DA UNIÃO ESTÁVEL, A SEPARAÇÃO DE CORPOS E O AFASTAMENTO TEMPORÁRIO DE UM DOS CÔNJUGES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10558343


Márcia Silveira Borges1
Maria Maida2


RESUMO

Este artigo examina a aplicabilidade das tutelas de urgência, especialmente as tutelas cautelar e antecipada, no direito de família, focando na separação de corpos e no afastamento temporário da morada na união estável. A Constituição de 1988 elevou a união estável à condição de entidade familiar, mas o Código Civil de 2002 não a recepcionou da mesma forma. O artigo discute a união entre homem e mulher sem casamento, anteriormente chamada de concubinato, e suas restrições no Código de 1916. O estudo se concentra na união estável por opção, onde as relações patrimoniais precisam de proteção legal e moral. Com a dignidade da pessoa humana e a igualdade de gênero na Constituição, aspectos do direito de família precisaram ser revistos. O artigo propõe estudar a união estável no contexto atual da sociedade e a discriminação existente para essa entidade familiar.

Palavras-chave: Cônjuge. União estável. Entidade familiar.

ABSTRACT

This article investigates the application of urgent guardianships, specifically precautionary and anticipated guardianships, within the context of family law, focusing on stable unions. The analysis addresses the distinction between body separation and temporary home departure, as well as their applicability in stable unions. The study underscores the need for legal and moral protection in the patrimonial relations existing between partners. Furthermore, it discusses the necessary revision of aspects of family law in light of human dignity and gender equality, as established in the Constitution. The article proposes a study of stable unions in the current social context and the existing discrimination against this form of family entity.

Keywords: Spouse. Stable union. Family entity.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo se propõe a explorar aspectos fundamentais da união estável, com foco na separação de corpos e no afastamento temporário de um dos cônjuges. A união estável, reconhecida como entidade familiar pela Constituição de 1988, tem sido objeto de intensos debates e estudos jurídicos.

No entanto, o Código Civil de 2002 não a recepcionou da mesma forma, o que levanta questões importantes sobre a proteção legal e moral das relações patrimoniais na união estável. Este estudo se propõe a examinar essas questões, bem como a aplicabilidade das tutelas de urgência, especialmente as tutelas cautelar e antecipada, no direito de família.

Além disso, o artigo discute a distinção entre a separação de corpos e o afastamento temporário da morada na união estável, e a aplicabilidade do direito internacional privado às relações familiares. Através desta análise, o artigo busca contribuir para a compreensão da união estável no contexto atual da sociedade e da discriminação existente para essa entidade familiar.

Espera-se que este trabalho possa servir como um recurso valioso para acadêmicos, estudantes e profissionais que buscam uma compreensão mais profunda desses tópicos complexos e em constante evolução.

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA UNIÃO ESTÁVEL

A influência da Igreja Católica na sociedade brasileira, devido à colonização portuguesa, resultou na aceitação apenas do casamento celebrado com formalidades religiosas como legítimo, conforme a legislação portuguesa (Ordenações Filipinas) aplicada após a independência (BRASIL, 1891). A Constituição Brasileira de 1824 estabeleceu a religião católica apostólica romana como a religião oficial do Império brasileiro. O casamento civil foi regulamentado apenas após a Proclamação da República, pelo Decreto nº 181, de 24 de janeiro de 1890, e ratificado pela Constituição Republicana de 24 de fevereiro de 1891 (BRASIL, 1891).

O Código Civil de 1916 continuou a estabelecer o casamento civil como a única forma de constituição da família legítima. Embora não tenha regulamentado o concubinato, referiu-se a ele em algumas disposições para defender o instituto do casamento (AZEVEDO, 2011).

Com o tempo, a legislação esparsa e as decisões judiciais começaram a reconhecer direitos aos concubinos, principalmente nos casos de concubinato puro. O Decreto-lei nº 7.036, de 10 de novembro de 1944, que regulou o acidente de trabalho, e a Lei nº 4.297, de 23 de dezembro de 1963, que estabeleceu a possibilidade de concessão de pensão à companheira, são exemplos disso (BRASIL, 1944).

A Súmula nº 35 do Supremo Tribunal Federal, de 13 de dezembro de 1963, estabeleceu que “em caso de acidente do trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio” (BRASIL, 1963).

 Outro marco legal importante foi a edição, em 26 de dezembro de 1977, da Lei 6.515, que instituiu o divórcio no ordenamento jurídico brasileiro, acabando com o caráter de indissolubilidade do casamento, abrindo espaço para um maior reconhecimento da chamada família de fato. Paulatinamente, as decisões judiciais também passaram a reconhecer direitos às concubinas pela contribuição das mesmas ao patrimônio adquirido pelo esforço comum do casal, culminando com a edição, em 03 de abril de 1964, da Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, determinando que “comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum” (BRASIL, 1964).

Com o passar do tempo, algumas decisões judiciais firmaram o entendimento de que o concubinato, por si só, não daria origem à sociedade de fato mencionada na já citada Súmula nº 380 do STF, sendo necessário a prova da efetiva colaboração dos concubinos para a formação do patrimônio comum.

