutamento das mesmas. Este termo refere-se à função de carregar e entregar substâncias ilícitas, frequentemente em condições perigosas e com elevado risco de captura, punição legal e riscos, principalmente, para a saúde pois esses indivíduos carregam várias porções de drogas por meio do engolimento de cápsulas para o estômago, havendo o grande perigo das mesmas se romperem dentro do organismo e assim causar overdose na mula que o transporta.

1.1.         Contexto histórico

O tráfico internacional de drogas é uma atividade criminosa que vem ocorrendo ao longo de décadas e possui diversas ramificações e contextos históricos diferentes. Desde o século XIX, com o início da colonização europeia das Américas, houve a expansão do cultivo e comércio de plantas com propriedades psicoativas, como a coca e o ópio. A partir do século XX, com o advento das rotas de transporte internacionais, como o avião e o navio, o tráfico de drogas se tornou ainda mais globalizado e sofisticado. As diferentes épocas e eventos históricos influenciaram diretamente nas formas de atuação das mulas no tráfico internacional de drogas, sendo importante compreender esse contexto para entender a dinâmica atual dessa atividade criminosa (Quintero, 2014; Cunha Filho, 2020).

No século XXI, o tráfico internacional de drogas continua a ser uma das principais preocupações para a segurança global. Com o avanço da tecnologia e da conectividade, os traficantes encontraram novas estratégias para expandir suas operações e evitar a detecção das autoridades. A evolução das redes criminosas e o aumento da cooperação entre diferentes organizações tornaram o tráfico de drogas uma atividade cada vez mais complexa e difícil de combater (Carvalho, 2021).

Segundo análises, devido à sua localização geográfica e vastas fronteiras com nações conhecidas como “países produtores de drogas”, o Brasil se torna um terreno favorável para o tráfico internacional. É comum que traficantes usem o Aeroporto Internacional de Guarulhos como ponto de partida para o transporte de cocaína originada de países como Peru, Bolívia, Colômbia e outros da América Latina, com destino final em países africanos e, posteriormente, Europa. A cada fronteira transposta, os valores das drogas aumentam exponencialmente, alcançando patamares exorbitantes em mercados europeus e asiáticos. Segundo dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o tráfico de entorpecentes é considerado a atividade criminosa mais lucrativa globalmente, movimentando cerca de 320 bilhões de dólares anualmente. Apenas no ano de 2018, registros policiais indicam a prisão de 290 indivíduos por envolvimento com tráfico internacional de drogas no Aeroporto Internacional de Guarulhos, com a apreensão de 1.861,7 quilos de cocaína em mais de 300 investigações em curso (Cunha Filho, 2020).

Além disso, a globalização e a abertura das fronteiras facilitaram o fluxo de mercadorias e pessoas, favorecendo o transporte de drogas. O surgimento de rotas alternativas e o uso de meios de transporte inovadores, como drones e submarinos, demonstram a capacidade de adaptação e criatividade dos traficantes (Coggiolo, 2001).

No entanto, a repressão ao tráfico internacional de drogas também se fortaleceu ao longo dos anos. A cooperação internacional entre os países, por meio de acordos de extradição e compartilhamento de informações, tem proporcionado avanços significativos na desarticulação das redes criminosas. O fortalecimento das agências de combate ao tráfico, a modernização dos equipamentos de segurança e a formação de equipes especializadas têm sido cruciais para combater essa atividade ilegal.

Além disso, é importante destacar o impacto social e econômico do tráfico de drogas. As comunidades ao redor do mundo são afetadas pela violência, dependência química e corrupção relacionadas ao comércio ilegal de entorpecentes. O tráfico causa instabilidade, desestruturação familiar e perda de vidas preciosas.

Por fim, é fundamental que a sociedade se conscientize sobre os danos causados pelo tráfico internacional de drogas e apoie políticas de prevenção e enfrentamento desse problema. A educação sobre os riscos e consequências do consumo de drogas, bem como o investimento em programas de reabilitação e reinserção social dos dependentes químicos, são medidas essenciais para combater essa prática criminosa e construir um futuro mais seguro e saudável para todos.

1.2.         Conceito de mula no contexto do tráfico internacional de drogas

A expressão “mula” é amplamente utilizada no contexto do tráfico internacional de drogas para se referir a indivíduos responsáveis pelo transporte de substâncias ilícitas, seja em seus corpos, pertences ou em meio a mercadorias. As mulas são recrutadas pelos traficantes para realizar essa função, muitas vezes de forma involuntária, através de cooptação, ameaças ou até mesmo sedução (Fleetwood; Leban, 2022).

Geralmente, são pessoas vulneráveis economicamente e sem antecedentes criminais, o que lhes permite passar despercebidas pelos sistemas de segurança nos aeroportos, portos e fronteiras. O trabalho das mulas é extremamente arriscado, uma vez que carregam consigo grandes quantidades de drogas, correndo o risco de serem presas e condenadas a penas severas em vários países ao redor do mundo (Faé, 2020; Fleetwood; Leban, 2022).

De acordo com Fleetwood; Leban (2022) o fenômeno das “mulas da droga” teve sua origem na década de 1980, principalmente em reportagens midiáticas sobre mulheres provenientes da Jamaica, América do Sul e Nigéria que foram detidas no Reino Unido e nos EUA. Essas mulheres eram identificadas como transportadoras de drogas através de fronteiras internacionais, muitas vezes motivadas por recompensa financeira, coerção ou ameaças. Como afirma seguir os autores.

Além disso, embora os estudos sobre o comércio de drogas tendam a ser direcionados para os homens, os estudos sobre mulas de drogas sãodirecionados para as mulheres, embora elas representem apenas cerca de 20-30% dos presos que atravessam fronteiras internacionais com drogas (Fleetwood, 2014 apud Fleetwood; Leban, 2022, p. 13).

A análise desses casos revela uma tendência eurocêntrica na investigação sobre o tema, com foco predominantemente nas mulheres, embora representem apenas uma parcela minoritária dos presos envolvidos nesse tipo de atividade ilícita. Este viés reflete estereótipos de gênero arraigados na percepção de homens como criminosos ativos e mulheres como vítimas passivas.

As mulas, nesse contexto segundo Fleetwood; Leban (2022) são consideradas peões descartáveis pelas organizações criminosas, que se aproveitam de sua vulnerabilidade para fazer com que carreguem tamanhas quantidades de drogas. O risco é iminente e o peso que carregam, literal e figurativamente, é gigantesco. Muitas vezes, essas pessoas são enganadas ou coagidas de maneira sutil e persuasiva, manipuladas com promessas de dinheiro fácil ou ameaçadas com as consequências da recusa. Além disso, elas são selecionadas criteriosamente: não podem possuir ficha criminal, devem apresentar condição financeira precária e, é claro, não podem levantar qualquer suspeita (Fleetwood; Leban, 2022).

O fenômeno surgiu na década de 1980, principalmente em reportagens nos meios de comunicação social sobre mulheres da Jamaica, da América do Sul e da Nigéria detidas no Reino Unido e nos EUA, como as chamadas “mulas da droga”. Isto é, transportar drogas para outra pessoa atravésde uma fronteira internacional, seja por recompensa financeira, pressão ou em resposta a uma ameaça (EMCCDA 2012;Fleetwood 2014a: 74 apud Fleetwood; Leban, 2022, p. 249).

O transporte de drogas por mulas é uma engrenagem crucial no funcionamento do tráfico internacional. Esses indivíduos são responsáveis pelo transporte de grandes quantidades de drogas, utilizando as mais diversas estratégias para evitar a detecção das autoridades. Desde ingerir pacotes de drogas até escondê-los dentro de objetos pessoais, eles se arriscam constantemente em nome do crime organizado. No entanto, mesmo com tamanha responsabilidade e perigo, muitas vezes não têm controle ou respaldo, sendo apenas uma peça descartável dentro de uma engrenagem maior (Fleetwood; Leban, 2022).

É importante ressaltar que as mulas, mesmo que involuntárias, não estão isentas de punição. Ao serem descobertas, são submetidas a julgamentos severos e podem ser condenadas a longos períodos de prisão, muitas vezes sem o devido suporte jurídico. A situação se agrava ainda mais quando levamos em consideração que as prisões estrangeiras, em especial nos países que são destinos finais das drogas transportadas, costumam ter condições desumanas e tratamento precário aos detentos (Fleetwood; Leban, 2022).

O combate ao tráfico de drogas envolve ações de inteligência, monitoramento e cooperação entre países. Porém, é necessário também abordar as causas estruturais que levam tantas pessoas a se envolverem nesse tipo de atividade. A desigualdade social, a falta de oportunidades de trabalho e a ausência de políticas de prevenção ao consumo de drogas são apenas alguns dos fatores que contribuem para a exploração das mulas. É preciso investir em educação, inclusão social e políticas públicas que promovam a igualdade de oportunidades, contribuindo para a redução das vulnerabilidades e, consequentemente, para o enfraquecimento do tráfico.

1.3.         Papel e perfil típico das mulas na cadeia do tráfico internacional de drogas

As mulas no tráfico internacional de drogas geralmente são recrutadas entre pessoas vulneráveis e de baixa renda, que se encontram em uma situação financeira desesperadora e sem oportunidades de melhoria. Elas são frequentemente aliciadas por quadrilhas criminosas, que utilizam promessas de enriquecimento rápido e fácil como forma de persuasão. Os perfis das mulas podem variar, mas há características comuns que as definem. Geralmente, são indivíduos que enfrentam problemas financeiros graves, fruto do desemprego ou da falta de escolaridade. Segundo Fleetwood; Leban (2022) surgiu a chamada tese da emancipação onde o aumento da liberdade de gênero na sociedade, devido aos inúmeros problemas sociais e econômicos  incentivou a entrada das mulheres no mundo do tráfico. Como também comenta a seguir (Fleetwood; Leban, 2022, p. 240).

