CAPACIDADE CONTRIBUTIVA: INSTRUMENTO JURÍDICO ESTATAL PARA DIMINUIÇÃO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

CONTRIBUTION CAPACITY: LEGAL INSTRUMENT STATE FOR SOCIAL INEQUALITY REDUCTION OF THE CONSTITUTION OF THE FEDERATIVE REPUBLIC OF BRAZIL 1988

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202409131922


Everton Medeiros Dantas


Resumo

Com foco, este artigo analisa a potencialidade do contribuinte, considerando sua capacidade econômica e contributiva, intimamente ligada às riquezas produzidas de forma pessoal, com fim específico de discussão acerca da diminuição das desigualdades criadas pela falta de manutenção da legislação tributária brasileira de forma geral, como reforma tributária. Comparar o ordenamento jurídico pátrio, infraconstitucional, com os princípios gerais trazidos pela Constituição Federal, como dignidade da pessoa humana, permite apontar condições para aprimoramento da incidência tributária de forma mais igualitária e proporcional à riqueza do contribuinte.

Palavras chave: Capacidade contributiva. Desigualdades. Dignidade da pessoa humana.

ABSTRACT

With focus this article analyzes the taxpayer’s potential considering its economic and fiscal capacity, closely linked to wealth produced in a personal way, with specific purpose of discussion on the reduction of inequalities created by the lack of maintenance of the Brazilian tax law generally as tax reform. To Compare the legal order, infra legal system with the general principles brought by Federal Constitution , such as human dignity, allows to point conditions for improvement of tax incidence more equally and in proportion to the wealth of the taxpayer.

Keywords: Ability to tax pay. Inequalities. Dignity of the human person.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo principal dos tributos é a arrecadação estatal para obtenção de recursos financeiros. Atualmente, percebe-se claramente a interferência na economia privada, através da utilização de tributos, objetivando dar maior efetividade a determinados setores econômicos, bem como tentando coibir a aquisição de determinados serviços ou bens. 

Percebe-se essa interferência na edição de normas para estimular setores da economia, como importante meio para reduzir a carga tributária sobre contribuintes de menor poderio econômico, como o microempreendedor individual. Também os produtos considerados essenciais como os que constam na cesta básica, podem se beneficiar das desonerações aplicadas pelo governo federal como meio de possibilitar a aquisição pelos mais vulneráveis.

Por outro lado, é perceptível a majoração de alíquotas sobre produtos considerados supérfluos, como bebidas alcoólicas, de forma a contribuir com a arrecadação e desestimular o consumo, sendo necessária uma nova adaptação do mercado atingindo.

Vale destacar a intervenção do Estado sobre as riquezas produzidas pelos contribuintes visando à distribuição da renda e a tão sonhada justiça social. 

Nessa perspectiva, o Estado brasileiro possui normas constitucionais que exigem da máquina pública a adoção de medidas para que, sempre que possível, os impostos tenham caráter pessoal e sejam aplicados de acordo com a capacidade econômica do contribuinte, respeitando-se os direitos individuais conforme dispõe o art. 145, § 1°, da Constituição Federal. Esse mandamento constitucional veio prestigiar o Princípio da Capacidade Contributiva.

O que se deve evitar, e será visto durante todo esse artigo, são as medidas arrecadatórias e desenfreadas da administração pública, em qualquer das suas esferas, União, Estados ou Municípios, as quais possuem caráter contrário aos princípios constitucionais e pior, com baixíssimo retorno ao próprio contribuinte.

Nesse sentido, o presente estudo é imperioso pela observância da necessidade de aprimoramento do sistema de tributação no Brasil, com constatações de irregularidades tributárias, e evitando carga maior sobre a população que depende, minimamente, da intervenção estatal para manutenção das necessidades básicas familiares.

Ao longo deste estudo, restará cristalina a intenção do poder público de arrecadar cada vez mais, sem observar o impacto sobre os contribuintes, tributação sobre o consumo, como a tentativa de assegurar a política econômica vigente. 

2 PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Como pilar dos direitos fundamentais, o Princípio da Igualdade consagra-se na Constituição Federal de 1988 (CF/88), previsto no caput do art. 5° e inciso I, vedando qualquer distinção.

Na visão do professor Celso Antônio Bandeira de Mello se observa que: 

A lei não pode ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos. Esse é o conteúdo político-ideológico absorvido pelo princípio da isonomia e juridicizado pelos textos constitucionais em geral, ou de todo modo assimilado pelos sistemas normativos vigentes. (MELLO, 2006, p. 10) 

O doutrinador Pedro Lenza (2012, p. 973) destaca a busca pela igualdade substancial, lembrando a “Oração dos Moços, de Rui Barbosa, inspirada na lição secular de Aristóteles, devendo tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades”.  

