CONFLITIVIDADE NA ESCOLA: UM DESAFIO EDUCACIONAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102410161206


Antonio Petronio Lopes de Oliveira


Resumo

Por entender que o conflito faz parte da interação humana, desde os seus primórdios, e que tal fenômeno acontece naturalmente independente de aspectos geográficos, culturais, políticos, religiosos e afins, o presente artigo realiza um levantamento bibliográfico sobre a temática do conflito e sua existência dentro do espaço escolar, assim como o posicionamento possível da escola através de ações e programas direcionados sobre a temática. Trata ainda sobre os tipos de conflito, seus níveis de percepção e a visão que se tem acerca dele, à luz de autores e obras relevantes.

Palavras-chave: Conflito. Escola. Desafio Educacional.

Abstract

Understanding that conflict has been part of human interaction, since its beginnings, and that this phenomenon occurs naturally regardless of geographic, cultural, political, religious and similar aspects, this article carries out a bibliographical survey on the subject of conflict and its existence within the school space, as well as the possible positioning of the school through actions and programs focused on the topic. It also deals with the types of conflict, their levels of perception and the vision we have about it, in the light of relevant authors and works.

Keywords: Conflict. School. Educational Challenge.

Introdução

Viver em sociedade significa viver em constante situação de conflito. Ele está presente no nosso cotidiano. Faz parte da atividade social, seja ela contemporânea ou primitiva. Ele está vinculado à diferença de interesses entre os indivíduos.

Redorta (2004) citado por Chrispino e Chrispino (2011, p. 38) traz um panorama sobre o conflito na visão de alguns célebres autores:

  • Freud: destaca o conflito entre o desejo e a proibição, expresso pela repressão e a defesa e sintetizado na luta pelo dever;
  • Darwin: destaca o conflito o sujeito e o meio, expresso pela diferenciação e adaptação e sintetizado na luta por existir;
  • Marx: destaca o conflito entre classes sociais, expresso pela estratificação social e hierarquia e sintetizado na luta pela igualdade;
  • Piaget: destaca o conflito nas decisões e experiências, expresso na aprendizagem e resolução de problemas e sintetizado na luta por ser.

A escola, por ser um dos primeiros espaços sociais de grande interação para os seres, torna-se assim palco para as mais diversas manifestações conflitivas. Não à toa, nos últimos anos, muitos estudos têm se debruçado sobre a análise, reflexão e estudo dos conflitos no ambiente escolar.

A tese que defendemos é a de que a escola se tornou de massa e passou a abrigar alunos diferentes, com inúmeras divergências. Habituada a lidar com iguais, a escola não se preparou para essa diversidade de alunos. Por isso, surgem antagonismos que se transformam em conflitos e que podem chegar aos extremos da violência (Chrispino e Chrispino, 2011, p. 8).

O presente trabalho busca, através da revisão bibliográfica de obras relevantes que versam sobre a conflitividade num âmbito geral e de sua existência no cotidiano do espaço escolar, situar a escola e seus agentes, bem como o currículo utilizado, no bojo da discussão sobre a atuação destes em face do conflito, inerente às relações sociais.

O Conflito

A palavra conflito, tradicionalmente, é vinculada a aspectos negativos. As pessoas tendem a usar essa expressão sempre que desejam ilustrar um embate doloroso e sofrível com o qual estejam lidando. Isso porque parte-se do pressuposto de que num conflito obrigatoriamente haverá apenas um vencedor.

 Jansen (2017, p.1) assim define:

Um conflito fica caracterizado quando duas partes, ou mais, descobrem que suas posições são incompatíveis e que, se um lado alcançar seu objetivo, bloqueia os objetivos da outra parte. Um conflito é uma disputa que surge sempre que as ações de uma pessoa interferem nos objetivos da outra.

Na mesma direção de entendimento, Glinow e McShane (2014, p. 289) afirmam sobre o conflito que:

Ele pode ocorrer quando uma parte obstrui outra de alguma forma na busca de seus objetivos ou simplesmente quando uma parte percebe a situação dessa maneira. Em última análise, o conflito se baseia em percepções; ele existe sempre que uma parte acredita que a outra pode obstruir seus esforços, independentemente desta pretender de fato obstruí-la ou não.

Pickering (2002, p.2) complementa a ideia de conflito ao alegar que “Na essência, o conflito existe quando duas ou mais respostas ou cursos de ação divergentes para um único evento são considerados. O conflito não implica necessariamente hostilidade, embora a hostilidade possa fazer parte da situação.”.

