REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10637129
Cirlene Benvindo de Souza¹
RESUMO: No mundo globalizado, as constantes mudanças na sociedade e nas formas de comunicação apontam novos caminhos para o ensino. Estamos vivenciando novos hábitos, novos valores e novas formas de interação principalmente com as tecnologias digitais. Com isto, percebe-se uma multiplicidade de canais de comunicação e uma grande diversidade cultural e linguística que precisa ser considerado no processo de ensino e aprendizagem. Em se tratando da educação infantil, compreender processos cognitivos e multiletramentos é um desafio, tendo em vista, que nesta faixa etária, as crianças estão em desenvolvimento integral em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social. Partindo da premissa de que a temática da cognição e multiletramento são elementos fundamentais para avançar no processo de ensino e aprendizagem e que há dificuldades na compreensão e até mesmo a falta de conhecimento da aplicação desses conceitos, o presente artigo tem como objetivo compreender os conceitos e quais as contribuições da utilização da Pedagogia dos Multiletramentos na aprendizagem das crianças de Educação Infantil. O presente artigo é fruto da revisão bibliográfica de literatura, base que sustenta qualquer pesquisa cientifica de natureza qualitativa. Neste sentido, foram utilizados artigos e teses de autores que embasam os conceitos trabalhados sobre aspectos pedagógicos que envolvem a cognição e aprendizagem, multiletramentos no contexto da sala de aula e desafios e considerações da integração da cognição e do multiletramentos no contexto da educação infantil.
Palavras-chave: Educação infantil, Cognição, Multiletramentos, Integração.
1. Introdução
As constantes mudanças na sociedade e nas formas de comunicação apontam novos caminhos para o ensino. Estamos vivenciando novos hábitos, novos valores e
novas formas de interação principalmente com as tecnologias digitais. Com isto, percebe se então, que há uma multiplicidade de canais de comunicação e uma grande diversidade cultural e linguística. E isto requer pensar em inovações nos processos de ensino e aprendizagem.
Entender os aspectos cognitivos no processo de ensino e aprendizagem e as múltiplas linguagens (multiletramentos) que se dá na Educação Infantil tem sido um desafio, tendo em vista que nesta etapa as crianças estão em desenvolvimento e ao mesmo tempo em constante contato com a multiplicidade de comunicação, com as diversidades culturais e linguísticas.
Cognição e multiletramentos são dois conceitos que no processo de ensino estão intimamente interligados, enquanto a cognição está relacionado a forma como o individuo aprende, multiletramentos diz respeito aos múltiplos modos de expressão, a diversidade cultural e a linguística. Cognição está relacionada à capacidade de processar informações disponíveis no mundo em que vivemos e transformá-la em conhecimento através de um conjunto de habilidades mentais ou cerebrais, significa dizer que na prática educativa precisamos proporcionar e disponibilizar informações através das múltiplas linguagens presente na sociedade e estimular as crianças a aprender a partir das vivencias. A cognição é a interpretação que o cérebro faz de todas as informações captadas do meio através dos sentidos, é nesse processo que desenvolvemos a aprendizagem e construímos conhecimentos. Multiletramentos tem como objetivo ampliar os métodos de ensino por meio de atividades que integrem as novas tecnologias, a globalização e a internet. Ou seja, é preciso integrar na prática educativa, aspectos da linguagem da realidade contemporânea. Para Rojo (2012)
no mundo contemporâneo, os cidadãos circulam por diferentes espaços entre esferas públicas e privadas, profissionais e pessoais. Essa circulação demanda variadas maneiras de interagir, o que impõe uma flexibilidade cultural e de linguagem. Os multiletramentos seriam letramentos para essa sociedade contemporânea, preparando os alunos para transitarem por entre os diversos espaços e situações do mundo globalizado. O multiculturalismo reconhece que a interação social varia culturalmente. As realidades locais e suas interferências por conta da globalização e fluxos de informação se traduzem em uma multiplicidade de espaços sociais, nos quais diferentes identidades e realidades circulam (ROJO, 2012).