A tese da “emancipação” surgiu nos EUA, mas encontra eco na investigação internacional. Baseando-se na investigação etnográfica realizada em Ciudad Juarez/El Paso, na fronteira entre os EUA e o México, Campbell argumentou que a participação das mulheres no tráfico transfronteiriço de cocaína pode, paradoxalmente, “estar ligada aos efeitos interactivos de maiores liberdades sociais para asmulheres e à marginalização económica” ( Campbell 2008: 259, grifo nosso). As mulheres que já ocupavam posiçõessociais privilegiadas tinham mais condições de lucrar com o tráfico, ganhando dinheiro e um certo grau de independência e liberdade pessoal. Mesmo assim, a maioria eram mulas; uma função que oferece poucas perspectivas de“subir” na carreira e sair da pobreza (Campbell, 2008).

A citação destaca a complexidade das relações entre liberdade e marginalização econômica na participação das mulheres no tráfico de drogas transfronteiriço. Ao analisar a dinâmica em Ciudad Juarez/El Paso, Campbell sugere que, embora a emancipação social possa proporcionar às mulheres oportunidades econômicas, muitas ainda acabam presas em papéis de pouca mobilidade social, como mulas de drogas. Isso revela como as estruturas sociais e econômicas podem moldar as escolhas e as limitações enfrentadas pelas mulheres, mesmo em contextos de maior liberdade aparente. De acordo com Pancieri (2014), o corpo feminino pode ser visto como um meio de transporte para substâncias ilícitas, sendo tratado como descartável e dispensável. Ao ser usado para o tráfico de drogas, essas substâncias podem ser absorvidas pelo sistema legal como violadoras da lei, enquanto também são traficadas pelas próprias organizações criminosas.

Os sujeitos secundários do tráfico formam o setor “feminizado” da economia ilícita, já que vivem sua condição híbrida entre sujeito e objeto, traficante e traficado, vítima e delinquente, e estão expostos a vários riscos colaterais dispondo de menos garantias, sendo a detenção o principal deles (Pancieri, 2014, p. 68).

Muitas vezes, essas pessoas já possuem um histórico criminoso, com passagens pela polícia, envolvendo-se em atividades ilícitas. No entanto, também existem casos em que as mulas são vítimas de coerção ou tráfico humano, sendo enganadas e induzidas a transportar drogas involuntariamente. É de extrema importância compreender o perfil típico das mulas a fim de implementar medidas eficazes de prevenção e combate ao tráfico internacional de drogas, protegendo essas pessoas vulneráveis e garantindo a segurança da sociedade como um todo.

A educação e o acesso a oportunidades socioeconômicas são fatores cruciais na prevenção do recrutamento de mulas no tráfico de drogas. É fundamental investir em programas de capacitação profissional e conscientização sobre os riscos envolvidos nesse tipo de atividade criminosa. Além disso, é preciso fortalecer e ampliar os mecanismos de segurança e controle nas fronteiras, para detectar e deter de forma mais eficiente o transporte de drogas.

Além disso, é fundamental promover campanhas de conscientização e educação pública, visando informar a população sobre os perigos do envolvimento no contrabando de drogas e as consequências devastadoras que isso pode ter para as famílias e comunidades.

Somente através de uma abordagem integrada e abrangente é possível enfrentar efetivamente o problema do tráfico internacional de drogas e proteger as pessoas vulneráveis que são exploradas nesse negócio ilícito. A cooperação entre os países, a educação pública e a implementação de políticas sociais são pilares fundamentais no combate ao tráfico de drogas e na construção de uma sociedade mais segura e justa para todos.

O perfil típico das mulas, que já têm sido abordado em detalhes, normalmente engloba pessoas financeiramente vulneráveis, facilmente cooptadas por organizações criminosas inescrupulosas.

2.     LEGISLAÇÃO PENAL SOBRE O TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS

A igualdade perante a lei é um princípio fundamental, de forma que todas as pessoas deverão ser tratadas de forma igual perante a lei, independentemente de religião, raça, sexo, origem, entre outras características pessoais. Significando que todas as pessoas devem receber o mesmo tratamento e oportunidades nos processos jurídicos e serem sujeitas da mesma forma de leis e penas. No contexto do tráfico internacional de drogas, as pessoas envolvidas  deverão ter os mesmos  direitos e garantias fundamentais, sendo importante ressaltar que, embora todas as pessoas tenham direitos de igualdade perante a lei, as consequências legais para envolvimento no tráfico de drogas e de outros fatores relevantes, desta forma resultado em diferenças nas penas aplicadas pelo sistema judicial brasileiro.

2.1.         Direitos e garantias fundamentais constitucionais

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 3, cita os objetivos do Estado Brasileiro, sendo um deles constituir uma sociedade livre, justa e solidária, desta forma visa a construção de uma sociedade baseada na liberdade, justiça e solidariedade entre seus membros conforme confirmado em Brasil (1988). Utilizando tais orientações  para a atuação do Estado Brasileiro em suas políticas públicas e na busca do desenvolvimento nacional. Os direitos e garantias fundamentais inerentes aos seres humanos está previsto nos art. 5 a 17, assim, todos que  estiverem no país terão direitos de igualdade perante a lei, direito a vida, liberdade, igualdade, segurança, liberdades individuais, direito a privacidade e a intimidade, direitos sociais e políticos, direitos individuais e garantias processuais.

Estes são apenas alguns das principais garantias asseguradas pela constituição federal brasileira, para promover  os objetivos citados no art. 3 de uma sociedade livre, justa e solidária.

Um aspecto que diferencia princípios de regras é a possibilidade de coexistência harmoniosa entre princípios dentro de um ordenamento jurídico, sem que ocorram incompatibilidades, ao contrário do que ocorre com regras confrontantes. Princípios incompatíveis podem ser ponderados em sua aplicação, enquanto regras confrontantes exigem uma escolha entre uma ou outra.

Desta forma orientado por Luís Roberto Barroso a partir da enunciação dos seguintes princípios:

a) Princípio da supremacia da Constituição: a interpretação constitucional se assenta na superioridade jurídica da Carta Maior sobre as demais normas do ordenamento, sejam elas princípios ou regras;

b) Princípios da presunção de constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público: em virtude da vinculação dos poderes públicos aos direitos fundamentais, presume-se como constitucionais os atos provenientes dos três poderes, bem como as leis aprovadas pelo Legislativo. Por isso, “nenhum Poder, nem mesmo o Judiciário, pode intervir em esfera reservada ao outro para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade”;

c) Princípio da interpretação conforme a Constituição: a leitura de uma norma constitucional não pode fugir à analise de um todo. Barroso decompõe este princípio em quatro constatações: 1) trata-se de uma escolha interpretativa diante de outras possibilidades de interpretação admitidas pela norma; 2) tal interpretação busca encontrar um sentido normativo distinto daquele expressado pelo enunciado da norma; 3) a escolha de uma interpretação significa a rejeição de outras linhas interpretativas que gerariam um resultado conflitante com a Constituição; 4) este princípio não é tão somente regra de hermenêutica, mas, sobretudo, mecanismo de controle de constitucionalidade. Depura-se como propriedade maior do princípio o encontro de um significado que dê legitimação à norma tida como suspeita. Mas importa salientar que tal interpretação deve circunscrever-se no limite de uma ponderação razoável, pois não se pode dar à lei sentido adverso àquele para qual à mesma foi instruída;

d) Princípio da unidade da Constituição: embora a Carta Magna seja um conjunto indiviso, a qual expressa a vontade única do legislador, cumpre recordar que esta vontade única é sobretudo uma síntese possível de diversos interesses conflitantes. Assim, a interpretação das normas constitucionais deve ser sempre sistemática, jamais individualizada, e sempre focada no núcleo principal da Constituição formado pelos direitos fundamentais. Mais ainda, não deve ser orientada apenas dentro da Carta, mas também fora dela, o que significa estimar mais as implicações sociais concretas da linha de interpretação escolhida;

e) Princípio da razoabilidade-proporcionalidade: trata-se de “um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça”. Para que não haja margem para subjetivismo na aplicação desse princípio, cumpre elucidar que a razoabilidade de uma norma está ligada aos motivos de sua criação, às suas finalidades, aos instrumentos mediante os quais se fará executar, bem como aos valores consagrados na organização do Estado. O princípio da razoabilidade consiste na verificação de uma adequação da norma, tanto da perspectiva interna de usa ratio legis, instrumentos e finalidades, quanto do ponto de vista externo, de coerência com o conjunto da Constituição.

Em resumo, conforme explicado pelo referido doutrinador, a interpretação das normas em nosso ordenamento jurídico deve ser feita sob a supremacia da constituição, a fim de preservar a harmonia do sistema. Essa interpretação deve sempre priorizar a proteção dos direitos fundamentais expressos nos princípios constitucionais, buscando alcançar a justiça material, para além da justiça formal baseada apenas na letra da lei.

Nesse sentido, a doutrina frequentemente critica os meios jurídicos de efetivar os direitos fundamentais do homem. Embora estejam inscritos na Constituição, sua aplicação efetiva muitas vezes é considerada insuficiente diante das demandas da realidade.

É importante ressaltar o processo de ponderação dos princípios constitucionais, que representam os direitos fundamentais do homem em nosso sistema jurídico. Em algumas situações, mesmo em um ordenamento jurídico coeso, sob a supremacia de uma constituição, podem surgir conflitos entre direitos.

