REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7327115
Lorenna Santos Conceição de Jesus Duarte1
Tayanná Santos de Jesus Sbrana2
Resumo: A presente pesquisa analisa os impactos da Reforma Trabalhista de 2017 nas relações laborais e sindicais em indústrias de Açailândia-MA, observando o contexto de transformações desde a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943, até a atualidade. O objetivo central é observar as transformações ocorridas no âmbito da legislação sindicalista, enfocando as práticas sindicalistas e antissindicalistas à luz do Direito na realidade industrial açailandense, em conexão com o contexto nacional e regional. Para tanto, compreenderemos as transformações históricas do direito sindical no Brasil, refletindo a respeito do conceito de práticas sindicalistas e antissindicalistas para esclarecer o que são práticas sindicalistas e antissindicalistas e como podem ser identificados seus reflexos nas relações laborais em indústrias de Açailândia-MA. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa qualitativa, com levantamento bibliográfico, análise de documentação, realização de trabalho de campo e construção de entrevistas. O referencial teórico baseia-se nos temas: práticas sindicalistas e antissindicalistas; concepção, organização e estrutura sindical no contexto do novo sindicalismo; relações laborais.
Palavras-chave: Sindicalismo; Direito Sindical; Indústrias; Açailândia-MA.
Abstract: This research analyzes the impacts of the 2017 Labor Reform on labor and union relations in industries in Açailândia-MA, observing the context of transformations since the Consolidation of Labor Laws (CLT), in 1943, to the present day. The main objective is to observe the changes that have taken place within the scope of trade union legislation, focusing on trade unionist and anti-unionist practices in the light of Law in the industrial reality of Açailândia, in connection with the national and regional context. In order to do so, we will understand the historical transformations of union rights in Brazil, reflecting on the concept of unionist and anti-unionist practices to clarify what unionist and anti-unionist practices are and how their reflexes can be identified in labor relations in Açailândia-MA industries. Methodologically, it is qualitative research, with bibliographic survey, documentation analysis, field work and construction of interviews. The theoretical framework is based on the following themes: unionist and anti-unionist practices; union conception, organization and structure in the context of the new unionism; labor relations.
Keywords: Unionism; Union Law; Industries; Açailândia-MA.
1 INTRODUÇÃO
Este Trabalho de Conclusão de Curso parte de indagações referentes às transformações na legislação trabalhista e sindical brasileira desde seus inícios até a atualidade, momento em que buscamos elucidar de que maneira o sindicalismo transformou-se e foi transformado mediante as mudanças no campo do Direito. Para tanto, realizamos apanhado histórico sobre o tema, nivelamento teórico a partir da bibliografia especializada e o conjunto doutrinário vigente, e estudo de caso a partir da realidade industrial de Açailândia-MA.
De acordo com o historiador Marcelo Badaró Matos, especialista em História do Trabalho, na obra Trabalhadores e sindicatos no Brasil (2009, p. 7), “Não devemos nos levar ao julgamento de que o sindicalismo (…) no Brasil é coisa recente”. O movimento sindicalista não é de hoje, ou ainda de duas décadas atrás, mas vem caminhando por um longo tempo. Construído por histórias de luta, de revoluções sociais, de conquistas, de perdas e ganhos, marcado pelas aventuras e desventuras de uma sociedade que possui em seus baldrames arraigadamente a desigualdade social. Nas configurações sociais, ao longo do tempo, o poder é detido por uma minoria que obtém riquezas pela exploração do trabalho.
Nosso trabalho busca acompanhar essa trajetória do trabalhismo no Brasil em suas nuances, tendo como foco a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) de 1943, a Constituição Federal do Brasil de 1988 e a Reforma Trabalhista de 2017. Para tanto, focalizamos o olhar no município de Açailândia-MA, situado no sul do Maranhão, e que faz parte da importante cadeia mínero-metalúrgica brasileira. Especificamente, de que forma trabalhadores de indústrias mineiras e siderúrgicas compreendem o sindicalismo e também os sindicatos, diante dos processos sociais que vivenciam.
Suscitamos alguns questionamentos: Quais relações podemos estabelecer entre as transformações na legislação trabalhista e as transformações no modo de ser obreiro e na ação sindical na realidade industrial açailandense? Qual a pertinência de compreender esse contexto local para o Direito? Como compreender as transformações na legislação trabalhista e sindical ao longo do tempo? Essas questões orientam nossa pesquisa e configuram nosso objetivo: observar as transformações ocorridas no âmbito da legislação sindicalista, enfocando as práticas sindicalistas e antissindicalistas à luz do Direito na realidade industrial açailandense, em conexão com o contexto nacional e regional.
O trabalho, após esta Introdução, é composto por mais três itens. O primeiro, Referencial Teórico, é formado por dois subitens: Contextualização do trabalhismo no Brasil e Configuração do sindicalismo no Brasil. No primeiro subitem, apresentaremos uma breve contextualização do trabalhismo no Brasil, desenvolvendo sua historicidade a partir de alguns primeiros relatos da atuação do ser obreiro em busca dos direitos e garantias para o trabalhadores, até chegar ao contexto de criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, seguido por uma apresentação da Constituição Federal de 1988 e a forma como esta foi constituída após a Ditadura Militar (1964-1985), finalizando o item com uma exposição a respeito da Reforma Trabalhista de 2017 e as alterações ocorridas. No segundo subitem, abordaremos a configuração do sindicalismo no Brasil, com aspectos da organização sindical em geral e posteriormente a organização sindical brasileira, trazendo sua organização nos termos da lei. Também será trazida uma exposição da Reforma Trabalhista e seu impacto na legislação sindical, onde será destacado os principais pontos dessa alteração.
Temos ainda o segundo item, denominado Estudo de caso: práticas sindicalistas e antissindicalistas em indústrias de Açailândia-MA, no qual, como o título aponta, apresentaremos as práticas antissindicalistas e suas características com base na doutrina atual, analisando conjuntamente teoria e elementos advindos do estudo de caso com trabalhadores das indústrias em Açailândia. O texto se encerra com o terceiro item Conclusões, elencando nossa análise a partir do que obtivemos diante da pesquisa e interpretação dos dados, seguido por Referencial Teórico.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Para perseguir nosso objetivo, realizamos um diálogo entre duas disciplinas que andam juntas: História e Direito. Em primeiro lugar, construiremos uma contextualização do trabalhismo no Brasil, a partir de autores como Marcelo Badaró Matos (2009). Em segundo lugar, apresentaremos a forma do trabalhismo e do sindicalismo no Brasil, a partir do doutrinador Maurício Godinho Delgado (2019). Prosseguiremos com a análise a partir de Mendonça et Al. (2021) e Roberto Mancini (2021; 2022). Esses autores nos auxiliarão a construir a argumentação referente ao Estudo de Caso das relações laborais e sindicalistas entre trabalhadores de indústrias em Açailândia-MA.
2.1 Contextualização do trabalhismo no Brasil
No Brasil, a gestação da organização sindical deveu-se a uma série de contextos e conflitos, historicamente elaborados, o que nos leva a compreender que a organização sindical não surgiu do nada. Portanto, cada história de luta, por menor que pareça ser, ou aparentemente desorganizada, que tenha obtido sucesso ou não, foi importante para a construção da realidade sindical. A exploração e subordinação do trabalho não surgiu com a presença dos sindicatos, em verdade os sindicatos são produto dessa realidade conflituosa, advinda do período da colonização e da instituição e permanência duradoura da escravatura, conforme aponta Marcelo Badaró Matos (2009).
Devido ao formato deste trabalho, perseguiremos os rastros do trabalhismo apenas em três momentos cruciais para nossa pesquisa: a criação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), em 1943; a promulgação da Constituição Federal de 1988; e a Reforma Trabalhista, efetuada em 2017.
Contudo, para os objetivos de nosso estudo, precisamos entender algumas particularidades dos mundos do trabalho no Brasil, o primeiro e essencial, o modo escravista. É consenso historiográfico que a escravidão indígena se inicia no Brasil após a chegada dos primeiros europeus colonizadores, em 1500, com organização do sistema de escravização a partir da ocupação efetiva em 1530. Após isso, a chegada das primeiras levas de africanos escravizados se dá de forma sistemática, persistindo formalmente até a promulgação da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, antecedida por variadas leis que buscavam, de alguma forma, assegurar a persistência de um sistema lucrativo para os senhores e para a manutenção do país (STARLING; SCHWARCZ, 2015).
