DESAFIOS E PERSPECTIVAS DE ACESSO DE ALUNOS SURDOS À EDUCAÇÃO NA EMEIF DE CAMETÁ TAPERA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202407311537


Ênio Sales de Freitas1,
Mílvio da Silva Ribeiro2


RESUMO:

A população surda enfrenta diversos desafios para ser inserida na sociedade, por falta de apoio dos órgãos que deviam proporcionar essa inserção, falta de interesse, segregação ou até mesmo exclusão, que também ocorre em âmbito educacional. Nesse sentido, o presente trabalho disserta sobre as dificuldades de acesso de alunos surdos à educação na EMEIF de Cametá Tapera, tendo como objetivo investigar os empecilhos encontrados pelos alunos surdos da escola para a concretização de sua aprendizagem. Para enriquecer ainda mais esse debate, a pesquisa de caráter qualitativo conta com o método do estudo de caso, para desenvolver melhor, utilizasse do entrelaçamento desses dados com conceitos de autores como Campos (2014), Lenneberg (1987), Diniz (2012) e outros autores. Sendo assim, falar sobre a educação de surdos é compreender os enormes desafios, enfrentados principalmente por alunos, mas também por professores, devido à falta de apoio dos órgãos competentes, que não oferecem materiais e nem formações suficientes para o melhor atendimento desses alunos.

Palavras-Chave: Surdos. Educação. Cametá-Tapera. Dificuldades.

1 INTRODUÇÃO

A Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental de Cametá Tapera foi o lócus da presente pesquisa, que teve como objetivo investigar as dificuldades enfrentadas pelos alunos surdos dessa instituição para a concretização de sua aprendizagem. Pois como afirma Saviani: “O marginalizado já não é, propriamente, o ignorante, mas o rejeitado. Alguém está integrado não quando é ilustrado, mas quando se sente aceito pelo grupo e, através dele, pela sociedade em seu conjunto.” (Saviani, 1999, p. 19).

É no sentido da inclusão desses alunos surdos no processo educacional, que se pretende analisar a realidade vivenciada nessa escola, partindo da hipótese de que faltam aparatos tecnológicos e material humano para que ocorra efetivamente a sua inclusão, observando-se a falta de materiais assistivos e de intérpretes de libras que possam facilitar a comunicação, e assim, auxiliar no processo de ensino-aprendizagem.

Para uma educação que realmente seja inclusiva, que não somente carregue esse título, torna-se necessário romper com as práticas passadas nas quais o aluno somente era inserido no ambiente escolar. A educação inclusiva não significa somente o aluno ter acesso ao processo educacional, mas participar efetivamente no desenvolvimento das atividades realizadas pela turma e pela comunidade escolar, permanecendo ativo no processo de ensino-aprendizagem para assim formar-se como cidadão parte da sociedade.

A inserção de uma criança surda na comunidade escolar é dificultada por problemas de comunicação, pois, a criança surda geralmente apresenta como primeira língua a LIBRAS, que é aprendida espontaneamente no seu convívio social, denominada também de língua materna. Ao passar a frequentar a escola o aluno surdo necessita tornar-se bilíngue, precisando aprender a língua portuguesa escrita como segunda língua. Porém, os professores, os alunos e o restante dos profissionais que compõem a comunidade escolar, geralmente não dominam a língua brasileira de sinais, impossibilitando em muitos casos a comunicação. A isso se soma a falta de interpretes e de tecnologias que ajudariam na mediação do processo comunicativo.

Os reflexos negativos que poderão ser observados na escola são resultado de uma educação que tem descaso com as minorias sociais, cenário no qual pouco é ofertado à população proletária e do campo, em que não são dadas condições adequadas para o acesso e a permanência de toda a diversidade de alunos existente nas comunidades locais. Os alunos surdos para serem atendidos sofrem, sendo que deveriam ser ofertados pelo poder público meios que possibilitassem a melhor interação e encaminhamento do processo de formação desses enquanto cidadãos.

Diante das hipóteses levantadas e dos estudos de Campos (2014), Lenneberg (1987), Diniz (2012) e outros autores, assim como a utilização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, será investigada essa realidade, que faz parte de minha vida pessoal e profissional. Serão averiguadas a partir da convivência na escola de Cametá Tapera, as particularidades e as generalizações possíveis de serem postas diante desse estudo caracterizado como de cunho qualitativo, que se dará pela coleta de dados feita por meio da observação e tendo como método o estudo de caso.

Com a visão de Paulo Freire de que a educação transforma o mundo, e que o diálogo é a chave para a melhor aprendizagem, espera-se que sejam possibilitadas aos professores e alunos melhores condições de comunicação para que possam ter um processo educacional mais igualitário e que funcione no sentido de formar cidadãos conscientes para a sociedade, conscientes sobre as diferenças, sobre as singularidades de realidades, além de compreenderem seus direitos e seu papel no mundo.

Ao pesquisar sobre a temática do ensino de surdos na EMEIF de Cametá Tapera, pretendeu-se constatar os empecilhos que dificultam o processo de ensino e aprendizagem, pensando-os a partir da realidade de uma comunidade ribeirinha e do campo de Cametá, que apresenta alunos com demandas pertinentes para as suas formações. Esse trabalho é de grande importância acadêmica, científica e social, para além da importância educacional, visto que aborda um tema que atinge todas essas dimensões e que precisa de mais estudos particulares, para que se entenda essa problemática geral, e assim inclua as pessoas com deficiência em todos os campos da sociedade.