Em resposta a tal posicionamento, uma parte da doutrina e da jurisprudência passou a sustentar o entendimento de que a sociedade de fato entre os concubinos apresentava caráter diferenciado da sociedade de fato comum, prevista no artigo 1.363 do Código Civil, estabelecida com base no direito obrigacional, na medida em que tinha como escopo principal a constituição da família de fato.

Assim, a simples permanência da concubina no lar, nas lides domésticas e no cuidado com os filhos do casal, já seria suficiente para o reconhecimento do esforço comum (contribuição indireta), com a consequência partilha igualitária dos bens adquiridos na constância da união.

Outro marco jurisprudencial relevante a ser destacado é a edição da Súmula de nº 382 pelo Supremo Tribunal Federal estabelecendo que: “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato” (BRASIL, 1964). Desta forma, foi consolidado o entendimento de que o simples fato dos concubinos residirem em domicílios diferentes não impedia o reconhecimento da união, desde que presentes outros requisitos caracterizadores do mencionado instituto, como a afetividade e a intenção de constituir família.

Se, entretanto, o direito à partilha do patrimônio comum dos companheiros foi paulatinamente sendo admitido pela doutrina e a jurisprudência, com base na chamada sociedade de fato, nos termos da Súmula nº 380 do Supremo Tribunal Federal, o direito a alimentos entre os companheiros sempre foi controverso.

Os julgados inclinavam-se no sentido da negativa de referido direito, justamente em virtude de a figura da sociedade de fato situar-se no campo do direito das obrigações, e não do direito de família. Tal situação somente foi sanada com o advento da Constituição Federal promulgada em 05 de outubro de 1988, que expressamente reconheceu a união estável como entidade familiar.

3 TUTELA DE URGÊNCIA: TUTELA CAUTELAR E TUTELA ANTECIPADA

O Estado, ao proibir a autotutela privada, tomou para si a obrigação de tutelar de forma efetiva os conflitos de interesses surgidos no seio da sociedade. Nas palavras de Luiz Fux: O Estado, como garantidor da paz social, avocou para si a solução monopolizada dos conflitos intersubjetivos pela transgressão à ordem jurídica, limitando o âmbito da autotutela. Em consequência, dotou um de seus Poderes, o Judiciário, da atribuição de solucionar os referidos conflitos mediante a aplicação do direito objetivo, abstratamente concebido, ao caso concreto.

Contudo, para a prestação da tutela jurisdicional definitiva e satisfativa, com lastro em juízo de cognição exauriente, obtido através de larga investigação probatória, o Estado, por vezes, demanda de um lapso temporal que se mostra incompatível com a urgência da tutela pleiteada.

Nos dizeres de Fredie Didier Jr., “em tais casos, para que não fique comprometida a efetividade da tutela definitiva satisfativa (padrão), percebeu-se a necessidade de criação de mecanismos de preservação dos direitos contra os males do tempo.” Por esta razão, o Código de Processo Civil, através de tutelas de urgência, estabelece a possibilidade de se obter, de maneira imediata, o bem jurídico pretendido, sem que haja a necessidade de a parte aguardar o julgamento final da lide.

O gênero tutela de urgência subdivide-se em duas espécies: a tutela antecipatória e a tutela cautelar. Apesar de apresentarem pontos convergentes, ambas não se confundem. Em apertada síntese, é possível definir a tutela antecipada como sendo uma espécie de tutela provisória de caráter satisfativo, que permite que a parte goze imediatamente os efeitos da tutela definitiva que se pretende alcançar ao final da demanda ajuizada. Nos moldes do que dispõe o art. 273 do Código de Processo Civil: Art. 273.

O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994) I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994) II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

A partir da leitura do citado dispositivo, verifica-se que para a sua obtenção faz-se necessário que se demonstre o periculum in mora (fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação), ou que se caracterize o abuso do direito de defesa ou, ainda, o manifesto propósito protelatório do réu. Imprescindível, ainda, a existência de uma ação em curso, a prova inequívoca do direito alegado, pedido expresso da parte e, por fim, a reversibilidade da medida.

A tutela cautelar, por sua vez, tem, em regra, caráter conservativo, uma vez que tem por finalidade garantir a eficácia da tutela definitiva, que só será obtida ao término do processo. É um instrumento que visa proteger a integralidade do direito material que se busca alcançar.

Nas palavras de Alexandre Freitas Câmara: O processo cautelar é, pois, instrumento através do qual se presta uma modalidade de tutela jurisdicional consistente em assegurar a efetividade de um provimento a ser produzido em outro processo, dito principal.

Ao contrário do que ocorre com os outros dois tipos de processo (cognitivo e executivo, e com o sincrético, que é resultado da fusão dos outros dois), o processo cautelar não satisfaz o direito substancial, mas apenas garante que o mesmo possa ser realizado em momento posterior, permitindo, assim, uma forma de tutela jurisdicional mediata.