O trabalho, portanto, nasce desse processo de escravização. O germe do movimento sindical já estava presente em suas nuances. Ocorre que após 1888 uma onda de solidariedade se inicia, os afins se juntam. Quando se traz esse termo solidariedade, não deve ser interpretado como uma dança. Devido a rompimentos desgastantes, um sistema em crise, inovações tecnológicas, mudanças econômicas, mudanças sociais, o ser trabalhador está submerso no meio disso, sem forças para arcar com quaisquer que sejam as consequências e ele vai se juntar com aquele que entende seu ponto de vista para se fortalecer. Ou seja, “os trabalhadores assalariados, que compartilhavam espaços de trabalhos e de vida urbana com os escravizados, atuaram coletiva e organizadamente pela sua libertação, demonstrando que este tipo de solidariedade na luta pela liberdade era parte do arsenal de valores da nova classe em formação” (MATOS, 2009, p. 21).
Esse momento, de compartilhar, como traz o autor, essa troca de experiência, proporcionou a associação. Padrões foram construídos para mobilização e luta. Vale destacar que os trabalhadores escravizados não tinham o direito de se associar, esta era mais uma barreira a ser vencida. Para que pudessem se reunir, utilizavam o meio religioso, já que ser devoto e pertencer a um grupo de um santo padroeiro era permitido. Assim, utilizavam o grupo, as chamadas irmandades, para construir uma rede de amparo social, fosse para ajudar as viúvas ou para ajudar na questão alimentar, quando perdiam os entes queridos que sustentavam a casa. Claro que também “existiam as irmandades organizadas por grupo de trabalhadores livres, que reunia aqueles do mesmo ofício, exemplo: artesãos, sob proteção de um santo padroeiro associado àquele ofício” (MATOS, 2009, p. 22), como exemplo a irmandade de São Jorge, que era dos ferreiros. Destarte, essas irmandades em algum momento se tornaram a porta de entrada e o ambiente para representar os interesses profissionais e aglutinações abolicionistas.
As associações não se deram somente pelo meio religioso, pois existiram aquelas que não tinham alusão religiosa. Essas, seus objetivos consistiam em reunir dinheiro para ajudar em momentos de enfermidades, morte, invalidez, entre outros motivos semelhantes. Como exemplo, a Sociedade Beneficente Leiga Operária que, em 1871, se “propunha a reunir todos os operários e artistas nacionais e estrangeiros e anunciava entre seus fins, representar os interesses dos associados” (MATOS, 2009, p. 23). Isso despertou algo, pois outras associações começaram a existir e os seus estatutos eram semelhantes.
É importante ressaltar, ainda, o poder de negociação, assunto caro a nossa pesquisa, por se relacionar diretamente com o objetivo geral do trabalho, a saber, observar as transformações ocorridas no âmbito da legislação sindicalista, enfocando as práticas sindicalistas e antissindicalistas à luz do Direito na realidade industrial açailandense, em conexão com o contexto nacional e regional. De acordo com Maurício Godinho, no Manual do Direito do Trabalho (2019), esse poder de negociar, antes nunca como iguais, pois iguais nunca serão, significa dizer que antes os trabalhadores não tinham poder de negociação por natureza da classe social, origem, e agora mesmo com as mudanças na sociedade, mudança na legislação, mesmo que tenha como se respaldar, ainda sim nunca negociarão como iguais, os poderes que cada um tem são completamente diferentes. Mas a reunião, com representante, com ordem, permite que a voz do ser obreiro seja capaz de fazer norma. Cada encontro, cada norma, cada acordo, são blocos que estruturam o pilar da Consolidação das Leis Trabalhistas, criada em 1943. Falaremos disso adiante.
2.1.1 Consolidação das Leis Trabalhistas (1943)
O final do século XIX e início do XX foi marcado pela chegada de imigrantes, a partir das políticas de imigração e embranquecimento promovidas pelo Estado brasileiro, e pela quantidade de antigos escravizados, agora livres, em situação de desemprego. Aqueles que estavam trabalhando tinham suas jornadas de 10 horas a 16/18 horas por dia, normalmente em um ambiente insalubre, sem proteção, sem medidas de segurança. A única coisa que importava para os contratadores era o produto e a quantidade. A saber, “as fábricas, condição de trabalho, jornadas longas, violência dos encarregados, constantes acidentes, exploração do trabalho de crianças e pelos abusos contra os operários” (MATOS, 2009, p. 41): esse era o contexto das primeiras décadas da classe trabalhadora e do sindicalismo no Brasil.
O voto não era permitido aos analfabetos e isso se refletia na porcentagem de pessoas que votavam nas eleições, de apenas 2% da população. Aqui começa a se demonstrar o papel chave dos sindicatos e dos partidos operários, que “foram criados ao longo de toda república velha, mas tiveram vida curta” (MATOS, 2009, p. 45). Essa vida curta se deu por vários motivos, mas em especial a restrição ao voto fazia com que as lutas, as participações político-eleitorais, não prosperassem. É percebido a partir das organizações do Partido Operário que leis de cunho social e a ampliação da participação política começam a ser desenhadas. Enfatiza-se que o Partido Operário foi criado por militantes imigrantes alemães, em 1890.
Aquela associação dos grupos anteriormente abordada, a união em objetivo de trazer melhorias sociais para determinado grupo de pessoas da mesma profissão – categoria – se dinamizou, pois “cruzaram-se as tradições das corporações de ofícios” (MATOS, 2009, p. 47). Essa associação, a participação ativa, conseguiria tratar de questões específicas e gerais no trabalho. Podemos fazer uma relação com a atual Constituição Federal de 1988, a qual apresenta direitos e deveres parecidos com os expressados anteriormente, desta forma, é possível dizer que essa história que se iniciou na busca de direitos e melhorias foi capaz de ir alcançando ao decorrer de cada uma consolidação desses direitos requeridos a ponto de tê-los presentes na atual Constituição da República Federativa do Brasil.
Entre os anos 1920 e 1922 surge uma onda de movimentos grevistas, levantes da “segurança pública”, repressão aos movimentos, exílio aos imigrantes que faziam parte dos movimentos, brasileiros enviados ao Oiapoque amazônico. A partir de 1922 ocorre a criação do Partido Comunista do Brasil (PCB), que tentava resgatar as práticas da Revolução Soviética de 1917. Uma vanguarda revolucionária, era como os líderes do partido se enxergavam. Conforme Matos (2009, p. 50), “nessa visão, os sindicatos seriam o melhor local para aglutinar os trabalhadores e difundir a doutrina comunista”. Nesse período se deram vários debates entre os anarquistas e comunistas, mas a hegemonia sindical seria alcançada pelos comunistas por volta do fim da década de 1920.
Posteriormente, nos quinze anos do primeiro governo Getúlio Vargas, pode-se dizer que uma das principais propostas foi a de “convivência harmônica entre trabalhadores e empresários” (MATOS, 2009, p. 61). Isto posto, o Estado seria o intermediador. O período de 1930, com a Revolução e a instauração do Estado novo, convivem percepções bem distintas e um tanto quanto conflituosas em relação aos trabalhadores e sindicatos. A questão político-administrativa, a Revolução de 1932 e Constituinte de 1934 eram sinais de um novo tempo, com o autoritarismo se apresentando.
Deve ser destacado que é neste cenário que o Estado começa a colocar o setor industrial em seus planos econômicos. Isso se deu em especial pela elevação da taxa de produção da indústria, crescendo com média anual de 11,3% contra 1,2% da agrícola-exportação, que antes era o carro chefe. Os trabalhadores vão sentir neste período que as lutas travadas anteriormente terão seus resultados a níveis nacionais, tais como a alteração na legislação, identificando o conjunto de lei “leis trabalhistas” (MATOS, 2009).