No contexto pedagógico da sala de aula, Rojo (2012), em Multiletramento na Escola propõe a adoção em sala de aula de práticas situadas, instrução aberta, enquadramento crítico e prática transformadora. Para a autora, a proposta didática sustentada em critérios de análise crítica é “de grande interesse imediato e condiz com os princípios de pluralidade cultural e de diversidade de linguagens envolvidas no conceito de multiletramentos”.
No que diz respeito a Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, compreender como as crianças aprendem e constroem conhecimento é um desafio, tendo em vista que nesta etapa as crianças estão em fase de desenvolvimento. E é na Educação Infantil também, que essas crianças aprendem a se relacionar e viver em sociedade, e são estimuladas a desenvolver habilidades fundamentais para formação humana, além das capacidades cognitivas e motoras a partir das vivencias do cotidiano familiar e escolar.
Neste sentido, a BNCC, afirma que
ao acolher as vivências e os conhecimentos construídos pelas crianças no ambiente da família e no contexto de sua comunidade, e articulá-los em suas propostas pedagógicas, têm o objetivo de ampliar o universo de experiências, conhecimentos e habilidades dessas crianças, diversificando e consolidando novas aprendizagens, atuando de maneira complementar à educação familiar – especialmente quando se trata da educação dos bebês e das crianças bem pequenas, que envolve aprendizagens muito próximas aos dois contextos (familiar e escolar), como a socialização, a autonomia e a comunicação (BRASIL 2018).
Sendo assim, o que se propõe na BNCC da Educação Infantil não foge do contexto da aprendizagem com as múltiplas linguagens presente no ambiente social do qual as crianças estão inseridas. Trazer os multiletramentos para o contexto da sala de aula implica observar novas formas de comunicação e interação em função da digitalidade e as diversidades culturais e linguísticas.
2. Metodologia
Para a compreensão do conceito e relações entre cognição e multiletramentos foi realizado como método de pesquisa, uma revisão bibliográfica do google acadêmico, scielo, livros físicos e PDF, base que sustenta qualquer pesquisa científica, e a metodologia utilizada condizem a análise qualitativa.
Neste sentido foram utilizados artigos e teses de autores que embasam os conceitos trabalhados sobre os aspectos pedagógicos que envolvem a cognição e aprendizagem, multiletramentos no contexto da sala de aula e por fim a integração desses saberes no âmbito da educação infantil, a saber: BRASIL (2018), DCNEI (2010), GNL (1996), GUNTHER KRESS (2003), HOWARD GARDNER (1983), JAMES PAUL GEE (1990; 2015), LORIS MALAGUZZI (1987;1993), MARY KALANTZIS E BILL COPE (2000), ROJO (2012), ROJO (2010), SANTOS (2021), SILVA (2016), entre outros.
3. Congnição na aprendizagem da Educação Infantil
Para entendermos como construir aprendizagem na educação infantil, é fundamental compreendermos o aspecto da cognição. A cognição é uma função psicológica que age na aquisição e construção do conhecimento, diz respeito a maneira como o cérebro percebe, aprende, pensa e recorda determinado conhecimento que é captado pelos sentidos. Sendo assim, na Educação Infantil, é preciso considerar o desenvolvimento cognitivo da criança, ou seja, a evolução da criança no processamento de informações no cérebro, pois à medida que a criança vai se desenvolvendo vai se tornando mais capaz de adquirir, fixar e utilizar os conhecimentos das situações do meio que vive no dia a dia. Considerar os aspectos cognitivos é fundamental para a aprendizagem infantil e sua estimulação através de atividades que desenvolva o raciocínio, a atenção, a concentração, memória, linguagem, senso crítico, solução de problemas, criatividade são extremamente importante para o desenvolvimento infantil.
Não obstante, o desenvolvimento cognitivo está relacionado ao desenvolvimento linguístico, ou seja, a aquisição e construção do conhecimento e de formas de resolver situações problemas que se dá através de um conjunto de processos mentais que envolvem a percepção, atenção, memória, raciocínio e imaginação, aspectos que podem ser estimulados através das praticas pedagógicas na Educação Infantil.