Para que seja concedida a tutela cautelar deve estar configurado o fumus boni iuris, que diz respeito à aparência do direito que será discutido na ação principal e o perriculum in mora, que se refere ao risco de dano ao bem da vida que será objeto daquela. As medidas cautelares podem ser típicas/nominadas ou atípicas/inominadas, tendo em vista o poder geral de cautela do juiz, previsto no art. 798 do Código de Processo Civil. Sobre o poder geral de cautela atribuído aos magistrados pelo art. 798, leciona Alexandre Freitas Câmara 4: […] Trata-se de poder que deve ser exercido de forma subsidiária, pois que se destina a completar o sistema, evitando que fiquem carentes de proteção àquelas situações para as quais não se previu qualquer medida cautelar típica.”

Em 2002, foi acrescentado, pela Lei Federal n. 10.444, o §7º ao art. 273, instituindo a fungibilidade das medidas urgentes, já esposada pela doutrina e pela jurisprudência, fazendo com que a distinção entre cautelares e tutelas antecipadas perdessem um pouco a utilidade prática.

Importa destacar que, ambos os institutos têm por finalidade distribuir o ônus do tempo no processo, como forma de consagrar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Segundo Luiz Guilherme Marinoni 5, “o processo, para ser justo, deve tratar de forma diferenciada os direitos evidentes, não permitindo que o autor espere mais que o necessário para a realização do seu direito.”

Neste sentido, tanto as tutelas cautelares como a figura da antecipação dos efeitos da tutela têm por finalidade garantir que o litigante que desde logo demonstre ser titular do direito alegado possa receber a tutela jurisdicional, sem que seja necessário aguardar o julgamento definitivo da lide.

4 DISTINÇÃO ENTRE SEPARAÇÃO DE CORPOS E AFASTAMENTO TEMPORÁRIO DE UM DOS CÔNJUGES

Nosso Código de Processo Civil – CPC regula, em seus artigos 888 e 889, uma série de medidas por ele denominadas “provisionais”. Antes de tudo, impende estabelecer o significado da palavra provisional. Embora com frequência utilizada para significar “provisório”, quer a expressão também significar “relativo à provisão”, que, como se sabe, é ato ou efeito de prover, de assegurar os atendimentos das necessidades humanas. Tal distinção é fundamental para se analisar a real natureza dessas medidas provisionais. Há de se afirmar, desde logo, sem embargo de controvérsias, que no artigo 888 do CPC dificilmente se encontrará alguma medida que tenha, realmente, natureza cautelar. Senão vejamos.

A medida prevista no inciso VI do art. 888 supracitado tem causado intensa controvérsia doutrinária. Autores há que equiparam a medida de afastamento temporário de um dos cônjuges àquela de separação de corpos, prevista no artigo 1562 do Código Civil. Contudo, outros se filiam à distinção entre as duas medidas, o que fazem apoiados na ideia de que a separação de corpos se limita a estabelecer um rompimento do dever de coabitação, dispensando o cônjuge do debitum conjugale e impedindo, por sua vez, que o outro consorte se valha desse argumento para que se pleiteie, em sede de separação judicial, o abandono de lar pelo primeiro, imputando a este a causa pela dissolução da sociedade conjugal.

Aqui incide a real distinção entre a separação de corpos e a medida de afastamento temporário de um dos cônjuges. Pela primeira, não há implicação necessária de que os dois cônjuges, uma vez separados os corpos, permaneçam residindo no mesmo endereço, dividindo até a mesma cama; pela segunda, fundamentalmente há o afastamento físico, com a saída de um dos consortes da residência familiar.

Assim, para essa segunda corrente, faz-se mister diferenciar uma medida de separação jurídica, a “separação de corpos”, que tão-somente libera um dos cônjuges do débito conjugal, de outra medida, de separação fática, o “afastamento de um dos cônjuges do lar conjugal”, que implica necessariamente a saída de um deles do imóvel onde reside a família. É de ser feita a ressalva que os pedidos podem ser cumulados; não há, inclusive, cabimento que se tenha separação física sem que tenha também separação jurídica, embora a recíproca não possa ser tomada como verdadeira. Uma vez esclarecida tal divergência, passemos à análise da questão que me proponho a responder.

Conquanto tratada no Código de Processo Civil como espécie do gênero ação cautelar, a medida de “afastamento de um dos cônjuges da morada do casal” (artigo 888, VI) não ostenta esta natureza jurídica.  É sabido que a ação cautelar é aquela que almeja garantir resultado útil à tutela de outra natureza (de conhecimento ou de execução). Presta-se, por conseguinte, uma tutela cautelar com a finalidade de assegurar, através dela, a efetividade de outra tutela, a ser perseguida em outro processo. Desta forma, facilmente se percebe que a medida em comento não tem a finalidade de garantir resultado útil à tutela de outra natureza – como uma separação judicial, um divórcio, uma anulação de casamento etc. – o que, como já se disse, constitui a característica fundamental de qualquer ação cautelar genuína.

Na verdade, o que se pretende com a medida do art. 888, VI, é a antecipação de um dos efeitos da dissolução da sociedade conjugal ou do casamento – a cessação do dever de satisfazer o debitum conjugale – e, também, o da vida em comum no domicílio conjugal, implicando dizer que o “afastamento de um dos cônjuges da morada do casal” participa da natureza jurídica da antecipação da tutela de mérito, regulada no artigo 273, e não de verdadeira e própria ação cautelar, como tal regulada no artigo 888, VI.