2 CARACTERIZAÇÃO DA EMEIF DE CAMETÁ TAPERA: HISTÓRICO E INFRAESTRUTURA

A pesquisa foi realizada na Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental (EMEIF) de Cametá-Tapera, localizada na zona rural do município de Cametá, no estado do Pará. Mais especificamente, a escola está situada na Vila de Cametá-Tapera, a cerca de 10 quilômetros da sede do município, integrando a esfera pública municipal. Assim, é essencial fazer uma breve contextualização da vila de Cametá-Tapera, um local onde além do fluxo turístico, ainda é possível sentir a atmosfera doce e simples da natureza, permeada por uma vida que preserva suas heranças naturais.

Situada às margens do rio Tocantins, Cametá-Tapera remonta ao período da colonização pelas missões católicas por volta de 1625. Segundo estudos da Prelazia de Cametá, antes da chegada dos portugueses, a região era habitada pelos indígenas camutás. Posteriormente, foi erguida uma ermida com o propósito de catequizar os nativos e estabelecer um aldeamento.

Em 24 de dezembro de 1635, a vila foi oficialmente reconhecida como Vila Viçosa de Santa Cruz de Caamutá, servindo como ponto de apoio para a capitania de Feliciano Coelho de Carvalho e contribuindo significativamente para a consolidação da cidade de Cametá. No entanto, somente em 1713, a sede administrativa foi transferida de Cametá-Tapera para o local que hoje é a cidade de Cametá. Dessa forma, o município de Cametá teve seu surgimento nesse povoado, sendo considerado hoje, de forma carinhosa, como herdeiro dos primeiros frutos da colonização surgidos em Cametá-Tapera (Souto, 2010).

Apesar de sua importância histórica, essa vila tranquila e acolhedora não apresenta vestígios visíveis de seu período colonial, sendo atualmente reconhecida por sua importância turística, a partir das praias e a culinária local que atuam enquanto atrativos para os turistas que buscam experiências autênticas.

Com boa parte de sua extensão territorial às margens do Rio Tocantins, a vila possui aproximadamente 500 habitantes, cujas principais fontes de renda são a agricultura, a pesca, os programas sociais como o Bolsa Família e o turismo.  No que se refere ao grau de escolaridade, a maioria dos moradores não concluiu o ensino fundamental, havendo inclusive uma pequena parcela de analfabetos. Essa condição tem influência direta na aprendizagem dos educandos matriculados na escola em que a pesquisa se deu.

Quanto à estrutura física, a escola conta com seis salas de aula, uma secretaria e uma diretoria, ambas com banheiros internos, sala de informática, copa/cozinha, sala de professores, biblioteca, sala adaptada para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) e uma área ampla para atividades físicas dos alunos, incluindo espaço para horta. Contudo, chama-se a atenção para o fato de que apesar de a escola possuir a sala de Recursos Multifuncionais, o AEE não funciona.

O ambiente escolar é arborizado, porém as salas de aula são inadequadamente quentes devido à insuficiência de energia para o funcionamento dos aparelhos de ar-condicionado. Desse modo, a temperatura elevada interfere diretamente no ambiente de aprendizagem, causando desconforto tanto aos alunos quanto aos professores.  Além disso, a biblioteca da escola é carente de variedade de livros, contando apenas com materiais didáticos fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Cametá (SEMED) e alguns gibis doados, que são empilhados no chão por falta de estantes. A sala destinada à biblioteca também não é climatizada, comprometendo seu potencial como espaço de estudo e pesquisa.

Dos 16 (dezesseis) professores da EMEIF de Cametá Tapera, um total de 07 (sete) possui especialização em Educação Especial e Inclusiva, além destes, 01 (um) professor possui especialização em Libras. Ademais, a partir do quadro apresentado, observa-se a ausência de profissionais específicos para atender às necessidades de inclusão de alunos surdos. Enquanto há um número significativo de professores, indicando uma boa proporção aluno-professor, a falta de professores especializados em Atendimento Educacional Especializado (AEE) e intérpretes de Libras é evidente. Sobre isto, acrescenta-se que os primeiros, desempenham um papel crucial na promoção da inclusão de alunos com deficiência, oferecendo suporte pedagógico e estratégias adaptadas às suas necessidades individuais e os segundo, garantem a uma comunicação eficaz entre alunos surdos e professores ouvintes, possibilitando sua plena participação nas atividades escolares.

Assim, a ausência desses profissionais apresenta-se como uma lacuna na oferta de recursos e suportes necessários para uma inclusão efetiva dos alunos surdos na escola. Isso ressalta a importância de investimentos na formação e contratação de profissionais especializados em educação inclusiva, visando garantir o acesso equitativo à educação para todos os alunos, independentemente de suas necessidades especiais.

