ASPECTOS DA INTERVENÇÃO MULTIPROFISSIONAL DURANTE A EXECUÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO ABERTO NO CREAS MARITUBA-PA.

ASPECTS OF MULTIPROFESSIONAL INTERVENTION DURING THE EXECUTION OF SOCIO-EDUCATIONAL MEASURES IN AN OPEN ENVIRONMENT IN CREAS MARITUBA-PA.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7802866


Jucielem Azulino de Farias1


RESUMO

Este artigo pretende abordar a temática sobre a intervenção multiprofissional da equipe do Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS do município de Marituba-PA, durante a aplicação das medidas socioeducativas de regime aberto, de Liberdade Assistida – LA e Prestação de Serviços à Comunidade – PSC, aplicadas à adolescentes e jovens mediante determinação judicial, após o cometimento de ato infracional que é uma conduta praticada por crianças ou adolescentes tida como crime ou contravenção penal. Fundamentado nas legislações do Estatuto da Criança e do Adolescente, no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, e na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Através da metodologia qualitativa, é realizado uma análise com base no relato dos profissionais da equipe e de entrevistas com os socioeducandos, compreendendo a medida socioeducativa como eficaz enquanto instrumento inibidor de reincidência de atos infracionais cometidos por adolescentes em conflitos com a lei. 

Palavras-chave: Medida socioeducativa, socioeducando, adolescentes, CREAS, LA, PSC. 

ABSTRACT

This article will address the theme about the multidisciplinary team intervention of Specialized reference Center for Social assistance-the municipality of CREAS MaritubaPA, during the application of socio-educational measures in open regime, freedom Assisted-LA and the provision of services to the community – PSC, applied to adolescents and young people by judicial determination, after the Commission of such act “that is a conduct practiced by children or adolescents considered felony or misdemeanor. Based on laws of the Statute of the child and adolescent in National System of Educational Assistance, and on National Service Socioassistenciais Typing. Through the qualitative methodology, an analysis is conducted on the basis of the report of the professional team and interviews with the socioeducandos, comprising the socio-educational measure as effective as inhibitor of recurrence of acts infracionais committed by adolescents in conflict with the law.  

Keywords: Socio-educational measure, socioeducando, teens, CREAS, LA, PSC. 

INTRODUÇÃO

A realização do artigo em questão veio através da percepção no trabalho técnico enquanto Assistente Social do Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS do município de Marituba o qual permitiu realizar essa pesquisa na tentativa de compreender o trabalho multiprofissional da equipe técnica do CREAS, durante a execução de medida socioeducativa.

Compreende-se que com o Estatuto da Criança e Adolescente – ECA, houve um relevante progresso em prol das crianças e adolescentes, a Lei 8069/1990 é uma ferramenta de garantia do cumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes de todas as classes sociais. Iniciando-se a doutrina da proteção integral, que consiste na  proteção biológica, psicológica e social, reconhecendo-se a indispensável importância do papel da família na sociedade. Repudia-se a palavra “menor” trazendo as expressões criança para aqueles de 0 a 11 anos, e adolescente para aqueles com 12 a 17 anos. Garantindo os direitos destes no que se refere à educação, saúde, cultura, lazer, esporte e por outro lado responsabiliza os adolescentes que cometem ato infracional, aplicando assim, medida socioeducativa aos referidos.

      As medidas socioeducativas são aplicadas e operadas de acordo com as características da infração, os regimes socioeducativos devem constituir-se em condição que garanta o acesso do adolescente às oportunidades de superação de sua condição de exclusão, bem como de acesso à formação de valores positivos de participação na vida social. A operacionalização deve prever obrigatoriamente, o envolvimento familiar e comunitário, mesmo no caso da privação de liberdade. Sempre que possível deverão ser avaliadas as condições favoráveis que possibilitem ao adolescente em conflito com a lei a realização de atividades externas.

As denominações das unidades de aplicação das medidas dos adolescentes envolvidos e das demais formas de identificação das atividades a eles relacionadas devem respeitar o princípio da não descriminação e não estigmatização, evitando-se os rótulos que marcam os adolescentes e os expõem a situações vexatórias, impedindo-os de superar suas dificuldades na inclusão social.

A lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE (Lei 12.594/2012),  por sua vez, elencou os objetivos a serem alcançados pela imposição de tais medidas, bem como a responsabilização do adolescente, a integração social, acesso à garantia de seus direitos e a desaprovação da conduta infracional.  