Isso porque a referida medida tutela diretamente o direito substancial, já que protege um dos cônjuges de sevícias, maus tratos ou outros malefícios que a convivência sob o mesmo teto com outro consorte poderia lhe causar. É assim uma medida antecipatória, que permite a imediata produção de parte dos efeitos que se produzirão após a prolação da sentença de procedência do pedido na ação matrimonial, a qual possui o fito de buscar a dissolução da sociedade conjugal, do vínculo matrimonial ou da união estável.

Da circunstância de não ostentar o “afastamento de um dos cônjuges da morada do casal” natureza jurídica cautelar, decorrem duas consequências importantes.

A primeira delas consiste em que a duração da decisão que determina ou autoriza o afastamento de um dos cônjuges da morada do casal deve estender-se até o trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida na causa principal, ficando assim imune a revogações ou modificações, não se lhe aplicando, portanto, o artigo 807, o qual permite, em relação às verdadeiras medidas cautelares, que sejam a qualquer tempo revogadas ou modificadas.

A segunda consequência se perfaz na desnecessidade de ser proposta a ação principal no prazo de 30 dias, sob pena de cessação da eficácia da medida (CPC, artigos 806 e 808, inciso I). Contudo, tal entendimento presta-se a controvérsias.

Mas da premissa de que se parte – o afastamento de um dos cônjuges da morada do casal não ostenta natureza cautelar – a conclusão a que se deve chegar é a de que quem a obteve não tem o ônus de propor a ação principal dentro do prazo legal para atender a dispositivo que trata daquilo que o artigo 888, VI não é: medida cautelar.

Parte da jurisprudência, no entanto, orienta-se no sentido inverso, no que se faz acompanhar por doutrina de peso (Ovídio Baptista, Humberto Theodoro Júnior, dentre outros). Argumenta-se que, uma vez concedida a medida do artigo 888, VI, terá a parte que a obteve o prazo do artigo 806 para a propositura da ação, sob pena de a mesma perder a eficácia. Contudo, essa perda se daria no plano jurídico, tornando ilegítimo o afastamento do cônjuge da morada do casal, mas não haveria qualquer eficácia condenatória ou mandamental capaz de impor o retorno do separado à convivência conjugal, que é mera questão de fato.

A solução preconizada ainda não resolve o problema que consiste em saber se, decretada a ineficácia da medida, no plano jurídico, teria o cônjuge que se afastou da morada do casal, voluntária ou compulsoriamente, o direito de a ela regressar, uma vez que a separação fática estaria consumada.

Ao meu entender, a resposta é negativa. A falta da propositura da ação, no prazo legal, não pode trazer por consequência a reunião compulsória de corpos que se odeiam. Isso fere o interesse público de se evitar animosidades. Deve-se sempre buscar o bem geral. Se, v.g., o marido se julgar injustiçado pela decisão que o afastou compulsoriamente do lar conjugal, tendo a mulher se desinteressado pela propositura da ação principal, deverá ele propor a ação principal contrária, alegando, por exemplo, em ação de separação judicial intentada com base no artigo 5° da Lei do Divórcio, grave violação, pela mulher, dos deveres do casamento.

Quando se dá “afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal”, há, já se disse, uma separação não apenas jurídica, mas também fática, ou seja, física. Para a concessão da medida, são necessários a comprovação da existência do casamento, avaliação da existência de constrangimentos resultantes da vida em comum ou da insuportabilidade do convívio durante todo o transcurso da ação principal.

Tratando-se de medida de antecipação de efeitos da tutela definitiva de mérito, a sua concessão depende também da coexistência dos requisitos do artigo 273 do Código Processual Civil: probabilidade da existência do direito para o qual se pretende pedir tutela, fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, inexistência de perigo de irreversibilidade etc.

Por todo o exposto, pode-se concluir que, por não se tratar de medida de providência essencialmente cautelar, ao “afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal” não se aplica o disposto no artigo 806 do CPC. Não há necessidade de intentar a ação principal naquele prazo (30 dias da efetivação da medida), amparando-se, para tanto, em abalizada doutrina e jurisprudência.

Na hipótese em discussão, entendo que deva prevalecer o pedido de afastamento, não havendo a necessidade de o cônjuge retornar ao lar, posto que, mesmo que se entendesse que a medida perderia eficácia, hipótese essa admitida apenas a título de argumentação, não haveria, como asseverado em linhas precedentes, qualquer eficácia condenatória ou mandamental capaz de impor o retorno do separado à convivência conjugal, que é mera questão de fato.

Entretanto, afirma-se mais uma vez que a medida prevista no art. 888, VI do CPC, ao meu entender, não se trata de medida cautelar. Em sendo assim, o consorte que fez o requerimento para deixar o imóvel não seria tomado como se tivesse abandonado o lar, pois a medida não perderia a eficácia se ele não tivesse entrado com a ação principal no prazo de 30 dias a contar da ciência da efetivação dela.

