AVALIAÇÃO DO IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NOS HÁBITOS SOCIAIS E SAÚDE MENTAL DA POPULAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7998747


Guilherme Ferreira Celeste da Silva1
Isabelle Kaori Duarte Morita1
Maysa Alahmar Bianchin2
Lilian Castiglioni2


RESUMO

Introdução: A COVID-19 (Coronavirus Disease 2019) é uma doença de alta infectividade que rapidamente se disseminou pelos países do mundo, tornando-se uma pandemia que perdura até os dias atuais. A instauração do isolamento social e das mudanças no cotidiano global atingiram várias populações, com repercussão importante na qualidade de vida. Tal contexto trouxe grandes impactos para as saúdes física, mental e hábitos sociais, que devem ser ‘estudados, comparando o cenário anterior à pandemia com o momento atual. Objetivo (s): Analisar os dados epidemiológicos da população de São José do Rio Preto e região, sobre a saúde global e hábitos diários que contribuem para a saúde física e mental, com foco na alimentação e exercícios físicos, visando estabelecer relações entre os cenários antes e durante a pandemia. Métodos: Trata-se de estudo transversal observacional descritivo. Os dados foram coletados pela divulgação de um formulário eletrônico no período de outubro a novembro de 2021, sendo que apenas os maiores de 18 anos foram inclusos, sem outros critérios de exclusão. O presente projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa responsável (CEP, Processo: 052573/2021) e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi preenchido online. Resultados: Foram coletados dados de 613 indivíduos, distribuídos em 15 estados brasileiros e 102 cidades (nas regiões Nordeste, Sul, Sudeste e Centro Oeste). Do total, 448 foram do sexo feminino (73%) e 162, masculino (26,4%). Comparando antes e durante a pandemia, observou-se uma piora importante das saúdes física e mental dos indivíduos (p < 0,0001), diminuições na prática de exercícios físicos (p=0,0003), na qualidade nutricional (p=0,000) e do sono (p=0,000), o que levou a um aumento da procura por suporte psiquiátrico e psicológico (p < 0,0026). Além disso, foram relatados maior quantidade de horas de televisão (p < 0,0001), um forte impacto financeiro negativo na renda mensal dos entrevistados (53.84%) e um prejuízo importante na qualidade do relacionamento familiar (p < 0,0001). Conclusão: Observou-se um grande impacto da pandemia nas saúdes física e mental da população, decorrente das modificações nos hábitos sociais e de manutenção da saúde, impostas pela pandemia. Esses fatores aumentaram a busca por apoio psicológico e psiquiátrico para tratamento de ansiedade, depressão e estresse. É importante ressaltar que as variáveis analisadas podem variar entre as populações de diferentes locais, inclusive no que se refere à variedade de medidas governamentais sobre a Covid-19. Tais resultados alertam para a necessidade atual de maiores intervenções e políticas públicas que visem a melhora da saúde física e mental, a fim de diminuir os impactos causados pelas restrições durante a pandemia e garantir maior bem-estar à população

Palavras-chave: pandemia, impacto, hábitos sociais, saúde

Abstract

Introduction: COVID-19 (Coronavirus Disease 2019) is a highly infectious disease that quickly spread across countries around the world, becoming a pandemic that lasts until the present day. The establishment of social isolation and changes in global daily life affected several populations, with relevant repercussions on quality of life. This context has had major impacts on physical and mental health, and social habits, which must be properly studied, comparing the pre-pandemic scenario with the current moment. Objective(s): To analyze the epidemiological data of the population of São José do Rio Preto and region, on global health and daily habits that contribute to physical and mental health, focusing on diet and physical exercise, aiming to establish relationships between the scenarios before and during the pandemic. Methods: This is a descriptive observational cross-sectional study. Data were collected by disclosing an electronic form from October to November 2021, with only those over 18 years old being included, without other exclusion criteria. This project was submitted and approved by the responsible Research Ethics Committee (CEP, Process: 052573/2021) and the Free and Informed Consent Form was completed online. Results: Data were collected from 613 individuals, distributed across 15 Brazilian states and 102 cities (in the Northeast, South, Southeast and Midwest regions). From the total, 448 were female (73%) and 162 were male (26.4%). Comparing before and during the pandemic, there was a significant deterioration in the physical and mental health of individuals (p < 0.0001), decreases in the practice of physical exercises (p=0.0003), in nutritional quality (p=0.000) and sleep (p=0.000), which led to an increased demand for psychiatric and psychological support (p < 0.0026). In addition, more hours of television were reported (p < 0.0001), a strong negative financial impact on the monthly income of respondents (53.84%) and a significant loss in the quality of family relationships (p < 0.0001). Conclusion: There was a great impact of the pandemic on the physical and mental health of the population, due to changes in social habits and health maintenance, imposed by the pandemic.