O ato infracional é uma forma de descumprimento às leis, aos direitos dos cidadãos ou do patrimônio, cometido por crianças ou adolescentes. Quando ele é cometido por crianças são aplicadas as medidas de proteção e o órgão responsável pelo atendimento é o Conselho Tutelar, por outro lado quando é cometido por adolescentes será aplicada medida socioeducativa de acordo com a gravidade de seu ato, podendo cumprir em regime fechado (internação) ou regime aberto.  Quando sentenciado por uma medida em meio aberto este adolescente será acompanhado por uma equipe multiprofissional do CREAS.

As medidas socioeducativas são classificadas conforme o ato, nessa classificação é oferecido seis tipos de medidas, onde iremos trabalhar somente as de meio aberto: Liberdade Assistida (LA) e a Prestação de Serviços à Comunidade (PSC) que devem ser cumpridas e monitoradas pelos Centros de Referências Especializados em Assistência Social.  As medidas socioeducativas de PSC e LA, para que sejam bem sucedidas, precisam estar alicerçadas em uma boa estrutura de articulação com organizações governamentais e organizações não-governamentais, num processo de fortalecimento contínuo de convívio familiar e comunitário do socioeducando.

No que diz respeito à medida socioeducativa segundo Liberati (2012) A medida socioeducativa é a manifestação do Estado, em resposta ao ato infracional, praticado por menores de 18 anos, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva cuja aplicação objetiva inibir a reincidência, desenvolvida com finalidade pedagógica- educativa. Destaca-se que o socioeducando tem uma percepção punitiva ao cumprir a medida socioeducativa de LA e PSC por ter sido sentenciado judicialmente, principalmente quando o socioeducando recebe a medida de PSC supondo que irá ser penalizado com trabalhos forçados que exijam mais do que eles possam dar, haja vista que a equipe multiprofissional a qual vai acompanhá-lo evidencia que é uma medida de caráter pedagógico.

Somente indivíduos na faixa etária entre 12 a 17 anos que praticam ato infracional estão sujeitos a estas medidas. Excepcionalmente, a sua aplicação e o seu cumprimento poderão ser estendidos até os 21 anos. Isto ocorre quando há certa morosidade por parte do Poder Judiciário prejudicando o processo da medida socioeducativa.

O Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS segundo a Lei nº 12.435/2011, é uma unidade pública estatal de abrangência municipal ou regional que tem como papel constituir-se em lócus de referência, nos territórios, da oferta de trabalho social especializado no SUAS – Sistema Único de Assistência Social a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social, por violação de direitos, tais como: violência física, psicológica , negligência, violência sexual: abuso e/ou exploração sexual, afastamento do convívio familiar devido à aplicação de medida socioeducativa ou medida de proteção, Tráfico de pessoas,situação de rua e mendicância, abandono, vivência de trabalho infantil, maus tratos e outros tipos de violações.

 O CREAS destina-se ao acompanhamento técnico especializado desenvolvido por uma equipe multiprofissional, de modo a potencializar a capacidade de proteção da família e favorecer a reparação da situação de violência vivida. Funciona em estreita articulação com demais serviços socioassistenciais e de outras políticas públicas, com o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Conselhos Tutelares e outros órgãos de Defesa de Direitos. 

Dentro dos serviços oferecidos pelo centro, se encontra Serviço de Proteção Especial Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida – LA e de Prestação de Serviços à Comunidade – PSCque tem por finalidade prover atenção socioassistencial e acompanhamento a adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, determinadas judicialmente. 

Dentro disto o serviço de proteção social a adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de LA e PSC têm como principais objetivos, segundo a tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, realizar acompanhamento social a adolescentes durante o período do cumprimento da medida, sua inserção em outros serviços e programas e políticas públicas setoriais criar condições para construção/reconstrução de projetos de vida que contribuam para ruptura do ato infracional também possibilitar o acesso e oportunidade para ampliação do universo informal e cultural e o desenvolvimento de habilidades e competências  dentre outros.

Buscando contribuir para fortalecimento de vínculos familiares e comunitários também visa à redução da reincidência da prática do ato infracional além da redução do ciclo da violência. Desta forma o centro de referência direciona seus esforços a fim de garantir a efetivação do que preconiza o ECA e SINASE para atendimento integral dos direitos fundamentais dos adolescentes que praticaram ato infracional.