A educação infantil é a etapa do desenvolvimento humano em que a pessoa está mais apta a aprender novos conhecimentos e novas habilidades de forma acelerada. Sendo assim, a educação infantil, primeira etapa da educação básica que compreende as etapas de creche e pré-escola é o primeiro espaço social em que as crianças têm contato longe do convívio familiar para se incorporar em a uma situação de socialização estruturada, na qual as crianças devem ser estimuladas a desenvolverem-se de forma integral os aspectos cognitivos, motor e afetivo. É no contexto da sala de aula que as crianças têm contato com outras formas de linguagens.
As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNEI 2010) define a criança como
sujeito histórico e de direitos, que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2010).
Portanto, é um sujeito que na sua vivencia em família e comunidade possui e tem contato com as múltiplas formas de linguagens do cotidiano. É esse contexto que se faz presente na aprendizagem das crianças da educação infantil.
De acordo com as DCNEI 2010, no Artigo 9º, os eixos estruturantes das práticas pedagógicas da Educação Infantil são “as interações e a brincadeira”, a qual é desenvolvida experiências em que crianças podem construir e apropriar-se de conhecimentos por meio de suas ações e interações criança x criança e criança x adulto, o que possibilita aprendizagens, desenvolvimento e socialização. É neste contexto que se considera a importância do desenvolvimento cognitivo das crianças partindo da realidade social, da interação com meio e das experiências. Neste sentido, “ao observar as interações e a brincadeira entre as crianças e delas com os adultos, é possível identificar, por exemplo, a expressão dos afetos, a mediação das frustrações, a resolução de conflitos e a regulação das emoções” BRASIL, 2018.
Ao tratar do desenvolvimento cognitivo e a aprendizagem das crianças da educação infantil, a BNCC estabelece os direitos de aprendizagens e desenvolvimento (conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se), que podemos destacar como aspectos que “asseguram as condições para que as crianças aprendam em situações nas quais possam desempenhar um papel ativo em ambientes que as convidem a vivenciar desafios e a sentirem-se provocadas a resolvê-los, nas quais possam construir significados sobre si, os outros e o mundo social e natural” (BRASIL, 2018).
Partindo da premissa de que as interações e brincadeiras são eixos estruturantes da pratica pedagógica e que compõem o currículo da Educação Infantil, o desenvolvimento da cognição e da aprendizagem são garantidas na BNCC e estimuladas através de praticas pedagógicas norteadas pelos direitos de aprendizagem e desenvolvimento. Portanto, desenvolver a cognição faz parte da prática cotidiana dos profissionais da educação infantil.
3.1 Multiletramentos no contexto da Educação Infantil
As sociedades em geral estão inseridas em um contexto global em que há processo desenfreado de avanços tecnológicos, munidos em um discurso de inovação para o desenvolvimento econômico, social, cultural e politico, o qual exige de nós uma constante atualização para acompanhar os meios e produtos advindos desses avanços. Paralelamente, a globalização por si só promove as transformações sociais, culturais, politicas e econômicas. E nessa ação acelerada de um mundo globalizado, tem-se a necessidade de promover a expansão das tecnologias de informação e comunicação por meio da interação entre as diferentes culturas. Diante desse contexto, a escola pública, como uma instituição que tem o papel de preparar os alunos para o exercício pleno da cidadania, é a principal ferramenta mediadora do contato com as novas tecnologias e novas culturas, que pode propiciar uma visão critica e analítica a cerca do mundo e das transformações que temos vivido na atualidade. Para Santos (2021)
trazer para as escolas esses recursos desde a primeira infância, período correspondente aos seis primeiros anos de vida da criança, aproxima o aluno de situações reais e cotidianas de interação, sendo esta pedagogia capaz de estimular o processo de ensino e aprendizagem no desenvolvimento motor, social e cognitivo, despertando a criatividade, lançando mão de tecnologias da cultura digital no contexto escolar, o que, para Gomes (2012), é visto como ferramenta que pode influenciar a formação em vários aspectos, incluindo raciocínio matemático, desenvolvimento da linguagem, entre outros (SANTOS, 2021 p. 3).