5 A APLICABILIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO ÀS RELAÇÕES FAMILIARES.

A teor do artigo 7º § 4º da Lei de Introdução o regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, o do primeiro domicílio conjugal.

Os entes que compõem os Estados Unidos da América gozam de autonomia para legislar, de forma independente, acerca de Direito de Família. Em termos de regime de bens, há lá dois tipos de estados: (1) os “community states” (que são apenas 9 estados: Arizona, Califórnia, Idaho, Louisiana, Nevada, Novo México, Texas, Washington e Wisconsin), nos quais com o casamento passa a existir uma forma de comunhão de bens (vale dizer, em que alguns bens, mesmo registrados em nome de um cônjuge, são de propriedade comum do casal) e os (2) “separate states”, dentre os quais a Flórida, em que não há uma comunhão de bens com o casamento, pois no curso do casamento cada cônjuge continua a ter um patrimônio próprio, podendo alienar inclusive bens imóveis sem outorga marital (embora, findo o casamento, haja uma como que participação final nos aquestos).

No Brasil, a legislação estabelece quatro regimes de bens no casamento, conforme elucidado por Luciana Vitalma F. da Costa (s.d.). Dentre eles:

Comunhão parcial (artigos 1.658 a 1.666 do Código Civil): Este é o regime legal vigente quando não há manifestação de vontade dos nubentes (Código Civil, artigo 1.640). Ele determina que se comunicam os bens adquiridos pelo casal na constância do casamento, criando três massas distintas de bens: a) bens particulares do marido; b) bens particulares da esposa; c) bens comuns do casal. Todos os bens adquiridos individualmente antes do casamento permanecem exclusivamente ao adquirente, inclusive aqueles bens que têm por título uma causa anterior (exemplo herança). O artigo 1.659 do Código Civil arrola os bens que são excluídos da comunhão, enquanto o artigo 1.660 relaciona os bens que entram na comunhão. A administração dos bens comuns compete a ambos os cônjuges (Código Civil, artigo 1.663).

Comunhão universal (artigos 1.667 a 1.671 do Código Civil): A opção por esse regime deve ser através de pacto antenupcial.

No regime de comunhão universal, todos os bens, móveis ou imóveis, adquiridos em qualquer momento (antes ou depois do casamento) são compartilhados, mesmo que o bem esteja registrado em nome de apenas um dos cônjuges. As dívidas também são compartilhadas neste regime (Código Civil, artigo 1.667, parte final).

No entanto, existem bens que são excluídos da comunhão, conforme estabelecido no artigo 1.668 do Código Civil. Esses incluem bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os substituídos em seu lugar, bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva, entre outros.

É importante ressaltar que a cláusula de incomunicabilidade mencionada no inciso I do artigo citado deve ser expressa e essa incomunicabilidade se estende aos bens substituídos no lugar daquele gravado com a mencionada cláusula.

Conforme disposto no artigo 499 do Código Civil, é permitida a venda e compra entre cônjuges, com relação aos bens excluídos da comunhão. Além disso, conforme expressamente determinado no artigo 1.669 do Código Civil, a incomunicabilidade dos bens não se estende aos frutos quando percebidos ou vencidos durante o casamento. Assim como na comunhão parcial, a administração dos bens é de responsabilidade de ambos os cônjuges.

O “regime de participação final nos aquestos” é uma inovação do Código Civil de 2002 e está previsto nos artigos 1.672 a 1.686. Segundo Clovis Couto e Silva, elaborador do Anteprojeto da parte de Direito de Família no Código Civil, este novo regime de bens pode atender a situações especiais, como é frequente em nações que estão alcançando maior grau de desenvolvimento, onde ambos os cônjuges exercem atividades empresariais distintas. Para a adoção deste regime, os cônjuges devem fazer uso do pacto antenupcial.

Como muito bem ensina Caio Mário da Silva Pereira: A característica fundamental do regime de participação final nos aquestos consiste em que, na constância do casamento, os cônjuges vivem sob o império da separação de bens, cada um deles com o seu patrimônio separado. Ocorrendo a dissolução da sociedade conjugal (pela morte de um dos cônjuges, pela separação judicial ou pelo divórcio), reconstitui-se contabilmente uma comunhão de aquestos. Nesta reconstituição nominal (não in natura), levanta-se o acréscimo patrimonial de cada um dos cônjuges no período de vigência do casamento. Efetua-se uma espécie de balanço, e aquele que se houver enriquecido menos terá direito à metade do saldo encontrado.

O novo regime se configura como um misto de comunhão e de separação. A comunhão de bens não se verifica na constância do casamento, mas terá efeito meramente contábil diferido para o momento da dissolução.

De acordo com o artigo 1.673 do Código Civil, o patrimônio próprio de cada cônjuge é composto pelos bens que ele possuía ao casar e os bens adquiridos a qualquer título durante o casamento. Cada cônjuge tem a administração exclusiva de seus bens durante o casamento, podendo dispor livremente dos bens móveis e necessitando da anuência do outro cônjuge para os bens imóveis.