O presente artigo busca compreender se a medida socioeducativa é eficaz enquanto instrumento inibidor de reincidência de atos infracionais cometidos por adolescentes em conflitos com a lei. O objetivo é analisar se a medida socioeducativa, na percepção dos socioeducandos, nos espaços em meio aberto – CREAS, do município de Marituba é eficaz enquanto instrumento inibidor de reincidência de atos infracionais. O objetivo geral também deverá ser alcançado através do relato da equipe multiprofissional do CREAS no processo socioeducativo dos adolescentes em conflito com a lei e identificar possíveis pontos negativos evidenciados pelos socioeducandos no cumprimento da medida.

A pesquisa fundamenta-se em uma abordagem qualitativa de natureza descritiva, onde o cenário das entrevistas é realizado no CREAS do município de Marituba. Este estudo foi desenvolvido com 03 dos 15 socioeducandos que estão sendo submetidos a medidas socioeducativas no mês de setembro/2017.

Os dados foram coletados através do agendamento com a assistente social da instituição, conforme os horários disponíveis e interesse dos socioeducandos. Dessa forma, a etapa de coleta de dados ocorreu no mês de 2017.

Os instrumentos utilizados originalmente na pesquisa foram a observação participante, por permitir ao pesquisador o contato direto com o fenômeno pesquisado, propiciando informações sobre a realidade dos sujeitos em seus próprios contextos (MINAYO, 1996); o diário de campo e entrevistas semi-estruturadas individuais com os adolescentes, gravadas em áudio. Esses três instrumentos ofereceram um grande montante de informações.

A entrevista foi desenvolvida com aplicação de um formulário semiestruturado com os seguintes tópicos: a) história de vida; b) o convívio familiar; c)relacionamento amoroso; d) percepções sobre a medida socioeducativa antes de cumpri-la; e)como o socioeducando é visto pela sociedade; f) acesso à programas sociais,documentações, saúde e profissionalização; g) expectativas das adolescentes quanto ao futuro;  h)a percepção atual sobre medida socioeducativa. 

1- LEIS QUE EMBASAM A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA

O Estatuto da criança e do adolescente – ECA  (Lei 8069/90),  é a normativa que protege o direitos fundamentais de crianças e adolescentes, com o estabelecimento desta lei as crianças (0- 11 anos) e os adolescentes (12- 17 anos) passam a ter seus direitos incontestáveis direitos estes como a vida , educação , saúde , escola  dentre outros.

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente ato infracional é todo aquele análogo a uma conduta criminosa descrita como crime ou contravenção penal segundo o artigo 103 do ECA. O rol de medidas socioeducativas estão estabelecidas no artigo 112 do referido Estatuto.  Nesse sentido, quando um adolescente comete um ato infracional o mesmo pode ser responsabilizado por meio de alguma medida socioeducativa quais sejam, advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade ou internação. 

A partir da comprovação do ato infracional são aplicadas às adolescentes medidas orientadas pela necessidade de processo socioeducativo, e não de simples sanção determinadas judicialmente. As medidas socioeducativas são a forma instituída na legislação brasileira para responsabilizar o adolescente pelos atos infracionais por ele praticados, mas concomitantemente, oferecer condições para a reinserção social.

O ECA artigo 112 inciso I a IV estabelece que as medidas socioeducativas impostas ao adolescente podem ser: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação” (Brasil, 1990). 

A Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo –SINASE instituída em janeiro de 2012 com intuito de regulamentar a execução das medidas socioeducativa direcionadas aos adolescentes que pratiquem o ato infracional, reforça o atendimento dos adolescentes na prática do ato infracional, como um atendimento de cunho pedagógico em detrimento do caráter punitivo além de definir competências dentro  das esferas municipais e  Estaduais  e União representando desta forma um instrumento que direciona a aplicação e execução das medidas sócio educativas  principalmente dando um novo olhar para questão do ato infracional com interesse de inserção social e adoção da medida em meio aberto como melhor alternativa para reeducação para este adolescente.

È possível observar que a construção do SINASE buscou dar efetividade ao que já preconizava o ECA com intuito de garantir a proteção integral à infância e adolescência reafirmando a responsabilização do Estado, da família e da sociedade como um todo levando em consideração a condição do adolescente como pessoa em seu desenvolvimento.

Conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente, o socioeducando que receber medida socioeducativa em meio aberto, seja ela de Prestação de Serviços à Comunidade – PSC ou de Liberdade Assistida – LA, respectivamente, previstas nos artigos 112, 117,118 e 119, deverá ser acompanhado em seu processo de formação e educação por pessoa capacitada designada pelo Poder Judiciário, através do Juizado da Infância e Juventude, onde não existem os programas, ou para os órgãos executores das medidas socioeducativas em meio aberto, nos municípios.

Advertência- Traduz-se a medida de advertência num ato de autoridade, solene e revestido das formalidades legais, que exigem, para sua aplicação, a ocorrência da “materialidade e indícios suficientes da autoria”, segundo art. 114 do ECA.

Obrigação de reparar o dano- Segundo o ECA Art. 116 Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.

Tem como propósito que o adolescente autor de ato infracional se sinta responsável pelo ato que cometeu e não que os pais sejam responsáveis. A medida tem caráter educativo pela forma que é executada. Por outro lado, apresenta uma natureza sancionatória- punitiva, que impõe a ser cumprida pelo próprio adolescente.

Por outro lado o código civil diz que  os adolescentes  com menos de 16 anos de idade são considerados incapazes, com a medida socioeducativa aplicada de reparação dos danos será obrigatória, com exclusividade, para os pais, responsáveis, curadores e tutores, para estes ressarcir os prejuízos da pessoa que sofreu o dano, ao contrário se o adolescente for emancipado ou estiver trabalhando, este sim será responsável pelo seu ato.

Prestação de Serviço à Comunidade- É uma medida de extrema importância para o desenvolvimento integral do adolescente em conflito com a lei. Não poderá ser executada em lugares insalubres, em períodos noturnos e contra a vontade do socioeducando, pois corresponderá a trabalho forçado e obrigatório. As tarefas serão atribuídas de acordo com as aptidões do adolescente, não excedente 08 horas semanais, aos sábados, domingos e feriados, de modo que não possa prejudicar a frequência escolar ou a jornada de trabalho. 

O adolescente prestará serviço no horário que não interferir nos seus estudos. No entanto, esta medida valerá como experiência de vida comunitária, de aprendizado de valores e compromissos sociais. Terá que ter o acompanhamento adequado do adolescente pelo órgão executor e o apoio da entidade do trabalho no cumprimento de sua medida, menciona também o SINASE Artigo 13, o encaminhamento do socioeducando para o orientador e a supervisão enquanto o seu desenvolvimento da medida.

Liberdade Assistida– Conforme o ECA, Artigo 118- A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.

O cumprimento de medida será acompanhado por uma equipe Multiprofissional (Assistente Social, Psicólogo, Pedagogo e Advogado) capacitados designados pela autoridade. É uma medida que impõe ao adolescente se comportar de acordo com a ordem judicial. Poderá haver a proibição de ingerir bebida alcoólica, uso de substâncias entorpecentes, de frequentar determinados ambientes principalmente em lugares noturnos que possam apresentar risco para a vida do socioeducando.

Por outro lado, essa medida concretiza-se pelo acompanhamento do socioeducando em suas atividades sociais (escola, família, trabalho).

Entre as diversas fórmulas e soluções apresentadas pelo ECA, para o enfrentamento da criminalidade infanto-juvenil, a medida socioeducativa da Liberdade Assistida se apresenta como a mais gratificante e importante de todas, conforme unanimemente apontado pelos especialistas na matéria. Isto porque possibilita ao adolescente o seu cumprimento em liberdade junto à família, porém sob o controle sistemático do Juizado e da comunidade. (BARROSO FILHO, 2001)

  Nota-se que no cumprimento de Liberdade Assistida por se tratar de uma medida em meio aberto o socioeducando permanece em seu seio familiar, fortalecendo cada vez mais este vínculo afetivo, onde ele pode dar continuidade em seu processo de escolarização e quando se percebe a evasão do mesmo no âmbito escolar a equipe multiprofissional intervém para que ele retorne.

Mário Volpi (1997) pontua que a intervenção educativa da medida “se manifesta no acompanhamento personalizado, garantindo-se os aspectos de: proteção, inserção, comunitária, cotidiano, manutenção de vínculos familiares, frequência a escola, inserção no mercado de trabalho e/ ou cursos profissionalizantes e formativos”.