Neste sentido discutir multiletramentos na educação infantil constitui um desafio de compreensão na prática docente que atua nesta etapa da educação básica. A medida que a BNCC estabelece como eixos estruturantes da pratica pedagógica as interações e brincadeiras e destaca os direitos de aprendizagens e desenvolvimento, é preciso compreender o lugar dos multiletramentos na pratica pedagógica, tendo em vista que as crianças também estão tendo contato cotidianamente com as multiplicidade de comunicação, tendo acesso as diversas tecnologias disponíveis e por vezes crescem e adquiri maturidade nesse contexto das múltiplas linguagens. É preciso questionar: quais possibilidades de aprendizagens com multiletramentos na educação infantil?
Cotidianamente estamos refletindo sobre praticas de ensino e de alfabetização. A pedagogia dos multiletramentos traz a perspectiva e a necessidade de acompanhar as transformações e dinâmica da realidade no mundo globalizado. Principalmente pela presença das tecnologias de informação e comunicação e uso cada vez maior de mídias sociais nos diferentes contextos da vida humana, isto nos faz refletir novas formas de comunicação e demandas de sociabilidade. Por esse motivo, precisamos estar preparados para interpretar contextos diversos, que considerem a pluralidade de expressões, formatos e conteúdos.
Segundo Rojo (2010, p. 12):
A pedagogia dos multiletramentos deve partir das práticas situadas dos alunos, que fazem parte dos seus interesses, repertórios e modos de vida, para, por meio de instrução aberta, criar consciência e possibilidades analíticas – uma metalinguagem – capazes de ampliar repertório e relacionar essas a outras práticas de outros contextos culturais. Isso não se faz sem um enquadre crítico necessário para se provocar práticas transformadas (ROJO, 2010).
Neste sentido é preciso pensar no processo de ensino e aprendizagem contemplando o letramento digital, as diversas culturas e as diferentes linguagens com a formação dos profissionais da educação que lida diretamente na prática do ensino considerando as realidades do ambiente em que se está inserido.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2018), documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, propõe considerar novas práticas sociais, como a cultura digital, os multiletramentos e os novos letramentos, junto aos letramentos compreendidos como locais e/ou valorizados.
Em se tratando da Educação Infantil, multiletramentos parece muito amplo, mas é preciso considerar que estes sujeitos também fazem parte do mundo em transformações e estão cada vez mais envolvidos considerando a diversidade de linguagens e toda a pluralidade presente nas culturas que direta ou indiretamente interfere na formação e visão de mundo. É neste contexto que a educação assume um papel fundamental na formação humana.
Percebe-se que ao trabalhar na perspectiva do multiletramento, os sujeitos tem contato com diferentes ferramentas comunicativas, tecnológicas, linguísticas e culturais, que são elementos que ajudará a prepara-lo para atuar no mundo globalizado na qual esta inserido, ou seja, o preparará para enfrentar as constantes mudanças e atualizações que fazem parte da rotina da vida moderna. Dessa forma, é preciso que as escolas se adaptem ao multiletramento, contribuindo assim para formar pessoas preparadas para viver no mundo atual e serem agentes de transformação na sociedade. Para Santos (2021)
a Pedagogia dos Multiletramentos consiste numa proposta que visa o reconhecimento e valorização das mais variadas formas de se comunicar por meio de textos multimodais e semióticos que incluam em sua variação, além do verbal, os modos visual, auditivo, espacial, gestual e comportamental, tais como: linguagem computadorizada, vídeos, filmes, charges, outdoor, fotografias, entre outros (SANTOS et al , 2021 p.3).
Nesta perspectiva, pensar nas possibilidades de aprendizagens com os multiletramentos na Educação Infantil, considerando os eixos estruturantes da proposta pedagógica assegurando os direitos de aprendizagens e desenvolvimento, é preciso compreender a organização da proposta curricular. Na BNCC (2018 p.40)
“a organização curricular da Educação Infantil na BNCC está estruturada em cinco campos de experiências, no âmbito dos quais são definidos os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento. Os campos de experiências constituem um arranjo curricular que acolhe as situações e as experiências concretas da
vida cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural” (BRASIL, 2018 p. 40).