De Acordo com Ricardo Alexandre: 

A isonomia possui, portanto, uma acepção horizontal e uma vertical. A acepção horizontal refere-se às pessoas que estão niveladas (daí a nomenclatura), na mesma situação e que, portanto, devem ser tratadas da mesma forma. Assim, contribuintes com os mesmos rendimentos e mesmas despesas devem pagar o mesmo imposto de renda. A acepção vertical refere-se às pessoas que se encontram em situações distintas e que, justamente por isso, devem ser tratadas de maneira diferenciada na medida em que se diferenciam (ALEXANDRE, 2013, p. 91).

Esse entendimento parte de princípio basilar tratado na CF/88, no art. 145, § 1°, e art. 150, II. Veja-se respectivamente: 

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.

Vale ressaltar também a lição do professor Eduardo Sabbag (2013, p. 154) acerca da capacidade contributiva aliada a equidade e a tributação justa. Assim, tem-se que: “A capacidade contributiva evidencia uma das dimensões da isonomia, a saber, a igualdade na lei, quando se busca tratar de forma distinta situações diversas, (…)”. 

Conclui-se que é essencial tratar desigualmente os desiguais, adotando um modelo tributário que respeite essas desigualdades, baseando-se na riqueza e capacidade contributiva do contribuinte. A progressividade, que aumenta as alíquotas para quem tem maior poder econômico, impondo maior sacrifício financeiro proporcional à riqueza gerada, é vista por doutrinadores como uma aplicação prática do Princípio da Capacidade Contributiva.

Luciano Amaro (2010, pág. 165) assevera que “a progressividade não é ocorrência necessária da capacidade contributiva, mas sim um refinamento desse postulado”.

Depreende-se que para se alcançar uma mínima justiça tributária se faz necessária a ligação de determinados princípios constitucionais, como isonomia, capacidade contributiva, generalidade, progressividade, não confiscatoriedade, equitativa distribuição da carga tributária.

É de bom alvitre salientar também o alcance da norma constitucional, uma vez que seu texto (art. 145, § 1°) trata apenas dos impostos, o que faz surgir questionamentos acerca dos demais tributos em geral, como as taxas.

Apesar do princípio constitucional proteger economicamente os contribuintes, de acordo com a capacidade contributiva, na contramão, o legislador deixa de inserir na redação do citado artigo previsão geral para os tributos.

Desse tema, merece razão a compreensão extensiva aos tributos e não apenas impostos, como explica Hugo de Brito Machado:

Ao nosso ver o princípio da capacidade contributiva, ou capacidade econômica, diz respeito aos tributos em geral e não apenas aos impostos, embora apenas em relação a estes esteja expressamente positivado na Constituição. (MACHADO, 2010, p. 45)

Essa compreensão possibilita conceder benefícios fiscais na medida das desigualdades dos cidadãos de forma eminentemente humana, sem opor obstáculos à prestação de serviços públicos e proporcionando menores gastos, considerando a essencialidade dos bens e serviços.

3 EXTRAFISCALIDADE: SELETIVIDADE E ESSENCIALIDADE

É forçoso destacar princípios jurídicos que buscam a proteção dos cidadãos de possíveis abusos do Poder Executivo durante a tributação. Assim, o estudo de algumas regras constitucionais ligadas à isonomia e capacidade contributiva serão ressaltadas.

A noção de mera arrecadação tributária para custeio da atividade (tributos fiscais) têm limitações impostas pelo legislador, conforme informado no parágrafo anterior, alinhando-se ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana previsto na Carta Magna de 1988.

Da lição do professor Eduardo Sabbag (2013, p. 158), se extrai importante conclusão acerca da referida proteção, tendo citado que “a extrafiscalidade tem assim se revelado um poderoso expediente a serviço do Estado, quer quando permite inibir condutas indesejáveis, quer quando almeja estimular comportamentos salutares”. 

Na mesma linha o professor Leandro Paulsen, descreve que: 

Os efeitos extrafiscais são não apenas uma decorrência secundária da tributação, mas seu efeito principal, deliberadamente pretendido pelo legislador que se utiliza do tributo como instrumento para dissuadir ou estimular determinadas condutas. (PAULSEN, 2012, p. 8)

Na mesma esteira, é assegurada a seletividade de determinados impostos, como instrumento estatal para controle considerando a essencialidade do produto.