Keywords: pandemic, impact, social habits, health

Introdução

A doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV 2) chegou ao Brasil em fevereiro de 2020, após os primeiros casos terem sido registrados em na cidade de Wuhan, na China, ainda em 2019, e outros países entrarem em estado de alerta. A enfermidade, chamada de COVID-19 (Coronavirus Disease 2019), teve notificações em ascensão muito rapidamente, o que se deve a sua alta infectividade. Tendo em vista tal panorama, os governos mundiais tomaram atitudes para barrar o avanço da afecção, que atingiu o status de pandemia.  Dentre essas medidas, está a quarentena, baseada no isolamento social, o qual bloqueia o contato físico entre os indivíduos e impede a transmissão do vírus, que se dá principalmente por gotículas emitidas oralmente pelas pessoas contaminadas. Logo, a rotina da população foi radicalmente alterada ao longo da pandemia, incluindo aspectos como trabalho, educação, fontes de renda, alimentação, exercício físico, saúde mental, uso de álcool e outras drogas, além do contato social propriamente dito. É necessário que as diferentes variáveis sejam consideradas para que o comportamento da população frente à pandemia seja devidamente analisado, o que se refere, em especial, aos fatores socioeconômicos e suas implicações na saúde populacional.

Segundo a Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS) – NY, 22/7/1946, a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade. Gozar do melhor estado de saúde que é possível atingir constitui um dos direitos fundamentais de todo o ser humano, sem distinção de raça, de religião, de credo político, de condição econômica ou social. Entretanto, com a pandemia e a consequente quarentena, o sentimento de insegurança, medo, angústia, estresse e preocupação se tornaram bastante acentuados entre a população. Esses sentimentos podem, inclusive, agravar os sintomas de pacientes previamente diagnosticados com quadros psiquiátricos1, podendo causar aumento no consumo de álcool e drogas, sendo que a falta de contato humano, os impactos financeiros e a mudança na rotina como um todo são os principais fatores pelos quais os indivíduos são afetados pelo cenário pandêmico. Tais fatores afetam diretamente na saúde mental, relacionada com os sentimentos citados anteriormente, que devem ser relacionados com as questões de saúde, tendo em vista o modelo biopsicossocial do atendimento, em que a visão holística do indivíduo deve ser considerada, considerando todos os fatores que impactam no bem-estar.

É importante ressaltar que essa visão holística do indivíduo deve considerar também as desigualdades socioeconômicas a que a população está exposta. Dessa forma, alguns setores da sociedade podem estar sujeitos a maiores riscos devido à pandemia, como os trabalhadores que, mesmo com a quarentena, necessitam sair de casa para trabalhar, a fim de sobreviver com a renda obtida. Outro exemplo são os profissionais de saúde, que podem ter sua saúde mental e física afetadas pelo contato direto com o enfrentamento da pandemia em hospitais, unidades de saúde e emergências, em especial em relação à falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI)2. Tendo em vista tal panorama, um questionário sociodemográfico é de suma importância para que a avaliação do impacto da pandemia, sobretudo do isolamento social, nos hábitos sociais seja feita de forma completa, considerando todas as variáveis possíveis.

Mais especificamente sobre os hábitos sociais, o exercício físico como fator importante na saúde global tem sido alvo de muitos estudos. Por exemplo, a atividade física, como caminhada ou musculação, possui papel importante na melhoria da qualidade do sono, como foi estudado em idosos, por exemplo³. Dessa forma, o sono é muito importante como um fator de preservação e descanso, mantendo as funções fisiológicas. Outro exemplo é sua grande relevância para a saúde mental e a adesão ao exercício físico, que pode depender, principalmente, de fatores socioeconômicos4. Diante desse cenário, o levantamento mais recente sobre o assunto, feito em 2015 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)5, mostrou que 62,1% da população brasileira acima de 15 anos (cerca de 100,5 milhões de pessoas na época) não praticam atividade física, o que configura um alvo essencial de promoção de saúde, a fim de incentivar esse hábito social importante.