Ressalta-se, a priori, que as leis trabalhistas tratavam de quatro escopos: previdenciária, trabalhista, sindical e as leis que instituíram a Justiça do Trabalho, criada pelo Decreto-lei nº 1.237, de 2 de maio de 1939. A parte previdenciária tratava sobre as contribuições dos trabalhadores e empregadores a fim de haver uma caixa previdenciária, para dar uma seguridade, como aposentadoria, pensões, indenizações e assistências médicas; as leis trabalhistas propriamente ditas regulamentariam questões de jornadas de trabalho, férias, descanso entre outras; a legislação sindical tratava sobre normas regulamentadores, as criações de sindicatos entre outras e as leis que instituíram a justiça do trabalhador, encarregada de arbitrar os conflitos de natureza trabalhista (MATOS, 2009).
Vários foram os acontecimentos durante o período Vargas. O primeiro acontecimento significativo foi a criação do MTIC (Ministério do Trabalho Indústria e Comércio) pelo Decreto-Lei nº 19.770, de 1931, pois foi neste primeiro ministério que a grande maioria das leis trabalhistas saiu. Foi neste ministério que surgiu o Sindicato Oficial, que tinha como objetivo fundamental servir como interlocutor dos trabalhadores junto ao governo. Era a necessidade de mostrar que o governo não tinha um lado e sim servia como meio de organizar. O Estado tinha como prioridade a sociedade e o bem-estar, ser o mediador dessa atuação e transformar as conquistas em um gênero regulamentado (MATOS, 2009).
Entre 1942 e 1946, são intensificadas as conversas e as mobilização obreiras, em busca dos direitos e das questões atreladas aos trabalhadores. Este período assemelha-se ao período de 1934, pois Getúlio Vargas retomava, em seus discursos, a ideia de uma frente unida em prol de todos, do Estado como intermediador e figura regulamentadora centralizada visando o melhor para os dois lados.
Na década de 1940, as notícias veiculadas levam a informação que um novo Estado está surgindo, um Estado que é próximo das camadas mais populares, com novas leis, uma legislação com benefícios e garantias materiais aos trabalhadores. É neste intervalo de tempo que surge a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), sob o Decreto 5.452 de 1º de Maio de 1943, no qual tornam-se parte da legislação do país as conquistas obtidas pelos trabalhadores ao decorrer dos anos. Este é um dos marcos mais importantes da história dos trabalhadores do país, embalada pelas mobilizações sindicais de greves e a proporção do movimento.
Dentre as controvérsias deste período, citemos a tomada de direção e os discursos trazidos de garantias e conquistas para os trabalhadores, entretanto, também ocorre um longo período de suspensão de direitos, como o direito às férias, o aumento autorizado da jornada de trabalho e a mobilidade de emprego. Ademais, o alto custo de vida, alto custo dos gêneros e os arrochos salariais também configuram o momento como complexo e contraditório (MATOS, 2009).
Em meio a estes conflitos, Vargas utilizou-se de temas como a dignidade do trabalhador, aquele mesmo levantado pelos trabalhadores em 1930. Ter alguém que pensava, lutava por essa representação, por esta classe, era diferente, mas apoiar essa pessoa gerava uma barganha, pelo fato dele, Vargas, representar e trazer a questão trabalhista. Conforme Matos, “…era aplicar-se ordeiramente na elevação máxima da produtividade do trabalho. Mas era apoiá-lo politicamente, contribuindo, inclusive com o voto, quando esse voltasse a ser um instrumento de participação” (MATOS, 2009, p. 75). Com os governos seguintes, as questões passam a ter nuances próprias, considerando ainda a constituição das primeiras políticas de desenvolvimento e como isso afetou a vivência dos trabalhadores (SBRANA, 2021).
2.1.2 Constituição Federal de 1988
Nos anos de 1964 a 1985 no Brasil ocorreu o período denominado Ditadura Militar, iniciado com o golpe civil-militar de 31 de março 19641. Este golpe foi organizado pelos militares e alguns civis, como agentes do grande empresariado do país, por exemplo, no qual derrubaram o presidente João Goulart do poder. Foram 21 anos marcados por autoritarismo e grande repressão, principalmente contra os projetos trabalhistas. Antes de 1964, durante o governo Jango, vinham sendo efetuadas medidas que amparassem o bem-estar do trabalhador, denominadas Reformas de Base.
Nesse governo, por suas políticas em prol do trabalhador e medidas reformistas, havia descontentamento do grande empresariado e dos EUA, devido algumas políticas suas parecerem com ideias comunistas e por naquele período estarem em meio à Guerra Fria (1947 – 1991). Destacamos a mobilização dos setores conservadores da sociedade efetivada por uma passeata realizada antes do golpe de 1964, denominada Marcha da família com Deus pela Liberdade, a maior parte desses participantes conservadores, militares e empresários que levou ao golpe no dia 31 de março de 1964. Após esse período, o início de um Brasil que durante 21 anos foi comandado por presidentes militares, eleitos em eleições indiretas. Período marcado por violências e ainda a implementação dos grandes projetos de desenvolvimento, implementados, em sua imensa maioria, nas regiões Norte e Nordeste, acarretando diversos conflitos duradouros (SBRANA, 2021).
O caráter de exceção do período é percebido na elaboração de uma nova Constituição Federal, em 1967, que foi criada para legalizar práticas antidemocráticas e institucionalizar o regime, dando abertura ao Poder Executivo e enfraquecendo o federalismo. A partir dela, o presidente da República era fortalecido, os partidos políticos extintos, estabelecida a eleição indireta do presidente por um Colégio Eleitoral, restrição ao direito de greves e manifestação política, bem como fortalecimento da justiça militar. Com os Atos Institucionais, a CF passava a incorporar novos elementos e, em especial, com o Ato Institucional Nº 5, se fechou cada vez mais o regime, já que se incluía a possibilidade de fechamento do Congresso Nacional, Suspensão dos direitos civis e políticos dos cidadãos que cometiam crimes contra a Segurança Nacional e a censura prévia aos meios de comunicação2.
O período do fim da ditadura até a promulgação da Constituição Federal de 1988 é um longo tempo, antes dela houve a Constituição de 1824, a de 1891 no governo provisório de Marechal Deodoro da Fonseca, a qual foi promulgada no primeiro congresso Constituinte, a qual institucionalizava o estado brasileiro como uma República Federativa, e o governo presidencial. Em seguida a Constituição de 1934 de cunho autoritário e liberal em relação apenas ao voto da mulher. Após a Constituição de 1937, a qual seu texto reafirmava e fundamentava a ditadura do Estado Novo no País. Sucessivamente a de 1946, de caráter democrático, parecida com a Constituição de 1934. Então volta-se a uma Constituição que inaugura o regime militar, 1967. Nesse espaço de tempo, houve uma Constituição de 1969 a qual não foi ao certo uma constituição que renovava o texto da Constituição de 1967. Por fim chegando à Constituição de 1988, que em sua elaboração foi priorizado ser inédito, não copiar o texto das antigas Constituições, assim, levou em torno de um ano para ficar pronta. Esta é a oitava Constituição do Brasil (BEZERRA, 2022).
A Constituição Federal de 1988 advém da busca pela redemocratização que já vinha crescendo de pouco a pouco desde os anos finais da ditadura. Foi elaborada durante o governo de José Sarney, já que este assumiu no lugar do eleito Tancredo Neves, devido ao seu falecimento. Levou-se mais ou menos um ano de discussão entre os candidatos eleitos à deputados, senadores, e governadores porque a nova constituição foi elaborada do zero, na Assembleia Constituinte. Esta foi vista nos mínimos detalhes, para que fosse de fato uma Constituição democrática, envolvendo diversos agentes, desde parlamentares e legisladores a grupos de associações, comitês pró-participação popular, sindicatos, fizeram parte das discussões ao texto, tanto que foi considerada uma constituição bem à frente e que abarcou os direitos amplamente das minorias existentes no país.