Ainda na visão de Sabbag:

a seletividade é a forma de concretização do postulado da capacidade contributiva em certos tributos diretos. Nestes, o postulado da capacidade contributiva será aferível mediante a aplicação da técnica da seletividade, uma evidente forma de extrafiscalidade da tributação (SABBAG, 2013, p.186)

Assim, pela seletividade, determina-se o valor dos tributos sobre o consumo em razão do grau da sua utilidade social, como a tributação com alíquota reduzida de alimentos e medicamentos, por exemplo, constituindo assim um exemplo de extrafiscalidade. 

Para o conceito de essencialidade, é importante ressaltar a lição de Aliomar Baleeiro que aduz: 

A palavra (…) refere-se à adequação do produto à vida do maior número dos habitantes do país. As mercadorias essenciais à existência civilizada deles devem ser tratadas mais suavemente ao passo que as maiores alíquotas devem ser reservadas aos produtos de consumo restrito, isto é, o supérfluo das classes de maior poder aquisitivo. (BALEERIO, 1999, p. 347)

No mesmo sentido é a lição de Hugo de Brito Machado que assim disciplina: 

O critério da seletividade não pode ser outro. Há de ser sempre o da essencialidade, de sorte que a mercadoria considerada essencial há de ter alíquotas mais baixas, e a menos essencial, cuja gradação vai até aquela que se pode, mesmo, considerar supérflua, há de ter alíquotas mais elevadas (MACHADO, 2010, p. 396)

Desse modo, conclui-se que o ordenamento jurídico pátrio exige da administração pública uma política de seleção de produtos essenciais para a população, viabilizando a aquisição por meio de estímulos ou impondo barreiras fiscais para salvaguardar seus interesses.

Ademais, os estímulos fiscais permitidos devem alcançar o interesse da sociedade e não meramente arrecadatório do Estado, possibilitando dar efetividade ao que propõe, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana previsto em nossa Lei Maior.

Nesse sentir, é inegável a necessidade premente de ajustes em produtos básicos à população. Alíquotas absurdas de ICMS sobre a energia elétrica, por exemplo, recaem esmagadoramente sobre a parcela mais pobre, com variações de alíquotas entre os estados membros da federação de acordo com o interesse político momentâneo.

Vale ressaltar importante trecho destacado por Hely Lopes Meirelles:

Modernamente, os tributos são usados como instrumento auxiliar do poder regulatório do Estado sobre a propriedade particular e as atividades privadas que tenham implicações com o bem-estar social. Até mesmo o Direito norte-americano, tão cioso das liberdades individuais, admite essa função extrafiscal dos tributos, para o incentivo ou repressão da conduta do particular. (MEIRELLES, 1993, p. 151)

Observa-se que há verdadeira preocupação com o bem-estar social. Sendo assim, políticas públicas devem estar entrelaçadas com isenções cada vez mais eficazes, proporcionando o atingimento direto da população em seu anseio mais significativo.

O Estado possui em seu aparato instrumentos jurídicos decisivos que direcionam os contribuintes, com reais possibilidades de proporcionar maior inclusão no sentido de diminuir as desigualdades. Essa verdadeira missão estatal nada mais é do que dar efetividade às normas constitucionais, assegurando direitos fundamentais expressos e respeitando a dignidade da pessoa humana para conduzir o país a uma melhoria social ampla e significativa.

4 TRIBUTOS SOBRE O CONSUMO

Há muito se discute a aplicabilidade do Princípio da Capacidade Contributiva, previsto no art. 145, § 1°, da Constituição Federal de 1988. O formato da legislação tributária, segundo o citado Texto Supremo, deve alcançar conteúdo que se apresente eficaz e intimamente ligado a outro importante princípio constitucional, qual seja, o Da Igualdade. Nesse sentido explica o professor Paulo de Barros Carvalho:

Há necessidade premente de ater-se o legislador à procura de fatos que demonstrem signos de riqueza, pois somente assim poderá distribuir a carga tributária de modo uniforme e com satisfatória atinência ao princípio da igualdade. (CARVALHO, 2011, p. 216).

Não obstante tal assertiva pode-se afirmar também que no Brasil não há preocupações governamentais como a aplicação da capacidade contributiva, seja em qualquer esfera da República Federativa. 

Todos os anos se noticia a superação de recordes de anos anteriores da carga tributária no país. Respira-se uma política de arrecadação tributária injusta, com maior abrangência de incidência sobre o consumo.

