Associação entre variáveis sociodemográficas, nível de atividade física, hipertensão e diabetes em pacientes com dor crônica em serviços da Atenção Primária à Saúde

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.8179382


Isadora de Souza Bernardes Elias1,
Gustavo Baroni Araujo²,
Matheus Vinicius Barbosa da Silva3,
Geisa Franco Rodrigues4,
Helio Serassuelo Junior5,
Rui Gonçalves Marques Elias6
Michelle Moreira Abujamra Fillis7


Resumo

Objetivo: Investigar a associação entre variáveis sociodemográficas, nível de atividade física, hipertensão e diabetes em pacientes com queixa de dor crônica usuários da Atenção Primária à Saúde. Metodologia: Estudo transversal de base populacional comunitária com usuários da APS. A amostra foi composta por 91 adultos com idade média de 65 (55;70) anos sendo 81 do sexo feminino, que apresentaram queixa de dor crônica em serviços da atenção primária na cidade de Jacarezinho-PR. Utilizou-se questionário sociodemográfico para analisar as variáveis sociodemográficas dos pacientes, Escala visual analógica (EVA) para mensurar a intensidade da dor, aferição e classificação da pressão arterial para o diagnóstico de hipertensão, diagnóstico médico confirmado de diabetes (tipo I ou II) e IPAQ versão curta para investigar o tempo e classificação da atividade física. Utilizou-se o teste qui-quadrado estabelecer a associação entre nível de atividade física, hipertensão e diabetes e regressão logística stepwise com o Odds Ratio ajustado e um IC de 95%. Em todas as análises a significância adotada foi <0,05. Para a organização e tabulação dos dados utilizou-se uma planilha do Excel do pacote Office. A análise estatística foi realizada no software SPSS versão 27.0. Resultados: Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na associação entre as variáveis sociodemográficas analisadas, nível de atividade física, hipertensão e diabetes. Conclusão: Pacientes com dor crônica não apresentaram um perfil sociodemográfico e de condições de saúde associados ao nível de atividade física. Este hábito que pode variar a depender do quadro clínico, da queixa e das condições da dor do paciente.

Palavras-chave: Dor crônica; Exercício Físico; Saúde coletiva.

Abstract

Objective: To investigate the association between sociodemographic variables, level of physical activity, hypertension and diabetes in patients with chronic pain who use Primary Health Care. Methodology: Community population-based cross-sectional study with PHC users. The sample consisted of 91 adults with a mean age of 65 (55;70) years, 81 female, who complained of chronic pain in primary care services in the city of Jacarezinho-PR. A sociodemographic questionnaire was used to analyze the patients’ sociodemographic variables, Visual Analog Scale (VAS) to measure pain intensity, measurement and classification of blood pressure for the diagnosis of hypertension, confirmed medical diagnosis of diabetes (type I or II) and IPAQ short version to investigate the time and classification of physical activity. The chi-square test was used to establish the association between physical activity level, hypertension and diabetes and stepwise logistic regression with the adjusted Odds Ratio and a 95% CI. In all analyses, the adopted significance was <0.05. For the organization and tabulation of the data, an Excel spreadsheet from the Office suite was used. Statistical analysis was performed using SPSS version 27.0 software. Results: No statistically significant differences were found in the association between the analyzed sociodemographic variables, level of physical activity, hypertension and diabetes. Conclusion: Patients with chronic pain did not present a sociodemographic profile and health conditions associated with the level of physical activity. This habit may vary depending on the patient’s clinical picture, complaint and pain conditions.

Keywords: Chronic pain; Physical exercise; Collective health.