No que tange ao direito do processo judiciário justo, no Brasil, todas as pessoas têm direito a um processo justo, garantido pela constituição e também por tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. Desta forma, mesmo que as pessoas que tranportam drogas, têm direito às garantias processuais básicas como o devido processo legal, o direito à ampla defesa e o contraditório. Também a presunção de inocência, o direito a ampla defesa e ao contraditório e o direito a um julgamento justo e imparcial, onde a pessoa acusada tem o direito a ser julgada por um tribunal imparcial e competente, em conformidade com as leis e procedimentos legais pré-estabelecidos no ordenamento atual. O direito a assistência jurídica gratuita as pessoas hipossuficientes que se envolvem em tais atividades, não podendo pagar por um advogado, terão o direito de receber assistência jurídica gratuita fornecida pelo Estado.

O ordenamento jurídico brasileiro é composto por normas, que se dividem em princípios e regras. Esse conjunto de normas forma um sistema legal coerente, harmonioso e coeso, refletindo a estrutura da Constituição Federal de 1988, que possui supremacia interna e orienta a interpretação e aplicação das demais normas.

Os princípios constitucionais têm um caráter abrangente e abstrato, o que permite sua aplicação em diversas situações legais, servindo como diretrizes fundamentais na interpretação e aplicação das normas em geral. Dessa forma, no entendimento de Walter Rothenburg, as normas principiológicas são:

(…) verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos ordenados em um sistema de conceitos relativos a dada porção da realidade. Muitas vezes, também se denominam princípios certas proposições que, embora não sejam evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes de validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários (Rothenburg, 1999).

2.2.         Lei especial de drogas n° 11.343/2006

No Brasil foi estabelecida em 24 de agosto de 2006 a legislação especial sobre  drogas, entrando em vigência em 45 dias após a sua publicação (Brasil, 2006). A lei tem como objeto, intituir o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, prescrever  as medidas de prevenção ao uso indevido, além de medidas para atenção e reinserção social dos usuários e dependentes. Também estabelece normas para a repressão a produção não autorizada e ao tráfico ilicito de drogas.

A lei classifica os envolvidos em toda a cadeia do tráfico, na conceituação de usuário em seu art. 28 da lei n° 11.343/06.

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II – prestação de serviços à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.(Brasil, 2006).

A lei trouxe diversas modificações no quesito do usuário de drogas como por exemplo, criou duas novas figuras típicas que é o de transportar e ter em depósito, e substituiu a expressão substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica por drogas. O quesito sobre a conduta do tráfico de drogas se encontra no art. 33 da referida lei.

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (Brasil, 2006).

Desta  forma a lei manteve as dezoito condutas típicas que estavam presentes no revogado art. 12 caput. da lei n° 6.368/76, trazendo assim mudanças que buscam mudar e atualizar a legislação para uma realidade que comtemple e faça jus no cotidiano.

Art. 12. Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Esta lei foi uma legislação brasileira que estabelecia normas para reprimir o tráfico além do uso indevido de substâncias entorpecentes e drogas, também definia as penas para o tráfico e delineou procedimentos legais para investigação, julgamento e punição dos infratores. Principalmente representou um marco inicial na abordagem do Brasil ao controle de drogas e teve um papel muito importante para o início da base legal para lidar com tal questão no país.

Ainda na legislação atual a norma pode ser classificada como tipo misto alternativo, de forma que a alternatividade ocorre quando é descrita várias formas de realização de uma figura típica, em que a realização de uma ou todas configura um único crime. Sendo descrita 18 formas diferentes  de praticar o tráfico de drogas, desta forma a prática de mais de uma das condutas descritas por parte de um único agente poderia configurar um crime único ou o concurso material entre condutas devendo ser necessariamente analisada o concurso material entre elas. Como bem observa Vicente Greco Filho, ao comentar a revogada Lei, “são 18 os núcleos do tipo contidos no caput. do art. 12, descrevendo condutas que podem ser praticadas de forma isolada ou sequencial.

A lei penal tem a objetividade jurídica de proteger a saúde pública, desta forma controlando a disseminação descontrolada de forma ilícita da droga que destrói a efetividade da sociedade. Para  que o delito exista, não é necessário a ocorrência do dano, o perigo neste caso, é presumido  em caráter absoluto, assim bastando  que a conduta seja subsumida em um dos verbos dispostos no artigo para que seja  caracterizada o delito. Qualquer que seja a quantidade de drogas sendo transportadas, haverá sempre em perigo social, tendo o STF, afastado a incidência do princípio da insignificância na hipótese de transporte de pequena quantidade  de droga que tenha sido apreendida com o traficante. Além de também ter traçado alguns vetores para a incidência do princípio da insignificância, considerando necessária a relevância material da tipicidade penal e alguns outros fatores como a mínima ofensividade da conduta do agente, a falta de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade comportamental.  No entanto, cabe ressaltar,  que o STF em tema de entorpecentes, por considerar a falta dos vetores capazes de descaracterizar em seu aspecto material a  própria tipicidade penal.  tem assinalado que a pequena quantidade de substância tóxica apreendida em poder do agente não afeta nem exclui o relevo jurídico-penal do comportamento transgressor do ordenamento jurídico, por entender inaplicável, em tais casos, o princípio da insignificância” (STF, 2ª T., HC 84.412/SP, rel. Min. Celso de Mello, j. 19-10-2004, DJ, 19-11-2004).

O sujeito ativo do delito do tráfico de drogas delineado pela lei n° 11.343/2006 pode ser qualquer pessoa, em se tratando de crime comum, pois não exige capacidade especial por parte do agente e o sujeito passivo principal ou imediato é toda a coletividade, de forma que se encontra exposta a perigo por conta da prática destas condutas típicas. É possível a existência de um sujeito  passivo secundário,  em caso da venda de drogas a dependente, ministrar a menor ou doente mental, nesses casos a coletividade e também o usuário está sendo atingido. Entre as ações descritas entre os 18 verbos estão a de importar e exportar, sendo a importação descrita por Fernando Capez. 

Importar é trazer a droga para dentro do território nacional, por via aérea, marítima ou terrestre. Consuma-se o delito quando são transpostas as fronteiras do País, no momento em que o agente penetra no território, mar territorial ou espaço aéreo nacional. A tentativa é de difícil configuração, mas, em tese, admissível, como no caso de um traficante que está para atravessar a fronteira do Brasil, quando é efetuada uma vistoria e encontrado o produto (Capez, 2023).

No caso em que é feito tal vistoria e dessa forma é encontrado as drogas em posse do traficante, é possível o caso de tentativa. O crime de contrabando do art. 334 do CP, é absorvido do art. 33 da lei de drogas nas ações da importação e exportação levando em consideração o princípio da especialidade, uma vez que a lei 11.343 é específica em relação ao código penal, uma vez que tal crime é de entrar ou sair do território nacional com qualquer mercadoria que seja proibida, não sendo especificada a droga no enquadramento do tipo penal, desta forma, devendo prevalecer a norma especial. Sendo assim, na hipótese de importação de cloreto de etila (lança-perfume), embora se trate de mercadoria proibida, tal substância está catalogada pelo Ministério da Saúde como droga, capaz de determinar dependência física ou psíquica. Assim, pelo princípio da especialidade, prevalece a norma do art. 33, na modalidade importar, ficando o contrabando absorvido pelo tráfico internacional de drogas. Nesse sentido: STF, HC 77.879 e STJ, HC 7.972.

A  ação de exportação consiste em fazer com que a mercadoria saia do território nacional. O objetivo da proibição da exportação de drogas é impedir  que se espalhe em outros países, de acordo com tratados internacionais, como por exemplo, a Conveção Única sobre Entorpecentes feita no ano de 1961, que foi ratificada pelo Congresso Nacional, sendo promulgada no Brasil  três anos depois e regulamentada pela portaria n° 8/67.

Os crimes de importação e exportação são classificados como de perigo abstrato, uma vez que é presumido que o dano para a comunidade internacional, sendo punida apenas a exportação clandestina de drogas, pois é permitida a exportação de drogas com a finalidade terapêutica ou para fins científicos.  A tentativa de exportação pode ser admitida em alguns casos, no entanto tem uma difícil configuração que pode ser utilizado para caso o agente seja surpreendido pela polícia de fronteiras no momento da tentativa de deixar o país portando as drogas para o tráfico. Difícil também será a hipótese de flagrante preparado, a qual exclui a incidência do fato típico (Súmula 145 do STF: “Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”), dada a imensa variedade de condutas.

De acordo com a Lei nº 6.368/76, o termo “droga” é utilizado de forma mais ampla do que apenas “substância entorpecente que determine dependência química ou psíquica”. O parágrafo único do artigo 1º define drogas como substâncias ou produtos capazes de causar dependência, conforme especificado em lei ou listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. O artigo 66 da mesma lei estabelece que, até que seja atualizada a terminologia da lista mencionada, são consideradas drogas as substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob controle especial, conforme definido na Portaria SVS/MS n° 344, de 12 de maio de 1998.

De acordo com o artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, sendo vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Essa disposição foi considerada inconstitucional pela Suprema Corte em 1º de setembro de 2010, por meio do julgamento do HC 97.256/RS, rel. Min. Ayres Britto, permitindo assim a aplicação de liberdade provisória e a conversão de pena privativa de liberdade em restritiva de direitos nos casos envolvendo tráfico de entorpecentes.

Além disso, o parágrafo único do artigo 44 estabelece que, nos crimes mencionados, o livramento condicional só será concedido após o cumprimento de dois terços da pena, sendo vedada sua concessão ao reincidente específico. Considera-se reincidência específica aquele que reincide em qualquer dos crimes previstos nos artigos 33 a 37 da Lei n° 11.343/2006.