No caso de dissolução da sociedade conjugal, conforme o artigo 1.674 do Código Civil, deve-se apurar o montante dos aquestos, excluindo da soma dos patrimônios próprios os bens anteriores ao casamento e os bens a ele sub-rogados, os que vierem a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade e as dívidas relativas aos bens. Cada cônjuge terá direito à metade dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso durante o casamento.

O direito à meação, conforme disposto no artigo 1.682 do Código Civil, não é renunciável, cessível ou penhorável durante a vigência do regime matrimonial. Este é um princípio de ordem pública que não pode ser contrariado pela vontade das partes.

O Código Civil prevê dois tipos de regime de separação de bens: a separação legal ou obrigatória, que decorre expressamente da lei, e a convencional, que decorre da manifestação de vontade dos nubentes.

Os incisos do artigo 1.641 do Código Civil definem as hipóteses em que é obrigatório o regime de separação de bens. Este regime é obrigatório e, portanto, não é necessário celebrar o pacto antenupcial. As causas suspensivas estão elencadas no artigo 1.523 do Código Civil. A restrição visa proteger tanto as pessoas maiores de 70 anos quanto aquelas que dependem de suprimento judicial para casar-se, ou seja, os menores de 18 anos não emancipados, e tem como objetivo evitar um casamento de interesse puramente material.

O regime de separação de bens convencional, como o próprio nome indica, é aquele que decorre da manifestação de vontade dos nubentes e está previsto nos artigos 1.687 e 1.688 do Código Civil.

Para a adoção do regime de separação de bens, é necessária a celebração do pacto antenupcial. Segundo o artigo 1.687 do Código Civil, a administração e a fruição dos bens permanecem exclusivamente ao cônjuge, que pode inclusive alienar ou gravar de ônus seus bens. Nesse regime, os cônjuges são obrigados a contribuir para a manutenção das despesas do casal na proporção dos seus rendimentos e de seus bens, embora possam estipular de forma diferente no pacto antenupcial.

Na legislação brasileira, o cônjuge sobrevivente que era casado em regime de separação de bens, sem herdeiros necessários, tem direito à metade da herança, mesmo que o falecido tenha deixado testamento, pois é considerado herdeiro necessário. A outra metade será destinada ao herdeiro necessário.

No regime de comunhão universal de bens, as dívidas são compartilhadas, pois são comunicáveis. No entanto, o artigo 1.668 do Código Civil exclui da comunhão os bens doados ou herdados com cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar. Assim, se um imóvel doado com cláusula de incomunicabilidade for desapropriado, a indenização é paga pelo poder público (Decreto-lei 3.365/41, artigo 31) ao donatário, em razão de sub-rogação real, não se comunicando ao seu cônjuge. Além disso, os bens de herança necessária a que se impuser a cláusula de incomunicabilidade também são excluídos do regime de comunhão universal, conforme o artigo 1.848 do Código Civil.

Veja-se o caso de alguém que ganhou herança dos seus pais. Que regime de bens deverá escolher para que ele não seja da futura esposa em caso de divórcio?  Pode-se optar pelo regime da comunhão parcial de bens ou pelo regime da separação total de bens. O único regime que comunicaria esse bem seria o da comunhão universal de bens. Hoje em dia, poucas pessoas se casam nesse tipo de regime. Os demais são bens anteriores, de doação ou herança, e eles não são comunicáveis.

No Brasil, o antigo Código Civil impossibilitava a alteração do regime de bens escolhido por ocasião da celebração do casamento, ao dispor no artigo 230 que: “O regime de bens entre cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento, e é irrevogável”. O atual Código Civil, ao contrário, em seu artigo 1.639, parágrafo segundo, dispõe que “é admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiro”.

 É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição da inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade”.

Para o STJ, é possível alterar o regime de bens do casamento, desde que respeitados os efeitos da opção anteriormente feita pelo casal.

O tema “Alteração do regime de bens na constância do casamento” possui 14 acórdãos. “É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando, então, o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com a ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade”, diz um dos acórdãos.

Para os ministros do STJ, o Judiciário deve aceitar o desejo do casal de alterar o regime conjugal, uma vez que “a paz conjugal precisa e deve ser preservada”. No entendimento da Corte, diante de manifestação expressa dos cônjuges, não há óbice legal, por exemplo, de um casal partilhar os bens adquiridos no regime de comunhão parcial, na hipótese de mudança para separação total, desde que não acarrete prejuízo para ambos – entendeu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao reformar decisão Justiça do Rio Grande do Sul. No caso, o casal recorrente argumentou que o marido é empresário e está exposto aos riscos do negócio, enquanto a esposa tem estabilidade financeira graças a seus dois empregos, um deles como professora universitária.

Os magistrados de primeiro e segundo graus haviam decidido que é possível mudar o regime, mas não partilhar os bens sem que haja a dissolução da união. Assim, o novo regime só teria efeitos sobre o patrimônio a partir do trânsito em julgado da decisão que homologou a mudança.

O relator do recurso interposto pelo casal contra a decisão da Justiça gaúcha, ministro Marco Aurélio Bellizze, ressaltou que os cônjuges, atualmente, têm ampla liberdade para escolher o regime de bens e alterá-lo depois, desde que isso não gere prejuízo a terceiros ou para eles próprios. É necessário que o pedido seja formulado pelos dois e que haja motivação relevante e autorização judicial.

