REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202507311356
Walkíria Simony Campos de Queiroz Santos1
RESUMO
Crianças com TDAH do tipo combinado, o qual é mais prevalente, não correspondem ao padrão de comportamento social, e logo, tendem a ser prejudicadas na escola quando o professor desconhece a neurobiologia do transtorno, e lhe falta preparo para conviver, fomentar a socialização do aluno e executar estratégias de ensino compatíveis. A fim de reverter essa situação, este trabalho propõe a integração entre a Neurociência e a Educação, visando evidenciar as contribuições da Neuroeducação para a potencialização da inclusão escolar dos alunos diagnosticados com TDAH, com vista às estratégias metodológicas que envolvem o ensino, a aprendizagem e a socialização. Para tanto, rebuscou-se embasamento bibliográfico em autores como: Mantoan (2003), Assencio-Ferreira (2005), Mattos (2014) e dentre outros, que colaboram para o respaldo dos argumentos expostos. Constatou-se a importância do diagnóstico de TDAH na infância, pois, quanto antes for identificada a condição, mais assertivas serão as soluções inclusivas no contexto escolar. Embora a aprendizagem desse aluno seja primariamente dificultada por fatores orgânicos, pode ser influenciada por aspectos escolares. Logo, quando as estratégias pedagógicas são subsidiadas pela Neurociência, há a efetivação de uma rotina apropriada e atividades adaptadas às capacidades do aluno, que nesse caso, consegue reconhecer-se como alguém capaz de aprender, com autoestima para harmonizar-se consigo mesmo e com os outros. A escola contemporânea heterogênea demanda do docente o discernimento claro acerca da relação entre linguagem, memória, atenção, emoções e aprendizagem, que decorrerá do acesso às redes neurais. As práticas neuro-educativas podem modificar a situação de ensino e aprendizagem deficitários no Brasil.
Palavras-chave: TDAH. Neuroeducação. Aprendizagem. Socialização. Inclusão.
ABSTRACT
Children with ADHD, particularly the combined type, often deviate from typical social behavior patterns and are therefore disadvantaged in school settings when teachers lack knowledge of the disorder’s neurobiology and the pedagogical training needed to address it. This paper advocates for the integration of Neuroscience and Education to enhance school inclusion of students diagnosed with ADHD through the use of neuroeducational strategies that support teaching, learning, and socialization. The study is grounded in authors such as Mantoan (2003), Assencio-Ferreira (2005), and Mattos (2014). It concludes that early diagnosis of ADHD can lead to more effective inclusive interventions. Despite biological factors, school practices can significantly influence learning. When pedagogical strategies are supported by neuroscience, inclusive routines and activities tailored to the student’s capabilities become possible, promoting self-esteem and learning success. A heterogeneous school context demands that educators understand the relationship between language, memory, attention, emotion, and learning—connections made possible through neuroscience. Neuroeducational practices can help overcome educational deficits in Brazil.
Keywords: ADHD. Neuroeducation. Learning. Socialization. Inclusion.
1 INTRODUÇÃO
O Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade é um dos distúrbios neurobiológicos mais recorrentes na sala de aula (MAIA; CONFORTIN, 2015). As crianças com TDAH, principalmente aquelas que apresentam o tipo combinado, o mais prevalente, tendem a serem excluídas socialmente e de diante do processo de aprendizagem.
Isso ocorre porque seu comportamento não corresponde ao padrão social, e faltam profissionais capacitados para executar procedimentos de ensino adequados a esse alunado (BENICIO; MENEZES, 2017). Logo, a exclusão se dá quando os profissionais envolvidos na escolarização do referido indivíduo não cooperam com a viabilização de uma prática real de inclusão na escola; não fomentam a socialização entre os alunos, e, tampouco, buscam maneiras de alcançar a todos através de novos métodos de ensino e aprendizagem.
Considerando a ocorrência da situação exposta, e a fim de revertê-la, destaca-se que o trabalho do educador se torna mais significativo quando ele conhece o funcionamento cerebral da criança (CONSENZA; GUERRA, 2011), pois, a partir disso, se torna possível adaptar a sua metodologia à realização de um trabalho inclusivo, que atende à perspectiva discente igualitária.
