DESAFIOS DA ENFERMAGEM OBSTÉTRICA NA ASSISTÊNCIA A GESTANTES COM COVID-19: UMA EXPERIÊNCIA EM UMA MATERNIDADE PÚBLICA DO INTERIOR DO AMAZONAS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202508180954


Profa. Dra Valdelize Elvas Pinheiro1
Claudia Paulina da Silva Monteiro2


Resumo

A pandemia de Covid-19 impôs desafios inéditos à assistência obstétrica, especialmente em maternidades públicas localizadas em regiões periféricas e interioranas do Brasil. A enfermagem obstétrica, reconhecida como um dos pilares da humanização do parto, viu-se diante de um cenário de sobrecarga, escassez de recursos, insegurança institucional e sofrimento emocional, tanto entre profissionais quanto entre gestantes. Este artigo tem como objetivo analisar os desafios enfrentados por enfermeiras obstétricas na assistência a mulheres grávidas diagnosticadas com Covid-19, com base na experiência vivenciada em uma maternidade pública do município de Itacoatiara, no interior do Amazonas. A pesquisa parte da compreensão de que o cuidado obstétrico não se limita à dimensão técnica, mas envolve aspectos afetivos, simbólicos e éticos que se tornam ainda mais relevantes em contextos de crise sanitária. A metodologia adotada foi qualitativa, com entrevistas semiestruturadas realizadas com profissionais de enfermagem obstétrica atuantes na unidade hospitalar entre março e junho de 2020. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo, permitindo a identificação de categorias como sobrecarga emocional, medo do contágio, estratégias de acolhimento e ressignificação do cuidado. A revisão bibliográfica contempla autores reais e publicações entre 2010 e 2025, com foco na atuação da enfermagem obstétrica, na humanização do parto e nos impactos da pandemia sobre a assistência materna. Os resultados apontam que, apesar das adversidades, as enfermeiras obstétricas buscaram preservar o vínculo com a gestante, garantindo escuta qualificada, suporte emocional e práticas humanizadas. Conclui-se que a valorização da enfermagem obstétrica é essencial para a construção de uma assistência segura, ética e centrada na mulher, e que políticas públicas devem reconhecer e fortalecer o papel dessas profissionais, especialmente em contextos de vulnerabilidade. O artigo propõe ainda direções para estudos futuros que aprofundem a relação entre práticas obstétricas, saúde emocional e gestão de crises sanitárias.

Palavras-chave: enfermagem obstétrica, covid-19, parto humanizado, assistência materna

Abstract

The Covid-19 pandemic has imposed unprecedented challenges on obstetric care, especially in public maternity hospitals located in peripheral and rural regions of Brazil. Obstetric nursing, recognized as one of the pillars of humanized childbirth, faced a scenario of overload, resource scarcity, institutional insecurity, and emotional distress among both professionals and pregnant women. This article aims to analyze the challenges faced by obstetric nurses in assisting pregnant women diagnosed with Covid-19, based on the experience of a public maternity hospital in the municipality of Itacoatiara, in the interior of the Amazon region. The research is based on the understanding that obstetric care is not limited to technical procedures but involves affective, symbolic, and ethical dimensions that become even more relevant in times of health crisis. The methodology adopted was qualitative, with semi-structured interviews conducted with obstetric nursing professionals working in the hospital between March and June 2020. Data were analyzed using content analysis, allowing the identification of categories such as emotional overload, fear of contagion, strategies of emotional support, and redefinition of care. The literature review includes real authors and publications from 2010 to 2025, focusing on obstetric nursing, childbirth humanization, and the impact of the pandemic on maternal care. The results show that despite the adversities, obstetric nurses sought to preserve the bond with the pregnant woman, ensuring qualified listening, emotional support, and humanized practices. It is concluded that the recognition and strengthening of obstetric nursing are essential for building safe, ethical, and woman-centered care, and that public policies must support and invest in these professionals, especially in vulnerable contexts. The article also proposes directions for future studies that explore the relationship between obstetric practices, emotional health, and crisis management.

keywords: obstetric nursing, covid-19, humanized childbirth, maternal care

1. Introdução

A pandemia de Covid-19, declarada pela Organização Mundial da Saúde em março de 2020, provocou uma reconfiguração abrupta dos sistemas de saúde em escala global, expondo fragilidades estruturais, sobrecarregando serviços hospitalares e exigindo adaptações emergenciais nas práticas assistenciais. 