Apesar da escola não possuir um Projeto Político Pedagógico (PPP) formalizado3, é importante destacar que a Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental (EMEIF) de Cametá-Tapera adota a proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) como referência para organizar seu currículo escolar. A BNCC, documento que estabelece os conhecimentos, competências e habilidades essenciais que todos os alunos brasileiros devem desenvolver ao longo da educação básica, serve como um guia fundamental para a elaboração e implementação das práticas pedagógicas na escola. Dessa forma, mesmo sem um PPP específico, a escola busca alinhar suas práticas educativas aos princípios e diretrizes estabelecidos pela BNCC, visando oferecer uma educação de qualidade que promova o desenvolvimento integral dos alunos. Essa abordagem evidencia o compromisso da instituição em seguir padrões e diretrizes educacionais nacionais, contribuindo para a formação acadêmica e cidadã dos estudantes.

A abordagem é bastante flexível, levando em consideração os interesses e a realidade vivenciada pelos alunos no dia a dia, especialmente os interesses coletivos. Nesse contexto, a escola adota a concepção de que o aluno é um sujeito político, cultural e social, sendo o professor o mediador do conhecimento. Além disso, os conteúdos escolares são selecionados e aplicados de forma a estabelecer uma inter-relação entre o currículo e a realidade dos educandos, valorizando o conhecimento cultural de cada aluno. Tal exercício promove uma articulação eficaz entre teoria e prática, incentivando a interdisciplinaridade e a integração curricular

No que diz respeito à avaliação, a escola enfatiza a construção do processo de conhecimento e de ensino. Nesse sentido, o educador elabora diversas atividades avaliativas para obter resultados precisos sobre o processo de ensino e aprendizagem. Com base nesses resultados, o professor pode ajustar suas estratégias de ensino, reconhecendo que a avaliação não deve ser considerada o único indicador de aprendizagem. Por fim, conforme evidenciado pelas práticas pedagógicas e pela equipe gestora da escola, a instituição se compromete a oferecer uma educação de qualidade, reconhecendo que é por meio dela que o indivíduo pode alcançar sucesso e ascender na sociedade.

3 COMPREENDENDO AS ABORDAGEMS DA INCLUSÃO

A educação inclusiva, tal como conhecemos hoje passou por diversos períodos e acompanhou os moldes da história da humanidade, assim, ao longo desse processo as concepções de mundo e de paradigmas sobre o próprio conceito de deficiência também se modificaram diversas vezes e vem sem transformando reproduzindo as transformações ocorridas na sociedade. A história mostra que durante muito tempo o processo de escolarização era privilégio de poucos, impossibilitando assim que algumas classes de pessoas frequentassem o ambiente escolar. Dentre esses grupos excluídos do convívio social, familiar e escolar, as pessoas com deficiências, físicas ou mentais eram as que mais sofriam visto que eram consideradas dependentes e incapazes de executar qualquer função na sociedade, não sendo inclusive reconhecidas como pessoas produtivas.

Nesse sentido, a reflexão sobre o processo de inclusão está inicialmente centrada nos princípios de igualdade e nos princípios de diversidade ou diferença. O primeiro convida-nos a pensar em uma característica universal inerente ao ser humano, diante do qual todos compartilhamos os mesmos direitos fundamentais derivados da humanidade. Em contrapartida, o princípio de diversidade destaca as diferenças existentes nos aspectos físicos, psicológicos e culturais, mesmo que provenhamos do mesmo espaço e tempo.

No entanto, a diferença entre os indivíduos não deve ser interpretada como uma comparação para diminuir ou exaltar suas capacidades, mas sim como o ponto em que reside o princípio de igualdade da humanidade. Em outras palavras, a igualdade está na diversidade, conforme expresso por Lima (2006) “somos todos iguais, como seres humanos. Este é o aspecto da identidade, que indica o pertencimento à espécie. No entanto, somos todos diferentes, cada um com a sua particularidade, e aí reside a diversidade humana”.

Isso posto, o termo inclusão, de maneira simplificada, representa um conceito que une diversidade e igualdade em uma relação de pertencimento. A inclusão funciona como uma mediação para mitigar as desigualdades resultantes das comparações entre deficientes e não deficientes. Busca-se eficazmente superar situações de exclusão no âmbito educacional e social, envolvendo toda a sociedade no ideal de proporcionar às pessoas com deficiências um atendimento que estimule sua participação social de diversas formas.

Enquanto a sociedade e a legislação brasileira afirmam a igualdade de todos, sujeitos às mesmas leis e sanções, surge uma contradição ao considerar que, por muito tempo, a diversidade física, cultural ou psicológica foi um mecanismo de exclusão. Sobre isto, Pessoti (1986) citado por Lima (2006), evidencia como ao longo da história, as pessoas com deficiências foram rotuladas como incapazes, inválidas e inferiores, distantes da visão de cidadãos com direitos e deveres.

Na Antiguidade Clássica, pautada nos ideais da perfeição, as pessoas com deficiência eram eliminadas, como acontece hoje em algumas sociedades indígenas, por motivos religiosos ou crenças comuns. Na Idade Média, acreditava-se que muitas pessoas com deficiências eram portadoras de doenças contagiosas ou estavam possuídas pelo demônio; em seguida, com o início da produção mercantil, elas foram consideradas incapazes e, posteriormente, deficientes. Durante o Nazismo, a eliminação das pessoas com deficiência recomeçou, não mais associada a culturas especificas, e sim baseada numa motivação aparentemente irracional, guiada pelo princípio de eugenia, ou seja, de purificação da raça, a partir do pressuposto da superioridade ariana (Pessotti, 1986 apud Lima, 2006, p. 27).