Pode-se dizer então que a pratica pedagógica dos multiletramentos na educação infantil pode ser contemplada a partir dos campos de experiências a qual são definidos os objetivos de aprendizagens que devem fornecer indicadores amplos do conhecimento, dos conceitos, habilidades e processos que as crianças adquirem durante esse importante período do desenvolvimento.
Na Educação Infantil, as aprendizagens essenciais compreendem tanto comportamentos, habilidades e conhecimentos quanto vivências que promovem aprendizagem e desenvolvimento nos diversos campos de experiências, sempre tomando as interações e a brincadeira como eixos estruturantes. Essas aprendizagens, portanto, constituem-se como objetivos de aprendizagem e desenvolvimento (BRASIL, 2018 p. 41).
Em multiletramentos na escola, Rojo (2012 p.22) aponta que em todo o procedimento dos multiletramentos valoriza-se o emprego de textos interativos, colaborativos, transgressivos, híbridos e fronteiriços, e mestiços. Esta perspectiva estimula a inserção dos mais variados textos escritos multimodais de prática social no contexto escolar, trazendo para a sala de aula contextos rotineiros facilitadores do processo de ensino e aprendizagem.
Santos (2021 p. 8) considera que
“tudo isso colabora para o” incentivo à autonomia do aluno, sendo que a implementação de tal metodologia educacional na Educação Infantil instiga-o em seu desenvolvimento, tornando-o construtor de sentido, buscando oportunizar novos horizontes ao seu perfil. e, assim, trazendo a cultura digital como aporte para a interação e a aprendizagem.
Partindo desse pressuposto, ano âmbito da BNCC da Educação Infantil e da Pedagogia dos multiletramentos é preciso considerar a lacuna existente em pensar uma pratica em sala de aula centrada nos multiletramentos, principalmente no que diz respeito a cultura digital presente em todos os ambientes escolares, considerando a formação dos profissionais e a realidade das unidades escolares. Enquanto a Pedagogia do Multiletramento propõe uma prática de ensino baseada nas mais variadas formas de se comunicar com as diversas formas de culturas, as unidades de ensino por vezes não possuem estrutura capaz de proporcionar recursos suficientes espaço para que os professores (re)pensem e (res)signifiquem suas práticas pedagógicas, tendo em vista o atual contexto sociocultural, a exigir desses profissionais que se apropriem da diversidade de linguagens, culturas e hipermídias que constituem os multiletramentos.
Portanto, é possível desenvolver aprendizagem através dos multiletramentos na educação infantil, considerando os eixos estruturantes, garantindo os direitos de aprendizagens e desenvolvimento tendo como base os objetivos estabelecidos nos campos de experiências na BNCC. Porém, é preciso considerar a formação dos educadores. Para que estes possam dar significado e consequentemente resultados na ação pedagógica partindo do multiletramento, precisa se apropriar da multiplicidade de canais de comunicação e da grande diversidade cultural e linguística presente em nossa sociedade.
4. Integração da Cognição e Multiletramentos na Educação Infantil: Desafios e Considerações
Conceitualmente, cognição está relacionada à forma como o individuo aprende, é a capacidade de processar informações disponíveis no mundo em que vivemos e transforma-la em conhecimento através de um conjunto de habilidades mentais ou cerebrais, ou seja, a interpretação que o cérebro faz de todas as informações captadas do meio através dos sentidos. É nesse processo que desenvolvemos a aprendizagem e construímos conhecimentos. (Gardner, 1983, “Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences”).
Multiletramento diz respeitos à multiplicidade de canais de comunicação, a grande diversidade cultural e linguística, ou seja, a capacidade de interpretar, criar e comunicar significados por meio de uma variedade de formas de comunicação, como a visual, oral, corporal, musical e alfabética (Mary Kalantzis e Bill Cope, 2000).
Na Educação Infantil como primeira etapa da educação básica e sendo o primeiro espaço social em que as crianças têm longe do convívio familiar, a grande preocupação é estimular o desenvolvimento cognitivo, motor e afetivo das crianças através de atividades pedagógicas que desenvolva o raciocínio, a atenção, a concentração, coordenação motora, em fim, atividades voltadas a atender as necessidades de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Significa dizer que na prática educativa precisamos proporcionar e disponibilizar informações através das múltiplas linguagens presente na sociedade e estimular as crianças a aprender a partir das suas vivencias.
Compreendendo essa abordagem, vale destacar as contribuições de Howard Gardner, Loris Malaguzzi e James Paul Gee no contexto da integração e multiletramentos na educação infantil:
Howard Gardner (1983) que é conhecido pela teoria das ‘inteligências múltiplas’, na qual argumenta que “existem diferentes tipos de inteligência, como linguística, lógico-matemática, musical, espacial, corporal-cinestésica, interpessoal e intrapessoal”.
Assim ao reconhecer esses diversos tipos de inteligência na educação infantil, os educadores podem desenvolver estratégias de multiletramento que respeitam e respondem a esses diferentes modos de aprendizado, permitindo que as crianças explorem e se expressem através de várias formas de comunicação e representação.
O fundador da abordagem educacional de Reggio Emilia, Loris Malaguzzi(1987;1993), enfatiza a “importância do ambiente de aprendizagem”, vendo a criança como um construtor ativo de conhecimento e destacando a “importância da expressão simbólica e criativa”. Nesta perspectiva, o multiletramento é integrado de maneira que as crianças utilizam a linguagem (seja verbal, artística ou corporal) para interagir com o mundo ao seu redor, desenvolvendo uma compreensão ampla e multifacetada da comunicação. Disponível em: https://reggioaustralia.org.au/the-hundred-languages-of-children/> Acesso em: 28-jan-24.
Outro pesquisador que contribuiu significativamente para a teoria dos multiletramentos, foi James Paul Gee (1990; 2015), que particularmente teve a ideia de “Discursos” (com “D” maiúsculo), referindo-se a diferentes maneiras de se comportar, interagir, valorizar e comunicar dentro de uma comunidade. Gee foca na ideia de que o letramento vai além da linguagem escrita, envolvendo várias “semióticas” como imagens, gestos, símbolos, e sonoridades. A aplicação disso na educação infantil consiste em encorajar as crianças a se engajarem e participarem de diversas “semióticas” para criar significado e aprender através de múltiplas formas de representação e pensamento. ( Gee, J. P. (2015). Social Linguistics and Literacies: Ideology in Discourses. Reino Unido: Routledge).
Integrando as ideias de Gardner, Malaguzzi e Gee na educação infantil para promover multiletramentos, poderíamos ver um ambiente de aprendizado onde as crianças são incentivadas a explorar e aprender através de diversas mídias e formas de expressão. Isso pode envolver métodos que incluem os tradicionais ler e escrever, mas também atividades como jogos, música, arte, dramatização e interação social, respeitando os diferentes ritmos e estilos de aprendizado de cada criança, e proporcionando vastas oportunidades para o desenvolvimento de habilidades de comunicação e pensamento crítico.
Outro conhecido por suas contribuições na área dos multiletramentos e mídia, com foco especial na interseção da cognição, é Gunther Kress (2003). Ele identifica desafios significativos ao integrar cognição e multiletramentos na educação infantil. (Kress, G. R. (2003). Literacy in the New Media Age. Reino Unido: Routledge).
Na visão de Kress, um dos desafios principais é reconhecer a forma como as crianças aprendem e compreendem o mundo ao seu redor. Ele argumenta que as práticas de multiletramentos devem ser adaptadas para refletir não apenas a diversidade de maneiras pelas quais as crianças interagem com textos e mídias, mas também suas variadas formas de entendimento cognitivo. Integrar abordagens de multiletramento que respeitem e respondam aos diferentes estilos cognitivos das crianças é fundamental para uma educação infantil eficaz.