Ademais, é fundamental que a saúde mental seja considerada e debatida pois, apesar de não ser o alvo sistêmico da infecção, esse aspecto é bastante impactado pela pandemia, haja vista o forte fator social envolvido. Sendo assim, é importante que esse tópico esteja sob estudo para que a pluralidade individual seja considerada. Tal análise vale tanto para as pessoas contaminadas com a doença quanto para aquelas que não contraíram a doença, mas estão em risco de exposição, o que envolve, inclusive, os profissionais e técnicos de saúde que trabalham com pacientes contaminados e trabalhadores que possuem contato com o público em geral. Um dos estudos mais citados nessa problemática, envolvendo 1.210 participantes, observou, no estágio da pandemia, que 8,1% relataram sintomas severos de estresse, 28,8% relataram sintomas severos de ansiedade e 16,5% relataram sintomas depressivos severos em virtude do cenário pandêmico[3]. Em última análise, esses quadros psicológicos também se relacionam com o uso de medicamentos, receitados ou não, pela população.

Em suma, é essencial que analisemos todos esses fatores em conjunto, para que toda a extensão biopsicossocial do indivíduo seja considerada e devidamente sujeita aos níveis de atenção do sistema de saúde, sobretudo no cenário da pandemia que, além da infecção propriamente dita, pode afetar a saúde global do indivíduo de diversas formas diretas e indiretas. Dessa forma, as mudanças em hábitos como alimentação, exercício físico, sono e a dinâmica da saúde mental influenciam no bem-estar individual, podendo também impactar no aspecto coletivo. Tal análise sociodemográfica e epidemiológica é crucial para que estratégias de auxílio e atendimento sejam devidamente estruturadas para atender às demandas da população.

O presente estudo é justificado devido à importância de se estudar o impacto da pandemia da Covid-19 nos hábitos sociais, como o consumo de álcool e drogas, e sua relação com a saúde global dos indivíduos, tendo em vista o bem-estar holístico de cada um e sua relevância para a saúde mental.

Objetivo

Este estudo objetivou coletar dados sociodemográficos e epidemiológicos relacionados ao consumo de álcool, drogas e medicamentos de uso controlado e sua relação com a saúde mental da população avaliada, visando analisar o impacto da pandemia da Covid-19 nesses aspectos. 

Métodos

O presente projeto trata-se de um estudo transversal observacional, de caráter descritivo e exploratório, que foi realizado por meio de aplicação de questionário utilizando-se a plataforma Google Forms. Todas as pessoas na idade de 18 anos ou mais, residentes de São José do Rio Preto e região, durante a pandemia de COVID-19, foram consideradas elegíveis para participar deste estudo. Não houve critérios de exclusão e o período de coleta de dados compreendeu os meses de outubro até novembro de 2021. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética/FAMERP (Nº do Processo: 052573/2021).

Para a coleta de dados foi elaborado um questionário online anônimo, utilizando a plataforma Google Forms, com finalidade de identificar dados socioeconômicos dos participantes, sua percepção acerca do consumo de álcool e drogas antes e durante a pandemia pelo COVID-19, as prováveis mudanças negativas nesses hábitos e suas implicações na saúde física e mental. 

Após a coleta dos dados os mesmos foram planilhados no Excel. A análise estatística descritiva foi realizada a partir dos cálculos das medidas de tendência central, dispersão e contagens de frequências. Para a análise estatística inferencial foi utilizado o Teste de Qui-quadrado.  Em todas as análises um foi considerado estatisticamente significativo P valor ≤ 0,05. Os Programas utilizados foram o SPSS (IBM, versão 23, 2014) e GraphPad Instat (3.10, 2009).