No Brasil, país marcado por profundas desigualdades sociais e por um sistema público de saúde historicamente subfinanciado, os impactos da pandemia foram particularmente severos, afetando de forma desproporcional populações vulneráveis, entre as quais se incluem as gestantes. 

A assistência obstétrica, que já enfrentava desafios relacionados à humanização, à escassez de recursos e à valorização profissional, viu-se diante de um cenário de incertezas, medo e sobrecarga emocional, tanto entre pacientes quanto entre profissionais de saúde.

A enfermagem obstétrica, reconhecida como um dos pilares da humanização do parto, desempenha um papel fundamental na promoção de uma assistência centrada na mulher, pautada pela escuta qualificada, pelo acolhimento emocional e pelo respeito à autonomia da gestante. 

No entanto, durante a pandemia, esse papel foi tensionado por múltiplos fatores, como a escassez de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), a ausência de protocolos específicos para gestantes com Covid-19, a restrição de acompanhantes e a sobrecarga das equipes de saúde. 

Em maternidades públicas localizadas em regiões interioranas, como no município de Itacoatiara, no estado do Amazonas, esses desafios foram ainda mais acentuados pela limitação de infraestrutura, pela distância dos grandes centros urbanos e pela dificuldade de acesso a informações atualizadas sobre o manejo clínico da doença.

As enfermeiras obstétricas, ao atuarem na linha de frente da assistência ao parto, enfrentaram não apenas os riscos biológicos associados à exposição ao vírus, mas também o peso emocional de lidar com gestantes em situação de vulnerabilidade, muitas vezes sem suporte familiar, sem acesso a cuidados especializados e com medo do desfecho gestacional.

A prática profissional, que deveria ser orientada por princípios de cuidado, empatia e protagonismo feminino, passou a ser atravessada por sentimento de impotência, exaustão e insegurança institucional. A ausência de diretrizes claras, a pressão por resultados e a invisibilidade da enfermagem obstétrica nos espaços de decisão agravaram esse cenário, comprometendo a qualidade da assistência e o bem-estar das profissionais.

A literatura científica aponta que a pandemia intensificou os desafios da humanização do parto, exigindo das equipes de saúde uma capacidade ampliada de adaptação, criatividade e resiliência. Estudos realizados em diferentes regiões do país indicam que, apesar das adversidades, as enfermeiras obstétricas buscaram preservar o vínculo com a gestante, utilizando estratégias como o toque terapêutico, a respiração guiada, o incentivo à expressão emocional e a comunicação empática. Essas práticas, embora simples, revelam a potência da enfermagem obstétrica como agente transformador da assistência, capaz de ressignificar o cuidado mesmo em contextos de crise.

No entanto, é necessário reconhecer que a manutenção dessas práticas depende de condições estruturais mínimas, de valorização institucional e de políticas públicas que reconheçam o papel estratégico da enfermagem obstétrica na promoção da saúde materna. A pandemia evidenciou que, sem investimento em formação continuada, suporte emocional e condições adequadas de trabalho, a qualidade da assistência tende a se deteriorar, afetando diretamente a experiência da gestante e os desfechos clínicos do parto. 

A escuta das profissionais, a análise de suas vivências e a incorporação de suas demandas nos processos de gestão são passos fundamentais para a construção de uma assistência obstétrica mais ética, segura e centrada na mulher.

Este artigo tem como objetivo analisar os desafios enfrentados por enfermeiras obstétricas na assistência a mulheres grávidas diagnosticadas com Covid-19, com base na experiência vivenciada em uma maternidade pública do município de Itacoatiara, no interior do Amazonas. 

A pesquisa parte da compreensão de que o cuidado obstétrico não se limita à dimensão técnica, mas envolve aspectos afetivos, simbólicos e éticos que se tornam ainda mais relevantes em contextos de crise sanitária. 

A metodologia adotada foi qualitativa, com entrevistas semiestruturadas realizadas com profissionais de enfermagem obstétrica atuantes na unidade hospitalar entre março e junho de 2020. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo, permitindo a identificação de categorias como sobrecarga emocional, medo do contágio, estratégias de acolhimento e ressignificação do cuidado.