Resumen

Objetivo: Investigar la asociación entre variables sociodemográficas, nivel de actividad física, hipertensión arterial y diabetes en pacientes con dolor crónico que acuden a la Atención Primaria de Salud. Metodología: Estudio transversal de base poblacional comunitaria con usuarios de APS. La muestra estuvo compuesta por 91 adultos con una edad media de 65 (55;70) años, 81 del sexo femenino, que se quejaron de dolor crónico en los servicios de atención primaria en la ciudad de Jacarezinho-PR. Se utilizó un cuestionario sociodemográfico para analizar las variables sociodemográficas de los pacientes, Escala Visual Analógica (EVA) para medir la intensidad del dolor, medición y clasificación de la presión arterial para el diagnóstico de hipertensión arterial, diagnóstico médico confirmado de diabetes (tipo I o II) e IPAQ versión corta para investigar el tiempo y clasificación de la actividad física. Se utilizó la prueba de chi-cuadrado para establecer la asociación entre el nivel de actividad física, la hipertensión y la diabetes y la regresión logística por pasos con el Odds Ratio ajustado e IC del 95%. En todos los análisis, la significación adoptada fue <0,05. Para la organización y tabulación de los datos se utilizó una hoja de cálculo Excel de la suite Office. El análisis estadístico se realizó con el software SPSS versión 27.0. Resultados: No se encontraron diferencias estadísticamente significativas en la asociación entre las variables sociodemográficas analizadas, nivel de actividad física, hipertensión y diabetes. Conclusión: Los pacientes con dolor crónico no presentaron perfil sociodemográfico y condiciones de salud asociadas al nivel de actividad física. Este hábito puede variar según el cuadro clínico, la queja y las condiciones de dolor del paciente.

Palabras llave: Dolor crónico; Ejercicio físico; Salud pública.

1. Introdução

A elevada prevalência e incidência de pacientes diagnosticados com dor crônica caracteriza a problemática como um problema global de saúde pública. O que gera uma ampla variedade de consequências, tanto a nível individual quanto coletivo, incluindo danos físicos, sociais, emocionais e econômicos (GoldBerg; McGee, 2011). Por definição, a dor crônica se desenvolve de forma contínua ou recorrente com duração mínima de três meses, tendo sua etiologia incerta e não desaparecendo após o emprego de procedimentos terapêuticos convencionais, causando incapacidades e inabilidades de forma prolongadas (AGUIAR et al., 2021).

Diversos estudos (CIOLA et al., 2021; SILVA et al., 2021; MOURA et al., 2022) têm buscado investigar a associação entre dor crônica e as variáveis sociodemográficas destes pacientes. Sabe-se que o sexo feminino e sujeitos com saúde mental prejudicada apresentam maior predisposição ao desenvolvimento do quadro, ainda, é possível que a dor crônica possa estar associada a eventos como à depressão, problemas relacionados ao sono, incapacidade de realizar atividades físicas e atividades da vida diária e ainda comprometer as relações sociais (SOUZA et al., 2019).

Assim, nota-se que a presença de dor crônica pode acarretar em prejuízos significativos em diferentes aspectos da saúde, bem-estar e da qualidade de vida destes pacientes. Ao tratarmos os hábitos saudáveis, a prática de atividade física tem sido fortemente recomendada como forma de manutenção e minimização de prejuízos à saúde, como forma de tratamento e diminuição da dor crônica além de ser fator de proteção para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) como hipertensão e diabetes (ARAUJO et al., 2021; Silva et al., 2023).

Dados disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde de Jacarezinho-PR em 2022 através do “Programa Nacional de Atenção à Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus” apontam cerca de 4.751 hipertensos e 2.010 diabéticos estratificados no município (BRASIL, 2022). Os números parecem alarmantes considerando a estimativa populacional de 40.356 habitantes em 2023. Neste contexto, frente a magnitude do problema, a atenção primária à saúde (APS) desempenha papel fundamental na identificação, estratificação e gerenciamento desses pacientes, por meio da garantia ao acesso à saúde e estratégias de prevenção e promoção da saúde (Laura et al., 2021; Silva et al., 2023).