Resultados

Os dados descritivos das variáveis sociodemográficas constam da Tabela 1. No presente trabalho foram obtidas 613 respostas através de formulário eletrônico, sendo 73,1% do sexo feminino e 26,4% do sexo masculino, com média de idade de 32±15 anos. Quanto à etnia, 77,7% se autodeclararam brancos, 13,2%, pardos e 2,8%, pretos. Em relação à escolaridade, a maioria (42,3%) possuíam ensino superior incompleto, 24,1% eram pós-graduados e 13,2% com ensino superior completo. A maior parte dos indivíduos possuía renda familiar mensal per capita de 5-10 salários-mínimos (30%), sendo que mais da metade das respostas eram de estudantes (52,4%), com porcentagem expressiva de autônomos (35,4%). Em relação à situação de emprego, 54% eram estudantes, 23,7% possuíam trabalho de tempo completo e 5,2% meio período, 5,5% eram aposentados, 8,6% autónomos e 2,9% estavam desempregados. Sobre o estado civil, houve 67,5% de indivíduos solteiros e 25,1% de casados. No que diz respeito à vacinação, 85,6% disseram ter se vacinado contra Covid-19. 72,3% dos sujeitos eram assistidos por planos de saúde. 

Tabela 1: dados sociodemográficos

Na Tabela 2 podemos observar os dados referentes aos hábitos sociais e de saúde. No formulário, os participantes da pesquisa classificaram a própria saúde em uma nota de 1 (ruim) a 5 (ótima), ao que a maioria respondeu ser 4 (45%). A nota 3 recebeu 25,9% das respostas e a nota 5, 22%. 

Quando questionados sobre a mudança na quantidade de substâncias ingeridas no período anterior à pandemia e durante a pandemia, os participantes relataram que em relação ao álcool, 46,5% mantiveram ou diminuíram a quantidade ingerida e 11,9% aumentaram seu consumo. Quanto ao cigarro, 3,42% mantiveram ou diminuíram a quantidade de cigarros fumados e 5,22% aumentaram. Já em relação ao consumo de drogas ilícitas, 0,8% mantiveram a quantidade consumida, 0,5% mantiveram e 2,3% aumentaram seu consumo. Quanto ao uso de medicamentos controlados, relataram que em relação aos antidepressivos, 3,26% aumentaram a dose do medicamento e 0,32% diminuíram, no entanto, 4,73% começaram a usar o antidepressivo no período da pandemia e 1,46% pararam o uso, já em relação aos ansiolíticos, 3,42% aumentaram a dose e 0,65% diminuíram, enquanto 5,22% começaram a utilizar e 1,3% interromperam o uso. 

A maior parte dos entrevistados (77,5%) não apresentava comorbidades mas 22,5% tinham, as principais eram asma (4,4%), obesidade (4,1%), diabetes (3,3%) e hipertensão (7,2%).

Em relação ao orçamento mensal, relataram que a pandemia teve um impacto negativo para 53,8% dos entrevistados, positivo para 10,4% e para 35,7% não houve impacto. Os participantes que haviam tido um impacto o classificaram com uma nota que variava de1 (não impacto) até 5 (impactou muito), a maioria respondeu nota 3 (27,4%), seguida de nota 1 (26,4%) e nota 4 (25,3%).

Tabela 2: hábitos sociais e saúde

Na Tabela 3 constam os dados e as análises comparativas dos hábitos sociais e saúde antes e durante a pandemia.

Em relação ao consumo de bebidas alcoólicas no período anterior à pandemia da COVID-19, podemos observar que, apesar de ter ocorrido uma diminuição no consumo de álcool (p= 0,0471), os indivíduos que consumiam álcool antes do isolamento social mostram um aumento significativo na frequência ingerida (0,0059).

Analisando o consumo de cigarro, no período anterior à pandemia 91,7% dos participantes não fumavam e 8,3% fumavam (p= 0,2380).  Destes, 3,3% fumavam raramente, 1% moderadamente e 4,3% diariamente. Durante a pandemia, 89,7% não estavam fumando e 10,3% estavam. Destes, 2,8% fumavam raramente, 1,8% moderadamente e 5,2% diariamente. Comparando-se esses dados, podemos observar um aumento na frequência diária de consumo de cigarros, porém a mesma não foi significativa (p= 0,4123). 

Avaliando o consumo de drogas ilícitas, 90,4% não usavam drogas no período anterior à pandemia e 9,6% usavam, já durante a pandemia 91,4% não estavam usando e 8,6% usavam (p= 0,5520). 

Em relação à prática de exercícios físicos, houve diminuição da mesma durante o isolamento social (p= 0,0243). Entretanto, com relação à frequência da prática de exercícios físicos pelos sujeitos que já eram praticantes antes da pandemia, não houve diferença significativa (p= 0,4653).