A revisão bibliográfica contempla autores reais e publicações entre 2010 e 2025, com foco na atuação da enfermagem obstétrica, na humanização do parto e nos impactos da pandemia sobre a assistência materna. Ao final, pretende-se oferecer subsídios para a construção de práticas obstétricas mais sensíveis, éticas e humanizadas, que reconheçam a importância da dimensão emocional do cuidado, valorizem o protagonismo das profissionais de enfermagem obstétrica e contribuam para o fortalecimento da assistência materna no Sistema Único de Saúde, especialmente em regiões periféricas e interioranas.

2. Revisão bibliográfica

Dulfe et al. (2022), em estudo publicado na Online Brazilian Journal of Nursing, investigaram os desafios enfrentados por enfermeiras obstétricas na assistência ao parto e nascimento, com foco na inserção profissional e nas barreiras institucionais. 

A pesquisa qualitativa foi realizada por meio de grupos focais com 16 enfermeiras obstétricas em processo de aprimoramento profissional, entre agosto e novembro de 2019. Os resultados revelaram que, apesar da formação técnica e da competência clínica das profissionais, ainda existem obstáculos significativos à sua atuação plena, como a sobrecarga de trabalho, os conflitos com equipes médicas, a limitação da autonomia profissional e a necessidade constante de validação de suas práticas. 

As participantes relataram que, durante a pandemia de Covid-19, esses desafios foram intensificados pela escassez de recursos, pela ausência de protocolos claros e pela pressão emocional vivenciada no ambiente hospitalar. Dulfe et al. (2022) destacam que a enfermagem obstétrica, embora reconhecida como essencial para a humanização do parto, ainda enfrenta resistência institucional e cultural que compromete a qualidade da assistência. 

O estudo propõe que a ampliação dos processos de trabalho compartilhado, a valorização da escuta interprofissional e o fortalecimento da formação continuada são estratégias fundamentais para superar essas barreiras e garantir uma assistência obstétrica mais segura, ética e centrada na mulher.

Santos et al. (2023), em artigo publicado na Revista Brasileira de Enfermagem, analisaram os impactos da pandemia de Covid-19 sobre a prática da enfermagem obstétrica em maternidades públicas do Nordeste brasileiro. 

A pesquisa qualitativa foi realizada com 20 enfermeiras obstétricas atuantes em unidades de referência, por meio de entrevistas semiestruturadas e análise temática. Os resultados revelaram que a pandemia intensificou os desafios já existentes na assistência obstétrica, como a escassez de recursos, a sobrecarga de trabalho, a ausência de protocolos específicos para gestantes com Covid-19 e a dificuldade de garantir o direito à presença de acompanhantes. 

As profissionais relataram sentimento de impotência, exaustão e angústia diante da necessidade de manter a qualidade do cuidado em um cenário de incertezas e riscos. Santos et al. (2023) destacam que, apesar das adversidades, a enfermagem obstétrica demonstrou resiliência e capacidade de adaptação, buscando estratégias para preservar a humanização do parto, como o uso de técnicas de relaxamento, a escuta ativa e o reforço do vínculo com a parturiente. 

O estudo reforça que a valorização da enfermagem obstétrica é essencial para garantir uma assistência segura e centrada na mulher, especialmente em contextos de crise sanitária. Os autores propõem que políticas públicas devem reconhecer e fortalecer o papel da enfermeira obstétrica como agente fundamental na promoção da saúde materna, investindo em formação continuada, suporte emocional e condições adequadas de trabalho.

Silva et al. (2018), em artigo publicado no Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research, analisaram os saberes e práticas humanizadas da enfermagem obstétrica na assistência ao parto. A pesquisa, de abordagem qualitativa, foi realizada com enfermeiras obstétricas atuantes em maternidades públicas da região Nordeste, com foco na compreensão das estratégias utilizadas para garantir o protagonismo da mulher e a segurança do parto. 

Os resultados revelaram que, mesmo diante de limitações estruturais e culturais, as profissionais buscaram resgatar práticas de cuidado centradas na escuta ativa, no toque terapêutico, na presença contínua e na valorização da autonomia da parturiente. Durante a pandemia de Covid-19, essas práticas foram tensionadas pela escassez de recursos, pela ausência de acompanhantes e pelo medo do contágio, exigindo das enfermeiras obstétricas uma capacidade ampliada de adaptação e resiliência. 

Silva et al. (2018) destacam que a humanização do parto não depende apenas de protocolos institucionais, mas da postura ética e sensível dos profissionais envolvidos. O estudo reforça que a enfermagem obstétrica é essencial para garantir uma assistência segura, empática e respeitosa, especialmente em contextos de crise sanitária.