Por fim, o artigo 59 estipula que nos crimes dos artigos 33, caput e § 1º, e 34 a 37 da Lei de Drogas, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, a menos que seja primário e de bons antecedentes, conforme reconhecido na sentença condenatória. Capez afirma em seu livro que:

(…)O recolhimento obrigatório ao cárcere, sem a existência do periculum in mora, isto é, sem que estejam presentes os motivos que autorizariam a prisão preventiva, implica ofensa ao princípio do estado de inocência, de modo que o juiz deverá, sempre, fundamentar se o condenado pode ou não apelar em liberdade, não existindo recolhimento obrigatório (Capez, 2023).

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal já se posicionou no sentido de que a exigência de recolhimento à prisão para apelar, conforme estabelecido no artigo 59 da Lei n° 11.343/2006, viola os princípios constitucionais da presunção de inocência, ampla defesa, contraditório e duplo grau de jurisdição, conforme decisão proferida no HC 106.243/RJ. É importante observar que a Lei n° 12.403/2011, que promoveu alterações nos institutos da prisão e da liberdade provisória no âmbito do Código de Processo Penal, estabeleceu que, antes do trânsito em julgado da condenação, o indivíduo só poderá ser mantido em prisão em duas situações: prisão temporária e preventiva, não havendo a obrigatoriedade de prisão decorrente de sentença condenatória recorrível.

Entretanto, em casos nos quais o réu já se encontrava preso antes da prolação da sentença condenatória, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que o juiz não deve permitir que o réu que estava detido apele em liberdade, uma vez que a sentença condenatória apenas reforçaria a necessidade de manutenção da prisão preventiva, desde que presentes os requisitos legais para sua decretação.

Já decidiu o Supremo Tribunal Federal: “Impossibilidade de concessão de liberdade provisória a réu que, preso em flagrante delito e denunciado por crime hediondo, permanece preso durante todo o curso do processo

A circunstância de réu primário juntamente com o de bons antecedentes não é o suficiente para impedir a manutenção da prisão, quando da pronúncia, como obsta o HC 82695/RJ, onde o juíz deve manisfestar-se de forma fundamentada os motivos da prisão preventiva de acordo com o art 387, § 1º, do CPP.

§ 1o O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).

No § 1º do artigo 33 da Lei de Drogas, são previstas condutas equiparadas ao caput: no inciso I consta o tráfico de matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, enquanto no inciso II, a semeadura, o cultivo e a colheita de plantas que constituam matéria-prima para a preparação de drogas. O inciso III prevê a conduta de utilizar local ou bem ou consentir que outrem dele se utilize para o tráfico ilícito de drogas. O legislador teve como finalidade evitar situações que levassem à impunidade do agente, buscando antever todas as hipóteses com a inclusão dessas figuras equiparadas. Para a configuração do delito, as ações do parágrafo devem ser praticadas indevidamente, ou seja, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, uma vez que, se a conduta for praticada com autorização e de acordo com as normas sanitárias adequadas, o fato será considerado atípico.

Uma alteração recente efetuada pelo artigo 10 da Lei n.º 13.964/2019 acresceu ao artigo 33, § 1º, da Lei de Drogas o inciso IV, nos seguintes termos: “§ 1º Nas mesmas penas incorre quem: (…) IV – vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente”. Diante dessa novidade legislativa, foi editado o Enunciado 4, da I Jornada de Direito Penal e Processo Penal CJF/STJ: “Não fica caracterizado o crime do inciso IV do § 1º do art. 33 da Lei n° 11.343/2006, incluído pela Lei Anticrime, quando o policial disfarçado provoca, induz, estimula ou incita alguém a vender ou a entregar drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à sua preparação (flagrante preparado), sob pena de violação do art. 17 do Código Penal e da Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal”.

A Lei de Drogas brasileira, Lei nº 11.343/2006, desempenha um papel crucial na regulamentação do tráfico e do uso de substâncias entorpecentes. No entanto, diferentemente de outras legislações penais, ela se destaca por ser uma lei penal em branco, o que significa que depende de regulamentações complementares para definir suas disposições mais relevantes.

Uma lei penal em branco é aquela cujo texto remete a outra norma, frequentemente de caráter administrativo ou regulamentar, para complementar seu conteúdo e determinar o que é permitido ou proibido. No caso da Lei de Drogas, ela menciona substâncias ou produtos específicos, porém, deixa para regulamentações ou listas específicas, como aquelas elaboradas pelo Poder Executivo, a tarefa de definir detalhadamente as substâncias que se enquadram na categoria de drogas proibidas.

Portanto, a definição precisa das substâncias consideradas drogas, bem como as penalidades aplicáveis ao seu tráfico e uso, são estabelecidas em regulamentações complementares, como portarias e listas que são atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União, conforme mencionado anteriormente. Essa abordagem confere flexibilidade à legislação, permitindo que ela se ajuste às transformações na ciência, na tecnologia e nas dinâmicas do mercado de drogas ilícitas.

Para acessar as listas complementares que especificam as substâncias ilícitas conforme a Lei de Drogas, é necessário recorrer aos órgãos responsáveis pela regulamentação e controle dessas substâncias. O Ministério da Saúde, por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), desempenha um papel fundamental nesse processo. O site oficial do Ministério da Saúde oferece acesso a informações detalhadas sobre substâncias controladas, além de disponibilizar as listas atualizadas periodicamente.

Da mesma forma, o site da Anvisa é uma fonte confiável para encontrar as listas atualizadas de substâncias controladas e as regulamentações relacionadas à Lei de Drogas. A Anvisa é o órgão responsável por regular o controle sanitário de substâncias no país, e suas publicações são consideradas oficiais e legalmente válidas.

Além dos recursos online, as atualizações das listas de substâncias controladas também são divulgadas no Diário Oficial da União (DOU). O DOU é o veículo oficial de publicação de normas e atos do governo federal e as informações relacionadas à regulamentação de drogas e substâncias controladas são frequentemente encontradas em suas páginas.

Portanto, para acessar o complemento da Lei de Drogas e obter informações sobre as substâncias ilícitas, é essencial consultar as fontes oficiais mencionadas, garantindo assim o acesso a dados precisos e atualizados fornecidos pelos órgãos competentes.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), as drogas são substâncias ou produtos capazes de causar dependência física, psíquica ou ambas, conforme especificado em lei ou listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Essas substâncias podem ser classificadas em diferentes categorias como entorpecentes, psicotrópicos, precursoras e outras sob controle especial.

A Anvisa é responsável por regulamentar e controlar o uso, a produção, a comercialização e a importação de drogas no Brasil, visando garantir a segurança e a saúde pública. Para isso, a agência elabora listas de substâncias controladas, que são atualizadas de acordo com as mudanças na legislação e na ciência, e também com base em evidências epidemiológicas e avaliações de risco.

Essas listas estabelecem quais substâncias são consideradas drogas e estão sujeitas a controle e fiscalização, bem como as medidas restritivas aplicáveis a cada uma delas. Dessa forma, a definição e classificação das drogas de acordo com a Anvisa são fundamentais para a aplicação da legislação vigente e para a proteção da saúde pública.

2.3.         Convenção de Xangai

A Convenção de Xangai sobre Entorpecentes foi um tratado internacional firmado durante a Quarta Conferência Internacional do Ópio, realizada em Xangai, China, em 26 de fevereiro de 1909 (Garbaccio; Bizawu, 2015). Este tratado foi uma das primeiras tentativas significativas de abordar a questão do tráfico de drogas e do uso indevido de substâncias entorpecentes em escala internacional.

Um dos principais objetivos da Convenção de Xangai foi regulamentar o comércio e o controle do ópio, que era uma das substâncias entorpecentes mais amplamente utilizadas na época. Para alcançar esse fim, a convenção propôs medidas para controlar a produção, a venda, a exportação e a importação de ópio entre os países signatários.

Além disso, a Convenção de Xangai previa a criação de um sistema internacional de controle e supervisão do comércio de ópio, visando a cooperação entre os países participantes para garantir o cumprimento das disposições do tratado e combater o tráfico ilícito da substância.

O tratado também estabelecia penalidades para aqueles que violassem suas disposições, incluindo a criminalização do tráfico ilegal de ópio e outras substâncias entorpecentes. Embora a Convenção de Xangai tenha representado um avanço significativo na regulamentação internacional sobre drogas na época de sua assinatura, ela foi posteriormente substituída por tratados mais abrangentes e atualizados, como as Convenções Únicas sobre Entorpecentes de 1961 e 1971, que ampliaram o escopo do controle internacional para incluir outras substâncias além do ópio.

A Convenção de Xangai sobre Entorpecentes foi importante para o Brasil por diversos motivos. Primeiramente, ela representou um marco nas discussões internacionais sobre o controle e regulação do comércio de substâncias entorpecentes, especialmente o ópio, que naquela época era uma questão de preocupação global devido ao seu uso indevido e ao tráfico ilícito.

Para o Brasil, a assinatura e participação nesta convenção significaram o compromisso do país em cooperar com a comunidade internacional para combater o tráfico de drogas e promover políticas de controle de entorpecentes. Isso ajudou a estabelecer uma base para a criação de leis e regulamentações nacionais relacionadas ao controle de drogas e substâncias psicoativas.

Além disso, a participação do Brasil na Convenção de Xangai foi importante para fortalecer suas relações diplomáticas com outros países signatários e para demonstrar seu compromisso com os princípios e valores compartilhados pela comunidade internacional em relação ao controle de drogas. Ao longo do tempo, a participação do Brasil em tratados e convenções internacionais sobre entorpecentes contribuiu para a formulação de políticas nacionais de drogas e para o fortalecimento das medidas de combate ao tráfico e uso indevido de substâncias entorpecentes no país.