Recentemente, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – IBPT divulgou pesquisa realizada tomando por base o Censo de 2010 e a pesquisa de orçamentos familiares do IBGE, chegando à seguinte conclusão: “Mais de 79% da população brasileira, que recebe até três salários mínimos por mês, contribui com 53% (cinquenta e três por cento) da arrecadação tributária total no país”1. É de bom alvitre destacar que no mês de agosto de 2014, a arrecadação tributária superou a marca de 1 trilhão de reais.

Assim, enquanto o governo brasileiro mantém programas assistencialistas como bolsa família, bolsa escola, auxílio gás, etc, os quais também são importantes para atendimento de necessidades emergenciais, castiga os próprios beneficiados com elevada carga tributária sobre o consumo, sem combater a desigualdade social em longo prazo. Nessa esteira, há uma falsa percepção de atendimento da população efetivamente pobre, a qual recebe benefícios para apenas atenuar os altos impostos.

O que se vê, é o estado brasileiro mantendo um ciclo vicioso sobre a camada mais desfavorecida da sociedade brasileira, alimentando a ideia de poder de compra, com uma estratosférica arrecadação.

Nesse passo, para atender as necessidades governamentais sem alarmar a população, o Poder Executivo tem preferência sobre impostos indiretos, os quais possuem efeito cascata – como CIDE, IPI, PIS/COFINS, ICMS – visto que atingirão os preços para o consumidor final que culpará os empresários pela possível alta desenfreada.

Para se ter uma ideia da dimensão da cobrança brasileira, destaca-se a incidência sobre o consumo de 8% (oito por cento) no Japão, após 17 anos sem qualquer elevação que mantinha o percentual de 5% (cinco por cento).

Essa elevação no país japonês, apesar da grande possibilidade de atingir negativamente o mercado de consumo, ainda se justifica pelos investimentos governamentais com real retorno à população.

Simples bens móveis podem se transformar em verdadeiros vilões no bolso do consumidor pela alta incidência tributária. Na tentativa de dar maior transparência, o Congresso Nacional editou a sancionada Lei n° 12.741, de 08 de dezembro de 2012, editada pela Medida Provisória n° 649, de 05 de junho de 2014, que impõe medidas de esclarecimento ao consumidor à informação do valor aproximado correspondente à totalidade de tributos de qualquer esfera de poder.

A citada previsão pode causar efeito desejável para a população que se encontra desavisada da política tributária nacional.

O pior de toda essa história é a certeza que a maioria das pessoas, ou seja, os realmente pobres e necessitados de tratamento desigual, é que sofrem com essas medidas descabidas de foco no consumo para distribuir riqueza.

5 MÍNIMO EXISTENCIAL

No ordenamento jurídico brasileiro, impõe-se ao Estado o dever de segurança sobre uma condição mínima de existência. Para isso, o legislador limitou o poder estatal de tributar criando um liame entre a fiscalidade e a dignidade humana. 

O constituinte não cuidou da matéria ora tratada de forma direta, senão por meio de princípios e objetivos previstos na Carta Magna de 1988. O respeito à dignidade da pessoa humana vem expresso no art. 1°, III, da CF: 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana.

Também está assegurada no texto da Lei Maior os objetivos de erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais (art. 3°, III, CF/88). 

Sendo assim, não se deve ignorar os preceitos constitucionais no momento da imposição de tributos em detrimento da parcela pobre da população. Ao revés, importa ao poder público blindar as necessidades básicas dos que realmente necessitam de atenção estatal.

Por um flanco, pode-se citar a isenção de impostos ofertada pelo governo sobre a cesta básica, considerando a devastadora carga tributária brasileira sobre o consumo. Nesse sentido, foi sancionada a Lei n° 12.839, de 09 de julho de 2013, que reduziu a zero as alíquotas do PIS, Cofins, e Pasep incidentes sobre a receita decorrente da venda no mercado interno e sobre a importação de produtos que compõem a cesta básica.

Por outro, a progressividade prevista no imposto de renda como forma de onerar mais as maiores riquezas do país, também tem o condão de diminuir as desigualdades e preservar os cidadãos na medida do seu ganho de capital.

Foi nesse sentido que a Carta Magna deu efetividade ao citado instrumento jurídico, dispondo em seu art. 153, §2°, inciso I, que o imposto de renda será informado pelos critérios da generalidade, universalidade e progressividade. Apesar do comando constitucional o qual visa arrecadação justa, no Brasil a progressividade é aplicada de maneira tímida, conforme esclarece Eduardo Sabbag:

No Brasil de hoje, o imposto sobre a renda, conquanto se revele um importante gravame para a arrecadação fiscal, aponta dados curiosos: estudos econômicos demonstram que a participação da tributação da renda na carga tributária brasileira é baixa, atingindo pouco mais de 20%, enquanto, em países desenvolvidos, essa participação representa cerca de 70% (SABBAG, 2013, p. 169).