Contundente a essa proposta, menciona-se a integração entre a Neurociência e a Educação, que juntas, constituem caminhos neurais para a aprimoração da prática educativa na perspectiva da inovação e do respeito às singularidades e potencialidades de cada indivíduo. Logo, esse aporte se torna significativo nos casos de alunos que apresentam disfunções neurológicas, e, por conseguinte, Necessidades Educacionais Específicas.
Diante disso, o objetivo deste artigo é evidenciar as contribuições da Neuroeducação para a potencialização da inclusão escolar dos alunos diagnosticados com TDAH, com vista às estratégias metodológicas que envolvem o ensino, a aprendizagem e a socialização. Para tanto, rebuscou-se embasamento bibliográfico em autores como: Mantoan (2003), Assencio-Ferreira (2005), Mattos (2014) e dentre outros, que esclarecem conceitos pertinentes ao tema central e colaboram para o respaldo dos argumentos expostos.
Inicialmente, neste trabalho, apresenta-se os aspectos gerais do Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade, bem como as suas implicações no contexto escolar. Paralelo a isso, explicita-se as dificuldades no processo de aprendizagem, provenientes de fatores externos e/ou orgânicos, sendo estas situadas no contexto do TDAH. Posteriormente, indica-se fatos que justificam a Neurociência aliada à Educação como uma alternativa eficaz para a inclusão de alunos com TDAH.
Logo, são apresentadas algumas estratégias subsidiadas pela Neuroeducação, que além de contribuírem para a eficiência da entrada, processamento e saída de informações no cérebro da criança com TDAH, pressupõem atitudes por parte do neuroeducador, que poderá cooperar para a socialização desse indivíduo na sala de aula. Por fim, é tecida a conclusão deste estudo, decorrente do período de leitura, análise e reflexão.
Espera-se que as ideias apresentadas neste trabalho agucem a percepção dos profissionais de Educação quanto à necessidade de (in)formação de cunho neurocientífico, a fim de que seja viabilizada a compreensão das atividades cerebrais e por conseguinte, a efetivação da inclusão escolar da criança com TDAH.
2 TRANSTORNO DO DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE: contextualização introdutória
O Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é uma condição neurobiológica crônica que surge na infância e acompanha o sujeito em toda a sua vida (ABDA, 2017). Estudos que utilizam tecnologias de imagem cerebral sugerem que os indivíduos com esse transtorno apresentam uma disfunção nos neurotransmissores, em específico, na área frontal do córtex cerebral, em regiões subcorticais e na região límbica (COUTO; MELO-JUNIOR; GOMES, 2010).
Sendo assim, o TDAH está associado ao déficit funcional de noradrenalina e dopamina, o que leva o indivíduo a apresentar os sintomas clínicos relacionados principalmente à desatenção, hiperatividade e impulsividade, pois, mediante informações de cunho neurobiológico, compreende-se que:
A região frontal do cérebro é responsável pela inibição do comportamento, pela capacidade de prestar atenção, pela memória, pelo autocontrole, pela organização e planejamento. Nos portadores de TDAH, o funcionamento de sistema de neurotransmissores, principalmente dopamina e noradrenalina, fica alterado. Há uma alteração neuroquímica na liberação desses neurotransmissores. Dada a natureza neurobiológica do transtorno, a criança não consegue controlar os sintomas e eles ocorrem em qualquer contexto (SCHWARTZMAN, 2008 Apud ANDRADE, 2015, p. 12).
Dadas tais implicações, mas visando não generalizar os indivíduos com TDAH, é possível categorizá-los de acordo com Associação Americana de Psiquiatria (APA). O primeiro tipo é o desatento, caracterizado da seguinte forma: o sujeito não enxerga detalhes; comete erros por descuido; apresenta dificuldade em manter a atenção e em seguir instruções; evita as tarefas que exigem esforço mental prolongado; apresenta desorganização; distrai-se com facilidade e esquece-se de realizar atividades cotidianas, ainda que sejam diárias (APA, 2000). Sendo assim, pontua-se que essa categoria propende aos déficits de aprendizagem mais intensos.
O segundo tipo é o hiperativo/impulsivo. Neste caso, o indivíduo tende a ser inquieto; sente dificuldades em permanecer sentado; sobe nos móveis; não consegue manter silêncio, mas sim, fala excessivamente; intromete-se em conversas e responde perguntas antes de serem concluídas por quem as faz (APA, 2000). Percebe-se que nesse caso, ocorre o comprometimento das relações sociais.
A terceira categoria corresponde ao tipo combinado, que refere-se à junção dos dois conjuntos de critérios, os quais são: desatento e hiperativo/impulsivo (APA, 2000). Assim, é destacável que se o indivíduo apresenta os sintomas característicos dos dois tipos, há a combinação aumentada de prejuízos. Rappley (2005) relata que cerca de 80% dos indivíduos com diagnósticos de TDAH apresentam sintomas tanto de desatenção quanto de hiperatividade e impulsividade, evidenciando que na maioria das vezes, sobretudo quando se refere às crianças, o transtorno é bastante comprometedor.
Por isso, é imprescindível o diagnóstico, fundamentalmente clínico, apoiado em critérios de sistemas classificatórios como o DSM–IV-RTM e o CID-10 e em exames neurológicos. De acordo com Mattos (2014), as crianças com TDAH, principalmente antes de serem diagnosticadas de fato, são vítimas das barreiras afetivas e sociais, traduzidas em discriminação, preconceitos, rótulos e adjetivações. Essa estigmatização se dá principalmente no ambiente escolar, que é o local onde os sintomas do transtorno são ressaltados.
2.1 Implicações do TDAH no contexto escolar
Os sintomas clínicos do Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade, oriundos da disfunção neurológica, permitem a interpretação inadequada por parte dos docentes, sobretudo quando o diagnóstico é tardio, e quando considera-se que: “muitas escolas não apenas desconhecem o TDAH como também não têm o desejo ou possibilidade de participar do tratamento” (MATTOS, 2014, p. 43). Nesse ínterim, tendo em vista a prevalência do TDAH do tipo combinado, é comum que no contexto escolar ocorram as seguintes situações:
[…] Nas provas, são visíveis os erros por distração (erram sinais, vírgulas, acentos, etc.). Esquecem recados, material escolar ou até mesmo o que estudaram na véspera da prova. Tendem a ser impulsivas (não esperam a vez, não lêem a pergunta até o final e já respondem, interrompem os outros, agem antes de pensar). Dificuldades com relação a horários, frequentemente não os cumprem. É comum apresentarem dificuldades em se organizar e planejar aquilo que querem ou precisam fazer. Dificuldades com relação à escala de prioridades (ABDA, 2010, p. 1).
Diante disso, é corriqueiro que os comportamentos citados no que tange à inquietude e impulsividade sejam traduzidos como indisciplina, enquanto a desatenção pode ser facilmente interpretada como desleixo. O TDAH pode ser então, confundido como um desvio de conduta, em um local onde existe um padrão de disciplina a ser seguido.
Quando há o diagnóstico, “o aluno deve ser considerado como uma criança com Necessidades Educacionais Especiais, para que tenha garantidas as mesmas oportunidades de aprender que os demais colegas de sala de aula” (REIS, 2011, p. 8). Tal fato sugere adaptações no ambiente da sala de aula, visando mitigar o impacto dos sintomas no desempenho das atividades pedagógicas.
Diante disso, ressalta-se que a criança que apresenta as manifestações do referido transtorno, desafia diariamente a equipe escolar, tendo em vista a necessidade de maiores incentivos, propostas de intervenção e trabalhos direcionados às suas dificuldades diante do processo de aprendizagem.
3 DIFICULDADES NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM
Diante da perspectiva neurocientífica cognitiva, cujo foco está na compreensão das atividades cerebrais, a aprendizagem do ser humano não desdobra-se a partir de um simples armazenamento de dados perceptuais, mas sim de uma teia de relações no que tange ao processamento e elaboração das informações decorrentes das percepções do cérebro (CARVALHO, 2011).
Compreende-se então, que o processo de aprendizagem é complexo. Não obstante, segundo Assencio-Ferreira (2005), trata-se de uma variável condicionada por fatores orgânicos e influenciada por fatores ambientais. Logo, as dificuldades manifestam-se quando há entraves extrínsecos ou intrínsecos ao ser humano que obstaculizam o recebimento, processamento e saída de informações.
As dificuldades na aprendizagem oriundas dos fatores orgânicos ou internos são aquelas que “se originam a partir de disfunções neurológicas de origem genética ou adquirida” (SILVA; MORINO, 2015, p. 57). Ou seja, trata-se de uma situação em que o aluno apresenta um transtorno cujos sintomas afetam diretamente ou indiretamente a sua capacidade de aprender. Em contrapartida, os fatores ambientais ou externos decorrem de:
Aspectos físicos (como deficiência visual ou auditiva), emocionais (luto, separação dos pais), familiares (brigas, falta de estímulo dos pais ao conhecimento), sociais (meio ambiente cultural pobre, problemas financeiros) e aspectos escolares (professores mal preparados, falta de vínculo entre aluno e professor e entre aluno e escola) (SILVA; MORINO, 2015, p. 58).
Apesar de os fatores serem separados em dois grupos, podem coexistir, pois, a dificuldade em aprender acarretada por um transtorno específico ou não específico de aprendizagem, pode ser agravada ou influenciada por aspectos escolares negativos.
Freitas et. al. (2010) conduziram um estudo em que evidenciam os impactos dos fenômenos ambientais em uma criança que possui TDAH, indicando que no contexto escolar os problemas no processo de aprendizagem são agravados, por situações como: professores pouco treinados e sobrecarregados, escola despreparada e salas de aulas superlotadas. Logo, quando um indivíduo com um transtorno neurobiológico é vitima de um ambiente desfavorável, seus sintomas são ampliados e acabam por prejudicá-lo em seu processo de aprendizagem.
Nesse sentido, Silvestre et. al. (2016) expressam que apesar das dificuldades decorrentes do transtorno, as crianças com TDAH conseguem adquirir o aprendizado. Desse modo, é preciso que os profissionais da Educação saibam diferenciar “dificuldades” de “impossibilidade” na aquisição do conhecimento formal, pois, pessoas com TDAH apresentam inteligência e capacidade de aprendizado idênticas a de outros indivíduos que não possuem disfunções neurológicas.
Considerando tal fato e tendo em vista que, em contrapartida, os aspectos extrínsecos ao indivíduo também podem ser favoráveis ao seu desenvolvimento, pontua-se em especial, no caso do TDAH, a importância de os professores realizarem uma parceria com a equipe multidisciplinar da escola. Essa colaboração entre especialistas de diferentes áreas pressupõe o atendimento das demandas oriundas das Necessidades Educacionais Específicas dos alunos, de modo a incluí-los efetivamente nos grupos sociais e no contexto da aprendizagem.
É relevante também que os docentes busquem especializar-se em áreas, como a Neurociência voltada à Educação ou Neuroaprendizagem, uma vez que “a compreensão de como o cérebro funciona permite um melhor entendimento da aprendizagem e o consequente aprimoramento da transposição didática” (CARVALHO, 2011, p. 1). Essa formação ou cooperação com um profissional formado na área o auxiliará quanto à organização de estratégias de ensino baseadas na totalidade do cérebro.
4 A NEUROCIÊNCIA ALIADA À EDUCAÇÃO: caminhos alternativos para a inclusão escolar
O Ministério da Educação implementa o Documento Subsidiário à Política de Inclusão, que preconiza diretrizes acerca da reestruturação do sistema educacional, com o objetivo de tornar a escola um espaço democrático que acolha e garanta a permanência e o êxito de todos os alunos, independente de distinção social, étnica, deficiência e características pessoais (BRASIL, 2005).
Além desse escrito, existem outros documentos constitucionais referentes ao aperfeiçoamento dos sistemas públicos de ensino e voltados à inclusão educacional. Partindo de uma perspectiva otimista, é provável que a criação e execução de propostas legislativas com esse viés auxiliem na diminuição significativa dos atos de exclusão.
Em contrapartida, percebe-se que a existência desses materiais ocorre, pois, “a escola brasileira é marcada pelo fracasso e pela evasão de uma parte significativa dos seus alunos, que são marginalizados pelo insucesso, por privações constantes e pela baixa autoestima resultante da exclusão escolar” (MANTOAN, 2003, p. 18).
Ou seja, a inclusão é proposta porque a exclusão existe, é marcante e persiste. Nesse sentido, incluir é um desafio às escolas, que devem garantir o acesso aos conteúdos básicos, inclusive aos alunos com Necessidades Educacionais Específicas, ou seja, àqueles que apresentam quadros psicológicos, neurológicos, superdotação, condutas típicas de síndromes ou transtornos, deficientes e dentre outros. Além disso, a política de inclusão é sobre garantir o acesso e permanência desses indivíduos no ambiente escolar, respeitando a diversidade (BRASIL, 2005).
Perante esse fato, compreende-se que não é o aluno que deve adaptar-se à escola, mas sim a instituição que deve tornar-se inclusiva, moldando-se às necessidades dos alunos e flexibilizando o seu currículo. Ademais, a inclusão escolar envolve a participação ativa do aluno em sua aprendizagem e o estímulo à interação social, uma vez que:
A separação entre a aprendizagem e a integração social é artificial, pois sabemos que estes dois fatores são indissociáveis: fazer parte de um grupo implica compartilhar interesses e aprendizagens feitas no mesmo. […] Uma proposta educativa que não esteja atenta a tais questões apenas cristaliza a diferença do aluno dentro da sala regular e reforça a sua exclusão, ainda que compartilhe o mesmo espaço físico que os outros (BRASIL, 2005, p. 10).
Nessa perspectiva, é possível considerar tal afirmação relevante aos quadros de exclusão escolar de alunos com TDAH, visto que eles, além de apresentarem dificuldades no processo de ensino e aprendizagem, são habitualmente prejudicados socialmente, por causa das suas características decorrentes do transtorno (BENÍCIO; MENEZES, 2017).
Cumprir os objetivos da política inclusiva no campo educacional requer compreender uma série de fatores, principalmente neurológicos, atrelados ao transtorno, pois, diante disso, será possível melhorar as condições educacionais, e logo, estabelecer o que é preconizado na legislação vigente. À vista disso, Cosenza e Guerra (2011, p. 143) garantem que “o trabalho do educador pode ser mais significativo e eficiente quando ele conhece o funcionamento cerebral”. Isto é, considerar o funcionamento cerebral distinto na remodelação de estratégias pedagógicas é primordial para tornar a educação de crianças com NEE uma realidade.
Não obstante, tendo em vista o que é proposto pela inclusão escolar, considera-se as contribuições da Neuroeducação, pois, os achados na área têm contribuído para uma melhoria significativa na otimização das práticas inclusivas, haja vista que a Neurociência proporciona a compreensão sobre os fenômenos estruturais do funcionamento neural, enquanto a Educação cria um ambiente favorável atrelado às estratégias pedagógicas (SOUZA; MENDONÇA; BARBOSA, 2021). Logo, a combinação dessas áreas ajuda a estabelecer uma estrutura teórico-metodológica, a fim de serem testadas as melhores práticas pedagógicas inclusivas.
Para Stern (2005), a junção dos fundamentos neurocientíficos voltados à área educacional cria um instrumento de mudança do modelo educacional atual, o qual é excludente, e na maioria das vezes, insuficiente para satisfazer as necessidades específicas dos alunos, sobretudo, por não aproveitar o potencial de desenvolvimento de cada um. Apesar disso, dentro da sua própria realidade, os profissionais da Educação podem reverter esse quadro ao executarem em sua prática as metodologias estratégicas inclusivas subsidiadas pela Neuroeducação.
4.1 O TDAH sob o enfoque da Neuroeducação: estratégias metodológicas facilitadoras no contexto da sala de aula
O estudante com Déficit de Atenção/Hiperatividade apresenta dificuldades no ambiente acadêmico decorrentes das disfunções neurobiológicas. Damasceno et. al. (2021, p. 7) explica que o TDAH é: “um distúrbio do comportamento e não do aprendizado, porém como áreas importantes no aprendizado (memória e atenção) são prejudicadas, isso acaba por prejudicar o aprendizado como efeito secundário”.
Os sintomas decorrentes do transtorno, principalmente quando combinados, podem criar adversidades secundárias, afetando negativamente o desempenho escolar da criança, tornando-a parte dos excluídos do processo de aprendizagem e do meio social (DAMASCENO et. al. 2021).
As demandas educacionais, sobretudo com foco nos alunos com NEE, requerem um professor especializado; que compreenda o aluno como singular e capaz de aprender à sua maneira. Para tanto, é necessário o entendimento dos fatores neurológicos, sem o desprezo dos aspectos biológicos e sociais, os quais interagem para o desenvolvimento da aprendizagem humana (COSENZA; GUERRA, 2011). Diante disso, é importante destacar a atuação do professor do século XXI: o neuroeducador, que em posse desses saberes, torna viável o desenvolvimento de uma Pedagogia ativa, contemporânea e inclusiva.
No caso do TDAH, tendo em vista as valiosas contribuições neurocientíficas sobre o funcionamento cerebral de pessoas com o referido transtorno, é possível pontuar, de acordo com autores, as estratégias que colaboram com a eficiência da entrada, processamento e saída de informações no cérebro da criança, e que, logo, cooperam para a facilitação do movimento de inclusão escolar.
Para a entrada de informações, Brown e Dias (2017) sugerem estratégias de figura fundo visual, indicando que professor/neuroeducador pode: manter a sala limpa e organizada; ensinar o aluno a utilizar o marca texto para sublinhar informações importantes, pois o contraste de cores o auxiliará na organização e encontro dos dados relevantes; e colocar o estudante sentado próximo a ele.
Com foco na discriminação de figura fundo auditiva, Brown e Dias (2017) recomenda que o neuroeducador diminua a quantidade de ruídos no ambiente e repita as instruções das tarefas, falando pausadamente ao aluno com TDAH. Com vista a diminuir a ansiedade e o medo de esquecimento da criança, o professor deve dosar as orientações, e quando possível ordená-las no quadro.
Para melhorar a atenção, o educador pode propor atividades em que o aluno deva estar atento aos detalhes, como vagar pelo espaço escolar com o restante dos colegas, pedindo que o grupo – que inclui o estudante com TDAH, busque pequenos objetos não percebidos outrora (BROWN; DIAS, 2017). Assim, também é viável o uso de livros com ilustrações, auxiliando-o a atentar-se aos pequenos detalhes
O professor pode durante a sua aula, mencionar o nome do aluno, buscando trazer a sua atenção ao que está sendo dito, assim como também pode citar o nome de outros colegas, para evitar constrangimentos (BROWN; DIAS, 207). Ensinar os estudantes a se olharem nos olhos enquanto falam também ajuda a turma a ser gentil e inclusiva, como também auxilia o discente com TDAH a concentrar-se melhor no que está sendo dito.
Para o processamento eficiente de informações, é ideal considerar a memória, a concentração e a organização do aluno. Quanto a isso, Brown e Dias (2017) afirmam que o indivíduo com TDAH apresenta dificuldades para compreender enunciados extensos, por isso, é importante propor atividades curtas, claras e objetivas, de poucos comandos e intercalados com momentos agradáveis.
Diante disso, para a memória, é importante utilizar atividades lúdicas de interação entre os alunos, pois, esses momentos afetivos e emocionais são acompanhados da liberação de hormônios periféricos e neurotransmissores centrais e são mais lembrados do que as memórias irrelevantes ou adquiridas em estado de sonolência (MCGAUCH, 1988).
Visando colaborar com a organização, é recomendável: resumir conteúdos em tópicos; elaborar tabelas com o assunto do dia; utilizar mapas mentais e estratégias de visualização mental; utilizar material concreto (ALONSO, 2015). Conforme essa ideia, é inferível que seja estimulado o senso de organização de responsabilidades, de maneira que o aluno consiga enxergar com clareza o que constitui ordem e decência no seu cotidiano.
Acerca da saída de informações, Brown e Dias (2017) aconselham que sejam utilizadas as técnicas de respiração, pois, estas ajudam o aluno a manter a calma no momento de resposta. As autoras também contribuem informando que no caso de inquietação, pode ser oferecido ao aluno um objeto para que ele o manipule enquanto fala, pois os movimentos repetitivos, além de servirem como antiestresse, ajudam a regular o alto nível de estimulação recebido.
Alonso (2015) sugere que o neuroeducador ajude o aluno a encontrar os próprios “erros” em suas respostas, para fazer a autocorreção, e logo, sentir-se mais seguro para expressar-se. Para a expressão, é aconselhável promover rodas de conversa com assuntos interessantes que provoquem a interação e participação de todos, e concomitantemente ensine-os sobre ouvir enquanto o outro fala.
Conhecer o aluno em seus aspectos neurológicos permite o vasto conhecimento de estratégias metodológicas, mas para que estas abordagens sejam reconstruídas na perspectiva da inclusão e para que sejam facilitadoras, é preciso romper com a resistência dos professores e com os seus pré-conceitos acerca da área neurocientifica.
Segundo Fischer (2004), é nítido que eles manifestam sua resistência à área como fonte de informação; têm medo de seguir um modelo médico e patologizar as crianças. Todavia, é importante saber que as estratégias expostas, isto é, o modo que se molda o entorno da aprendizagem, influencia o crescimento de novos modelos de aprendizagem no cérebro e rompe com os antigos padrões excludentes.
5 CONCLUSÃO
O artigo aborda as contribuições da Neuroeducação para a inclusão escolar do aluno com Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade. Diante dos achados teóricos, confirma-se o alcance do objetivo proposto inicialmente, e mais do que isto: a ciência da possibilidade de que as práticas neuroeducativas podem modificar a situação de ensino e aprendizagem deficitários no Brasil.
Diante do que foi abordado, compreende-se que a aprendizagem do aluno com TDAH é primariamente dificultada por fatores orgânicos, mas, sobretudo agravadas por aspectos ambientais escolares, os quais geralmente ocorrem devido à falta de preparo dos docentes no que tange às relações de convívio e métodos de ensino incompatíveis com a neurobiologia do transtorno.
Em contrapartida, as estratégias pedagógicas quando subsidiadas pela Neurociência servem à minimização dos impactos negativos dos sintomas clínicos do transtorno no contexto escolar, haja vista a efetivação da rotina e das atividades adaptadas às capacidades do aluno, que concomitantemente, por serem bem sucedidas, sugerem que o aluno é capaz de aprender e que o seu potencial é válido. Com o aumento da sua autoestima, ele harmoniza-se consigo mesmo e com os outros, e até mesmo os obstáculos que impedem a socialização com os seus colegas de classe são transpassados.
A inclusão escolar do aluno com TDAH é, nesse sentido, viabilizada enquanto resultado da preparação do professor, que informado, reconhece o aluno enquanto um sujeito com anatomia e fisiologia cerebral singular dentro de uma diversidade de discentes. E, este é atualmente o desafio: educar em uma sala de aula heterogênea, composta por estudantes com transtornos, deficiências ou simples dificuldades, que aprendem de modos divergentes. Essa situação demanda do docente o discernimento claro acerca da relação entre linguagem, memória, atenção, emoções e aprendizagem, que decorrerá, neste caso, do acesso às redes neurais.
Por outro lado, no decorrer deste estudo, também clarificou-se a importância do diagnóstico de TDAH na infância, pois, quanto antes for identificada a condição, menos má interpretações comportamentais haverá, e menos exclusão. A intervenção neuropedagogica poderá ser mais assertiva e logo, serão minimizadas as chances de prejuízo na aprendizagem e interação social. Seguir as políticas de inclusão baseando-se nos fundamentos neurocientíficos é uma alternativa de transformação do espaço escolar em um ambiente democrático, acolhedor e propício à aprendizagem eficiente.
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1Graduada em Pedagogia pela Universidade Potiguar (2020). Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional (2020) e Neuroaprendizagem (2021) e Pós-graduanda em Gestão e Coordenação Pedagógica. Atualmente é técnica na Secretaria Municipal de Educação como coordenadora do Tempo Integral no município de São José de Mipibu/RN. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Orientação Educacional.