2.4.         Convenção de Haia

A Convenção de Haia sobre Drogas foi um tratado internacional assinado em Haia, nos Países Baixos, em 1912. Essa convenção foi um dos primeiros esforços internacionais para abordar a questão do controle de drogas em nível global, seguindo os passos da Convenção de Xangai sobre Entorpecentes de 1909.

Carvalho (2014) nos traz que a Convenção de Haia estabeleceu medidas para controlar a produção, distribuição, venda e uso de substâncias entorpecentes, especialmente o ópio. Ela reforçou o compromisso dos países signatários em cooperar uns com os outros para combater o tráfico ilegal de drogas e promover políticas de controle de entorpecentes.

Entre as disposições importantes da Convenção de Haia estavam a regulamentação do comércio internacional de ópio, a imposição de penalidades para o tráfico ilegal de drogas e a promoção da cooperação internacional para combater o uso indevido de substâncias entorpecentes.

A Convenção de Haia sobre Drogas foi um marco na história da regulamentação internacional de drogas e ajudou a estabelecer os princípios e diretrizes para tratados posteriores sobre o assunto. Embora tenha sido substituída por tratados mais abrangentes ao longo do tempo, sua importância histórica no desenvolvimento do direito internacional sobre drogas é inegável.

A Convenção de Haia sobre Drogas e a Convenção de Xangai sobre Entorpecentes são dois tratados internacionais que tratam do controle de drogas, especialmente do ópio, mas foram assinados em momentos e locais distintos, e por diferentes grupos de países.

A Convenção de Xangai sobre Entorpecentes foi assinada em Xangai, China, em 1909. Seu escopo principal estava direcionado ao controle do comércio e uso do ópio. Ela refletia a preocupação predominante na época em relação ao impacto negativo do ópio na saúde pública e nas sociedades, principalmente na região asiática.

Por outro lado, a Convenção de Haia sobre Drogas foi assinada em Haia, nos Países Baixos, em 1912. Embora também abordasse o controle de drogas, ela tinha uma abrangência mais ampla em comparação com a Convenção de Xangai. Além do ópio, a Convenção de Haia tratava de outras substâncias entorpecentes e estabelecia medidas para regulamentar seu comércio e uso.

Enquanto a Convenção de Xangai era mais específica e limitada em seu escopo, focando principalmente no controle do ópio e sendo assinada por um número limitado de países diretamente envolvidos no comércio de ópio na época, a Convenção de Haia contou com uma participação mais ampla de países.

Embora ambas as convenções tenham representado marcos importantes no desenvolvimento do direito internacional sobre drogas, suas diferenças refletem os contextos históricos e as preocupações específicas dos países envolvidos na época de sua assinatura.

O artigo 1 da Convenção de Haia sobre Drogas estabelece os fundamentos e o propósito essencial do tratado. Ele delineia o compromisso dos Estados signatários em trabalhar em conjunto para regular a produção, o comércio e o uso indevido de substâncias entorpecentes, com um foco particular no ópio. Este artigo reflete os princípios fundamentais do direito internacional, destacando a importância da cooperação entre os países para abordar desafios compartilhados, como o controle de drogas. De forma que, em seu texto temos:

Artigo I

1. Na presente Convenção, entende-se por “estupefacientes” as drogas e substâncias às quais se aplicam ou se aplicarão as disposições da Convenção da Haia, de 23 de janeiro de 1912, e das Convenções de Genebra, de 19 de fevereiro de 1925, e 13 de julho de 1931.

2. Na presente Convenção, entende-se por “extração” a operação pela qual se separa um estupefaciente da substância ou do composto de que faz parte, sem haver fabricação ou transformação propriamente ditas. Esta definição da palavra “extração” não compreende os processos pelos quais se obtém ópio bruto da “papoula”, processo esse denominado pelo termo “produção”.

Ao reconhecer a soberania de cada Estado signatário, o artigo também ressalta a necessidade de respeitar as leis e regulamentos internos de cada nação ao implementar medidas de controle de drogas. Embora a cooperação internacional seja promovida, a autonomia de cada Estado em determinar suas próprias políticas e abordagens permanece intacta. Cabe destacar também o art. 2 da Convenção de Haia sobre Drogas:

Artigo II

Cada uma das Altas Partes contratantes se compromete a baixar as disposições legislativas necessárias para punir severamente, e sobretudo com pena de prisão ou outras penas privativas de liberdade, os seguintes atos:

a) fabricação, transformação, extração, preparação, detenção, oferta, exposição à venda, distribuição, compra, venda, cessão sob qualquer título, corretagem, remessa, expedição em trânsito, transporte, importação e exportação dos estupefacientes, contrárias às estipulações das referidas Convenções;

b) participação intencional nos atos mencionados neste artigo;

c) sociedade ou entendimento para a realização de um dos atos acima enumerados;

d) as tentativas e, nas condições previstas pela lei nacional, os atos preparatórios.

Que estabelece as responsabilidades dos Estados signatários em nível nacional para garantir a aplicação efetiva das disposições do tratado. Ele exige que os Estados adotem legislação interna adequada para proibir e punir o tráfico ilegal de drogas, além de regular a produção, distribuição e uso legal de substâncias controladas.

Nesse contexto, reforça as obrigações internacionais dos Estados, conforme estabelecido na Convenção, refletindo os princípios fundamentais do direito internacional em relação ao cumprimento de tratados. Ao mesmo tempo, ele enfatiza a importância da implementação dessas obrigações em nível nacional, incentivando os Estados a adotarem legislação interna coerente com as disposições da Convenção.

Assim, visa garantir a harmonização entre as leis nacionais e os compromissos internacionais assumidos pelos Estados signatários da Convenção de Haia sobre Drogas, com o objetivo final de promover o controle efetivo das drogas e combater o tráfico ilegal, em conformidade com os princípios do direito internacional.

2.5.         Convenção Única Sobre Entorpecentes

A Convenção Única sobre Entorpecentes foi um tratado internacional adotado em 1961 pelas Nações Unidas (Lima, 2010), teve o objetivo de estabelecer um sistema de controle global para regular a produção, distribuição e uso de substâncias entorpecentes e psicotrópicas. Essa convenção foi elaborada em resposta ao aumento do tráfico internacional de drogas e ao reconhecimento da necessidade de uma abordagem coordenada para lidar com esse problema em nível global.

A Convenção Única sobre Entorpecentes estabeleceu várias medidas para controlar a produção, comércio e uso de substâncias entorpecentes, incluindo a proibição de certas drogas, a imposição de requisitos rigorosos para a produção e distribuição de substâncias controladas e a implementação de medidas para prevenir o abuso e a dependência de drogas.

Ao longo dos anos essa convenção foi complementada por outras convenções e tratados internacionais relacionados ao controle de drogas, como a Convenção de Haia sobre Drogas de 1912 e a Convenção de Viena sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971. Juntas, essas convenções formam a base do atual regime internacional de controle de drogas, buscando garantir a saúde pública e prevenir o uso indevido de substâncias entorpecentes em todo o mundo.

O Brasil ratificou a Convenção Única sobre Entorpecentes em 5 de dezembro de 1971. Como membro das Nações Unidas, o Brasil se comprometeu a cumprir as disposições desta convenção e a adotar medidas internas para garantir o controle adequado das substâncias entorpecentes em conformidade com as diretrizes estabelecidas no tratado internacional. O decreto n° 54.216 de 27 de agosto de 1964, faz o reconhecimento dos danos e os outros fins da droga.

Reconhecendo que o uso médico dos entorpecentes continua indispensável para o alívio da dor e do sofrimento e que medidas adequadas devem ser tomadas para garantir a disponibilidade de entorpecentes para tais fins,

Reconhecendo que a toxicomania é um grave mal para o indivíduo e constitui um perigo social e econômico para a humanidade,

Conscientes de seu dever de prevenir e combater êsse mal.

Considerando que as medidas contra o uso indébito de entorpecentes, para serem eficazes, exigem uma ação conjunta e universal.

Julgando que essa atuação universal exige uma cooperação internacional, orientada por princípios idênticos e objetivos comuns,

Reconhecendo a competência da Nações Unidas em matéria de contrôle de entorpecente e desejosas de que os órgãos internacionais a êle afetos estejam enquadrados nessa Organização. (Brasil, 1964).

A Convenção Única sobre Entorpecentes é uma peça-chave na luta contra o tráfico internacional de drogas por diversas razões.

Primeiramente, ela estabelece um conjunto de normas e diretrizes internacionalmente aceitas para o controle de substâncias entorpecentes. Isso permite uma ação coordenada entre os países, evitando divergências e brechas legais.

Além disso, ao ratificar a convenção, os países concordam em cooperar uns com os outros no combate ao contrabando de entorpecentes. Isso inclui o compartilhamento de informações, assistência em investigações e operações policiais conjuntas, e até mesmo a extradição de suspeitos de crimes relacionados a drogas.

A convenção também estabelece padrões e procedimentos para o controle da produção, distribuição e uso de substâncias entorpecentes. Isso ajuda a prevenir desvios e abusos, garantindo que as drogas sejam utilizadas apenas para fins legítimos, como tratamento médico e científico. Além de combater o tráfico, a convenção também promove medidas para prevenir o uso indevido e a dependência de drogas. Isso inclui a implementação de programas de educação e prevenção, acesso a tratamento e reabilitação para usuários problemáticos e políticas de saúde pública.

2.6.         Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes

Ainda de acordo com Lima (2010), a Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas é um tratado internacional adotado em 1988 pelas Nações Unidas com o objetivo de combater o tráfico ilícito de drogas em nível global. Também conhecida como Convenção de Viena, esse tratado estabelece medidas abrangentes para prevenir, investigar e reprimir o tráfico de entorpecentes e substâncias psicotrópicas, bem como para promover a cooperação internacional nessa área.

Essa convenção ampliou e atualizou os compromissos internacionais assumidos por meio da Convenção Única sobre Entorpecentes de 1961 e da Convenção de Haia sobre Drogas de 1971. Ela aborda questões como a criminalização do tráfico de drogas, a extradição de traficantes, a cooperação policial e judicial entre países, o controle da produção e distribuição de substâncias controladas e medidas de prevenção e tratamento do uso indevido de drogas.

A Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas é um dos principais instrumentos internacionais no combate ao tráfico e desempenha um papel fundamental na coordenação de esforços entre os países para lidar com esse problema complexo e multifacetado.

O Brasil coloca em prática a Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas através de uma série de medidas e políticas, tanto em âmbito nacional quanto em colaboração com outras nações. Entre as principais formas de aplicação dessa convenção pelo Brasil se daria, primeiramente, que o país estabelece legislações e regulamentações que estejam alinhadas com as disposições da Convenção de Viena sobre o controle de drogas. Isso engloba a criminalização do tráfico de drogas, a regulação da produção e distribuição de substâncias controladas, bem como medidas para prevenir e combater o uso indevido de drogas.

Além disso, o Brasil participa ativamente de iniciativas de cooperação internacional visando combater o tráfico de drogas. Isso inclui o intercâmbio de informações, a realização de operações conjuntas e o suporte a programas de capacitação e assistência técnica em países afetados pelo tráfico.

3.     POLÍTICAS DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Os esforços internacionais contra o tráfico de drogas envolvem diversas estratégias e medidas adotadas por diferentes nações e organismos globais para enfrentar esse problema em escala mundial, desse modo, Chagas e Ventura (2010) aludem que a cooperação internacional irá se inserir num contexto de item de agenda estratégica da comunidade internacional. Dentre as práticas mais importantes nesse cenário está a cooperação na área da inteligência, onde os países trabalham juntos para compartilhar dados sobre rotas de tráfico, organizações criminosas e transações financeiras suspeitas ligadas ao comércio de entorpecentes.

Ademais, órgãos de segurança pública de várias nações unem esforços para desmantelar organizações criminosas, apreender carregamentos ilegais e capturar traficantes. Tratados de extradição são firmados para possibilitar que indivíduos suspeitos de tráfico de entorpecentes sejam extraditados para serem julgados em suas nações de origem ou nos locais onde os delitos foram praticados.

Uma outra tática fundamental consiste na formação e treinamento na qual nações mais avançadas fornecem suporte técnico para reforçar as habilidades de aplicação da lei e segurança em nações mais prejudicadas pelo comércio de entorpecentes. Sendo assim, existe uma colaboração judicial entre os sistemas judiciais de diversas nações para investigar, processar e julgar ocorrências relacionadas com o tráfico global de drogas.

As diretrizes de colaboração internacional têm como objetivo elaborar estratégias alinhadas a fim de impedir o comércio ilegal de entorpecentes, lidar com suas razões fundamentais e incentivar opções em substituição ao tráfico ilícito, nesse sentido, Gusmão (2015) relata em sua pesquisa que o que irá caracterizar a cooperação, portanto, são dois elementos: o comportamento orientado objetivando a criação de ganhos mútuos por meio do ajuste de políticas. São fundamentais para combater o comércio global de drogas, levando em consideração sua característica transnacional e intricada. Por meio do fortalecimento das ações conjuntas entre as nações, tais diretrizes têm o propósito de resguardar a segurança e o bem-estar das comunidades em âmbito mundial.

3.1.         Cooperação judicial e desenvolvimento de políticas conjuntas

A cooperação judicial e o desenvolvimento de políticas conjuntas são fundamentais para combater o tráfico internacional de drogas. Essas estratégias envolvem a colaboração entre sistemas judiciais de diferentes países e a formulação de políticas coordenadas para enfrentar esse desafio global Nascimento (2015) relata para o fato que os países que participam das convenções internacionais terão união de princípios e normas em partes dos casos, porém, boa parte das normas e regras específicas irão se diferenciar de Estado para Estado, ou seja, de país para país.

A cooperação judicial implica a troca de informações, evidências e provas relevantes para investigações e processos judiciais relacionados ao tráfico de drogas entre países. Isso pode incluir o compartilhamento de dados de inteligência, a execução de mandados de busca e apreensão em jurisdições estrangeiras e a extradição de suspeitos de tráfico de drogas para enfrentar a justiça em seus países de origem.

Já o desenvolvimento de políticas conjuntas envolve a coordenação de esforços para prevenir o tráfico de entorpecentes, interromper o fluxo de drogas ilícitas e desmantelar organizações criminosas envolvidas nesse comércio. Nascimento (2015) afirma que no chamado “período das convenções internacionais” várias dessas convenções serviram para os diversos países siginatários como um certo modeo a ser seguido e que pudesse dar um alicerce para o ordenamento jurídico dos países membros das convenções. O desenvolvimento de políticas conjuntas pode ser alcançado por meio da harmonização de leis e regulamentos, do estabelecimento de programas de prevenção ao uso de drogas, do fortalecimento das capacidades de aplicação da lei e da promoção de iniciativas de desenvolvimento alternativo em regiões afetadas pelo tráfico de drogas.

Além disso, os países compartilham experiências e lições aprendidas na implementação de medidas de combate ao tráfico, identificando e promovendo as melhores práticas em áreas como prevenção, tratamento, aplicação da lei e políticas de redução de danos. Isso permite que cada país se beneficie do conhecimento e da experiência de outros na luta contra o esse crime.

As políticas de deportação de traficantes internacionais de drogas variam dependendo das leis e regulamentos de cada país, mas geralmente seguem alguns procedimentos comuns.

Primeiro, a extradição é frequentemente solicitada. Muitos países têm tratados de extradição que permitem a transferência de suspeitos de crimes, incluindo o contrabando de entorpecentes, de um país para outro para enfrentar a justiça. Isso pode ocorrer quando um traficante internacional de drogas é preso em um país estrangeiro e sua extradição é solicitada pelo país onde o crime foi cometido ou por outro país com jurisdição sobre o caso.

Segundo, é garantido o devido processo legal. Antes de serem deportados ou extraditados, os traficantes internacionais de drogas têm direito a um julgamento justo e à oportunidade de se defenderem contra as acusações. Isso pode envolver audiências judiciais, revisões de casos e recursos legais.

Terceiro, a cooperação internacional desempenha um papel fundamental. A deportação de traficantes internacionais de drogas muitas vezes requer a colaboração entre os países envolvidos. Isso pode incluir troca de informações, solicitação de assistência legal mútua e negociações entre autoridades judiciais e governamentais.

Quarto, existem acordos bilaterais e multilaterais que regem a deportação de criminosos. Alguns países estabelecem acordos específicos que estipulam os procedimentos e requisitos para a transferência de indivíduos entre as nações. Esses acordos garantem que os direitos dos suspeitos sejam protegidos durante todo o processo.

Por fim, após a deportação ou extradição, os traficantes internacionais de drogas podem ser monitorados pelas autoridades para garantir que não voltem a se envolver em atividades criminosas. Além disso, podem ser implementados programas de reintegração para ajudá-los a se reintegrarem à sociedade de maneira legal e produtiva.

Após a deliberação acerca do alcance  da assistencia garantida pelo decreto  n° 3810 de 2001, tem como ponto facilitar a execução das tarefas das autoridades responsáveis pelo cumprimento da lei de ambos os países envolvidos na cooperação em processos de investigação, inquérito, ação penal e a prevenção de crimes e processos com relação aos delitos da natureza do tráfico internacional de drogas. No art 1 do decreto delinea as prestações de assitencias jurídicas obrigatórias por parte dos presentes no acordo incluindo:

1. As Partes se obrigam a prestar assistência mútua, nos termos do presente Acordo, em matéria de investigação, inquérito, ação penal, prevenção de crimes e processos relacionados a delitos de natureza criminal.

2. A assistência incluirá:

a) tomada de depoimentos ou declarações de pessoas;

b) fornecimento de documentos, registros e bens;

c) localização ou identificação de pessoas (físicas ou jurídicas) ou bens;

d) entrega de documentos;

e) transferência de pessoas sob custódia para prestar depoimento ou outros fins;

f) execução de pedidos de busca e apreensão;

g) assistência em procedimentos relacionados a imobilização e confisco de bens, restituição, cobrança de multas; e

h) qualquer outra forma de assistência não proibida pelas leis do Estado Requerido.

O processo de extradição no Brasil por tráfico de drogas internacional é um procedimento complexo que segue uma série de etapas bem definidas. Tudo começa com um pedido oficial de extradição feito pelo país que deseja julgar o indivíduo acusado de tráfico de drogas. Esse pedido é enviado ao Ministério da Justiça brasileiro, que analisa sua legalidade e mérito.

Após essa análise, o pedido é encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) para uma avaliação final. O STF verifica se o pedido está em conformidade com a Constituição brasileira e com os tratados internacionais. Durante todo esse processo, o indivíduo acusado de tráfico de drogas tem o direito de se defender e apresentar argumentos contra a extradição.

Após considerar todos os aspectos do caso, o STF emite uma decisão final sobre a extradição. Se o pedido for aprovado, o indivíduo é entregue às autoridades do país requerente para enfrentar o julgamento pelo crime de tráfico.

É importante destacar que o processo de extradição pode ser longo e complicado, envolvendo múltiplas etapas e considerações legais. Além disso, o indivíduo acusado de tráfico de drogas tem direito a garantias legais e processuais durante todo o processo.

3.2.         Operações conjuntas contra o tráfico Internacional de drogas

No Brasil, as operações conjuntas contra o tráfico internacional de drogas são conduzidas por várias instituições e órgãos, incluindo a Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Receita Federal, Forças Armadas, Ministério da Justiça e Segurança Pública, e agências de inteligência como a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).

A Polícia Federal (PF) desempenha um papel crucial no combate ao tráfico internacional de drogas no Brasil por meio de diversas estratégias e atividades. A PF trabalha investigando organizações criminosas envolvidas no tráfico, monitorando suas atividades e coletando evidências para processos judiciais. Além disso, utiliza informações de inteligência para mapear redes de tráfico, identificar pontos de entrada de drogas no país e antecipar movimentos de traficantes.

As operações de campo são realizadas para interceptar cargas de drogas, prender traficantes e desmantelar laboratórios de produção de drogas. A PF também coopera internacionalmente, compartilhando informações, coordenando operações conjuntas e realizando extradições de traficantes procurados. Investe em treinamento especializado, equipamentos de vigilância avançados e tecnologia de investigação forense. Além disso, desenvolve iniciativas de prevenção ao uso de drogas e conscientização sobre os riscos do tráfico, em parceria com escolas, comunidades e organizações da sociedade civil. Essas ações são fundamentais para a proteção da segurança pública e o enfrentamento do crime organizado no Brasil.

Essas operações visam combater o tráfico de entorpecentes em diferentes frentes, desde a investigação e monitoramento das rotas de tráfico até a apreensão de drogas e prisão de suspeitos. A colaboração entre essas instituições permite uma abordagem integrada e coordenada, fortalecendo as ações de combate ao crime organizado.

Por meio de patrulhamento em rodovias, fiscalização em portos e aeroportos, monitoramento de áreas de fronteira e troca de informações de inteligência, essas operações buscam desmantelar redes de tráfico e impedir a entrada e circulação de drogas ilícitas no território brasileiro.

Essa cooperação entre diferentes órgãos e instituições é fundamental para enfrentar o desafio complexo representado pelo tráfico internacional de drogas, contribuindo para a segurança pública e a proteção da sociedade brasileira.

4.     OS DIREITOS HUMANOS NO SISTEMA INTERAMERICANO

O sistema de proteção internacional dos direitos humanos no continente americano é composto por diferentes instrumentos e procedimentos, incluindo a Carta da Organização dos Estados Americanos, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e a Convenção Americana de Direitos Humanos. Inicialmente, tanto a Carta da OEA quanto a Declaração Americana conferiam uma série de competências a todos os Estados-membros. No entanto, com a adoção da Convenção Americana de Direitos Humanos, os procedimentos e instrumentos contidos nesse tratado passaram a ser aplicados exclusivamente aos Estados que são partes dessa convenção.

Portanto, é comum afirmar que no contexto americano existe um sistema dual de proteção dos direitos humanos: o sistema geral, fundamentado na Carta e na Declaração, e o sistema aplicável apenas aos Estados que são partes da Convenção. Este último, além de incluir a Comissão Interamericana de Direitos Humanos como no sistema geral, também engloba a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Essas distinções foram também delineadas por outros autores, como evidenciado a seguir:

“En el primer supuesto, las violaciones son cometidas por Estados miembros de la OEA que no han ratificado la Convención Americana de Derechos Humanos, como sucede por ejemplo con Estados Unidos y Canadá. En este supuesto la Comisión Interamericana a quien se dirige la petición, se rige por la Carta de la OEA y la Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre, así como por las disposiciones generales del Reglamento de la Comisión. En el segundo supuesto, la violación es cometida por Estados Miembros de la OEA que han ratificado la Convención Americana, pero no la cede por ejemplo con Jamaica. En este supuesto, la Comisión Interamericana se regirá no solo por la Declaración Americana de Derechos y Deberes del Hombre sino también por la Convención Americana de Derechos Humanos y el Reglamento de la Comisión. Finalmente, en el tercer supuesto, la violación es cometida por Estados Miembros de la OEA, que han suscrito la Convención Americana y que mediante declaración unilateral han aceptado la jurisdicción contenciosa de la Corte Interamericana de Derechos Humanos, como sucede, por ejemplo con el Perú. En este último supuesto el sistema de protección interamericano de derechos humanos despliega toda su capacidad, al permitir no solo la aplicación de los instrumentos antes referidos sino también la intervención da la Comisión y Corte Interamericana de Derechos Humanos”. (Talavera, 2003, p. 32).

No primeiro caso, as violações são cometidas por Estados membros da OEA que não ratificaram a Convenção Americana de Direitos Humanos, como é o caso dos Estados Unidos e do Canadá. Nesse cenário, a Comissão Interamericana, para a qual a petição é dirigida, é regida pela Carta da OEA e pela Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, além das disposições gerais do Regulamento da Comissão. No segundo caso, a violação é cometida por Estados membros da OEA que ratificaram a Convenção Americana, mas não aceitaram a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos, como é o caso da Jamaica. Nessa situação, a Comissão Interamericana segue não apenas a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, mas também a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Regulamento da Comissão. Por fim, no terceiro caso, a violação é cometida por Estados membros da OEA que assinaram a Convenção Americana e que, por meio de declaração unilateral, aceitaram a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos, como é o caso do Peru. Nesse último cenário, o sistema de proteção interamericano dos direitos humanos demonstra toda a sua capacidade, permitindo não apenas a aplicação dos instrumentos mencionados anteriormente, mas também a intervenção da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

“Trata-se de uma região marcada por elevado grau de exclusão e desigualdade social ao qual se somam democracias em fase de consolidação. A região convive ainda com as reminiscências do legado dos regimes autoritários ditatoriais, com uma cultura de violência e de impunidade, com a baixa densidade dos Estados de Direito e com a precária tradição de respeito aos direitos humanos no âmbito doméstico. Dois períodos assim demarcam o contexto latino­-americano: o período dos regimes ditatoriais e o período da transição política aos regimes democráticos, marcado pelo fim das ditaduras militares na década de 80, na Argentina, no Chile, no Uruguai e no Brasil”. (Piovesan, 2006, p. 85).

4.1.         Programas de reabilitação e reinserção social das mulas condenadas

No Brasil, programas de reabilitação e reinserção social se aplicam a pessoas condenadas por tráfico internacional de drogas, especialmente aquelas conhecidas como “mulas”. Estes programas visam ajudar estas pessoas a reintegrarem-se na  sociedade após a pena, oferecendo apoio psicológico, assistência social, formação profissional e oportunidades educacionais, Jardim (2022) nos atenta para o fato que a detenção propriamente dita serve como um fator de “punição” e objetiva a reabilitação e regeneração do deliquente, porém, com as atuais políticas de reabilitação não surtindo muitos efeitos em nossa sociedade. O apoio psicossocial às mulas envolvidas no tráfico internacional de drogas é parte integrante do processo de reintegração social e reabilitação destes indivíduos. Essa supervisão é realizada por profissionais especializados em psicologia e assistência social, que prestam apoio emocional, orientação e apoio durante toda a pena e também após a libertação.

O funcionamento desse controle pode variar de acordo com as políticas e programas específicos de cada instituição ou órgão responsável pela execução de penas. No entanto, isto muitas vezes envolve sessões de terapia individuais e de grupo, onde os indivíduos têm a oportunidade de expressar os seus sentimentos, resolver problemas emocionais e desenvolver estratégias para lidar com os desafios da vida após a prisão. Além disso, os profissionais psicossociais podem prestar apoio na resolução de problemas práticos do quotidiano, como problemas familiares, procura de emprego e habitação, ajudando assim os indivíduos a reintegrarem-se na sociedade de uma forma positiva e construtiva.

É importante notar que o apoio psicossocial é essencial para ajudar as mulas a superar o potencial trauma, o estigma e as dificuldades emocionais associadas à sua experiência de tráfico de drogas. Ao prestar este apoio, espera-se contribuir para a prevenção da reincidência criminal e para a promoção de uma reinserção social bem sucedida. O principal objetivo destas iniciativas é fornecer aos condenados as ferramentas necessárias para reconstruírem as suas vidas de forma positiva e produtiva, saindo do ciclo criminal. Podem incluir apoio psicossocial para lidar com o trauma e a ansiedade resultantes de uma experiência criminal, formação profissional em diversas áreas, acesso à educação formal e apoio para encontrar um emprego. 

Além disso, estes programas  oferecem apoio às famílias dos condenados, reconhecendo a importância do apoio familiar no processo de reinserção social. O objetivo final é ajudar a reduzir a reincidência criminal, proporcionando oportunidades de mudança de vida e construindo um futuro melhor para esses indivíduos e suas comunidades. Em primeiro lugar, proporciona apoio emocional às famílias, que muitas vezes enfrentam dificuldades emocionais e psicológicas para um membro que está encarcerado ou envolvido em actividades criminosas. Ao proporcionar um espaço seguro para expressar preocupações, obter conselhos e partilhar experiências, estes programas ajudam a reduzir o estigma e o isolamento social que as famílias enfrentam.

Ademais, estes programas prestam aconselhamento jurídico e assistência jurídica a famílias que possam enfrentar desafios relacionados com o sistema jurídico. por causa do envolvimento de um membro no tráfico de entorpecentes. Isto inclui informações sobre direitos legais, acesso a recursos legais e apoio durante o processo legal. Os programas também ajudam as famílias a aceder a serviços sociais adicionais, tais como assistência financeira, habitação, saúde mental, cuidados infantis e educação, identificando as suas necessidades e encaminhando-as para  recursos apropriados. Além disso, promove o fortalecimento dos laços familiares, que são essenciais. para o sucesso do processo de reinserção social das mulas.

4.2.         O entendimento do STF sobre o HC 97.256 – RS

No Habeas Corpus nº 97.256/RS, o Supremo Tribunal Federal foi instado a considerar a questão da conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos no contexto do tráfico de drogas. A Defensoria Pública do réu argumentou que a vedação presente no art. 44 da Lei nº 11.343/2006, que impede essa conversão, era inconstitucional.

A Defensoria baseou sua argumentação na ideia de que não deveria haver na legislação antidrogas uma presunção de que todos os crimes de tráfico são de extrema gravidade, a ponto de justificar a proibição genérica da conversão de penas.Argumentou-se que as circunstâncias individuais de cada caso deveriam ser consideradas.

Além disso, a Defensoria argumentou que essa proibição legal confrontava garantias constitucionais fundamentais, como a individualização da pena (inciso XLIV do art. 5º da CRFB/88), o acesso à Justiça (inciso XXXV do art. 5º da CRFB/88) e a proporcionalidade da resposta estatal ao delito (inciso LIV do art. 5º da CRFB/88).

No entendimento do Ministro Ayres Brito, presidente e relator do debate, defendeu a importancia da demanda demanda posta sob análise e julgamento do Supremo ao aduzir que “o Supremo, todavia, o Plenário não tem jurisprudência sobre a liberdade provisória, a possibilidade de liberdade provisória, por consequência, o regime, e, também, por desdobramento, o regime de cumprimento da pena, como não tem o Supremo decisão sobre a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direito. Segundo nosso rastreamento, aqui, jurisprudencial, nada foi encontrado. Então, nesse caso, eu também concordo com a proposto do Ministro Marco Aurélio e se a Ministra Cármen também concordar, nós o afetaremos ao Pleno”.

Para melhor entender a importancia da ementa do Habeas Cosrpus 97.256/RS, em torno do tema e de modo a orientar acerca do assunto tratado neste tópico, quando a questão foi levada ao Plenário, o Ministro Ayres Britto começou seu voto relembrando seu entendimento anterior no HC 85.894/RJ. Ele abordou e reiterou a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos no contexto do crime de tráfico de entorpecentes. Esse entendimento se baseava na ausência de proibição expressa na Lei nº 8.072/90. Em suma, o Ministro Ayres Brito manifestou seu entendimento pela superação da proibição de conversão das penas privativas de liberdade em penas restritivas de direitos, presente na parte final do artigo 44 e no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006.

EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 44 DA LEI 11.343/2006: IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE. OFENSA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA (INCISO XLVI DO ART. 5º DA CF/88). ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O processo de
individualização da pena é um caminhar no rumo da personalização da resposta punitiva do Estado, desenvolvendo-se em três momentos individuados e complementares: o legislativo, o judicial e o executivo. Logo, a lei comum não tem a força de subtrair do juiz sentenciante o poder-dever de impor ao delinqüente a sanção criminal que a ele, juiz, afigurar-se como expressão de um concreto balanceamento ou de uma empírica ponderação de circunstâncias objetivas com protagonizações subjetivas do fato-tipo. Implicando essa ponderação em concreto a opção jurídico-positiva pela prevalência do razoável sobre o racional; ditada pelo permanente esforço do julgador para conciliar segurança jurídica e justiça material.

2. No momento sentencial da dosimetria da pena, o juiz sentenciante se movimenta com ineliminável discricionariedade entre aplicar a pena de privação ou de restrição da liberdade do condenado e uma outra que já não tenha por objeto esse bem jurídico maior da liberdade física do sentenciado. Pelo que é vedado subtrair da instância julgadora a possibilidade de se movimentar com certa discricionariedade nos quadrantes da alternatividade sancionatória. 3. As penas restritivas de direitos são, em essência, uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos, estigmatizantes e onerosos do cárcere. Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas alternativas, pois essa é mesmo a sua natureza: constituir-se num substitutivo ao encarceramento e suas seqüelas. E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a cumprir a função retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva da sanção penal. As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel da retribuição-prevenção-ressocialização, e ninguém melhor do que o juiz natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo, recuperar socialmente o apenado, prevenindo comportamentos do gênero. 4. No plano dos tratados e convenções internacionais, aprovados e promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido tratamento diferenciado ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize pelo seu menor potencial ofensivo. Tratamento diferenciado, esse, para possibilitar alternativas ao encarceramento. É o caso da Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, incorporada ao direito interno pelo Decreto 154, de 26 de junho de 1991. Norma supralegal de hierarquia intermediária, portanto, que autoriza cada Estado soberano a adotar norma comum interna que viabilize a aplicação da pena substitutiva (a restritiva de direitos) no aludido crime de tráfico ilícito de entorpecentes. 5. Ordem parcialmente concedida tão-somente para remover o óbice da parte final do art. 44 da Lei 11.343/2006, assim como da expressão análoga “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante do § 4º do art. 33 do mesmo diploma legal. Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da proibição de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos; determinando-se ao Juízo da execução penal que faça a avaliação das condições objetivas e subjetivas da convolação em causa, na concreta situação do paciente. (HC 97256, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT VOL- 02452-01 PP-00113).

O entendimento proferido pelo Ministro Ayres Brito foi alcançado após uma análise criteriosa embasada em ampla doutrina e jurisprudência. Ele delineou sua linha de argumentação com base em diretrizes fundamentais: a) o tráfico de drogas, embora seja um crime hediondo, não teve sua conversão de pena vedada pela Constituição Federal de 1988, o que impede o legislador ordinário de restringir direitos fundamentais ou violar a dignidade humana; b) a individualização da pena, garantida pela Carta Magna, não pode ser anulada por legislação infraconstitucional; c) a individualização da pena exige uma personalização da resposta estatal, que requer do magistrado uma análise ponderada das circunstâncias do caso para garantir justiça material e segurança jurídica; d) a reprimenda estatal deve ser proporcional à gravidade do delito, e a privação da liberdade não é a única forma de cumprir essa função, já que existem outras penas possíveis, como as restritivas de direitos.

Por outro lado, o Ministro Joaquim Barbosa, em sentido oposto, votou pela constitucionalidade da vedação contida na Lei nº 11.343/2006, fundamentando-se em uma abordagem estritamente legalista, enfatizando os interesses da sociedade em detrimento dos comandos constitucionais dos direitos fundamentais. Seu entendimento foi acompanhado pelas Ministras Carmén Lúcia, Ellen Gracie e pelo Ministro Marco Aurélio.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal, ao pronunciar-se incidentalmente, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei nº 11.343/2006 que proibiam a conversão da pena restritiva de liberdade em penas restritivas de direito para os condenados por tráfico ilícito de drogas. Com isso, a Corte eliminou o obstáculo legal que conflitava com os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito brasileiro, os quais garantem a individualização da pena, o respeito à dignidade da pessoa humana e a aplicação da proporcionalidade. Dessa forma, o magistrado encarregado de personalizar a pena agora tem a prerrogativa de examinar os requisitos necessários para a conversão da pena.

CONCLUSÃO

Quando se vem à mente o termo “mula” logo se imagina a figura de um animal presente na natureza e que é usado em muitos lugares como um animal de transporte de cargas, entretanto há um outro termo em que a referida palavra é utilizada que no caso em tela seria as mulas do tráfico Internacional de drogas e que fazendo referência à mesma “utilidade” do animal, as mulas do tráfico são pessoas que carregam de forma literal conteúdos de entorpecentes acopladas externamente em seu corpo, ou ainda, carregam os mesmos entorpecentes internamente por meio do engolimento de cápsulas de drogas, com a finalidade de realizar o transporte desses tipos de materiais para outros países, utilizando-se principalmente das vias aeroportuárias, ou seja, o transporte por aviões comerciais.

Diante disso, a partir de uma análise da legislação brasileira e das jurisprudências do Supremo Tribunal Federal é possível destacar e levar à compreensão como as mulas do tráfico são tratadas no sistema jurídico nacional, ficando assim claro que apesar de serem consideradas criminosas essas pessoas ditas mulas do tráfico, por muitas das vezes e na maioria dos casos são simplesmente vítimas de várias circunstâncias alheias, como a falta de oportunidades, a vulnerabilidade social, etc.

Foi buscado traçar uma objetivação para a elucidação do modo que o sistema jurídico brasileiro encara esses indivíduos, se como traficantes ou como meros transportadores de drogas que não usufruem em nada ou quase nada daquele material que os mesmos carregam. Sendo assim, a individualização de pena se mostraria como um princípio fundamental a ser aplicado em casos do tráfico internacional de drogas, permitindo assim que as circunstâncias específicas analisadas de cada caso possam ser consideradas na determinação da pena do indivíduo.

A decisão do STF no Habeas Corpus n° 97.256/RS trouxe um marco importante nesse quesito, quando declara a inconstitucionalidade da proibição da conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos para os condenados por tráfico de entorpecentes, fazendo com que tal decisão represente um avanço na garantia dos direitos das mulas e num melhor aperfeiçoamento do sistema penal brasileiro. Além disso, é importante analisar e compreender como está o nosso atual sistema prisional, se o mesmo tem as capacidades para a real reabilitação e reinserção do preso na vida social de forma plena e eficaz, havendo assim a necessidade de programas efetivos para tais objetivos.

É importante ressaltar que todo e qualquer preso independente de seu crime é um ser humano que possui família e essa mesma família terá uma importância muito grande no apoio dessas mulas que muitas das vezes irão enfrentar muitas dificuldades, pois como citado anteriormente, boa parte desses indivíduos vem de origem muito humilde e encontram nesse mundo uma saída fácil para seus problemas. Sobretudo, a presente pesquisa buscou demonstrar a necessidade para uma abordagem mais individualizada em relação às mulas do tráfico Internacional de drogas, buscando consequentemente a criminalização dessas pessoas por meio de penas justas e que venham acompanhadas de medidas que vão visar futuramente a sua real integração na sociedade.

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