Atualmente, a postura da sociedade em relação às pessoas com deficiências não se orienta mais para a ideia de extermínio ou eliminação. Pelo contrário, as representações sociais sobre a deficiência buscam consolidar a aceitação social, adotando propostas integradoras que respeitem as formas de ser, pensar e agir desses indivíduos. Essa nova perspectiva da deficiência é fundamentada nos princípios da igualdade e da diversidade, como mencionado anteriormente, e propõe uma redefinição conceitual atribuída às pessoas com deficiências, que antes eram comumente vistas como defeituosas, incapazes e até mesmo doentes.

A abordagem inclusiva não se limita a pensar na deficiência como ausência de saúde ou mera condição de incapacidade ou improdutividade. Sob essa ótica, os limites das pessoas com deficiência são considerados um problema social, não exclusivamente ligado à deficiência individual. Sua vida em sociedade e identidade são moldadas pelos resultados de suas práticas sociais e pelos diferentes papéis que podem desempenhar na sociedade, estando sujeitas a constantes inovações e significados.

De acordo com Beyer (2006), no processo de inclusão, não deve haver categorizações como “alunos com e sem deficiência, com e sem distúrbios, com e sem necessidades especiais” (p. 280). O princípio da diferença serve como base para compreender a singularidade dos indivíduos, eliminando estereótipos como “os especiais”, “os normais” e “os excepcionais”. Esse viés pedagógico inclusivo reconhece apenas a existência de alunos com diversas necessidades e valores distintos como pessoas, não os rotulando como deficientes ou não deficientes.

Lima (2006) destaca a proposta de inclusão de todos como participantes ativos na produção social, cultural e econômica, enfatizando a igualdade concreta entre os sujeitos. Ao mesmo tempo, encara a deficiência como uma possibilidade, apontando para o reconhecimento das diferenças intrínsecas a cada indivíduo. Assim, “a diversidade não se opõe à igualdade, a desigualdade socialmente construída é que se opõe à igualdade, o enfrentamento e a superação dessa contradição são tarefas cotidianas em uma proposta inclusiva” (Lima 2006, p. 21).

Nisto percebe-se que a importância da inclusão vai além da promoção da tolerância às diferenças; ela busca a efetiva aceitação, visando construir na sociedade um espaço comum onde as pessoas possam conviver e interagir independentemente da presença ou ausência de deficiências. Nesse sentido, a Educação Inclusiva pode ser definida como “a prática da inclusão de todos independentemente de seu talento, deficiência, origem socioeconômica ou cultural, em escolas e salas de aulas provedoras, onde as necessidades desses alunos sejam satisfeitas” (Stainback & Stainback, 1992, p. 21).

Da mesma forma, ao discutir conceitos e políticas relacionadas à educação inclusiva, Carvalho (2004) destaca que:

A proposta de educação inclusiva passa a ter uma outra conotação, muito além do que denota o vocábulo inclusão, (…) devemos remover barreiras para a aprendizagem e para a participação de qualquer aluno, independentemente de suas características orgânicas, psicossociais culturais, étnicas e econômicas (Carvalho, 2004, p. 111)

A ideia de Inclusão afigurado no excerto acima, propõe uma analogia ao espaço onde aqueles que mais sofreram as consequências de políticas educacionais arbitrárias, possam participar ativamente do processo de construção e decisões políticas referentes à sua educação e à sua vida social.  Assim, o referido conceito propõe que a escola se trata de um ambiente multicultural, que precisa moldar-se para atender a heterogeneidade requerente dos seus atendimentos. Por quanto, há que se entender que a questão do Multiculturalismo vivenciado no interior das escolas diz respeito às múltiplas identidades de sujeitos que a compõe, não estritamente às pessoas com deficiências.com relação a isso Kelman (2012) diz que:

O multiculturalismo dentro da educação vem como decorrência de se ter alunos pertencentes a diferentes universos nas salas de aula, do ponto de vista cultural, social, linguístico e religioso e de se ter o desafio de transformar o espaço escolar em um espaço democrático, que possa oferecer igualdade de oportunidade, dando por isso mesmo, condições de atendimento educacional diferente a alunos diversos (Kelmam 2012, p. 94).

De maneira geral, o termo inclusão ou educação inclusiva surgiu em resposta a uma parcela minoritária afastada do centro das decisões sociais, representada pelos considerados excluídos. No entanto, ao vincular constantemente a inclusão apenas aos excluídos, aos deficientes, aos que possuem déficits, ela, por si só, incorpora elementos excludentes que não refletem verdadeiramente o processo de inclusão como princípio para uma sociedade para todos.

Persistindo nessa perspectiva equivocada de inclusão focada em uma especificidade de sujeitos, notamos que a ênfase na prioridade aos que possuem necessidades especiais contribui para uma maior segregação entre os dois grupos, destacando aqueles com reais possibilidades de exercício do poder, acesso à cultura e às tecnologias de um lado, e os que não têm essas oportunidades do outro, acentuando ainda mais as desigualdades sociais.

A inclusão, conforme observada em nível nacional, centrada nas deficiências e nas limitações de um grupo minoritário, muitas vezes não tem conseguido atender plenamente às necessidades desse grupo, perpetuando uma inclusão que, paradoxalmente, exclui. Sobre isso, Lima (2006) afirma: “entendemos que a sociedade está construindo um processo inclusivo, mas que ainda produz exclusão. Há um movimento para incluir e obstáculos à inclusão” (Lima, 2006, p. 34).

As principais barreiras encontradas nesse contexto estão relacionadas ao fato de que a maioria das escolas ainda está longe de se tornar um espaço acessível e inclusivo. Embora algumas escolas desenvolvam projetos de inclusão parcial com pequenas mudanças estruturais, continuam oferecendo condições segregadoras e excludentes mesmo nas classes regulares, onde a inclusão deveria ocorrer.

Por outro lado, a incessante busca por tornar os espaços verdadeiramente inclusivos gera pressão no poder público para adaptar os ambientes escolares e sociais às normas e exigências da legislação e documentos oficiais que delineiam as diretrizes da educação inclusiva. No entanto, essa abordagem frequentemente resulta em soluções paliativas e práticas emergenciais insatisfatórias, incapazes de atender a todos, afastando-se dos princípios associados ao termo inclusão, que pressupõe fazer parte e estar incluído. Lacerda (2007) destaca problemas encontrados no processo inclusivo brasileiro, alertando que:

[…] o discurso contradiz a realidade educacional brasileira, caracterizada por classes superlotadas, instalações físicas insuficientes, quadros docentes cuja formação deixa a desejar. Essas condições de existência do sistema educacional levam a questionar a própria ideia de inclusão como política que, simplesmente, insira alunos nos contextos escolares existentes (Lacerda, 2007, p. 261).

Em termos conceituais, uma diversidade considerável de estudos aborda o conceito de inclusão por diferentes perspectivas, uma vez que a inclusão é um processo complexo e contínuo, focado na qualidade do atendimento a todos, constantemente adaptando-se a novas necessidades e sugerindo mudanças emergenciais. No entanto, a inclusão é um processo que tem se consolidado gradualmente nas últimas décadas, contando com o apoio da sociedade que se comprometeu a adotar essa postura inclusiva.

4 DESAFIOS DE ACESSO E PERMANÊNCIA NA EMEIF DE CAMETÁ TAPERA DOS ALUNOS SURDOS

Os dados empíricos deste estudo são apresentados com base na experiência vivenciada na Escola de Cametá Tapera, que atualmente enfrenta uma série de desafios e insucessos no que tange a educação de alunos surdos. A escola, até o ano de 2023, possuía dois alunos surdos matriculados: Fábio que possui 22 anos e foi aluno da instituição por 08 anos consecutivos e evadiu enquanto cursava o 8º ano e João, com 10 anos que ingressou na escola com pouco mais de 03 anos de idade e atualmente encontra-se no 6º ano do ensino fundamental. Além destes, a escola possui outros alunos com deficiências matriculados, mas ainda assim, não possui professor de Atendimento Educacional Especializado, fato que ocasionou a extinção da turma e possivelmente pode ter contribuído para a evasão do aluno Fábio, conforme é relatado por seu pai, a seguir:

A escola ela não é apropriada para um aluno surdo, porque um aluno surdo ele precisa de alguém pra interpretar o que ele vai escrever e muitas vezes não tem, então, ele ficava isolado lá, porque ele não tem quem interprete. Ele fica sem a resposta, porque não tem alguém que se comunique com isso. O Fábio saiu da escola por causa disso, por não ter alguém que se comunique com ele, ele ficou vários anos e não se via evolução nele.  O Fábio estudou tantos anos e eu não vi nenhum avanço. Ele aprendia mais com aquela professora que ensinava Libras pra ele. Se ele tivesse tido esses recursos ele estaria formado hoje (Pai de aluno surdo em situação de evasão escolar).

Na fala, além da ausência do AEE, o pai do aluno chama a atenção para a falta de suporte e comunicação adequada na escola. O pai do aluno surdo expõe a inadequação da escola em atender às necessidades específicas de seu filho, apontando para a ausência de um intérprete ou de alguém capaz de interpretar o que o aluno escreve. Somado a isto, a falta de comunicação entre Fábio, professores e os demais alunos surdos, resultava em seu isolamento na escola e na não aquisição do conhecimento.

Tal questão encontra-se diretamente ligada a falta de formação específica dos professores para lidar com alunos surdos. A ausência de capacitação adequada em educação inclusiva e em língua de sinais limita a capacidade dos docentes de oferecerem um ambiente de aprendizado verdadeiramente acessível e inclusivo para os alunos surdos. Além disso, a gestão da escola não providenciar um intérprete de Libras agrava ainda mais a situação, dificultando a comunicação eficaz entre alunos surdos e professores, bem como entre os próprios alunos surdos e seus colegas ouvintes. Tais serão apresentadas na íntegra pelos colaboradores do estudo.

Nesse sentido, a primeira fala a ser analisada é da professora 01, que trabalha com a disciplina de Língua Portuguesa na referida escola, que apresenta sua atuação junto com os dois alunos surdos:

Fábio já era aluno, com 5, 6 anos ele frequentava a escola. Então, quando eu me deparei com o Fábio, aluno surdo, eu me desesperei. Me desesperei porque era nova em concurso e eu não tinha formação nenhuma. Agora nós temos o João, o João, ele ainda é uma criança, ele deve ter 10 ou 11 anos. Mas quando eu me deparei com o João que nós tivemos o planejamento no início do ano e nós tínhamos uma professora de AEE até o início do ano passado que atendia os alunos. Não só o surdo, como o autista tinha o atendimento, mas a partir de mês de março do ano passado, a professora, ela adoeceu acabou a turma e os alunos evadiram.

 Então, a pergunta que eu fiz a coordenadora esse ano, como seria o trabalho com João?

Sendo que eu não tenho formação em Libras, como eu ia ensinar o português para o João? E ela só me disse assim que eu tinha que adaptar o conteúdo que eu passasse para os alunos ditos “normais”, eu ia adaptar para o João.

A resposta dela não me satisfez, então eu fui procurar a Graziella, que coordena, a área educação especial, e ela me disse, me orientou muito bem educada, me orientou aí eu trabalhar com o visual, com o data show, mas nossa escola não tem datashow e nem eu tenho, de modo que continuou extremamente difícil manter esse aluno e ainda mais se integrar com os outros alunos. O que eu percebo que o João ele senta bem na frente da minha mesa. O João ele não é alfabetizado em libras, mas ele escreve todo o alfabeto (Professora 01).

A partir do relato da professora 01 percebe-se elementos de sua atuação com dois com os dois alunos surdos matriculados na escola de Cametá Tapera, elementos estes que perpassam pelo desespero experimentado ao não possuir formação específica para o atendimento dos mesmos. Percebe-se que a entrevistada relata uma diferença entre o ingresso do aluno Fábio e o ingresso do aluno João na medida em que quando o segundo fora matriculado, houve uma preparação prévia por parte da escola, que juntamente com a então professora do AEE, realizou um planejamento, em forma de diálogo para informar a presença do mesmo, bem como para encaminhar as ações que seriam realizadas a partir de então. No entanto, nota-se ainda conforme o relato que a partir da saída desta profissional da escola, não só o aluno surdo, como outros alunos com deficiência perderam o acesso ao serviço especializado, fato contraditório de acordo com as leis em vigor e apresenta-se como um retrocesso no campo da inclusão, comprometendo o trabalho docente e o aprendizado desses alunos.

Retomando às análises da fala da professora 01, percebe-se que a mesma chama a atenção para um elemento muito especial, que de forma proporcional compromete boa parte do serviço de inclusão prestado na escola, que se trata da formação dos professores para a atuação junto aos alunos com deficiência. Acerca disso, a mesma relata que julga não ser adequada a atuação com alunos surdos, a formação que possui.

Nós, como professores de disciplinas, nós não temos formação nenhuma em relação a libras a trabalhar com o surdo, então, a Secretaria de educação, ela não fornece para nós, capacitação, formação, algo parecido. Mas apenas essas formações que tem, pelo menos nos anos que eu observo, são somente para os professores do AEE. Então, nós, professores, nós não temos essa formação e como como eu já me formei lá atrás, não tinha no meu curso de letras nem uma disciplina de libras. Ao contrário de hoje que parece que os cursos já vêm com uma disciplina em libras, que também não é o suficiente.

Então, se a gente quer uma melhoria, uma qualidade de ensino melhor que o aluno surdo, a gente tem que ir para internet, fazer curso online, porque a remedia ela não, não nos fornece. Então, a na minha opinião, o professor, ele tem que ter a capacitação, a formação e a nossa formação lá na licenciatura, na pós, ela é inadequada porque inadequada porque eu estudei letras, eu fiz, meu curso de letras, o que tinha era o inglês instrumental de diferente. O resto era voltar tudo para letra. Não tinha libras, fiz várias pós também, não estudei libras, fiz um mestrado e também não estudei libras (Professora 01).

A professora 01 enfatiza que a ausência de formação no campo da surdez, compromete sua atuação junto ao aluno matriculado na escola, esta carência ocorre desde seus processos formativos e se estende por hora em face do pouco suporte prestado pela Secretaria Municipal de Educação. Acerca disso, é importante mencionar que a formação continuada numa perspectiva inclusiva é reconhecida como um processo contínuo e dinâmico, que não apenas deve fornecer ferramentas práticas aos professores, como também incentiva a reflexão constante sobre suas práticas pedagógicas, visando aperfeiçoar a qualidade da educação oferecida a todos os alunos, independentemente de suas características e necessidades.

Ao analisar a questão da formação para atuação ao público surdo, o Professor 02 relata que:

A gente não tem formação, quando a gente fez a graduação, não tinha libras no currículo, então a gente não é preparado para isso. Até mesmo para dar um conselho para ele, porque os alunos surdos têm seus problemas, assim como qualquer aluno e eles ficam mais intrigados quando eles estão com esse problema, com essa coisa de poxa, eu não vou estudar porque ninguém me entende. Eu, eles, se sentem incapazes.

Mas não é eles também. Eu acho que eu imagino que seja nós, a sociedade, que não estão preparados para ajudar, para conviver, é de forma prazerosa com ele. Nesse sentido que eu digo de ter o contato com a libras, conversar com ele e eles nos entenderem, até mesmo dão um conselho para esse aluno (Professor 02).