A Constituição de 1988 foi aprovada por Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, e foi promulgada no dia 5 de outubro de 1988. Esta constituição já possui trinta e quatro anos de história e durante todo esse tempo passou por algumas Emendas Constitucionais e Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. No que tange ao direito trabalhista, apresenta-se os artigos 7º e 8º da CF/88 , exemplo o art.7º que no caput expressa “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social…” e art. 8º no caput expressa “ é livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte…”, os quais trouxeram seguridade ao trabalhador em relação ao salário, jornada de trabalho, duração do trabalho, direito as atividades insalubre e perigosas, as horas trabalhadas a mais, ao descanso inter jornada e intrajornada, o reconhecimento das convenções e acordos coletivos, seguro contra acidentes de trabalho, proibição de diferenças salariais em função do critério de admissão por motivos de sexo, idade, cor ou estado civil, proibição na distinção do trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos, entre outras mudanças.
Também em relação aos sindicatos, é importante destacar que a lei não pode exigir a autorização do Estado para a fundação de sindicato, já que sua liberdade é amparada no artigo 9º da CF/88 que diz” É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio de defender”. Uma das mais relevantes para o nosso estudo foi a EC (Emenda Constitucional) 45 no art.114; a qual teve seu texto alterado de “Compete à Justiça do trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores” sendo que agora está “Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho”. Este simples enunciado no texto Constitucional trouxe uma alteração de proporção gigantesca, dando à Justiça do Trabalho força e competência necessária, não necessitando mais da Justiça Civil, as separando.
2.1.3 Reforma Trabalhista de 2017
A reforma trabalhista de 2017 foi um momento de instabilidade das leis trabalhistas. Foi brusca, pois já havia mais de três décadas de sua atuação em conjunto à Constituição de 88 e ao mesmo tempo que se exalava o ar de finalmente uma adequação condizente com o tempo que por vezes os operadores do direito tendem a pedir tanto em decorrência das leis infraconstitucionais serem anteriores à Constituição de 1988, assim era o período de 2016/2017.
Em sua nova redação, a Consolidação das Leis do Trabalho que foi reestruturada tinha à vista clara marcas de influência do poder econômico da seara da sociedade, economia e das políticas públicas. A nova legislação perdeu a estrutura que havia construído todos os anos anteriores e uma flexibilização exacerbada dos direitos que foram duramente conquistados, assim como trazia medidas de restrição ao acesso à justiça pelo trabalhador (DELGADO, 2019).
Foram efetuadas mudanças significativas, por exemplo em relação ao direito individual do trabalho, principalmente no tempo de trabalho ou a disponibilidade do trabalhador para o empregador e quesitos contratuais; foi excluído basicamente o conceito de “tempo a disposição” do art. 4, ss 1º e 2º da CLT; também em relação às horas in itinere, que são as horas de deslocamento da casa do trabalhador até o seu trabalho, foi revogado o parágrafo 3º. Em relação à jornada de trabalho, que antes era mais rígida, agora as regras encontram-se mais flexíveis. A contratação, pode-se dizer, está majoritariamente autônoma em vista à nova regra, novo art. 442 da CLT (DELGADO, 2019).
Observamos também a criação do contrato de trabalho intermitente, que nada mais é que a desvalorização mais pura e descabida, na qual extingue-se o conceito de jornada de trabalho, já que não há uma jornada de trabalho e simplesmente o trabalhador é contratado para fazer um serviço por algum temo e recebe, sem que haja de fato uma relação empregatícia na qual teria direitos amparados pela CLT, no art.443, P 3º. E novo art.452-A, caput, e ss 1º e até 9º da CLT (DELGADO, 2019).
Outras alterações foram concernentes à saúde e à segurança laborativa na duração de trabalho, exemplo disto é que a jornada de trabalho de 12×3 agora pode ser pactuada entre o empregador e empregado mesmo que contenham situações de ambientes insalubres e perigosos, no atual art. 59-A, P 2º, c/c parágrafo único do art. 60 da CLT; a exclusão da natureza salarial dos intervalos trabalhistas que não são remunerados, no art.71, P 4º e mais ainda quando se fala de intervalo de duração de trabalho cominado com higiene, saúde e segurança, art. 611-B, P. Único da CLT (DELGADO, 2019).
Também, em relação à natureza salarial de distintas parcelas contratuais trabalhistas, no art. 457, CLT, e a eliminação da incorporação de gratificação, que se tirava a média do que foi recebido, após 10 anos ou mais de contrato de trabalho, novo artigo 468, P. 2º, CLT. Há ainda as alterações que propiciam a discriminação direta ou indireta dos empregados, como a eliminação de proteção a remuneração do empregado mais qualificado, submetendo-o a indissimuláveis segregação jurídica, presente no novo parágrafo 2º do art. 444 da CLT; a diminuição das garantias antidiscriminatórias no contexto da equiparação salarial, art. 461 da CLT; a permissão de negociação na arbitragem nas relações laborais, art. 507-A da CLT; alargamento e desregulamentação da terceirização trabalhistas na nova lei 6.019/1974 (DELGADO, 2019).
Somando a essas modificações, as restrições quanto à regulamentação dos danos morais e materiais na seara das relações de trabalho, que estão no Título II-A da CLT, art. 223 até 223-G. Ressalta-se, por fim, a permissão para a celebração de termo anual de quitação de obrigações trabalhistas, art. 507-B da CLT; permissão para a pactuação da arbitragem nas relações de trabalho, art. 507-A da CLT; a eliminação de proteção normativas ao empregado relativamente mais qualificado e relativamente melhor remunerado, art. 444 da CLT; eliminação de formalidades e proteções rescisórias ao empregado com mais de um ano de contrato, art. 477, CLT; igualação das despesas individuais, plúrimas e coletivas, art. 477-A da CLT (DELGADO, 2019).
No que condiz ao direito coletivo do trabalho, houve tais alterações: o enfraquecimento adicional das entidades sindicais no sistema trabalhista brasileiro, mediante a supressão, sem transição, da obrigatoriedade da contribuição sindical, e esta é o agente principal no enfraquecimento do sindicalismo. O art. 611, XXVI, CLT dispõe sobre a proibição do desconto da contribuição negocial, ou similar, dos trabalhadores não associados, se não existir a anuência expressa e prévia deste, ou seja, o aceite por parte do trabalhador (DELGADO, 2019).
Também em relação ao direito coletivo, foi a alteração ao preceitos que autorizam a negociação coletiva trabalhista se tornar uma forma de supressão ou precarização de direitos e garantias trabalhistas, ao invés de se preservar como fórmula de agregação e aperfeiçoamento das condições de contratação e gestão de força de trabalho no ambiente empregatício, isto presente nos artigos 611-A, caput , inciso I até XV e parágrafo único; o novo art. 614 , parágrafo 3º, o novo texto do art. 620, todos da CLT, preceitos que se combinam com o novo texto art. 8º, parágrafos 2º e 3º, e o novo texto do art. 720, ambos também da CLT (DELGADO, 2019).
No que tange o direito processual, que é o meio para materialização do pleito, ocorreram diversas mudanças que dificultam a vida daquele que é pessoa simples, pois afeta negativamente o princípio do ius postulandi, no qual o trabalhador acaba sempre necessitando de um representante processual, de um certo amparo financeiro para poder prosseguir em ações. Assim como o instituto da prescrição, que insere a prescrição bienal e quinquenal, prescrição intercorrente, na qual o trabalhador tem dois anos da data do desligamento da empresa para entrar com ação judicial requerendo seus direitos, e ao entrar os direitos amparados ao pleito são dos últimos cinco anos, contando também da data do ajuizamento. Essa alteração na legislação trabalhista impõe aos operadores do direito da seara trabalhista uma visão de abrandamento. Rigor na lei e abrandamento nos direitos ao trabalhador em sentença (DELGADO, 2019).
2.2 Configuração do sindicalismo no Brasil
Para compreender o sindicalismo no Brasil, primeiramente devemos saber que o sindicalismo é um movimento que tem por objetivo congregar associações de trabalhadores com fins de analisar e de defender seus interesses, ou seja, é uma doutrina que visa fazer associação profissional do sindicato, os conjuntos de sindicatos e sindicalistas, no fundamento da organização econômica e social. Para entender com mais substância, partiremos de palavras-chave e assim teremos maior compreensão.