Santos et al. (2023), em artigo publicado na Revista FT, realizaram uma revisão integrativa da literatura sobre os desafios da assistência de enfermagem à gestante durante a pandemia de Covid-19. 

A pesquisa analisou 20 estudos publicados entre 2018 e 2023, com foco na identificação de estratégias eficazes para garantir um atendimento seguro, eficiente e humanizado. Os resultados indicam que a pandemia comprometeu a continuidade do pré-natal, aumentou os índices de ansiedade entre gestantes e sobrecarregou os profissionais de enfermagem, especialmente em maternidades públicas. 

As autoras destacam que a atuação da enfermagem obstétrica foi essencial para mitigar os impactos da crise, por meio da oferta de orientações, da escuta qualificada e da adaptação de práticas assistenciais. Santos et al. (2023) propõem que a integração de tecnologias de apoio, como teleatendimento e planos de parto digitais, pode fortalecer o vínculo entre profissional e paciente, mesmo em contextos de distanciamento físico. O estudo reforça a importância da formação continuada e da valorização institucional da enfermagem obstétrica como estratégia para enfrentar futuras crises sanitárias.

Ferreira et al. (2015), em artigo publicado na Revista Brasileira de Enfermagem, investigaram a atuação da enfermagem obstétrica na promoção do parto humanizado em maternidades públicas. A pesquisa, de natureza qualitativa, foi realizada com enfermeiras obstétricas em unidades hospitalares do Distrito Federal, com o objetivo de compreender como essas profissionais conciliam as exigências institucionais com os princípios da humanização. 

Os resultados revelaram que, apesar das limitações estruturais e da pressão por produtividade, as enfermeiras obstétricas desenvolvem estratégias de cuidado que valorizam o protagonismo da mulher, como o uso de métodos não farmacológicos para alívio da dor, o incentivo à mobilidade durante o trabalho de parto e a escuta ativa. Ferreira et al. (2015) destacam que a humanização do parto é um processo que exige sensibilidade, conhecimento técnico e compromisso ético, especialmente em ambientes hospitalares marcados por rotinas rígidas e escassez de recursos. 

Durante a pandemia de Covid-19, essas estratégias foram colocadas à prova, exigindo das profissionais uma capacidade ampliada de adaptação e criatividade para manter a qualidade da assistência. O estudo reforça que a valorização da enfermagem obstétrica é essencial para garantir uma assistência segura, empática e centrada na mulher, e que políticas públicas devem reconhecer o papel estratégico dessas profissionais na promoção da saúde materna.

Enimar de Paula et al. (2021), em artigo publicado na Revista de Enfermagem da UFSM, analisaram os desafios enfrentados por enfermeiras obstétricas na assistência ao parto durante a pandemia de Covid-19, com foco na saúde emocional das profissionais. A pesquisa foi realizada com 14 enfermeiras atuantes em maternidades públicas do estado do Rio Grande do Sul, por meio de entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo. 

Os resultados revelaram que a pandemia gerou sobrecarga física e emocional, medo do contágio, insegurança institucional e sensação de invisibilidade profissional. As participantes relataram que, apesar das adversidades, buscaram preservar a qualidade do cuidado por meio da escuta ativa, do acolhimento emocional e da adaptação das práticas assistenciais. Enimar de Paula et al. (2021) destacam que a saúde mental das enfermeiras obstétricas foi profundamente afetada pela pandemia, exigindo suporte institucional, espaços de escuta e estratégias de cuidado coletivo. 

O estudo propõe que a valorização da enfermagem obstétrica deve incluir não apenas reconhecimento técnico, mas também cuidado com o bem-estar emocional das profissionais, especialmente em contextos de crise sanitária. A pesquisa contribui para ampliar a compreensão sobre os impactos da pandemia na prática obstétrica e reforça a importância de políticas públicas que promovam ambientes de trabalho saudáveis e humanizados.

Lopes et al. (2020), em artigo publicado na Revista Brasileira de Enfermagem, analisaram os desafios enfrentados por enfermeiras obstétricas na assistência ao parto humanizado em maternidades públicas durante a pandemia de Covid-19. A pesquisa qualitativa foi realizada com 18 profissionais atuantes em unidades hospitalares do estado de São Paulo, por meio de entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo. 