O Professor 02, assim como já mencionado pela professora 01, remete a fragilidade de sua atuação no campo da surdez à ausência de formação em Libras durante a graduação, resultando na falta de compreensão e habilidades para interagir e se comunicar efetivamente com alunos surdos. No entanto, chama-se a atenção para o fato de que na ausência da formação inicial, tais profissionais poderiam ter buscado de forma autônoma por cursos e especializações que os capacitassem para o exercício junto aos alunos surdos com quem já estavam atuando. Para além disso, ressalta-se que na atualidade, a lacuna de formação inicial foi ressignificada pelo Decreto 5.626/05 que atentou para a obrigatoriedade da inclusão da disciplina de Libras em todas os cursos de graduação em Licenciatura, de modo a fornecer informações básicas aos futuros professores.

Neste viés, promover a formação de educadores, tanto no início de suas trajetórias quanto em etapas posteriores, significa disponibilizar a esses profissionais recursos que mesclam fundamentos teóricos com aplicações práticas. Esses recursos visam estimular o desenvolvimento de uma conscientização crítica acerca do papel social que abraçarão como docentes. Esse enfoque demanda um processo de capacitação que se baseie na constante interligação entre teoria e prática, ancorado na certeza de que todos os alunos têm a capacidade de absorver conhecimento (Zerbato, 2018).

A formação continuada, no contexto educacional, assume um papel fundamental numa perspectiva inclusiva, onde a busca pela equidade e pela valorização da diversidade são pilares essenciais. Nessa abordagem, a formação contínua de educadores não se limita apenas à atualização de conhecimentos, mas também se estende à construção de competências que permitam acolher e atender às necessidades de todos os alunos, independentemente de suas diferenças individuais, conforme sublinhado pela UNESCO, no excerto que segue:

O objetivo da inclusão é oferecer respostas apropriadas ao amplo espectro de necessidades de aprendizagem tanto em situações formais quanto não formais da educação. A educação inclusiva, mais que um tema marginal que trata sobre como integrar certos alunos no ensino convencional, representa uma perspectiva que deve servir para analisar como transformar os sistemas educacionais e outras situações de aprendizagem, com a finalidade de responder à diversidade dos alunos. O propósito da educação inclusiva é permitir que os professores e os alunos se sintam a vontade diante da diversidade e a percebam não como um problema, mas como um desafio e uma oportunidade para enriquecer as formas de ensinar e aprender. (UNESCO, 2005, p. 14.).

Nesse sentido, a formação continuada, torna-se uma ferramenta essencial para promover ambientes educacionais mais inclusivos, onde cada estudante possa desenvolver seu potencial máximo e sentir-se respeitado e valorizado. De igual modo, a formação continuada oferece uma série de benefícios para os professores, capacitando-os a enfrentar os desafios em constante evolução do ambiente educacional.

Ao participarem de programas de formação continuada, os educadores têm a oportunidade de atualizar seus conhecimentos, adquirir novas habilidades pedagógicas e familiarizar-se com as mais recentes metodologias de ensino. Isso não apenas melhora a qualidade do ensino oferecido aos alunos, mas também aumenta a confiança e a motivação dos professores, promove a troca de experiências entre colegas e contribui para o desenvolvimento profissional contínuo, garantindo que estejam sempre preparados para atender às necessidades diversificadas dos estudantes em constante mudança.

A educação é o processo pelo qual ocorre de forma institucionalizada e dirigida ocorre o desenvolvimento humano, no caso dos alunos com deficiência, a escola representa o primeiro lócus de inclusão, ampliando suas capacidades cognitivas, atitudinais e permitindo-lhes desenvolver habilidades de comunicação e convívio social. No entanto, essa inclusão deve transcender a mera presença na escola e na sala de aula, priorizando sobretudo a participação, a aprendizagem e o desenvolvimento de suas habilidades. Justamente estes aspectos são os principais desafios enfrentados pelas escolas atualmente.

Percebe-se que os docentes carecem de uma formação específica para lidar com a educação inclusiva e reconhecem isso. Por outro lado, percebe-se essa lacuna na capacitação desses professores na medida em que ao longo da entrevista é percebido que os mesmos possuem pouco embasamento sobre o assunto e recorrem a ideias estigmatizadas associadas às pessoas surdas, o que consequentemente resulta na adoção de práticas excludentes, pois são planejadas e implementadas com base no modelo do aluno ouvinte, não respeitando as características individuais e as necessidades específicas desses alunos.

Assim, chama-se a atenção para o fato de que o processo educativo leve em consideração a singularidade de cada aluno, garantindo que suas dificuldades sejam reconhecidas, mas sem que estas se tornem o foco principal, acentuando-as desnecessariamente. Os professores devem adotar uma abordagem que valorize as potencialidades dos alunos e esteja voltada para o desenvolvimento dessas habilidades.

Diante disso, a deficiência na formação dos professores dificulta a efetivação da inclusão e o desenvolvimento dos alunos surdos. Esse despreparo apenas ressalta a urgência de investimentos em formação continuada para os docentes, a fim de capacitá-los adequadamente para lidar com a diversidade presente nas salas de aula inclusivas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente estudo buscou-se mapear os desafios enfrentados pelos alunos surdos na EMEIF de Cametá Tapera, no sentido de examinar não apenas as dificuldades individuais de aprendizagem, mas também as barreiras estruturais e sociais que podem estar contribuindo para a exclusão desses estudantes. Acerca disso destaca-se que a pesquisa ressaltou a prevalência de questões como acessibilidade física, comunicação eficaz e apoio emocional somam o bojo dos desafios enfrentados. Além disso, é importante lembrar que as políticas educacionais e as diretrizes inclusivas propostas pela legislação em vigor não estão sendo implementadas na prática e isto impacta diretamente a experiência dos alunos surdos.

Ao analisar o contexto educacional na EMEIF de Cametá Tapera verificou-se que as práticas implementadas junto ao aluno surdo não são capazes de incluí-lo em sala de aula, primeiro porque o aluno não possui o suporte do atendimento educacional especializado onde poderia aprender a língua de sinais e ter o apoio de que necessita para desenvolver-se. Somado a isto, o aluno também não possui intérprete de Libras e como agravante os docentes não possuem nenhuma formação na área da inclusão.

No tocante aos desafios, percebe-se que estes são bilaterais, relatados igualmente pelos docentes e pela mãe do aluno que se encontra estudando, a maioria refere-se à acessibilidade comunicacional. De modo que enquanto perspectivas e expectativas dos educadores e os pais dos alunos surdos sugerem de imediato a presença de profissionais bilingues, em especial o intérprete de Libras e em esferas mais amplas, a realização de cursos e formações que abordem as características dos alunos surdos, de sua identidade e de sua língua, de modo a formar a comunidade escolar para o trabalho inclusivo.

Assim, os dados e ponderações levantados no interior desta produção textual, tanto as teóricas quanto as práticas coadunam para uma realidade corriqueira e repetitiva no que tange à educação de surdos onde a ausência de condições infra estruturais e humanas para o Atendimento Educacional Especializado não se restringe à educação de surdos, no entanto, sabemos que há muito o que se fazer pela educação de surdos, não se trata somente de uma questão de políticas públicas, mas um conjunto de mudanças que precisam ser repensadas no tocante à metodologia do professor, seu interesse em conhecer a língua de sinais, a formação continuada voltada para seus alunos. 

Este grupo por apresentar a particularidade de minoria linguística, necessita mais do que um professor de AEE para a consolidação de sua Inclusão em contexto escolar. Assim, o instrutor de Libras é o agente principal para dialogar entre o mundo ouvinte e o mundo surdo, uma vez que este ensinando a Língua ao surdo e a aos demais membros escolares iniciará um processo educativo muito distinto do que até então vem sendo realizado ali. Sobre isso, é preciso refletir que um processo educacional dito inclusivo que propõe ao aluno surdo aulas oralizadas sem a devida contextualização linguística e sem a presença de um profissional bilíngue em nada é inclusivo.

Por sua vez, a ausência desta formação mediada pela língua de sinais torna-se distanciada de suas condições de aprendizagem e pode ocasionar muitas vezes no desinteresse escolar por parte dos educandos surdos, e por fim este fato é responsável pelas elevadas distorções idade-série e a evasão escolar, já que muitas vezes é garantida a esses sujeitos uma educação abaixo dos limites mínimos determinados pela legislação.

Em contrapartida, a pesquisa levantou outras questões que precisam ser repensadas acerca da educação que destinada ao aluno da escola de Cametá Tapera, questões que estão para além do conhecimento escolar e tocam essencialmente em questões culturais e paradigmáticas sobre a surdez, visto que a história de vida deste educando com ausência de aquisição de língua de sinais tem sido escrita e contada pelos ouvintes que o cercam, a este não foi dada a oportunidade de ver-se e narrar-se e empoderar-se enquanto Surdo, no sentido político da palavra. Esta questão implica diretamente na constituição identitária surda que se dá a partir do resultado de práticas sociais, de relações sócio históricas, e de papéis que este desempenha linguisticamente entre o mundo surdo e o mundo ouvinte.

No que diz respeito à análise do contexto educacional na EMEIF de Cametá Tapera, é importante investigar quais práticas inclusivas estão sendo efetivamente implementadas para os alunos surdos. Isso pode incluir a avaliação dos recursos disponíveis, como materiais didáticos adaptados, equipamentos de apoio, além da capacitação dos professores em Língua de Sinais e pedagogias inclusivas. Identificar os pontos fortes e as lacunas nessas práticas pode fornecer insights valiosos para melhorias futuras.


3 É importante ressaltar que a Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental de Cametá Tapera não possui um Projeto Político-Pedagógico (PPP) formalizado. Esta ausência de documento é um problema complexo que envolve a falta de interesse por parte dos gestores da instituição, bem como a ausência de uma imposição por parte da Secretaria de Educação para que o referido PPP fosse desenvolvido e implementado. A elaboração e implementação de um PPP são fundamentais para orientar as práticas educacionais, definir metas e diretrizes pedagógicas, além de promover a participação da comunidade escolar na construção de uma educação de qualidade e inclusiva.


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1Graduado em Letras Língua Língua Inglesa pela UFPA, graduado em Pedagogia (FACIBRA) e Ciências sociais pela (UFPA) Especialista em Educação especial e inclusiva ( FACIBRA) Metodologia do ensino de língua portuguesa e estrangeira (UNINTER) Mestrando no Programa de Pós-graduação em Ciências da Educação pela Faculdade de Ciências Sociais Interamericana – FICS. E-mail: eniosales33@gmail.com.

2Mílvio da Silva Ribeiro – Doutor em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Pará – PPGEO/UFPA. Professor na Faculdade de Teologia, Filosofia e Ciências Humanas Gamaliel FATEFIG. Pedagogo; Geógrafo. E-mail: milvio.geo@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1118-7152