Kress 2023, também destaca a importância de considerar as implicações de diferentes mídias e modos de representação na cognição das crianças. Com as inúmeras formas de comunicação visual, digital e multimodal disponíveis, é necessário questionar como essas modalidades afetam o processamento cognitivo. Ao integrar essas mídias de maneira significativa, os educadores podem enfrentar o desafio de promover uma compreensão profunda e reflexiva da informação, ao mesmo tempo em que fomentam habilidades críticas de pensamento e interpretação.
Portanto, para Kress, os desafios e considerações de integrar cognição e multiletramentos na educação infantil incluem o reconhecimento e resposta aos diversos estilos cognitivos das crianças, além de considerar o impacto das mídias e modos de representação na cognição na era contemporânea. Superar esses desafios exige não apenas uma compreensão aprofundada da cognição infantil, mas também considerar um compromisso com a promoção de práticas de multiletramentos que ampliem e enriqueçam o pensamento infantil, preparando-os para enfrentar o mundo multilíngue e multimodal de hoje.
5. Considerações finais
O processo de aprendizagem e desenvolvimento em um mundo em constantes transformações exige do conjunto da sociedade uma atuação mais global e emergente. Refletindo sobre este aspecto, a educação assume um papel fundamental na formação humana, formando sujeitos capazes de lidar com a realidade de forma autônoma e atuar diante do mundo em evolução como agentes transformadores.
No que tange a Educação Infantil, não obstante dessa realidade, é preciso considerar o sujeito em desenvolvimento que lida diariamente com as transformações que o mundo vem proporcionando de forma desenfreada, e nos impõem a pensar formas cada vez mais inovadoras dos processos educativos capazes de fornecer uma formação integral, considerando aspectos cognitivos, motor e afetivos dos sujeitos.
Sendo assim, a integração da cognição e multiletramentos na educação infantil é fundamental para promover um aprendizado abrangente e eficaz para as crianças. Ao considerar a cognição, que trata do processo de aquisição de conhecimento, pensamento, percepção e resolução de problemas, e os multiletramentos, que envolvem a capacidade de interpretar, criar e comunicar significados por meio de uma variedade de formas de comunicação, como a visual, oral, corporal, musical e alfabética, os educadores buscam proporcionar experiências de aprendizado que atendam às diversas maneiras pelas quais as crianças interagem com o mundo ao seu redor.
Para tanto, integrar a cognição e os multiletramentos na educação infantil permite que as crianças desenvolvam habilidades críticas e criativas, explorando diferentes modalidades de expressão e compreensão. Isso inclui incentivar a leitura, a escrita, a expressão artística, a interação social, o pensamento lógico, a resolução de problemas e a compreensão de diferentes mídias, criando assim um ambiente de aprendizado enriquecedor e diversificado.
Afinal de contas, reconhecer e adaptar as práticas educacionais para refletir a interconexão entre cognição e multiletramentos, os educadores podem apoiar o desenvolvimento holístico das crianças, preparando-as para se tornarem comunicadoras habilidosas, solucionadoras de problemas e pensadoras críticas em um mundo cada vez mais complexo e diversificado.
Em suma, abordar o multiletramento no contexto da educação infantil requer também, pensar em um sistema de educação capaz de proporcionar as condições para garantir através da prática pedagógica uma formação humana de sujeitos autônomos, críticos e atuantes em uma sociedade em que está em constantes transformações. É preciso considerar também a formação dos profissionais como um aspecto atenuante desse processo. E para terminar, o multiletramentos na educação infantil se constitui considerar um desafio contínuo.
6. Referências
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¹Mestranda em Ciências da Educação, graduada em Pedagogia, e com especializações em: Música e Cognição; Gestão, Orientação e Supervisão Escolar; Educação Especial e Educação Inclusiva; Transtorno do Espectro Autista: Inclusão Escolar e Social. Professora Efetiva da Rede Municipal de Ensino – Palmas/TO. Email: cirlenebenvindo@gmail.com/https://orcid.org/0009-0007-5169-8823. Universidade Del Sol (UNADES), Campus Universitário Ciudad Del Este-PY