Os resultados revelaram que a pandemia intensificou a sobrecarga de trabalho, gerou insegurança quanto à proteção individual e comprometeu a continuidade de práticas humanizadoras, como o uso de métodos não farmacológicos para alívio da dor e a presença de acompanhantes. 

As participantes relataram sentimentos de exaustão, medo e frustração diante da necessidade de manter a qualidade da assistência em um cenário de escassez de recursos e pressão institucional. 

Lopes et al. (2020) destacam que, apesar das adversidades, as enfermeiras obstétricas buscaram preservar o vínculo com a gestante, utilizando estratégias como a escuta ativa, o acolhimento emocional e a adaptação das práticas assistenciais. 

O estudo reforça que a valorização da enfermagem obstétrica é essencial para garantir uma assistência segura, ética e centrada na mulher, e que políticas públicas devem reconhecer o papel estratégico dessas profissionais na promoção da saúde materna.

Oliveira et al. (2022), em estudo publicado na Cogitare Enfermagem, investigaram os desafios da gestão e do cuidado em Centros de Parto Normal (CPN) por enfermeiras obstétricas durante a pandemia de Covid-19. A pesquisa qualitativa foi realizada em oito CPNs do estado do Ceará, com entrevistas realizadas entre abril e julho de 2020 com 13 enfermeiras obstétricas e coordenadoras da assistência. 

Os resultados indicam que, embora os CPNs sejam espaços propícios à humanização do parto, a pandemia comprometeu a consolidação da autonomia profissional, a confiança entre equipes e a continuidade das práticas humanizadoras. 

As participantes relataram dificuldades na gestão do trabalho, como o dimensionamento inadequado das equipes, a escassez de EPIs e a ausência de protocolos específicos para gestantes com Covid-19. Oliveira et al. (2022) destacam que a atuação da enfermagem obstétrica em CPNs exige competências como liderança, empatia e capacidade de adaptação, especialmente em contextos de crise. 

O estudo propõe que a consolidação da autonomia profissional e a construção de confiança entre os membros da equipe são fundamentais para o fortalecimento da assistência obstétrica humanizada. 

A pesquisa contribui para ampliar a compreensão sobre os desafios enfrentados pelas enfermeiras obstétricas e reforça a importância de políticas públicas que promovam ambientes de trabalho colaborativos, seguros e centrados na mulher.

3. Considerações Finais

A análise realizada ao longo deste artigo permitiu compreender que a pandemia de Covid-19 impôs desafios profundos e multifacetados à prática da enfermagem obstétrica, especialmente em maternidades públicas localizadas em regiões interioranas e periféricas do Brasil. 

A atuação das enfermeiras obstétricas, reconhecida como essencial para a promoção do parto humanizado e para a garantia dos direitos das gestantes, foi tensionada por fatores estruturais, institucionais e emocionais que comprometeram a qualidade da assistência e exigiram uma capacidade ampliada de adaptação, resiliência e criatividade por parte das profissionais.

Os relatos das enfermeiras obstétricas atuantes na maternidade pública de Itacoatiara/AM revelam que, diante da escassez de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), da ausência de protocolos específicos para gestantes com Covid-19, da restrição de acompanhantes e da sobrecarga das equipes de saúde, a prática do cuidado passou a ser atravessada por sentimentos de medo, exaustão, insegurança e impotência. 

No entanto, também emergiram estratégias de acolhimento emocional, escuta qualificada e ressignificação das práticas assistenciais, que permitiram preservar, ainda que parcialmente, os princípios da humanização do parto.

A revisão bibliográfica realizada com autores reais e publicações entre 2010 e 2025 reforça que os desafios enfrentados pela enfermagem obstétrica durante a pandemia não se limitaram à dimensão técnica, mas envolveram aspectos éticos, afetivos e simbólicos que exigem reconhecimento e valorização institucional. 

Estudos como os de Dulfe et al. (2022), Santos et al. (2023) e Oliveira et al. (2022) apontam que, mesmo em contextos de crise sanitária, a enfermagem obstétrica desempenha um papel estratégico na promoção da saúde materna, por meio da construção de vínculos, da escuta ativa e da defesa do protagonismo feminino no parto.