Bellizze ressaltou que ainda há controvérsia na doutrina e na jurisprudência sobre o momento em que a alteração do regime passa a ter efeito, ou seja, a partir de sua homologação ou desde a data do casamento. O ministro salientou, porém, que há hoje um novo modelo de regras para o casamento, em que é ampla a autonomia da vontade do casal quanto aos seus bens.

No STJ, tem prevalecido a orientação de que os efeitos da decisão que homologa alteração de regime de bens operam-se a partir do seu trânsito em julgado. A única ressalva apontada na legislação diz respeito a terceiros. O parágrafo 2º do artigo 1.639 do Código Civil de 2002 estabelece que os direitos destes não serão prejudicados pela alteração do regime.

Para que tal modificação ocorra, é imprescindível a autorização judicial, que se dará mediante o ajuizamento de procedimento próprio por ambos os cônjuges, por intermédio de advogado. O pedido deve ser comprovadamente motivado, cabendo ao juiz acolher tal motivação.

Além disso, deve-se também preservar os direitos e interesses de terceiros, o que, aliás, tem se mostrado a maior preocupação dos juízes em relação a estes pedidos.

Para tanto, recomenda-se demonstrar ao juiz, através de certidões negativas dos cônjuges e documentos, que os direitos de terceiros serão preservados, ou seja, que o pedido não é uma tentativa de fraudar eventuais direitos de terceiros, por exemplo, credores.

Na França, há alguns detalhes a discutir. Os casamentos celebrados antes de 1 de setembro de 1992 estão sujeitos ao direito comum, ao passo que os contraídos depois dessa data encontram-se ao abrigo da Convenção da Haia, de 14 de março de 1978, sobre a lei aplicável aos regimes matrimoniais.

A lei aplicável aos regimes matrimoniais para cônjuges que se casaram antes de 1 de setembro de 1992 é, em princípio, determinada pela localização do primeiro domicílio conjugal. A lei assim designada rege todas as relações patrimoniais entre os cônjuges, independentemente da localização dos seus bens. Este critério do vínculo de conexão é permanente: a lei do primeiro domicílio conjugal aplica-se ao longo de todo o casamento, mesmo que os cônjuges se mudem para outro Estado.

Para os casamentos celebrados depois de 1 de setembro de 1992, é a Convenção da Haia, de 14 de março de 1978, que se aplica às relações patrimoniais entre os cônjuges, à exceção do regime primário, que continua a ser regido pelas disposições francesas aplicáveis nos termos das disposições imperativas (art.º 212.º-226.º do CC). Se os cônjuges não tiverem especificado uma escolha de lei antes do casamento, a lei aplicável é, em princípio, a da sua primeira residência habitual.

Ao contrário do direito comum, a Convenção da Haia prevê três casos em que a lei aplicável muda automaticamente (art.º 7.º, n.º 2): quando os cônjuges estabelecem a sua residência no Estado da sua nacionalidade comum; quando residem mais de 10 anos num Estado depois do casamento; para cônjuges que não tenham estabelecido a sua residência habitual no território do mesmo Estado depois do casamento (e cujo regime patrimonial estava consequentemente sujeito à lei do Estado de nacionalidade comum), quando estes estabelecem a sua residência habitual no mesmo Estado. Esta mudança automática tem efeitos apenas no futuro (contudo, o art.º 8.º permite que os cônjuges submetam todos os seus bens à nova lei, desde que esta escolha não prejudique os direitos de terceiros.

Quando não existe um contrato de casamento, os cônjuges ficam sujeitos ao regime legal da comunhão de bens: a comunhão de adquiridos (art.º 1400.º-1491.º do CC). Os bens adquiridos a título oneroso depois do casamento são comuns. No entanto, os bens que os cônjuges já possuíam no dia do casamento ou que adquiram por doação, legado ou herança, e os bens de “natureza pessoal”, são bens próprios (art.º 1404.º do CC).

Os bens dos cônjuges são considerados comuns, se não for provado que são próprios (art.º 1402.º do CC).

As dívidas anteriores ao casamento são ressarcidas através do património próprio e dos rendimentos do cônjuge devedor (art.º 1410.º e 1411º do CC). As dívidas contraídas durante o casamento podem ser executadas contra o património próprio do cônjuge devedor e contra o património comum (art.º 1413.º do CC).

Sem o consentimento do outro cônjuge, as dívidas que resultem de empréstimos ou avais só podem ser executadas contra o património próprio e os rendimentos do cônjuge contratante e não contra o património comum (art.º 1415.º do CC).

Por fim, quando a dívida for contraída conjunta e solidariamente pelos cônjuges, pode ser executada contra todos os bens da família (art.º 1418.º do CC). É o caso, em particular, de todas as dívidas contraídas para a manutenção do lar e a educação dos filhos (art.º 1414.º do CC).