Resta cristalino que a ideia inicial de tributar mais quem dispõe de melhores condições, não vem surtindo o efeito desejado se comparada com outras nações, recaindo sobre os mais economicamente vulneráveis a maior parcela tributária sobre os rendimentos.

Sob esse prisma, a difícil tarefa de estabelecer limites tributários vem se arrastando há décadas. A preocupação reside em diferenciar a capacidade econômica e capacidade contributiva.

Eduardo Sabbag levanta essa questão. Veja-se:

Se o “mínimo vital” se traduz na quantidade de riqueza mínima, suficiente para a manutenção do indivíduo e de sua família, sendo intangível pela tributação por via de impostos, é de todo natural que a capacidade contributiva só possa se reputar existente quando se aferir alguma riqueza acima do mínimo vital. (SABBAG, 2013, p. 157)

Esse é o ponto que deve ser constantemente debatido. A discussão parte da necessidade de quem mais precisa e de que precisa.

Não cabe ao Estado apenas proporcionar alimentos mais baratos, e sim, ampliar a potencialidade das pessoas por meio de acesso ao consumo, a estabelecimentos sociais, dentre outros, como meio de diminuir as desigualdades. A prioridade de qualquer governo deve ser incessante para adequar cada vez mais a dignidade humana.

Nesse diapasão, a segurança dada pelo Estado Democrático de Direito sobre as pessoas, garantido um mínimo existencial, as permitem que gozem de status de cidadãos, de forma digna e humana. 

Nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet (1998, p. 93) a dignidade humana é referida como direito fundamental, citando que “Um conjunto de prestações suficientes apenas para assegurar a existência (a garantia da vida) humana, o qual vai além de mera de satisfação das necessidades, mas uma vida com dignidade, no sentido de vida saudável.” . 

Essa visão distingue a ideia de mínimo existencial do necessário para sobreviver criando um paradigma a respeito do limite tributário.

Defender um sistema de proteção limitada às ações de combate à miséria, impede uma política pública de inclusão com diminuição das desigualdades. É imperioso que haja sensibilidade para ampliar a concepção de mínimo existencial, evitando o assistencialismo sem verdadeiramente combater as diferenças sociais a longo prazo.

A garantia dos direitos sociais estipulados na CF/88 é uma realidade que deve ser enfrentada pela sociedade. Para isso, se faz necessário que todos tenham iguais condições na prática do lazer, esporte, educação, moradia, segurança, saúde, etc. Assim, a prestação do serviço público com excelência tem o condão de servir todo e qualquer cidadão, principalmente, de forma isonômica.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se muito tímida a atuação do legislador brasileiro para preservar a capacidade dos contribuintes de acordo com as suas condições e necessidades, sendo imperiosa a ampliação do debate para fortalecer o anseio de milhões de nacionais que há décadas vêm aguardando soluções que mais se adequam à realidade do país.

Óbvio que a maioria dos cidadãos se sentem extremamente tributados, todavia, a distância causada pela desigualdade social apenas será diminuída na possibilidade de crescimento dos menores e maior contribuição dos que muito possuem.

O paliativo encontrado pela administração pública definindo políticas assistencialistas para diminuição da desigualdade social, embora surta efeito a curto prazo, sendo, inclusive, necessário na situação hodierna, não é a solução mais plausível quando se tem a possibilidade de adequação da carga tributária.

Assim, se faz necessária a revisão da carga tributária estipulada nos bens de consumo, a qual atinge todos os cidadãos indiscriminadamente, deixando de apertar mais ainda os desiguais, como se estivessem todos em condições igualitárias.

O real sonho do brasileiro é poder desembolsar seus tributos alegremente, com verdadeira resposta estatal sobre os bens comuns, evitando-se tributos confiscatórios que atinjam não só o bolso, mas o direito ao bem-estar em companhia da família, com retornos satisfatórios.


1BRASIL. Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – IBPT. Disponível em: <://www.ibpt.org.br/noticia/1860/Populacao-que-recebe-ate-tres-salarios-minimos-e-a-que-mais-gera-arrecadacao-de-tributos

REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 7 ed. São Paulo: Método, 2013.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizado por Mizabel Abreu Machado Derzi. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31 ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 6. ed. atualizada por Izabel C. L. Monteiro e Yara D. P.Monteiro. São Paulo: Editora Malheiros, 1993.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3 ed. 14 tir. São Paulo: Malheiros, 2006.

PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 4 ed. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2012.

SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direito fundamental na constituição federal de 1988. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.