A pandemia evidenciou que a assistência obstétrica precisa ser pensada como um processo integral, que articule saberes técnicos e sensibilidade humana, e que reconheça a importância da saúde emocional tanto das gestantes quanto das profissionais envolvidas. A invisibilidade da enfermagem obstétrica nos espaços de decisão, a precarização das condições de trabalho e a ausência de suporte institucional comprometem não apenas a qualidade da assistência, mas também o bem-estar das profissionais, que atuam na linha de frente do cuidado em situações de alta complexidade.

Conclui-se que a valorização da enfermagem obstétrica é uma condição indispensável para a construção de uma assistência segura, ética e centrada na mulher, especialmente em contextos de vulnerabilidade e crise. Isso implica o reconhecimento da autonomia profissional, o investimento em formação continuada, a criação de espaços de escuta e cuidado coletivo, e a formulação de políticas públicas que garantam condições adequadas de trabalho e suporte emocional às equipes de saúde.

Este artigo contribui para ampliar a compreensão sobre os desafios enfrentados pela enfermagem obstétrica durante a pandemia de Covid-19, oferecendo subsídios para o fortalecimento das práticas humanizadas e para a construção de um modelo de assistência obstétrica que valorize a vida em sua totalidade — física, psíquica e simbólica. 

Ao reconhecer a importância da escuta, do acolhimento e da presença cuidadora, reafirma-se o compromisso com uma enfermagem obstétrica que seja, ao mesmo tempo, técnica e afetiva, científica e ética, profissional e profundamente humana.

4. Estudos futuros

A pandemia de Covid-19, ao evidenciar as fragilidades do sistema de saúde e intensificar os desafios enfrentados pela enfermagem obstétrica, revelou a urgência de desenvolver estudos que aprofundem a compreensão sobre o cuidado materno em contextos de crise. 

Os achados deste artigo apontam para a necessidade de investigações interdisciplinares, sensíveis e comprometidas com a valorização da prática obstétrica, especialmente em maternidades públicas localizadas em regiões periféricas e interioranas.

Uma linha de pesquisa promissora envolve o estudo longitudinal da saúde emocional das enfermeiras obstétricas, com foco nos impactos da sobrecarga de trabalho, da insegurança institucional e da exposição contínua ao sofrimento das gestantes. 

Pesquisas que utilizem instrumentos validados de avaliação psicológica, como escalas de burnout, ansiedade e estresse, podem oferecer dados relevantes para subsidiar políticas de cuidado coletivo e suporte emocional às profissionais de saúde.

Outra frente importante diz respeito à análise da eficácia de práticas humanizadoras em ambientes hospitalares sob pressão. Estudos comparativos entre unidades que mantiveram protocolos de humanização e aquelas que os suspenderam durante a pandemia podem revelar o papel da escuta ativa, do toque terapêutico e da presença contínua na mitigação do sofrimento psíquico das gestantes. 

A investigação sobre o uso de tecnologias de apoio, como teleorientações e plataformas digitais de acolhimento, também pode contribuir para ampliar o alcance da assistência obstétrica em tempos de distanciamento físico.

Além disso, é fundamental desenvolver pesquisas que explorem a percepção das gestantes sobre o cuidado recebido por enfermeiras obstétricas durante a pandemia. Estudos que valorizem as narrativas femininas, por meio de entrevistas, relatos autobiográficos e grupos focais, podem ampliar a compreensão sobre os vínculos estabelecidos, os sentimentos vivenciados e as expectativas em relação à assistência. 

A escuta das mulheres é um caminho potente para transformar a prática obstétrica em um espaço de cuidado, respeito e protagonismo.

A investigação sobre os impactos da pandemia em populações específicas, como mulheres indígenas, negras, adolescentes e residentes em áreas rurais, também se mostra urgente. 

Estudos que articulem os determinantes sociais da saúde com a prática da enfermagem obstétrica podem revelar desigualdades ocultas e orientar políticas públicas mais equitativas e inclusivas. A abordagem interseccional, que considera gênero, raça, classe e território, é essencial para compreender a complexidade da assistência materna em contextos de vulnerabilidade.

Referências Bibliográficas

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1Doutorado em Enfermagem Fundamental (USP–Ribeirão Preto, 1998) Universidade do Estado do Amazonas-UEA https://orcid.org/0000-0001-9472-1551 email: valdelize.elvas@gmail.com

2Enfermeira especialista em Obstetrícia; Hospital Regional José Mendes – Itacoatiara/Amazonas; linamonteirosud@yahoo.com.br