No que concerne à dor crônica, estimativas demonstram que tal condição é uma das principais causas de anos de vida vividos com incapacidade, com carga mais prevalente em países de baixa e média renda (Hay SI et al., 2017; Kohrt et al., 2018). O ambiente da APS é extremamente propício para o manejo deve ser realizado de forma holística e integral, através de abordagens farmacológicas e não farmacológicas, com auxílio multiprofissional e quando necessário o referenciamento aos demais níveis de atenção (Mills et al., 2016).

Face a importância da prática de atividade física como um adjunto favorável contra os efeitos deletérios decorrentes da hipertensão, diabetes e dor crônica, o objetivo do presente estudo foi investigar a associação entre variáveis sociodemográficas, nível de atividade física, hipertensão e diabetes em pacientes com queixa de dor crônica usuários da APS.

2. Metodologia

Trata-se de um estudo transversal de base populacional comunitária com usuários da APS, parte do projeto de pesquisa intitulado “Fatores de risco para as doenças crônicas do aparelho circulatório e programa de exercício físico em adultos”, vinculado à Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP).

A amostra foi composta por 91 adultos com idade média de 65 (55;70) anos sendo 81 (89%) do sexo feminino, e 10 (11%) do sexo masculino que apresentaram queixa de dor crônica em serviços da atenção primária na cidade de Jacarezinho-Paraná. Após a autorização da Secretaria Municipal de Saúde e orientação da equipe da saúde da família (ESF), os pacientes com queixa de dor crônica foram encaminhados para a avaliação com profissionais da Fisioterapia em sua unidade de abrangência.

Para a coleta de dados, os pacientes foram abordados de forma individual e convidados a responderem os questionários contendo informações sociodemográficas, questões sobre o tempo de atividade física e sobre as condições de saúde. Mediante o aceite dos pacientes em participar do estudo pelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) estes indivíduos estavam aptos a participarem do estudo.

As avaliações foram realizadas por meio de questionário sociodemográfico, o qual incluía: nome, endereço, cidade/estado, telefone, idade, estado civil, data de nascimento, profissão atual, etilismo, tabagismo, uso de drogas, COVID-19 (se teve, a quanto tempo e se tomou a vacina contra o vírus) e se apresentava hipertensão arterial sistêmica (sim ou não) e diabetes mellitus (não).

Para verificar a dor foi utilizada a “Escala visual analógica” (EVA). Essa escala é um instrumento unidimensional para a avaliação da intensidade da dor. Trata-se de uma linha com as extremidades numeradas de 0-10. Em uma extremidade da linha é marcada “nenhuma dor” e na outra “pior dor imaginável”. Pede-se, então, para que o paciente avalie e marque na linha a dor presente naquele momento.

Para o diagnóstico da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), utilizou-se os valores de referências para população adulta disponibilizada na Diretriz Brasileira de Hipertensão mais recente (Barroso et al., 2021). Os valores para classificação da pressão arterial são: 1) Ótima (<120 e <80 mmHg); 2) Normal (<130 e <85 mmHg); 3) Limítrofe (130-139 e 85-89 mmHg); 4) Hipertensão estágio 1 (140-159 e 90-99 mmHg); 5) Hipertensão estágio 2 (160-179 e 100-109 mmHg); 6) Hipertensão estágio 3 (≥180 e ≥110 mmHg); e 7) Hipertensão sistêmica isolada (≥ 140 e < 90 mmHg).

Para o diagnóstico da Diabetes Mellitus (DM) tipo I ou II considerou-se diagnóstico médico confirmado (sim/não) de acordo com os valores de glicose plasmáticas (em mg/dl) para diagnóstico de DM e seus estágios pré-clínicos.

Para investigar o nível de atividade física, utilizou-se o International Physical Activity Questionnaire (IPAQ) em sua versão curta. Este questionário é composto por 8 questões abertas, sendo 6 para investigar o tempo de atividade física e 2 para investigar o tempo em comportamento sedentário. Este questionário se estrutura no formato recordatório, com base nos últimos 7 dias. O nível de atividade física que conceitua as categorias é classificado da seguinte forma: 1) Sedentário: não realiza nenhuma atividade física por pelo menos 10 minutos contínuos durante a semana; 2) Insuficientemente Ativo: indivíduos que praticam atividades físicas por pelo menos 10 minutos continuos por semana, porém de maneira insuficiente para ser classificado como ativos. Para classificar os indivíduos nesse critério, são somadas a duração e a frequência dos diferentes tipos de atividades (caminhadas + moderada + vigorosa). Essa categoria divide-se em dois subgrupos: 1) Insuficientemente Ativo A: realiza 10 minutos contínuos de atividade física, seguindo pelo menos um dos critérios citados: frequência – 5 dias/semana ou duração – 150 minutos/semana; e 2) Insuficientemente Ativo B: não atinge nenhum dos critérios da recomendação citada nos indivíduos insuficientemente ativos A. Indivíduos que atendem as recomendações propostas pela OMS são classificados em: 1) Ativo: cumpre as seguintes recomendações: a) atividade física vigorosa – ≥3 dias/semana e ≥ 20 minutos/sessão; b) moderada ou caminhada – ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 minutos/sessão; c) qualquer atividade somada: ≥ 5 dias/semana e ≥ 150 min/semana; e 2) Muito Ativo: cumpre as seguintes recomendações: a) vigorosa – ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 min/ sessão; b) vigorosa – ≥ 3 dias/semana e ≥ 20 min/sessão + moderada e ou caminhada ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 min/sessão (MELO et al., 2016).

As instruções a respeito dos questionários foram fornecidas antes do início da aplicação. A coleta de dados ocorreu entre outubro de 2021 a setembro de 2022. O tempo médio estipulado para resposta foi de aproximadamente 20 minutos. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa com seres humanos da UENP sob o parecer nº 4.170.827.

Para a análise dos dados, as variáveis numéricas foram testadas quanto à distribuição de normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk. Quando o pressuposto de normalidade foi aceito, as variáveis foram apresentadas em média (média) e desvio padrão (DP), quando não, os dados foram apresentados em mediana (Md) e quartis (25-75%). As variáveis categóricas foram apresentadas pela frequência.

A análise univariada foi aplicada usando as tabelas cruzadas por qui-quadrado (com correção de continuidade de Yates quando indicado) empregada para estabelecer a associação entre nível de atividade física (classe 1 e classe 2) e as variáveis: idade (até 59 anos e igual ou maior de 60 anos); sexo (feminino e masculino), cônjuge (com companheiro ou sem companheiro), trabalho (com trabalho ou sem trabalho/aposentado), diagnóstico de Covid-19 no último ano (sim ou não), HAS segundo a classificação da PA em 1 (ótimo, normal e limítrofe), 2 (hipertensão estágios 1,2, e sistólica isolada, DM (ausência ou presença).

Os valores dessas análises foram usados no modelo de regressão logística stepwise (razão de verossimilhança direta) com o Odds Ratio ajustado e um IC de 95% definido para expressar sua magnitude, onde a variável dependente foi nível de atividade física (categorizado em: 1) Classe 1: Indivíduos muito ativos e ativos; e 2) Classe 2: Irregularmente ativo A e B e sedentários. As variáveis independentes incluídas na análise foram: sexo (masculino e feminino), faixa etária (18-39 anos: adultos jovens; 40-59 anos: meia idade e; 60-90 anos: idosos), situação conjugal (com e sem companheiro), situação profissional (aposentado, não trabalha e trabalha), tabagismo (nunca fumou, ex-fumante e fumante), presença de dor crônica (sim ou não) diagnóstico médico de: hipertensão arterial (não e sim), diabetes mellitus (não e sim) e COVID-19.

Em todas as análises a significância adotada foi <0,05. Para a organização e tabulação dos dados utilizou-se uma planilha do Excel do pacote Office. A análise estatística foi realizada através do software SPSS versão 27 (IBM, NY, EUA) e GraphPad Prism versão 8.0.1.