Em relação à dificuldade para dormir, houve aumento significante na frequência de indivíduos (p < 0,0001). Da mesma forma, houve uma piora significativa (p=0,0002) na qualidade alimentar.

Quanto ao uso de medicamentos controlados, houve aumento significante no número de usuários (p= 0,0083), porém aqueles que já usavam, mantiveram as mesmas causas (p=0,8266).

Outros resultados interessantes foram uma piora significativa (p < 0,0001) na percepção da saúde mental dos entrevistados, diminuição na qualidade dos relacionamentos familiares (p= 0,0003), aumento do trabalho remoto (p < 0,0001) e aumento na quantidade de horas de TV durante a pandemia (p < 0,0001).

Tabela 3: Avaliação comparativa de hábitos sociais e saúde antes e durante a pandemia

Discussão 

Neste estudo, não foi observado uma mudança significativa no hábito de consumir ou não álcool, porém houve alteração na frequência da ingesta. Tal relação ao contexto da pandemia pode ser corroborado por dados da literatura, em que houve aumento importante no consumo de cigarro e álcool durante a pandemia [4, 5, 6]. No entanto, diferentemente de outros estudos da literatura [7]  no presente trabalho, não houve mudança no consumo e frequência de cigarros, o que pode ser atribuído à dificuldade dos entrevistados em quantificar esse consumo e, também, se sentirem desconfortáveis em responder a questão, mesmo as respostas sendo anônimas. As mesmas observações podem ser aplicadas ao consumo de drogas ilícitas [7]

Em relação à frequência de exercícios físicos, houve mudança expressiva de sua realização durante a pandemia e queda na qualidade da alimentação. Outros estudos também relataram essas questões e são enfáticos em relação aos problemas que esses comportamentos podem acarretar na população, tais como: hipertensão, diabetes, sobrepeso e obesidade, doenças cardiovasculares e até mesmo o câncer[8, 9, 10, 11,12] contexto no qual os exercícios físicos se encaixam como medidas preventivas de saúde. Ainda neste aspecto, no presente estudo, o aumento significativo nas horas de TV diária, pode agravar o quadro de sedentarismo, piorando a qualidade de saúde da população.

No que se refere à saúde mental, foi registrada piora importante dessa questão, o que pode ser atribuído às causas discutidas anteriormente, as quais claramente diminuem a qualidade de vida e de saúde da população, juntamente com a diminuição na qualidade dos relacionamentos familiares, forçados pelo isolamento social e aumento do trabalho remoto[5,6,13,14]. Ainda, a piora da saúde mental não refletiu em mudança na procura por suporte psiquiátrico e psicológico, o que pode agravar a situação. Estes achados provavelmente se devem ao isolamento social vivenciado no contexto da pandemia[15] em que trabalhos recentes mostraram aumento na incidência de estresse, depressão e ansiedade, embora o presente estudo não tenha observado mudança em tais questões. Nesse ínterim, estão diversos fatores, como o receio de contrair o vírus e o distanciamento das relações interpessoais[16] além do advento das fake news, que frequentemente veiculam notícias que contribuem para o estado de medo da população[16], além de preconceito quanto à procura destes profissionais[18]

 Por fim, a dosagem de medicamentos controlados aumentou de forma significativa, incluindo os usados para depressão, ansiedade, hipertensão, diabetes e insônia, o que corrobora o quadro de piora da saúde mental observado pelo estudo e achados na literatura recente que mostraram piora na qualidade do sono[14,19].

Os achados deste trabalho contribuem para ajudar a reconhecer os impactos da pandemia e do isolamento social sobre aspectos relevantes da saúde física e mental da população. 

Conclusões 

Os dados apresentados sugerem que a piora da saúde mental e a manutenção dos hábitos não saudáveis aqui elencados são decorrentes do isolamento social, causado pela pandemia de COVID-19. Por conseguinte, ações de promoção da saúde direcionadas à adoção ou manutenção de comportamentos saudáveis, implantação de políticas públicas que fomentem ações de promoção à saúde, inclusive orientações dadas pelos profissionais de saúde, especialmente da Atenção Primária à Saúde, devem ser usadas para diminuir o sofrimento psíquico e os comportamentos não saudáveis praticados pela população em geral.

Agradecimentos

Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que financiou a bolsa PIBIC para IKDM.

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1Discentes do curso de Medicina da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto

2Docente da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto