Arthime Alves Costa*, Érika Vanessa da Silva**, Pollyanna Dórea Gonzaga***, Vaneska da Graça Cruz****
*Médico tocoginecologista do Centro de Referência da Mulher em Aracaju-SE, ** Fisioterapeuta, *** Fisioterapeuta e especialista em saúde da mulher pela UNAERP, **** Fisioterapeuta e professora da disciplina fisioterapia em ginecologia e obstetrícia da UNIT- SE
Endereço para correspondência: pollydorea@pop.com.br, rua Godofredo Almeida nº 68 Bairro: Conceição Itabuna-Bahia CEP: 45600-000
Resumo
A incontinência urinária de esforço é definida como a perda de urina através do meato externo da uretra, quando a pressão intravesical excede a pressão de fechamento uretral, na ausência de contração do detrusor. A fisioterapia através de seus recursos e técnicas vem ganhando destaque nos últimos anos, como tratamento conservador, em face da melhoria dos resultados e baixos efeitos colaterais. A proposta essencial deste trabalho foi comparar a eficácia de dois métodos de tratamento cinesioterapêuticos (exercícios de Kegel e cones vaginais) em pacientes com incontinência urinária de esforço, de qualquer idade, avaliadas e encaminhadas pelo médico (ginecologista) ou outro com perícia neste campo. Foram selecionadas quatro mulheres com idades variando entre 23 e 68 anos (média de 47 anos) provenientes do Centro de Referência da Mulher da cidade de Aracaju-SE. As participantes foram divididas em dois grupos (grupo 1 cones vaginais e grupo 2 exercício de kegel) de forma randomizada. Através deste trabalho foi possível concluir que não existe protocolo específico para o tratamento de pacientes com incontinência urinária de esforço, devendo o fisioterapeuta ser capaz de designar qual o melhor recurso para sua paciente e ter consciência sobre a feminilidade e sobre os aspectos sociais e emocionais que envolvem cada paciente.
PALAVRAS-CHAVE: cones vaginais, exercícios de kegel, incontinência urinária de esforço
ABSTRACT
The stress urinary incontinence is defined as the urine loss through the external meato of the uretra, when the pressure intravesical exceeds the pressure of closing uretral, in the absence of contraction of the detrusor. The physiotherapy has been receiving more credit in the last years, due the improvement of the results and low collateral effects. The essential proposal of this work is to compare the effectiveness of two methods of cinesioterapêuticos treatments (exercises of Kegel and vaginal cones) in patients with stress urinary incontinence, in any age, evaluated and sent by the doctor (gynecologist) or another with know-how in this field. Four women were selected with ages varying between 23 and 68 years (average 47) coming frm the Center of Woman’s Reference in Aracaju city. Through this work it was possible to conclude that there isn’t specific protocol for the patients\’ treatment with urinate incontinence of effort, the physiotherapist should be capable to designate which the best resource for its patient and to have the awareness about the femininity and on the social and emotional that concerns each patient one.
KEYWORD: vaginal cones, exercises of Kegel, stress urinary incontinence
INTRODUÇÂO
A Incontinência Urinária de Esforço (IUE) é uma afecção que traz sérias repercussões à qualidade de vida da mulher, pois ao perderem urina, sentem-se constrangidas em seu convívio social por terem que usar absorventes, prejudicando assim suas atividades profissionais, deteriorando suas relações afetivas, restringindo suas atividades e causando, também, outras alterações como lesões vulvares que podem originar dispareunia. A incidência desta afecção é grande, sendo que uma em cada quatro mulheres na faixa de 30 a 59 anos já experimentou pelo menos um episódio de perda de urina ao longo da vida.Vale ressaltar, ainda que é cada vez maior o número de adolescentes a partir dos 18 anos que já demonstram flacidez da musculatura pélvica chegando a apresentar a IUE [ 1].
Segundo a Sociedade Internacional de Continência (SIC), a IUE é definida como a perda urinária através do meato externo da uretra quando a pressão intravesical excede a pressão máxima de fechamento uretral na ausência de contração do detrusor. Pode ser traduzida por um sinal que é a demonstração física da perda da urina, um sintoma que se refere à queixa da paciente e uma condição quando há o aumento da pressão intravesical [ 2 ].
A IUE é atribuída à coexistência de numerosos fatores e não a um isoladamente, como fraqueza muscular, idade, cirurgias prévias, número de partos, má assistência no parto dentre outros. Estes fatores juntos promovem alterações funcionais da uretra como a hipermobilidade uretral e/ou a insuficiência esfincteriana extrínseca [ 3 ].
O diagnóstico da IUE é imprescindível para a boa evolução do tratamento.Toda paciente deve ser submetida a uma anamnese completa e um exame físico que é de fundamental importância para se excluir algumas condições clínicas que possam interferir na avaliação diagnóstica da IUE. Testes especiais também podem ser realizados como a força dos músculos do assoalho pélvico e abdominais, o pad-teste, o teste do absorvente, o Q-tip teste e o teste de esforço [ 4 ] . Como propedêutica quantitativa pode ser realizado o estudo urodinâmico, o qual permite registrar com precisão os valores das pressões vesical e uretral e a respectiva relação com o repouso e o esforço [ 5, 6 ].
Uma vez confirmado o diagnóstico da IUE, o tratamento pode ser conservador (fisioterapêutico e farmacológico), cirúrgico ou combinado. O tratamento cirúrgico baseia-se na correção da hipermobilidade do colo vesical, ou no aumento da resistência uretral em caso de insuficiência esfincteriana intrínseca da uretra [ 7 ]. A farmacologia, com seus recentes avanços, dispõe de drogas cujos efeitos envolvem a contração e relaxamento da bexiga e uretra, contribuindo para o tratamento da IUE [ 4, 5 ].
A fisioterapia, ultimamente, tem se tornado fator contribuinte para a melhora ou cura da IUE. A função primordial é melhorar a força de contração das fibras do períneo e fortalecer os músculos necessários para manter a continência urinária [ 8 ]. Dentre os recursos utilizados pela fisioterapia tem-se a cinesioterapia perineal e postural, que é a utilização de exercícios, com o intuito de manter ou melhorar a força e o tônus muscular. Estes exercícios apresentam excelentes resultados em caso de IUE leve a moderada ou como coadjuvante do tratamento cirúrgico [ 3 ].
Os cones vaginais contribuem para o fortalecimento muscular pela resistência, promovem propiocepção aumentando, assim, a motivação da paciente e evitando contrações indesejáveis dos músculos abdominais e glúteos [ 7 ]. A eletroestimulação vaginal propicia um meio para a contração passiva da musculatura perineal, é muito importante na conscientização da musculatura do períneo em pacientes com dificuldade em identificar a mesma. O biofeedback, que em conjunto com outras técnicas, utiliza-se de instrumentos eletromecânicos e eletrônicos, permite à paciente estar ciente do funcionamento do seu corpo e através de sinais auditivos, visuais e gráficos facilita a reeducação da musculatura envolvida [ 9 ]. A cinesioterapia perineal, através dos exercícios de Kegel, tem como objetivo aumentar o tônus estático e a força rápida do músculo elevador do ânus. O procedimento consiste em educar a paciente a utilizar a musculatura adjacente à uretra, para um melhor controle da perda urinária, atuando principalmente nas fibras musculares estriadas do tipo II dos diafragmas urogenital e pélvico. Assim, pode-se melhorar a pressão intra-uretral e o suporte do colo vesical e uretra proximal, favorecendo melhor a transmissão da pressão [ 10, 11, 12 ]. E a cinesioterapia postural que atua como chave para preservar o equilíbrio entre os diferentes sistemas do corpo humano. Dentre as técnicas e recursos que podem ser utilizadas destacam-se a facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP), a reeducação postural global (RPG), o iso-streching, a ginástica abdominal hipopressiva, as bolas suíças, as caneleiras e theraband [ 13 ].
MATERIAIS e MÉTODOS
Foram selecionadas quatro mulheres com idades variando entre 23 e 68 anos (média de 47 anos), com diagnóstico de incontinência urinária de esforço, encaminhadas pelo ginecologista, provenientes do Centro de Referência da Mulher, na cidade de Aracaju-SE. O tratamento foi realizado no Centro de Reabilitação Leonor Barreto Franco, no período de 26 de setembro a 31 de outubro de 2003, totalizando dezesseis sessões, sendo que a primeira sessão foi destinada à avaliação e ao ganho de confiança da paciente, pois neste primeiro momento é que se estabelece o vínculo e conquista-se a confiança e a adesão da paciente ao tratamento.Foram dados esclarecimentos às pacientes sobre a patologia, através de palestra, o tratamento a ser realizado, com demonstrações dos recursos a serem utilizados, e para conhecimento da contração correta da musculatura perineal as pacientes foram orientadas a cortar o jato de urina, não sendo essa orientação utilizada como forma de tratamento, mas apenas para o conhecimento da musculatura perineal. As sessões foram realizadas três vezes por semana, às segundas, quartas e sextas-feiras, com duração de uma hora cada. Para a realização do trabalho, todos os envolvidos assinaram um termo de consentimento (médico, pacientes, acadêmicas e orientadora).
No exame físico foram realizadas avaliações da postura (anteversão ou retroversão pélvica, hipercifose torácica, escoliose, hiperlordose lombar e discrepância dos membros inferiores), visando à correção tanto quanto possível, pois estas poderiam estar causando desarmonia pélvica e desta forma exacerbando os desequilíbrios perineais como a incontinência. O grau de força de contração perineal foi mensurado e classificado de acordo com a avaliação funcional de ORTIZ, 1994. Após esse procedimento, utilizou-se o aparelho PERINA (myofeedback pneumático) produzido pela empresa QUARK, pelo qual se avalia de forma objetiva o nível de contração da musculatura do assoalho pélvico, que é demonstrado em mmHg. Para a realização do pad-test (teste do absorvente), o qual baseia-se na medida da perda urinária de acordo com a variação inicial e final do peso do absorvente, tendo duração de uma hora, a paciente foi orientada a não ingerir líquido em casa, pois segundo a SIC faz-se necessário a ingestão de 500mL de líquido por quinze minutos e repouso até o fim da primeira meia hora. Foi mensurada também a força dos músculos abdominais, adutores, glúteos e paravertebrais através do sistema de graduação numérica para a avaliação da força, pois esses músculos interferem diretamente na manutenção do equilíbrio da cintura pélvica e conseqüentemente contribuem para alterações perineais.
Outro recurso utilizado de grande valia foi o diário miccional. As pacientes foram orientadas a anotar todos os dados relativos à sua rotina miccional por um período de vinte e quatro horas. Esses testes serviram não só como meio de avaliação inicial e final, como também, como método de mensuração da eficiência da reabilitação, servindo ainda, para determinação da progressão da paciente no tratamento.
Para realização deste trabalho, foram aplicados dois métodos de tratamento cinesioterapêuticos (exercícios de Kegel e cones vaginais), tendo sido as pacientes escolhidas e locadas aleatoriamente nos dois grupos. O grupo 1 realizou o tratamento com a utilização de cones vaginais, PERINA (myofeedback pneumático) e exercícios isotônicos para a musculatura abdominal, paravertebral, glútea e adutora enquanto, o grupo 2 utilizou exercícios de Kegel, o PERINA (myofeedback pneimático), e os exercícios isotônicos para amusculatura específica. Em ambos os grupos foram utilizadas caneleiras de 1 Kg para o fortalecimento da musculatura glútea e adutora e foram trabalhadas as fibras de contração rápida (tipo II) e as fibras de contração lenta (tipo I) dos músculos do assoalho pélvico.
RESULTADOS
Para avaliar a eficácia das técnicas cinesioterapêuticas (exercícios de Kegel e cones vaginais), seis parâmetros foram levados em consideração como a avaliação da força do assoalho pélvico (AFA), o pad-test, o myofeedback pneumático (PERINA), o diário miccional, a troca de absorventes e a avaliação subjetiva. Esses parâmetros foram analisados na avaliação inicial, na décima sessão e na avaliação final (após quinze sessões).
Pela análise dos dados compilados pode-se afirmar que ambos os grupos obtiveram melhora em relação aos sinais e sintomas da incontinência urinária de esforço. Ressaltando-se que a melhora foi expressivamente melhor no grupo 1 (cones vaginais) em relação ao grupo 2 (exercícios de Kegel), o que pode ser confirmado objetivamente através do myofeedback . Em ambos os grupos, 50% das pacientes tinham vida sexual ativa e relataram uma melhora significativa de prazer durante o ato sexual. Os outros 50% que não tinham vida sexual ativa relataram uma melhora da auto-estima, das atividades do dia-a dia e o resgate ao convívio social.
CONCLUSÃO
Pelo tratamento realizado foi possível observar que a fisioterapia na reabilitação uroginecológica através dos seus recursos cinesioterapêuticos, trouxe benefícios consideráveis para as pacientes que sofrem de incontinência urinária de esforço, proporcionando alívio ou ausência dos desconfortos e insatisfações sentidas por elas.
Pode-se afirmar que não existe um protocolo específico para o tratamento das pacientes com incontinência urinária de esforço, já que cada paciente é única, sendo de fundamental importância um diagnóstico médico preciso para que o tratamento fisioterapêutico seja adequado.
O fisioterapeuta precisa ter consciência sobre a feminilidade, os aspectos sociais e emocionais que envolvem as pacientes, ter um conhecimento sólido da anatomia e fisiologia do organismo feminino, estar a par das repercussões que as técnicas podem acarretar a cada paciente, ser preciso e claro quanto aos esclarecimentos das dúvidas e ter aptidão para realizar as práticas a fim de desenvolver uma melhor abordagem em prol da recuperação da sua paciente.
Vale ressaltar ainda, a necessidade de uma equipe multidisciplinar a qual trará resultados mais satisfatórios para as pacientes, proporcionando-lhes uma melhor qualidade de atendimento.
REFERÊNCIAS
1. FERREIRA, J. S. As vantagens dos exercícios para a região genital. [online] Disponível via Internet em: http://www.google.com.br. Arquivo capturado em 16 de setembro de 2003.
2. HADDAD, J. P. Papel funcional da avaliação do assoalho pélvico no tratamento da incontinência urinária de esforço. In: Jornal da Incontinência Urinária Feminina. [online] Disponível na Internet via: http://www.jinuf.org.br . Arquivo capturado em 10 de setembro de 2003.
3. PACETTA, A. M. et al. Tratamento não cirúrgico da incontinência urinária de esforço. Revista do Centro de Referência. v. 1, n. 2, 1996, p, 22-26..
4. BARACHO, E. L. Fisioterapia aplicada á obstetrícia: aspectos de ginecologia e neonatologia. 3. ed. Minas Gerais: Médisi, 2002. 8-15 p; 274-291p; 308-325p; 366-373 p.
5. BEREK, J. S. Tratado de ginecologia. 12. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. 437-459 p.
6. GIRÂO, M. J; LIMA. G. R.; BARACATI, E. C. Uroginecologia. São Paulo: Artes Médicas. 1997. 33-43 p.
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8. GROSSE, D. ; SENGLER, J.. Reeducação perineal. 1. ed. Barueri, S P: Manole, 2002. 1-129p.
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13. CHAPIGNION, P. Respir-ações: a respiração para uma vida saudável. São Paulo: Summos, 1998. 27-28 e 53-58 p.