3. RESULTADOS

91 pacientes com queixa de dor crônica foram incluídos no estudo. A faixa etária mediana foi de 65 (55;70) anos, sendo 81 (89%) do sexo feminino e 10 (11%) do sexo masculino. A mediana da dor foi de 6 (3-8). A tabela 1 apresenta as características da amostra de acordo com as variáveis analisadas: sexo, faixa etária, cônjuge, profissão, tabagismo, etilismo, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e COVID-19.

Tabela 1. Informações descritivas da amostra de acordo com as variáveis sexo, faixa etária, cônjuge, profissão, tabagismo, etilismo, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e COVID-19 (n = 91).

Variáveln%
Sexo

Feminino8189,1%
Masculino1010,9%
Faixa Etária

18 – 39 anos44,4%
40 – 59 anos3134,1%
60 – 90 anos5661,5%
Cônjuge

Com cônjuge4852,7%
Sem cônjuge4347.3%
Profissão

Aposentado3437,4%
Desempregado33,3%
Empregado5459,3%
Tabagismo

Sim1213,2%
Não7986,8%
Etilismo

Sim1213,2%
Não7986,8%
Hipertensão arterial sistêmica

Sim5863,7%
Não3336,3%
Diabetes mellitus

Sim2224,1%
Não6975,9%
COVID-19

Não6369,2%
Sim2830,8%
Fonte: Elaborada pelos autores (2023).

Observa-se que a amostra foi composta principalmente por pacientes do sexo feminino, entre 60 e 90 anos, com cônjuge, com emprego, sem uso de tabaco e álcool. Cerca de 28,6% apresentaram o diagnóstico de diabetes mellitus e 63,7% apresentaram quadro de hipertensão arterial sistêmica. A figura 1 apresenta as informações relacionadas ao tempo de atividade física da amostra, segundo as classificações do IPAQ – versão curta: Muito ativo, ativo, irregularmente ativo A, irregularmente ativo B e sedentário.

Figura 1. Classificação do Nível de Atividade Física da amostra de acordo com as classificações do IPAQ – versão curta: Muito ativo, ativo, irregularmente ativo A, irregularmente ativo B e sedentário (n = 91).

Fonte: Elaborada pelos autores (2023).

A amostra foi enriquecida principalmente por indivíduos “Sedentários” (56%) e “Ativos” (18,6%). A tabela 2 apresenta a associação entre o nível de atividade física e as variáveis sexo, idade, cônjuge, profissão, hipertensão e diabetes.

Tabela 2: Associação entre classificação de atividade física e as variáveis sexo, idade, cônjuge, profissão, hipertensão (sim/não) e diabetes (sim/não).

VariávelClassificação de atividade físicap-valor***
Classe A* (n = 23)Classe B** (n = 68)
Sexo
Feminino22590.22
Masculino19
Idade
Até 59 anos12230.11
60 anos ou mais1145
Cônjuge
Com cônjuge1434
Sem cônjuge9340.36
Profissão
Aposentado/desempregado829
Empregado15390.50
Hipertensão
Não1241
Sim11270.49
Diabetes
Não17480.76
Sim620
Fonte: Elaborada pelos autores (2023).

Nota: *Classe A: Muito ativos e ativos; **Classe B: Indivíduos irregularmente ativos A e B e sedentários; ***teste qui-quadrado

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na associação entre nenhuma das variáveis sócio demográficas e classificação de atividade física, hipertensão e diabetes.

4. DISCUSSÃO

Este estudo investigou o perfil e a associação entre o nível de atividade física, hipertensão e diabetes em 91 pacientes com queixa de dor crônica usuários de unidades de atenção primária a saúde. O perfil dos participantes deste estudo foi composto em sua maioria pelo sexo feminino (89%), predominantemente idosos (60 – 90 anos), com cônjuge, empregados, não tabagista e etilista e que não tiveram COVID-19. Acredita-se que a heterogeneidade observada nas variáveis sociodemográficas da amostra deste estudo possa ter relação ao fato de serem pacientes da APS, já que o objetivo destes serviços é garantir atendimento abrangente, acessível e baseado na comunidade (TITTON et al., 2022).

Além disso, vale destacar que 63,7% da amostra apresentaram o diagnóstico de hipertensão arterial, os achados parecem similares ao do estudo de Da Rosa et al., (2022) onde a prevalência de HAS de 67% em indivíduos com idade entre 70 e 79 anos. Em relação a diabetes, cerca de 28,6% apresentaram o quadro da doença. Considerando que a amostra do presente estudo foi enriquecida por idosos, a prevalência de HAS e de diabetes pode estar associada ao avançar da idade, conforme já destacado por Sarno; Bittencourt; Oliveira (2020). Ainda, o desenvolvimento da HAS e da diabetes não ocorre unicamente pelo processo de envelhecimento, entretanto, o excesso de peso, fatores genéticos, estresse, hábitos alimentares inadequados e inatividade física são condições que contribuem para o surgimento ou agravamento destes quadros (NOVAES NETO; ARAUJO; SOUSA, 2020; OLIVEIRA et al., 2022).

O processo de envelhecimento traz consigo o aumento da probabilidade do desenvolvimento de multimorbidades, em especial às doenças crônico-degenerativas, além de que, quanto mais avançada a idade maior será o risco de exposição a eventos e estímulos nocivos que possam desencadear dor crônica (Mills et al., 2019). Em consonância, este estudo demonstrou a prevalência maior entre as faixas de 60 anos ou mais. No que diz respeito a dor crônica, a maior proporção de queixa foi observada no sexo feminino (89,1%) quando comparado ao sexo masculino (10,1%), o que corrobora com o estudo de Ruviaro e Filippin (2012), na qual a amostra foi composta predominantemente por indivíduos do sexo feminino (87%), além disso, a intensidade da dor da amostra, corresponde a uma média de 7,38, um índice relativamente alto e próximo da mediana 6 na escala EVA encontrado no presente estudo.

Em relação à maior prevalência da dor crônica no sexo feminino, estes achados podem ser parcialmente explicados pelo maior percentual busca das mulheres aos serviços de saúde (Szwarcwald et al., 2021), por questões genéticas e hormonais (Mills et al., 2019), e pela maior sensibilidade e disponibilidade em relatar a dor, visto que a masculinidade hegemônica torna-se um fator limitante, pois a demonstração da dor passa a ser considerada como um sinal de fraqueza e feminilidade (Samulowitz et al., 2018).

No tocante à classificação do nível da prática de atividade física dos participantes deste estudo, identificou-se a predominância de pacientes que referiram ser sedentários ou insuficientemente ativos. O estudo de Bobbo et al., 2018 demonstrou dados similares, onde a prevalência do sedentarismo em pacientes com dor crônica esteve associada à percepção negativa da própria saúde, maior consumo de medicamentos e maior sensação de dificuldade para realização das atividades devido à dor. Deste modo, acredita-se que a intensidade da dor pode ser um fator que interfira negativamente no habito de praticar atividade física.

Ainda, não foi encontrada associação entre classificação da atividade física com as variáveis sóciodemográficas investigadas. Estes achados refletem as diferentes características dos usuários da APS e reforçam a inexistência de um perfil sóciodemográfico que seja fisicamente ativo ou insuficientemente ativo. Reforça-se que a prática de atividade física é um habito que apresenta relação com o meio social e cultural, influenciado também por fatores ambientais, além de ser um hábito particular que está fortemente relacionado à disponibilidade de tempo, oportunidades e interesse pela prática (CELICH; SPADARI, 2008).