É fato que desde os primórdios o homem busca defender seus interesses e necessidades. E que a vida em sociedade trouxe, como consequência, choques e divergências entre os indivíduos. Pode-se assim dizer que os conflitos estão intrinsecamente ligados ao início da sociedade. De acordo com essa premissa os conflitos são, portanto, inevitáveis (Pickering, 2002).

Folger e Bush (2008) preconizam a compreensão de que a experiência do contato com o outro, e os impactos que esta produz, são a base da relação humana. Relação esta que se constitui o cerne dos conflitos.

Viver na sociedade moderna é viver em constante cenário de conflitos. Sobre isso Pickering (2002, p. 3) alerta:

O potencial de conflito continuará crescendo exponencialmente conforme o ritmo de nossa sociedade continuar sendo acelerado. Com avanços tecnológicos explosivos, vem uma avalanche de mudanças. As mudanças trazem incertezas, medo e desconforto, o que é um solo fértil para o conflito.

Thomas (1992) caracteriza que para haver o conflito são necessários três aspectos presentes:

  • O conflito deve ser percebido por uma ou ambas as partes. Se não houver percepção, mesmo que exista um cenário iminente, ele não se concretizará;
  • É necessário que haja interação entre as partes, seja física ou virtual;
  • Deve existir incompatibilidade entre as partes, ou seja, quando os interesses são opostos ou excludentes.

Figura 1 – Aspectos necessários para o conflito

Como visto até aqui, grande parte das definições sobre o conflito trazem a ideia do embate ou ruptura e por isso, naturalmente, tendem a despertar nas pessoas a sensação de que sempre se tratará de algo ruim.

Não obstante, durante um tempo não houve a preocupação com o gerenciamento dos conflitos, mas na busca por eliminá-lo do contexto. Nos últimos anos a percepção sobre a forma como os conflitos devem ser encarados adquiriu outro viés.

Para Jansen (2017) a maneira como o ser encara os conflitos é que irá determinar sua resposta ao mesmo. Encarar a discordância como algo inapropriado só deixará o indivíduo constrangido e sem saber como lidar com a situação, acarretando numa reação de negacionismo e/ou fuga.

Na visão de Rodríguez e Serrano (1993), a despeito do conflito ser um encontro de forças em direções convergentes e sentidos opostos, pode-se buscar desse encontro uma gerência produtiva com o intuito de obter algo positivo da situação.

Os tipos de conflitos

Pickering (2002) identifica os conflitos em três categorias:

  • Conflitos internos – Caracterizado pela desordem que surge em uma pessoa. Tais conflitos causam uma desarmonia emocional para o ser, pois fazem com que os valores, objetivos sejam alterados para atenderem certa circunstância num nível que vai além da sua região de conforto, ou até mesmo quando tais elementos conflitam entre si;
  • Conflitos interpessoais – São os experimentados entre os indivíduos. Geralmente desencadeados quando uma, ou mais, das necessidades psicológicas elementares do ser humano são violadas. A saber: necessidade de ser valorizado, necessidade de estar no controle, necessidade de ter autoestima e necessidade de ser coerente;
  • Conflitos grupais – São os conflitos que envolvem várias pessoas. Os envolvidos nestes conflitos, além de terem que lidar com seus questionamentos internos e com os de um terceiro, ainda precisam vivenciar os embates gerados pela interação de todos no grupo.

Berg (2012) também classifica os tipos de conflitos em três categorias, à semelhança de Pickering, tendo diferenciação em algumas de suas nomenclaturas. São eles:

  • Conflitos pessoais – como a pessoa lida consigo mesma e suas inquietações;
  • Conflitos interpessoais – ocorre entre indivíduos e quando estes encaram uma situação de forma diferente;
  • Conflitos organizacionais – como resultado das dinâmicas organizacionais que estão em constante mudança.

Burbridge e Burbridge (2012) classificam os conflitos como sendo:

  • Conflitos internos – tem como cerne o conflito entre as pessoas e figura como o mais complexo porque os protagonistas estão supostamente do mesmo lado;
  • Conflitos externos – acontecem com outras corporações, entes governamentais ou apenas outro indivíduo. Considerados os tipos mais fáceis de gerir.

Figura 2 – Definições sobre os tipos de conflitos

As visões do conflito

Como visto anteriormente, os conflitos nem sempre foram encarados como algo que pudesse resultar em aspectos positivos para os envolvidos. Tradicionalmente a visão de conflito era permeada pela ideia do embate, do confronto e da ruptura.

Robbins (2002) apresenta três visões para a abordagem dos conflitos:

  • Visão tradicional – o conflito é encarado como algo ruim e por isso deveria ser evitado a todo custo. Trazia a ideia de ser o resultante de falhas de comunicação e ausência de confiança entre os indivíduos, acarretando num aspecto negativo para o processo administrativo. Essa visão prevaleceu nas décadas de 1930 e 1940;
  • Visão de relações humanas – preconiza que o conflito deve ser entendido como algo natural e inevitável por existirem seres com valores, ânsias e atitudes distintas atuando num mesmo espaço. Ou seja, os conflitos são próprios da relação social e por isso não devem ser vistos como algo ruim. Podem inclusive servir como força propulsora para a produtividade do grupo. Essa abordagem prevaleceu de 1940 até 1970, sendo que algumas corporações ainda a utilizam nos dias de hoje;
  • Visão interacionista – a visão mais vigorante atualmente nas organizações. Ela encara o conflito não apenas como um aspecto positivo, mas necessário para uma performance eficaz do grupo. Entende-se que a conflitividade deve ser inclusive alimentada no grupo, de forma comedida, pelos gestores, para com isso oportunizar a criatividade e produtividade da equipe.

Figura 3 – As visões do conflito

Os níveis do conflito

Como já mencionado, o conflito, sob a ótica da visão de relações humanas, é algo inevitável. Chiavenato (2004, p.416) afirma que “[…] o administrador precisa conhecer a respeito de suas possíveis soluções ou resoluções. A solução de um conflito passa quase sempre pelo exame das condições que o provocaram”.

Chiavenato (2004) também vislumbra que o conflito possuí níveis de gravidade:

  • Conflito percebido – quando os envolvidos percebem e identificam a existência do conflito, sentindo assim que seus objetivos diferem e que existe a possibilidade de interferência e/ou bloqueio por parte do outro. É também chamado de conflito latente;
  • Conflito experienciado – quando os indivíduos já experimentam emoções e sentimentos que vão desde o medo, passando pela hostilidade e descrédito, podendo chegar na raiva propriamente dita. Por não ser manifestado e externado com clareza ele é também chamado de conflito velado;
  • Conflito manifestado – como o próprio nome sugere, é aquele que é expressado por comportamentos e percebido, inclusive, por terceiros. As atitudes dos envolvidos ganham caráter de interferência, seja ativa ou passiva. É conhecido por isso como conflito aberto.

O conflito na escola

A escola é um lugar de coexistência de várias classes sociais, diferentes raças, concepções religiosas e/ou políticas díspares.

Nesse sentido, pode-se apontar que é ali onde se refletem as diferentes dinâmicas de interação e convivência estabelecidas pela sociedade, pela família e pelo próprio indivíduo, por meio das atitudes e ações de alunos, professores e diretores pedagógicos. São formadas as subjetividades com as quais os alunos desenvolvem seu cotidiano dentro e fora da sala de aula (Gutiérrez-Torres e Buitrago-Velandia, 2019, p. 171).

Justamente pelo exposto acima é que a escola se constitui espaço inerente às manifestações dos mais variados conflitos. Também pelo mesmo motivo é vital que se compreenda o conflito como algo inevitável e até mesmo como fator relevante dentro do processo de ensino e aprendizagem, para que a partir dessa concepção, possa-se utilizar dos conflitos como oportunidades para o aprendizado individual e/ou grupal.

Com base nessa premissa, a gestão de conflitos na escola torna-se algo vital.

Assim, estão em desenvolvimento abordagens que procuram respostas e eficácia na ação construtiva na gestão dos conflitos. Trata-se de uma área em evolução no contexto educativo, dado ser um campo particularmente pertinente para as escolas devido ao papel formativo e educativo que as mesmas assumem na vida de todos os atores que nelas participam (O, Monteiro e Lourenço, 2016, p. 3).

A educação para resolução de conflitos

O presente estudo expôs até aqui vários aspectos quanto a concepção de conflito, suas mais variadas manifestações e níveis, quanto aos seus deflagradores e a ideia de que ele é inerente e até normal em ambientes de convivência e interação humana. Também explicitou que na escola, por ser um microcosmo que veio evoluindo e espelhando a sociedade do nosso país e seus problemas ao longo dos anos, estes conflitos impactam diretamente no processo de ensino-aprendizagem, bem como na formação plena do ser. Por tudo isso, abordar uma educação que se preocupe com a resolução de conflitos passa a ser algo de suma relevância.

Pereira e Quadros (2016, p. 3) apontam que:

Estamos vivendo uma realidade em que nos deparamos com uma cultura de violência que se faz avassaladora nos modos de interagir nos indivíduos e a qual as escolas em geral atualmente se enquadram. Para tentar frear um pouco essa situação é necessário desenvolver uma educação para uma boa convivência entre as pessoas e para uma gestão positiva de conflitos, para que assim possamos construir uma cultura pela paz, de verdadeira cidadania, tornando o ambiente escolar um lugar de convivência saudável entre todos os membros da comunidade escolar

Jones e Kmitta (2000) destacam 5 objetivos almejados pela ERC (Educação para Resolução de Conflitos):

  • Conceber ambiente de aprendizagem salutar através da redução da violência e de comportamentos que possam desencadeá-la;
  • Criar um ambiente que zele pela aprendizagem construtiva por intermédio das boas relações, fomentação das práticas de tolerância e respeito, com redução potencial do clima punitivo e autoritário na escola;
  • Aprimorar a gestão de sala de aula de forma que o tempo desperdiçado com questões disciplinares seja minimizado ao máximo;
  • Fortalecer nos estudantes os aspectos emocionais e sociais para que estes tenham a autogestão de conflitos e até mesmo participem de forma ativa na construção de inciativas e programas de ERC dentro da escola;
  • Oportunizar a criação de uma comunidade que reaja de forma construtiva diante dos conflitos através de maior participação dos pais e comunidade escolar em geral nos assuntos escolares.

Nunes Sobrinho (2009) citado por Aquino (2016, p. 21), no que tange a ideia de fortalecer os aspetos de autogestão nos alunos, defende a ideia do autocontrole comportamental como importante ferramenta na modificação da conduta dos discentes e, consequentemente, uma minimizadora em potencial das situações conflitivas na escola.

[…] a proposta do ensino do autocontrole cognitivo-comportamental implica, resumidamente, ajudar alunos no aprendizado do controle do comportamento, assim como torná-los envolvidos nas próprias mudanças cognitivas, emocionais e no crescimento pessoal. A meta é que sejam incluídos e que desenvolvam habilidades de autocontrole, autodeterminação, e que conquistem, gradualmente, o direito de exercício da cidadania.

A prática da mediação de conflitos, apesar de não ser algo novo, desponta como uma das principais ferramentas auxiliadoras na busca por essa escola que gerencia de forma construtiva as conflitividades.

Sobre isso, Ramos, Almeida e Paiva (2017, p. 135), preconizam:

A ideia de utilização da mediação de conflitos configura um ambiente de pacificação social em vista da construção de uma cultura de paz na escola. As práticas de restauração são formas de gerenciar conflitos por meio das quais um facilitador auxilia as partes envolvidas a realizar um processo dialógico com o objetivo de transformar uma relação de resistência em uma relação de cooperação.

A mediação, enquanto ferramenta de busca pela construção de uma relação cooperativa, também reforça a tentativa “[…] de restituir (ou manter) os laços de solidariedade mínima que caracterizam os cidadãos, uma vez que, passado o momento do conflito, […] os alunos voltarão a conviver no mesmo espaço” (Chrispino e Chrispino, 2011, p. 63).

A formação dos professores para resolução de conflitos

Se fica clara a importância de uma educação para resolução de conflitos na busca de uma escola cidadã e pacífica, e o quão importante é nesse processo o uso da técnica de mediação, não se pode relegar a atuação dos docentes, peças fundamentais, nessa missão.

Os conflitos entre estudantes na escola acontecem o tempo todo; é comum que eles se desentendam nas brincadeiras e nos jogos, o que não quer dizer que seja aceitável que os docentes deixem de atuar nessas ocasiões, intervindo para oferecer alternativas de comportamento, ou que deixem de aproveitar os conflitos para ajudar os estudantes a desenvolver a empatia e o respeito por si e pelos outros (Pereira, 2010, p. 53).

Ou seja, os docentes precisam estar preparados para lidar com as conflitividades e, acima de tudo, saberem usar essas manifestações de forma construtiva.

No entanto, não se pode ignorar o viés de que alguns dos conflitos citados e descriminados aqui também possuem causas deflagradoras que podem ser associadas a história de vida do educador envolvido nesses casos, bem como a formação pela qual ele passou.

Esta atitude, a meu ver, estaria localizada na formação dos educadores através de um currículo que leve em conta as mazelas dos conteúdos ocultos. Para isso é preciso também que um processo de autorreflexão seja implantado na formação, capacitação e cotidiano dos educadores, para que não lhes fuja o domínio sobre suas ações (Cruz, 2002, citado por Aquino, 2016, p. 19).

Garcia (2008) citado por Aquino (2016) também salienta que enquanto a formação inicial dos docentes for carente de uma atenção especial quanto a sua capacitação para o enfrentamento de situações conflitivas nas escolas, é vital que este tema esteja presente nas formações continuadas, promovidas por escolas ou sistemas públicos de ensino.

Lopes e Gomes (2012) citados por Aquino (2016, p. 20) complementam a ideia sobre a importância da formação continuada como retificadora do déficit da formação inicial dos professores no que tange as conflitividades escolares:

Para tanto, se faz necessário uma educação continuada dos educadores, sobretudo daqueles que atuam na regência de turma, para aprofundar estudos dos porquês e adquirir segurança, a fim de aplicar os meios eficazes para a mediação das situações de indisciplina na sala de aula, que constituem barreiras ao processo de aprendizagem. A educação para a paz deve ser uma busca contínua.

Currículo de resolução de conflitos

Na busca de uma escola pacífica, não se pode esperar que apenas um programa de mediação de conflitos, aliado a formação, seja inicial ou continuada, dos professores seja o suficiente para alcançar resultados perenes.

Chrispino e Chrispino (2011), traçando um breve histórico sobre solução de conflitos e mediação escolar, comentam as experiências das cidades de São Francisco e Nova York.

Em São Francisco, no ano de 1982, foi criado o programa Conflict Resolution Resources for School and Youth. Esse programa elaborou currículos específicos para as diversas séries.

Em 1985 foi a vez da cidade de Nova York criar o Resolving Conflict Creatively Program, que também consistia no desenvolvimento de um currículo para a resolução de conflitos.

Os objetivos do programa nova-iorquino eram:

  • Apresentar alternativas não violentas para a resolução dos conflitos;
  • Desenvolver habilidades que possibilitassem aos alunos a resolução dos conflitos utilizando alternativas não violentas;
  • Promover a compreensão da própria cultura e de culturas diferentes, por parte do aluno;
  • Destacar o papel determinante que os educandos têm na criação de uma sociedade pacífica.

A introdução do tema mediação de conflitos no currículo é a oportunidade de verbalizar uma questão e tornar claro o que se espera do jovem no conjunto de comportamentos sociais. De outra forma, é dizer ao jovem e à criança que suas diferenças podem se transformar em antagonismos e que, se estes não forem entendidos, evoluem para o conflito, que deságua na violência. Cabe ressaltar que esse aprendizado e essa percepção social, quando ocorrem com o estudante, são para sempre (Chrispino e Chrispino, 2011, p. 72).

Pelo mundo afora, vários países também introduziram programas com o mesmo intuito: criar um currículo que prestigiasse a cultura para resolução de conflitos.

Formar os (as) alunos (as), desenvolver sua personalidade, fazê-los (as) conscientes de suas ações e das consequências que acarretam, conseguir que aprendam a conhecer melhor a si mesmos (as) e às demais pessoas, fomentar a cooperação, a autoconfiança e a confiança em suas companheiras e seus companheiros, com base no conhecimento da forma de agir de cada pessoa, e a beneficiar-se das consequências que estes conhecimentos lhes proporcionam. A realização destes objetivos leva a formas de convivência mais satisfatórias e a melhoria da qualidade de vida das pessoas, qualidade de vida que não se baseia no consumo, e sim em gerir adequadamente os recursos mentais… intelectuais e emocionais – para alcançar uma convivência humana muito mais satisfatória (Sastre e Moreno, 2002, p. 58).

Considerações Finais

Como exposto no presente artigo, é utópico idealizar a escola, espaço de múltiplas interações e conexões sociais, como um lugar que deva ser isento de conflitividade. Assim como errôneo e infrutífero objetivar a eliminação dos conflitos como sendo esta a meta para construção de um ambiente pacífico.

O conflito é um elemento conatural da vida pessoal; não é necessariamente negativo, dependendo do modo como é enfrentado, gerido e resolvido, seguramente causa sofrimento, mas pode ser ocasião de crescimento e mudança, pessoal e coletiva. Para isso é necessário reconhecer os conflitos e não removê-los, ou fazê-los emergir, quando são latentes, mas constituem um problema real ao menos para uma das partes. Também a paz não é ausência de conflitos, nem apenas ausência de guerra, mas ausência da violência em todas as suas formas (GUIMARÃES, 2005, p. 70).

É na consciência do significado do conflito, dos seus tipos, dos seus níveis e das visões que se tem sobre ele que a escola poderá lidar de forma construtiva, adotando um currículo adequado e auxiliando na formação de todos os agentes envolvidos – docentes, discentes, comunidade, funcionários e etc. – para a construção de uma cultura de paz.

Não a paz que vê no conflito sua antítese perigosa que precisa ser anulada, mas a paz que aprende com as situações e as usa a seu favor, oportunizando aos seus atores principais instrumentalizarem-se de ferramentas que os capacite em suas jornadas pessoais e interpessoais.

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