Primeiramente, sindicato é um sujeito do direito coletivo. Nas palavras de Maurício Godinho Delgado,
sindicatos são entidades associativas permanente, que representam trabalhadores vinculados por laços profissionais e laborativos comuns, visando tratar de problemas coletivos das respectivas bases representadas, defendendo seus interesses trabalhistas e conexos, como o objetivo de lhes alcançar melhores condições de labor e vida (DELGADO, 2019, p. 1590).
Após entender o que significa o conceito de sindicato nas palavras do ilustre doutrinador, é importante compreender o que é a associação sindical e que esta tem respaldo na Consolidação das Leis do Trabalho, no seu artigo 511, caput:
[…] [é a] associação para fins de estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autônomos, empregados profissionais exerçam, respectivamente, a mesma atividade ou profissão ou atividades ou profissões similares ou conexas (CLT, 1943, p. 208 – grifo nosso).
A partir destes conceitos tem-se uma visão mais ampla sobre o tema. Já foi abordada a historicidade e o desenvolvimento do sindicalismo no mundo e no Brasil anteriormente, portanto, agora, trataremos mais especificamente dos conceitos e desenrolar dos padrões, e a legislação obreira e como as suas recentes alterações têm atingido os sindicatos para, desta forma, compreender sua relevância para o movimento sindicalista contemporâneo. É importante ressaltar que o sindicato não é necessariamente de exclusividade dos trabalhadores, sabendo que há os sindicatos de empregadores e os sindicatos mistos, mas o foco deste trabalho se dará aos sindicatos obreiros.
2.2.1 Organização Sindical
Há padrões desenvolvidos e estes são importantes para a compreensão do desenvolvimento do Direito Coletivo do Trabalho, para chegarmos ao cerne deste trabalho. Enquanto os empregadores, em primeiro lugar, são como agentes estruturadores e administradores do processo produtivo, como os seres coletivos que são, e de forma secundária as associações empresariais, os trabalhadores necessitam unir-se, conforme observamos. Nesse sentido, para se conhecer os sindicatos trabalhistas e sua organização, veremos como são divididos a fim de exemplificar.
De um lado, a fórmula de estrutura que une trabalhadores de uma mesma profissão, segmento de atividade, mesmo que empresarial, e de outro lado, o sistema de representação trazida por lei que também pode se subdividir, para aqueles que não seguem o unitarismo. Segundo Delgado (2019, p. 1592), “trata-se em suma, do conhecido debate entre a unidade, que é determinada por lei, e a não prefixação legal da unidade ou pluralidade sindical”.
A agregação do ser obreiro pode ser dada em quatro requisitos, seguindo a CLT. Primeiramente, por ofício ou profissão. Apesar de ser um dos modelos iniciais, no Brasil não é o modelo dominante: “são sindicatos que agregam trabalhadores em vista de sua profissão, no Brasil, são chamados sindicatos de categoria, sindicatos horizontais, como exemplo de sindicatos destes são os de professores, aeronautas, motoristas, aeroviários…” (DELGADO, 2019, p. 1592). A prerrogativa de sua modalidade encontra-se no artigo 577 da CLT, e que tem sua hipótese levantada do Art. 511, P. 3º da CLT.
Segundamente, por categoria profissional. São os mais comuns no Brasil e remetem às décadas de 1930 e 1940, chamados sindicatos verticais. Esse padrão vem a partir do Art. 511, P. 2 da CLT. A sua organização se dá pela similitude laborativa: “a categoria profissional, regra geral, identifica-se, pois, não pelo preciso tipo de labor ou atividade que exerce o obreiro, e (nem por suas exatas profissões) as pela vinculação a certo tipo de empregador” (NASCIMENTO, Apud DELGADO, 2019, p. 1593). Exemplo deste tipo de sindicatos, são os sindicatos metalúrgicos, comerciais, empresas bancárias, entre outros.
Em terceiro, os sindicatos por empresa. Esse tipo de sindicato é mais frequente na América do Norte, já que a Constituição Federal de 1988 preconiza que os sindicatos deverão ter uma categoria profissional para sua estruturação e, nos requisitos necessários, o município deve constar como base territorial (art. 8º, II, CF). A saber, “a estruturação sindical por empresa tem sido criticada por reduzir a possibilidade de generalização de conquistas trabalhistas para um âmbito econômico-profissional mais amplo, enfraquecendo o papel progressista do Direito do Trabalho” (DELGADO, 2019, p. 1595).
Em quarto, os sindicatos por ramo empresarial de atividade. Este tipo de sindicato tem um poder de negociação muito maior e mais forte, e ultrapassam as barreiras territoriais municipais, sendo regionais. Exemplos: sindicatos do segmento industrial, segmento comercial, setor agropecuário. No Brasil, precisamente atingindo o norte e sul do Estado do Maranhão, temos o sindicato STEFEM (Sindicato dos Trabalhadores de Empresas Ferroviárias do Estado do Maranhão). Conforme Delgado, “em síntese, a força organizativa dos sindicatos resultantes deste critério permite o mais perfeito cumprimento do princípio da real equivalência entre os contratantes coletivos” (DELGADO, 2019, p. 1596).
Os sindicatos não são os únicos que podem representar o ser obreiro, contudo, são os únicos dotados de poder de negociação disposta em lei, com estruturação disposta na CF 88, vindo desde 1930. Na estruturação é percebido um certo entrave no quesito sindical concernente à unicidade ou pluralidade. A unicidade vem prevista no ordenamento jurídico, sendo obrigatória, conforme art. 516 da CLT: “não será reconhecido mais de um sindicato representativo da mesma categoria econômica ou profissional, ou profissão liberal, em uma dada base territorial”. Portanto, cabe dizer que não pode haver concorrentes de entidade sindicais (DELGADO, 2019).
Essa determinação legal entra diretamente em conflito com a convenção de 87 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) de 1948, a qual o Brasil ainda não subscreveu. Grande parte dos países ocidentais vivem sob o sistema da liberdade sindical, ou seja, com o pluralismo. O pluralismo não é ausência da unicidade, e sim a liberdade para haver a unicidade ou não, não necessitando de ter regulamentado em lei ou submissão de vistoria a uma entidade (DELGADO, 2019).
A unicidade no Brasil foi imputada em meados dos anos de 1930 e 1945, correspondentes ao Estado Novo. Dentro deste modelo estão presentes alguns requisitos, tais como: o sindicato único por categoria ou profissional; a vinculação direta ou indireta ao Estado. Neste ponto destaca-se que atualmente este trabalho é feito pelo Ministério do Trabalho, após a EC de 2004 em que foi feita a alteração no ordenamento jurídico, desvinculando as matérias trabalhistas das civis, como exemplo o disposto no art. 114 da CF/88.
A Constituição, apesar de afastar a possibilidade jurídica de intervenção e interferências político-administrativas do Estado, também reforçou o papel dos sindicatos inclusive em assuntos judiciais e administrativos. Alargou os poderes de negociações coletivas do trabalho sob o manto da participação sindical obreira, e assegurou amplamente o direito de greve. (DELGADO, 2019, p. 1598). Para Delgado, “fica claro, portanto, que, passados 25 anos de vigência da Constituição Federal da República (1988-2013/2015), somente quanto ao sistema sindical é que certos traços corporativistas se mantiveram preservados” (DELGADO, 2020, p. 1598).
Seguindo a argumentação do autor, as atualizações legislativas recentes demonstram a necessidade de reformulação do ordenamento jurídico quando falamos em questões trabalhistas, devido às incompatibilidades na redação legal original e das transformações recentes do Direito Trabalhista no Brasil e no mundo. Exemplo disso encontra-se na Convenção de 98 da OIT, a qual o Brasil adotou e, da mesma forma, adotou a Convenção 135, gerando imbróglio devido às suas redações conflituosas. Essa transição democrática “necessita de medidas eficazes de proteção à estruturação e atuação democrática do sindicalismo no País” (DELGADO, 2019, p. 1600).
2.2.2 Organização sindical brasileira atual
Para uma melhor compreensão da organização sindical atual, explanaremos primeiro sua estrutura externa e, em seguida, sua composição e funcionamentos internos. Em relação à estrutura externa, podemos desenhá-la a partir da pirâmide de Kelsen: na base está o sindicato, no meio, a federação, e no topo a confederação.
Imagem 1. Organização sindical atual
A CLT é de 1943, tendo passado por diversas Constituições Federais e sido recepcionada pela atual Constituição. Então temos características de um outro período, a chamada Era Vargas, trazendo fatores que não encontrarão guarida na Constituição de 1988, fazendo estes serem implicitamente anulados, bem como questões que a própria Constituição ainda se abstém de abarcar para que não venha se contradizer. Seguindo ainda Delgado (2019), sabe-se que a base territorial mínima dos sindicatos é municipal, conforme art. 8 da CF/88 pois, nesse aspecto, não foi o artigo 517 da CLT recepcionado. As federações são a junção de cinco sindicatos ou mais, da mesma categoria, profissão, ou vertente econômica, vide art. 534 da CLT e a confederação é a junção de três federações, respeitando a categoria, a profissão ou vertente econômica, com sede em Brasília, conforme art. 535 da CLT. A estrutura e funcionamento interno vem disposta no título V da CLT, que informa sobre os órgãos internos dos sindicatos e a administração como ocorrerá. Do art. 511 ao 569, lemos sobre a instituição sindical; nos Art. 570 a 577, sobre o enquadramento sindical e nos Art. 578 a 610 sobre a contribuição sindical.
Após a exposição desses elementos, passaremos ao Estudo de Caso.
3 ESTUDO DE CASO: PRÁTICAS SINDICALISTAS E ANTISSINDICALISTAS EM INDÚSTRIAS DE AÇAILÂNDIA-MA
No item anterior, falamos a respeito da Reforma Trabalhista de 2017 e os seus implicativos na Consolidação das Leis do Trabalho. Agora trataremos estritamente das alterações que afetaram os sindicatos. Lembramos que este trabalho tem como objetivo apontar as práticas sindicalistas e antissindicalistas nas relações laborais, ou seja, explorar como têm ocorrido tais práticas e o impacto delas no mundo do trabalho em indústrias de Açailândia-MA.
A cidade de Açailândia se torna relevante neste estudo por ela possuir um dos polos industriais mais importantes do Estado do Maranhão. Desta forma, grande parte da população da cidade encontra-se em relações de trabalho em indústrias como VALE S/A, AVB, CVB e VIENA3. Todas relacionadas ao ramo da mineração e da siderurgia, seja extraindo, exportando, transformando e produzindo outros materiais. Conforme Mendonça et Al. (2021, p. 255),
A dinâmica econômica do município de Açailândia nas últimas décadas está diretamente relacionada com sua filiação ao Programa Grande Carajás (PGC) e ao Projeto Ferro Carajás (PFC), desenvolvidos pela então Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Para Açailândia, que fica a 562,4 km da capital do Estado, São Luís, o PGC reservou como plano de negócios a produção de ferro- gusa, um processo de transformação do minério de ferro com altos custos sociais e ambientais. A história econômica recente de Açailândia, assim, também está vinculada às transformações e oscilações do mercado externo, haja vista a importância da siderurgia no contexto local e sua submissão às lógicas do consumo internacional de seus produtos.
Ainda conforme os autores, devemos compreender a história econômica açailandense em dois momentos: iniciando nos anos 1960, o primeiro momento remete ao início da atividade agrícola a partir da Colônia Gurupi, local que depois se tornou a Vila Maranhão. Em 1968 foram construídas a BR-010 e a BR-222, trazendo a possibilidade de ampliação das atividades como o comércio, a pecuária, a extração de madeiras e a construção de serrarias, o chamado Ciclo da Madeira. O segundo momento é mais atual, conhecido pela efervescência das siderúrgicas, tendo iniciado com a construção da Estrada de Ferro Carajás e com a instalação da empresa Vale S.A. (antes Cia. Vale do Rio Doce), nos anos 1980. Mesmo com oscilações na produção mineral e siderúrgica, a cidade de Açailândia continua tendo nesses dois ramos os seus principais sustentáculos no que concerne à geração de emprego e renda (MENDONÇA et Al., 2021). E isso claramente se relaciona com nosso objetivo de compreender como as transformações no Direito do Trabalho impactam as vidas dos trabalhadores nessas indústrias.
Diante disso, passemos para uma explanação a respeito das práticas sindicalistas e antissindicalistas. Para se entender estas práticas, vamos esclarecer a liberdade de associar-se, a liberdade sindical que há na Constituição Federal e é amparada pela Convenção de 87 e 98 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Isto preconiza que o ser obreiro tem a liberdade de filiar-se ou não ao sindicato, também que, ao fazer parte de um, terá direitos que lhe seguirão, um amparo.
Ainda que existam os direitos e garantias advindos desta relação de sindicalizado, por vezes ocorrem situações a este ser obreiro que o desestimula a continuar sindicalizado ou nem mesmo se sindicalizar. O que se pensa neste momento é: por que o ser obreiro que tanto lutou para conquistar uma legislação trabalhista acaba deixando-a de lado? A esse respeito, o doutrinador, conhecido como pai do Direito Trabalhista no Brasil, Mauricio Godinho Delgado traz em seu livro Manual do Direito Trabalhista, no capítulo em que aborda acerca do Princípio da Liberdade Sindical que há as práticas denominadas de Cláusula de Sindicalização Forçada – as chamadas práticas sindicalistas – e as práticas antissindicalistas que, como sugere o nome, levam o ser obreiro a não se sindicalizar.
A cláusula de sindicalização forçada é, em resumo, uma cláusula no contrato de trabalho na qual obriga o empregado a filiar-se ao sindicato. Mas não ocorre de uma só forma, pois existem quatro espécies dessas cláusulas, que serão explicadas adiante.
A primeira, denominada closed shop –no português, empresa fechada – significa que o empregador se obriga em frente ao sindicato obreiro a só contratar as pessoas que estão filiados a este. A segunda, identificada por Union shop –no português, empresa sindicalizada –, é a empresa que se compromete a só contratar trabalhadores que, após um certo prazo de admissão, se filiem em um respectivo sindicato obreiro. Neste caso, não há problema em o trabalhador a princípio não ser sindicalizado, mas, após certo tempo, este deve se filiar e, caso não se filie, será demitido (DELGADO, 2019).
A terceira, Preferencial shop –em português, empresa preferencial –, é uma modalidade que favorece a contratação dos empregados que já são filiados a determinado sindicato. A quarta, por sua vez, é chamada de Maintenance of membership – em português, manutenção de filiação –, ou seja, o empregado que está filiado a determinado sindicato deve preservar sua filiação durante o prazo de vigência da respectiva convenção coletiva, sob pena de perda do emprego (DELGADO, 2019).
Este tipo de ação sindicalista preconizado por empresas coloca em xeque a liberdade de associação sindical. Enquanto também se questiona o quanto aquele sindicato agirá em prol de seus empregados ou exercerá a representação conforme o art. 8º da CF/88. Tais atitudes em verdade enfraquecem mais ainda a relação sindicato e sindicalizado, conforme Delgado (2019).
As práticas antissindicais, como já afirmamos, são práticas que desestimulam a sindicalização. Se as listadas anteriormente estimulam a sindicalização, em muitos casos, a qualquer custo, as práticas antissindicais ou antissindicalistas desestimulam. Estas, por sua vez, se dividem em algumas espécies, tais como: yellow dog contracts, company unions e, ainda,aprática mise à l’index (DELGADO, 2019).
Nos yellow dog contracts – em português, contratos de cães amarelos –, o trabalhador firma um compromisso com o empregador de não se filiar a seu sindicato, como critério de admissão e manutenção de emprego. Diz o doutrinador, a esse respeito:
[…] contudo (inclusive no Brasil), sabe-se que os fatos tendem a se passar de maneira diversa: é comum ouvir-se falar em práticas meramente informais, inviabilizando, pela pressão surda no ambiente laborativo, a efetiva possibilidade de adesão de empregados a seus respectivos sindicatos. […] [N]o Brasil, sindicatos amarelos, o próprio empregador estimula e controla (mesmo que indiretamente) a organização e ações dos respectivos sindicatos obreiros (DELGADO, 2019, pg. 1559).
No segundo caso, Company unions, seria a união de empresas que se unem com o sindicato obreiro para controlá-lo, popularmente conhecido como sindicatos pelegos. Em terceiro, mise à l’index, (colocar no index), significa a criação de uma lista suja, na qual são colocados os nomes dos trabalhadores que atuam significativamente no sindicato em uma lista e esta lista é divulgada entre as empresas para que estes trabalhadores possam ser excluídos do mercado de trabalho. Segundo o doutrinador, estas práticas são totalmente inválidas e ferem diretamente o nosso ordenamento jurídico (DELGADO, 2019).
Mediante a compreensão do que são práticas sindicalistas e antissindicalistas, partiremos para o estudo de caso realizado com trabalhadores das indústrias de siderurgia e mineração de Açailândia. Após aplicação de questionário desidentificado e online através da plataforma Google Forms com dez pessoas, bem como levantamento de dados em sítios eletrônicos das indústrias referenciadas anteriormente, e ainda a realização de entrevista com especialistas nos temas abordados neste trabalho, pudemos elencar os seguintes resultados.
3. 1 Percepções a partir das respostas enviadas
O questionário desidentificado foi composto por seis perguntas:
- Encontra-se empregado?
- Sim
- Não
- Caso sim, selecione a empresa na qual possui vínculo empregatício
- AVB
- Viena
- CVB
- VALE
- Outra
- Em qual faixa etária você se encontra?
- 18-24 anos
- 25-34 anos
- 35-44 anos
- 45-54 anos
- 55-64 anos
- Você conhece algum sindicato que represente a sua categoria?
- Sim
- Não
- Você é um trabalhador sindicalizado?
- Sim
- Não
- Qual sua opinião sobre os sindicatos?
As cinco primeiras, como pode-se notar, são perguntas objetivas, sendo apenas a última subjetiva. Os resultados das cinco primeiras perguntas foram:
Imagem 2. Respostas à pergunta 1
Imagem 3. Respostas à pergunta 2
Imagem 4. Respostas à pergunta 3
Imagem 5. Respostas à pergunta 4
Imagem 6. Respostas à pergunta 5.
Ressaltamos que o questionário foi enviado para grupos somente de trabalhadores na plataforma Whatsapp, não sendo direcionado para grupos sociais que não estavam abarcados nessa categoria. Chamou nossa atenção a variedade de faixas etárias das pessoas que responderam ao questionário. Além disso, outro elemento que consideramos significativo é a relação que podemos estabelecer entre a resposta das perguntas 4 e 5: 90% das pessoas conhecem algum sindicato que represente sua categoria e 60% delas são sindicalizadas. De acordo com o pesquisador Roberto Mancini, entrevistado no dia 11 de outubro de 2022 pela autora e sua orientadora, existem o que ele identifica como duas gerações de trabalhadores: uma mais antiga, ligada às primeiras lutas sindicais, e uma mais recente, que não se identifica ou pouco se identifica com os atuais sindicatos. Em suas palavras,
Lá em Açailândia, o sindicato dos metalúrgicos a sigla é STIMA. […] [E]les nos últimos anos […] tiveram uma atuação muito boa, eles foram muito ativos em diversas questões ali relacionadas à existência mesmo do polo siderúrgico. E eles mostraram, digamos assim, o posicionamento deles de defesa dos empregos, da manutenção dos salários porque embora ocorra diversas questões ao redor do polo, relacionadas ao polo como as questões dos impactos ambientais e socioambientais, mas é lógico que o ponto de vista do sindicato, embora eles tenham muita noção disso, lógico que eles estiveram envolvidos nessas questões, o mais importante para eles vai ser sempre a manutenção dos empregos. A manutenção dos postos de trabalhos. Então o STIMA o sindicato lá dos metalúrgicos teve uma atuação bastante atuante [sic], sobretudo no início da década de 2010 mais ou menos até 2015, 2016, eles estiveram uma atuação muito forte e porque também foi o período em que eles mudaram lá a diretoria, era uma diretoria mais antiga e que estava ali no controle do sindicato em um período de mais estabilidade, digamos assim do polo, que economicamente não teve grandes novidades, eles só ficavam regulares. Rotação de empregos foi muito grande, daí vários trabalhadores, os metalúrgicos, falaram para mim os mais antigos, eram muito fáceis de conseguir emprego, saia de um ficavam um tempo sem, mas as vezes por opção ia arranjava outro depois de um tempo. Então não tinha muita novidade. Na situação assim economicamente falando assim, não teve muito susto. E isso muda a partir de 2010 que teve umas situações assim a partir da década de 2000. A partir da crise de 2008 da crise mundial o polo siderúrgico de Açailândia, ele é seriamente abalado e tem impacto nas vendas muito grande, já que a produção siderúrgica do ferro gusa quando era o ferro gusa, sobretudo o ferro gusa com o polo de siderúrgica entre Açailândia e duas cidades do Maranhão e Marabá e Barcarena, 18 unidades produzindo o ferro gusa, era um mercado efervescente mesmo. Uma produção basicamente mais de 95% voltada para os Estados Unidos, então obviamente quando tem a crise de 2008, o polo é necessariamente abalado, depois eles até recuperam um pouco o nível das vendas, mas teve outro grande agravante que foi chamado de crise do minério em 2010, e obviamente o minério de ferro que eles usam exclusivamente fornecido pela Vale e as taxações mundiais do preço do minério, a partir de 2010 se elevam bastante e por exemplo esse foi o grande problema que, esse foi o pior digamos assim, fator pro polo siderúrgico de Marabá muito mais do que os programas financeiros dos Estados Unidos foi a elevação do preço da Vale, o que é até meio irônico.
As respostas à pergunta 6 são significativas no que diz respeito a como os sindicatos são compreendidos pelos trabalhadores:
Na primeira resposta lemos que o sindicato é
Uma “instituição” que busca benefícios e a melhora do ambiente de trabalho para o trabalhador visando o “ser” trabalhador. Infelizmente em algumas regiões não acontece como planejado, tendo como prioridade apenas o desconto da folha salarial para sustentar os cargos fantasma ocupados por pessoas de altos cargos nas empresas. (Opinião baseado no empirismo).
A segunda resposta indica que o sindicato é “comprado pela indústria”. Já a terceira, aponta que
as principais responsabilidades dos sindicatos estão a negociação de acordos coletivos, intervenção legal em ações judiciais, orientação sobre questões trabalhistas, participação na elaboração da legislação do trabalho, recebimento e encaminhamento de denúncias trabalhistas e preocupação com a condição social do trabalhador. Sendo assim, os sindicatos deveriam atuar com mais presteza com informações relevantes para tais categorias de trabalhadores
A quarta resposta indica, de forma complexa, que o sindicato seria “Uma coisa boa para o trabalhador”, contudo, a pessoa que respondeu demonstra insatisfação, pois complementa que “hoje em dia quero tirar meu nome, porque não vejo eles querendo brigar pelos nossos direitos”. Essa opinião é corroborada pela resposta número 5: “Não estão fazendo um trabalho que realmente ajudem os metalúrgicos, estão bem precários, precisam melhorar vários pontos.”. Também na resposta número 8 encontramos insatisfações em relação aos sindicatos: “Não vejo muito vantagem, não ouvimos muito falar, não sei quem é o presidente e os representantes”.
A sexta resposta provavelmente vem de um trabalhador que presta serviços de transporte para as indústrias. Segundo o que foi escrito, o “sindicato da minha Categoria (motorista) é muito atuante, acho bom”, demonstrando um certo otimismo que também é encontrado na resposta seguinte, a número 7: “Acho bom, consegue coisa para nós”. A nona resposta é assim apresentada: “O sindicato tem tido um papel muito importante na defesa dos direitos do trabalho e preservação dos postos de trabalho.”, semelhante ao indicado na décima e última resposta: “é de suma importância, tanto para representar quando defender os direitos dos trabalhadores”.