Apesar de não terem sido encontradas estatisticamente significativas entre nível de atividade física e HAS e DM (p=0,49 e p=0,76, respectivamente), embora a prevalência de ambas as condições tenha sido maior entre os indivíduos com níveis mais baixos de atividade física, os achados de Turi et al., (2011) evidenciaram maior tempo em inatividade física em indivíduos diabéticos e/ou hipertensos. Sabe-se que a prática de atividade física é um habito fortemente recomendado por profissionais da saúde, com grande contribuição para a saúde física, mental, e no controle de doenças crônicas não transmissíveis (ARAUJO et al., 2021; VENANCIO et al., 2022).

De acordo com Geneen et al., 2017 a realização de intervenções baseadas em exercícios está associada a redução da dor e incapacidade em adultos com agravos crônicos, como artrite reumatoide, osteoartrite, fibromialgia, dor lombar, claudicação intermitente, dismenorreia, distúrbio do pescoço, lesão da medula espinhal, síndrome pós-pólio e dor femoropatelar, sobretudo pela melhora da qualidade de vida, função física e redução da gravidade da dor. Entre as estratégias destacam-se os exercícios de alongamento, força e equilíbrio, pilates, exercícios baseados no core (Fernández-Rodríguez et al., 2019), ioga, tai chi, treinamento aeróbico (Geneen et al., 2017), treinamento de habilidades motoras (Van Dillen et al., 2021) e exercícios resistidos (Kang and Kim, 2022).

Este estudo apresenta algumas limitações. Por se tratar de um estudo transversal, o estabelecimento da relação causa e efeito não se fez presente. Além disso, o instrumento de coleta utilizado para analisar o tempo de atividade física semanal foi o IPAQ, questionário no formato recordatório com base nos últimos sete dias, o que pode apresentar viés, por estar sujeito ao esquecimento. Entretanto, considerando a aplicabilidade e viabilidade, este questionário se apresenta como uma forma prática para coletar informações sobre níveis de atividade física em consultas em serviços de saúde.

Todavia, os resultados deste estudo podem apresentar informações relevantes para a elaboração de políticas públicas de saúde, além de fornecer referência para os profissionais de saúde que atuam com pacientes com dor crônica, sobretudo na atenção primária à saúde, de modo a reconhecer o perfil desses pacientes possibilitando um acolhimento e cuidado adequado e direcionado a suas necessidades. Assim, considerando a dor crônica como uma condição que não se restringe à um grupo populacional específico, ressalta-se a importância da atuação multidisciplinar, reforçando aspectos da educação em saúde através de hábitos saudáveis, bem como a importância do cuidado terapêutico.

5. CONCLUSÃO

Neste estudo, não foram encontradas associações entre as variáveis sóciodemográficas, nível de atividade física, hipertensão e diabetes. Desta forma, é possível concluir que indivíduos com dor crônica usuários da APS não apresentam um perfil sóciodemográfico e de condições de saúde que esteja relacionado ao nível de atividade física.

Por fim, vale ressaltar que a atividade física é um habito saudável, entretanto, ao consideramos uma amostra com pacientes com queixa de dor crônica, nota-se que a atividade física pode sofrer interferência a depender do estado, queixa e condições da dor.

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1Graduanda em Fisioterapia. Universidade Estadual do Norte do Paraná; Jacarezinho – PR;

2Doutorando em Educação Física. Programa de Pós-Graduação associado em Educação Física UEM/UEL – Universidade Estadual de Londrina; Londrina – PR;

3Graduando em Enfermagem. Universidade Federal de Pernambuco; Vitória de Santo Antão – PE;

4Mestra em Ciências do Movimento Humano. Programa de Pós Graduação em Ciências do Movimento Humano da UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná; Jacarezinho – PR;

5Doutor em Educação Física. Docente do Departamento de Ciências do Esporte – Universidade Estadual de Londrina; Londrina – PR;

6Doutor em Educação Física. Pró Reitor de Extensão e Cultura e Docente no Programa de Mestrado em Ciência do Movimento Humano – Universidade Estadual do Norte do Paraná; Jacarezinho – PR;

7Doutora em Saúde Coletiva. Docente do curso de Fisioterapia – Universidade Estadual do Norte do Paraná; Jacarezinho – PR.