O regime patrimonial automático estabelecido pela lei, caso os cônjuges não façam uma escolha diferente, é a comunhão legal, na qual recaem todos os bens adquiridos pelos dois cônjuges, juntos ou separadamente durante o casamento, exceto aqueles considerados pessoais. Abrangem, portanto, as empresas que são administradas pelos dois cônjuges depois do matrimônio e os frutos e os proventos de bens próprios e das atividades de cada um dos cônjuges (por exemplo, a renda de locação que um dos dois cônjuges recebe por um imóvel de sua propriedade).

No caso em questão, os frutos derivados dos bens próprios e os proventos derivados da atividade serão reincluídos na comunhão se, no momento da dissolução, não tiverem sido consumidos. A lei prevê seis casos de bens que, expressamente excluídos, não reentram na comunhão legal:

  • Bens de propriedade de um dos cônjuges antes do casamento;
  • Bens de um dos cônjuges derivados de uma sucessão hereditária ou de uma doação;
  • Bens de uso pessoal;
  • Bens utilizados para o exercício da profissão desenvolvida pelos cônjuges (a menos que tais bens sejam inerentes a uma eventual empresa administrada pelo casal);
  • Bens obtidos a título de ressarcimento de danos e aqueles derivados da pensão devido à perda de capacidade de trabalho;
  • Bens adquiridos com o valor obtido pela transferência dos bens acima indicados, desde que seja expressamente indicado no ato de aquisição.

Em relação à administração de bens que recaem no regime de comunhão legal, a lei prevê que os cônjuges podem agir separadamente para os atos de administração ordinária. Para os atos que excedem a administração ordinária, é necessário o consenso de ambos os cônjuges.

Os credores dos cônjuges podem recorrer aos bens que recaem na comunhão legal, que constituem a principal garantia para os débitos contraídos.

O regime de comunhão legal pode ser modificado para separação legal, seja no ato da celebração do matrimônio, com uma anotação feita à margem do ato, seja após o casamento.

Em caso de divórcio, separação, anulação do matrimônio, morte de um dos cônjuges ou escolha de regime de separação dos bens, a comunhão legal se dissolve.

6 CONCLUSÃO

A separação de corpos é uma medida judicial que autoriza a saída ou a retirada de um dos cônjuges do lar conjugal, seja por autorização judicial, espontânea ou compulsoriamente. Embora o Código de Processo Civil de 2015 não mencione expressamente a separação de corpos, ele unificou os procedimentos, simplificando o processo e eliminando a necessidade de dois processos separados para a ação cautelar de separação de corpos e a ação principal de divórcio ou dissolução de união estável.

A separação de corpos pode ser solicitada quando um dos cônjuges desejar, no momento do pedido de divórcio ou de dissolução de união estável. Esta medida também é aplicada em casos de agressão, onde o cônjuge agredido pode solicitar a saída do lar conjugal ou a retirada do cônjuge agressor.

O regime de comunhão legal pode ser alterado para separação legal, seja no ato da celebração do matrimônio, com uma anotação feita à margem do ato, seja após o casamento. Em caso de divórcio, separação, anulação do matrimônio, morte de um dos cônjuges ou escolha de regime de separação dos bens, a comunhão legal se dissolve.

Portanto, a separação de corpos e a escolha do regime de bens são aspectos fundamentais do direito de família no Brasil, com implicações significativas para os direitos e obrigações dos cônjuges. É essencial que os indivíduos estejam cientes dessas questões ao entrar em um casamento ou união estável, e que busquem aconselhamento jurídico adequado para entender completamente as implicações dessas decisões.

REFERÊNCIAS

AGOSTINHO, A. Jurista fundador da PUC/SP, afirmava: “O Direito de Família começa onde termina o amor”. E, em paráfrase, mesmo a dizer, então, que “a separação de fato começa quando termina o amor”, impõe-se identificar o “quando”.

ZANFORLIN, D. L. Do Divórcio, da Separação e dos efeitos da Emenda Constitucional nº 66/2010 na Ordem Constitucional do Casamento. In: CAMPOS, A. R. C.; LOBO, F. A.; LEAL, L. M. M. Direito das Famílias das Sucessões. Recife: Editora Nossa Livraria, 2014. p. 179-221.

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ALVES, J. F. Novo regime jurídico do nome civil e outros avanços do direito registral. 2022. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2022-jul-11/processo-familiar-regime-juridico-nome-civil-outros-avancos-direito-registral>. Acesso em: 15 out. 2023.

LOBO, P. Processo Familiar. Consequências jurídicas atuais da separação conjugal de fato e de corpos. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-set-13/processo-familiar-consequencias-juridicas-separacao-conjugal-fato-corpos>. Acesso em: 15 out. 2023.


1Graduada em Direito pela Universidade Católica de Goiás PUC (2005), pós-graduada-graduada em Direito Notarial e Registral pela Unisul. Pós-graduada em Direito Administrativo e Direito Civil pela FIJ – Universidades Integradas Jacarepaguá. Mestre em direito pelo Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. Atualmente, é Doutoranda na Universidad Del Museo Social Argentino (UMSA).

2Graduada em Direito, Universidade de Buenos Aires (UBA), 1983. Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais, Universidad del Museo Social Argentino (UMSA), 2008. Atualmente, é Professora e Orientadora na Universidad del Museo Social Argentino (UMSA).