Observamos que as respostas estão divididas entre as pessoas que veem no sindicato, de forma geral, uma entidade representativa nos trabalhadores, remetendo a uma visão que muito se assemelha aos primeiros sindicatos abarcados pela CLT, por um lado. Temos outra posição que é de negação da importância do sindicato, não encontrando vantagens em sua atuação ou mesmo ausência. Essa posição está ligada, conforme Mancini, ao que seria uma geração mais nova de trabalhadores, muitos deles multitarefas, denominados proativos, que já não se identificação na categoria genérica trabalhador, pois há uma redefinição geral do ser trabalhador tornado cada vez mais individualizado.
A terceira posição tenta casar uma percepção da importância dos sindicatos para os trabalhadores, ao mesmo tempo em que não vê uma atitude em prol dos trabalhadores. Embora seja perceptível uma grande atuação dos trabalhadores, a exemplo do que Mancini apontou como as lutas empreendidas pelo STIMA, essas ocorrem entre os anos 2010 e 2015/2016, chegando, após esse período, à atualidade em que não há uma identificação generalizada dos trabalhadores com os sindicatos4. Note-se, por fim, que o período de desmobilização coincide com a Reforma Trabalhista que, em termos gerais, promoveu uma precarização do amparo aos trabalhadores.
4 CONCLUSÃO
A reforma trabalhista afetou significativamente o trabalhismo que, como vimos, foi sendo construído ao longo do tempo. Um exemplo pode ser percebido nas alterações quanto ao fato de rescisão da empresa e empregado, pois antes a legislação protegia o trabalhador de forma que, quando ocorresse a rescisão, o trabalhador deveria levar ao sindicato, o termo de rescisão, para que houvesse a homologação, e lá seria informado dos seus direitos. Agora, com a reforma, não há obrigatoriedade da homologação do sindicato, pois a rescisão pode ser efetivada apenas com a assinatura do empregado e empregador (DELGADO, 2019).
Outro ponto é em relação à rescisão em massa: a fim de evitar uma situação que desfavorecesse mais o trabalhador, deveria ser estabelecido entre empresa e sindicato nas situações de demissões em massa. Agora, contudo, não é necessária mais a concordância, podendo ser feita diretamente pela empresa em relação ao empregado. Também, já mencionado anteriormente, vivencia-se a não obrigação da contribuição sindical, se tornando necessário o aceite do empregado para que a contribuição seja descontada (DELGADO, 2019).
Mendonça et Al. (2021) trazem importante relato de um trabalhador açailandense a respeito desses elementos:
[…] existe um senso comum entre os trabalhadores de que o Sindicato dos Metalúrgicos não funciona para qualquer trabalhador, apenas para os chefes, e que é ineficaz em lutar por demandas básicas, como os auxílios para saúde e alimentação. Em suas palavras: Optei por não colocar vir menos tantos de dinheiro no meu contracheque para sindicato. Primeiro porque o sindicato em Açailândia não tem nenhum tipo de eficiência, assim, em questão de briga por alguma coisa. Claro que eu tô falando aqui… eles podem… hoje eles conseguiram tantos por cento no aumento da alimentação, conseguiram coisa que era pra acontecer, que é o aumento do salário, porque o salário ele não aumentou tantos por cento… enfim. Mas aconteceram várias coisas que o sindicato não interferiu, por exemplo, as siderúrgicas pagavam vale e salário, né? Esse vale seria uma quinzena e o sindicato, quando a siderúrgica cortou esse vale, não interferiu. Fora que tem várias coisas que o sindicato poderia ter ajuda e não ajuda (MENDONÇA et Al., 2021, p. 269).
Para nós, essa fala é significativa para compreendermos a incidência das práticas sindicalistas, conforme definido por Delgado (2019). O trabalhador, no caso em tela, não foi nem obrigado nem desobrigado de contribuir com o sindicato, mas observa, em seu ambiente de trabalho, o que seriam práticas obtusas que nublam a atuação sindical, cada vez mais distante da realidade dessa geração de trabalhadores.
Mediante o que temos analisado, pela leitura da bibliografia especializada, legislação e análise do estudo de caso, podemos observar que a nova reforma parece não seguir o princípio da isonomia, tomando partido. Através destas alterações, parece o legislador ter se lembrado mais do empregador do que da figura mais importante, do elo mais fraco, daquele que precisa ser amparado de fato, o empregado. Quando se perde o equilíbrio que se tinha, o próprio sindicalismo e as conquistas da classe trabalhadora, que foram duramente conquistadas se perdem, priorizando-se o eu, em frente a uma nova geração de trabalhadores, haja vista que se passaram mais de setenta anos do adimplemento da CLT e mais de 120 anos dos primeiros sinais da luta dos trabalhadores no Brasil, seguindo os argumentos de Delgado (2019).
Assim, a atual legislação encontra-se no mesclado de duas gerações de trabalhadores, a primeira geração que lutou, vivenciou a participação ativa e essencial dos sindicatos, e a segunda geração, que vem das memórias de luta, da ideia de sindicalismo, mas não precisou ver essa atuação mais marcante, uma geração que já tem uma consolidação das leis do trabalho nas mãos e que passa por uma desconstrução desse processo mediante uma Reforma, reiteramos, que prioriza o patronato.
Em Açailândia-MA, cidade polo da siderurgia no Estado, as relações entre sindicatos e trabalhadores se tornam cada vez mais distantes, pois há uma transformação na legislação, mas também na forma da classe trabalhadora, que passa a ser cada vez mais individualizada, perdendo os laços com antigas lutas.
Para os trabalhadores mais novos pode parecer que em verdade sua liberdade de expressão, sua liberdade de trabalhador está sendo assegurada quando os direitos trabalhistas parecem deixar o trabalhador à vontade, que ao poder negociar diretamente com o patrão é significado de autonomia, quando o que se de fato tem é uma perda drástica e uma antagonização da legislação trabalhista. Enquanto alguns seres obreiros aceitam aquilo que é ofertado e à maneira que é ofertado do empregador, ainda há uma parcela que acredita na luta de classe, na mobilização e importância de representação sindical, que acredita que sozinho não é capaz de sustentar seus direitos, mais sim que precisa estar em coletividade para lutar pela manutenção dos seus direitos (MANCINI, 2021).
Por fim, conclui-se através do desenrolar do contexto histórico das lutas dos trabalhadores e as transformações na legislação brasileira, o movimento sindicalista que se estende até a atualidade, apesar das baixas que sofreu com as últimas alterações obreiras, o trabalhador enfrentou as mais duras batalhas, duras conquistas, teve seus direitos recebidos e, depois tomados, mas nunca ficou parado, lutou contra as repressões, e persevera contra estas. Independente do tempo, dos costumes, o ser obreiro mantém o cerne de não desistir dos seus direitos.
REFERÊNCIAS
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1 Existem diferentes nomenclaturas para definir o período e o evento que o iniciou. Em nosso trabalho, optamos pela ênfase nos agentes condutores do processo, as Forças Armadas, portanto Ditadura Militar. Para compreender mais a respeito do debate das classificações, ver Melo, 2005.
2 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao67.htm. Acesso em: 06 nov. 2022.
3 VALE S/A nome reconhecido na Bolsa de Valores a partir de 2007. Anteriormente possuía as siglas CVRD, 1942 (Companhia Vale do Rio Doce), conforme o próprio site da empresa dispõe em www.vale.com. AVB (Aço Verde Brasil) do grupo Ferroeste, desde 1990 atuando em Açailândia-Ma, de acordo com informações no site da empresa www.avb.com.br. CVB (Cimento Verde Brasil), societária do grupo Masaveu e o Grupo Ferroeste. Desde maio de 2011, conforme o site da empresa: www.cimentoverdedobrasil.com.br. VIENA siderúrgica do Maranhão, desde 1967. Fundada pelo empresário Júlio Valadares, conforme site: www.vienairon.com.br. Informações todas acessadas em 05 nov. 2022.
4 A título de exemplo, nós fomos algumas vezes à sede do STIMA a fim de entrevistar lideranças, mas não encontramos atendimento nos horários indicados pelo próprio sindicato como de atendimento ao público.
1 Acadêmica do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP, advlorennasantos@gmail.com
2 Orientadora, Mestra em História Social (UFMA), Professora do curso Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Humanas – Geografia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Campus Grajaú, santostaay@gmail.com.