2- A INSTITUIÇÃO CREAS MARITUBA

Segundo a Tipificação de Serviços Socioassistenciais, a Proteção da Assistência Social no Sistema único da Assistência Social (SUAS) está dividida em Proteção Social Básica e Proteção Social Especial. A Proteção Social Básica tem por objetivo contribuir para a prevenção de situações de risco social por meio do desenvolvimento das potencialidades, aquisições e fortalecimentos de vínculos familiares e comunitários; tendo como demanda a população em situação de vulnerabilidade social. Os serviços oferecidos são organizados e coordenados pelos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS).  Sendo estes, responsáveis pelo atendimento de 1.000 famílias ao ano, por cada território de até 5.000 famílias.

No que tange a Proteção Social Especial, esta tem como objetivo principal atender famílias e indivíduos em situação de risco pessoal e social em decorrência de abandono, maus tratos físicos ou psicológicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras. Sendo que estes serviços estão divididos em: média e alta complexidade.

Os Serviços de Proteção Social de Média Complexidade devem oferecer atendimentos individuais a famílias com direitos violados, mas cujos vínculos familiares e comunitários não foram rompidos. Já os serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade devem garantir proteção integral: moradia, alimentação, higienização, e trabalho protegido. Estes dirigem as famílias, seus membros e indivíduos que se encontrem sem referência familiar ou ameaçados.

Importante ressaltar que Marituba, é localizado na região metropolitana de Belém, sendo a menor extensão territorial do Estado, com 103Km², e um dos municípios do Pará com maior concentração populacional, segundo o IBGE com 108.248 habitantes. É um município de médio porte, encontrando-se na Gestão Básica, dentro da Política de Assistência Social.

No que diz respeito à empregabilidade, em Marituba, o setor que mais emprega é o comércio, seguido do setor de Serviços e em terceiro aparece o setor industrial. Desse modo, este quadro também reflete no contexto social do município, que se analisando de forma breve, detecta-se a concentração de renda de uma parte pequena da população e a maioria desprovida de qualidade de vida e de acesso aos bens e serviços. A população de baixa renda é atendida pelo poder público municipal, juntamente com o Programa de Governo Federal Bolsa Família que em Marituba, possui uma base de Cadastro Único com 21.350 famílias cadastradas, dessas 12.534 famílias têm benefício ativo e liberado. Sendo a maioria mulheres, chefes de família, segundo as informações do Ministério do Desenvolvimento Social, dados de setembro/2017. 

O CREAS foi implantado em 12 de janeiro de 2010, com base no Sistema Único de Assistência Social conta com uma equipe Multiprofissional Especializada (Assistentes Sociais, Psicólogos, Pedagogos, Educadores Sociais e Advogados), para apoiar, orientar e acompanhar indivíduos e famílias em situação de ameaça e/ ou de violação de direitos, situação de risco social, e adolescentes/jovens em cumprimento de medida socioeducativa.

3 – A EXECUÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA NO CREAS MARITUBA

Ao adentrar no serviço, o socioeducando é apresentado à equipe de referência composta pelos profissionais de: Serviço Social, Psicologia, Pedagogia e Direito; o qual procedimento denominado de acolhimento cujo objetivo deste é identificar as necessidades apresentadas pelos mesmos e suas famílias, norteando as primeiras ações dos profissionais, bem como contribuirá para o início da construção de vínculo de referência e de confiança, lançando as bases para a construção conjunta do plano de acompanhamento (MDS-CREAS, 2014). 

Durante este acolhimento é feito a explanação do serviço de medida socioeducativa no que se refere à execução de Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à Comunidade, pontuando todos os aspectos que nortearam o cumprimento das mesmas. Cabe pontuar que a partir deste momento são feitos os procedimentos que dizem respeito aos atendimentos individuais/familiar psicológicos, sociais, jurídico e pedagógico, grupalização, visitas domiciliares e institucionais, encaminhamentos, articulações com a rede de serviço, atividades externas, avaliação do cumprimento da medida e elaboração de relatórios técnicos.

3.1- FLUXO DE ATENDIMENTOS 

Sobre o fluxo de Atendimentos, a Pedagoga do CREAS destaca que o atendimento pedagógico tem como função acompanhar e supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar dos socioeducandos, facilitando a inclusão escolar e promovendo sua matrícula quando necessário; resgate do comprometimento da família, enquanto responsável pela permanência do socioeducando nas unidades escolares; elaborar relatório, realiza ações tais como: Visita Escolar, Encaminhamentos, Articulação com a rede de Serviço, Acompanhamento, Avaliação e desempenho escolar, mediação de grupo e elaboração de relatório técnico de encerramento da Medida Socioeducativa, e de descumprimento do socioeducando.

Segundo a pedagoga, há certa resistência no âmbito escolar para receber o socioeducando, quando matriculados os gestores escolares evidenciam na escola que em algumas situações eles são estigmatizados pelos atos que cometeram. O papel da pedagoga é fundamental neste processo, pois ela intervém para que isso não ocorra. Quando os adolescentes não estão matriculados, ela articulou com a rede de ensino para conseguir matriculá-lo, desta forma garantindo o direito do socioeducando conforme está aludido no Artigo 119, inciso II, do ECA, supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula.

É necessário que o socioeducando durante o seu cumprimento de medida seja encaminhado para o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, que é realizado através de grupos nos CRAS, a fim de complementar  o trabalho social com famílias e prevenir a ocorrência de situações de risco social, tendo como um de seu objetivos fortalecer vínculos familiares e incentivar a socialização e a convivência comunitária. Incluindo nesses Serviços Adolescentes e Jovens egressos de medida socioeducativa de internação ou em cumprimento de outras medidas socioeducativas em meio aberto, conforme disposto na Lei 8.069/1990, artigo 119, inciso I ”promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;” e o SINASE Artigo 35º inciso IX ‘fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo’.

Para o Ministério do Desenvolvimento Social – MDS é necessário a inclusão desse adolescente com prioridade, caso a sua família tenha perfil adequado, em todos os   programas sociais, tais como, Programa Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Brasil Carinhoso, Tarifa Social de Energia Elétrica entre outros, sendo esta avaliação e encaminhamento realizada pela Assistente Social.

Com base nas Orientações Técnicas para o CREAS (2011), o atendimento jurídico para a advogada do CREAS na execução de medida, tem por objetivo contribuir no processo de responsabilização do socioeducando prestando-lhes consultorias jurídicas sobre seus direitos e deveres estabelecidos no ECA e legislação correlata, os direitos e deveres no cumprimento da Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à Comunidade. Realiza também visita Institucional a 1º Vara Cível de Marituba para consulta do processo de conhecimento quando necessário,comunicação documental, por meio de ofício, quando há necessidade de informações pessoais sobre o socioeducando, elaboração de relatório técnico de encerramento da medida socioeducativa, e de descumprimento do socioeducando, realizando ainda mediação das grupalização com o socioeducando e seus familiares. 

O atendimento psicológico, segundo o psicólogo do CREAS- possibilita ao socioeducando uma reflexão para que consiga sair do papel de conflito com a lei e retomar sua autonomia e cidadania, descobrindo perspectivas para sua vida. E possibilitar no atendimento com ele um autoconhecimento em relação à sua auto-estima e auto-imagem, para que descubra o seu valor, os seus limites, e a sua capacidade, percebendo-se um sujeito capaz, desenvolvendo amadurecimento e criando perspectivas futuras. Suas ações são com base no atendimento aos pais com objetivo de orientá-los e auxiliá-los nas dificuldades com os socioeducandos, restaurando e ressignificando os vínculos familiares; realizando mediação de grupo, acolhimento para a formação de vínculos, esclarecimentos dos compromissos a serem cumpridos no tempo que estiver no serviço, contato com o adolescente e a família e elaboração de relatório técnico de encerramento da medida socioeducativa, e de descumprimento do socioeducando.

A partir das Orientações Técnicas para o CREAS (2011), o atendimento social desenvolve as ações da área de competência do Serviço Social no Programa de Liberdade Assistida, através das dimensões técnico- metodológica e ético-política, com intuito de assegurar a qualidade no atendimento dos socioeducandos, realizando entrevista com o socioeducando e família; Visitas domiciliares de acompanhamento; encaminhamentos à rede de serviço; Prestar apoio socioassistencial; Elaboração de relatório técnico de encerramento da medida socioeducativa, e de descumprimento do socioeducando; Mediação de grupo; contato com o adolescente e a família;  Preenchimento de prontuário. Durante o atendimento social com socioeducando e família são coletados alguns dados específicos necessários, como a situação socioeconômica da família, condições de moradia, acesso a documentação, e acesso aos serviços de garantia de direitos.

Portanto durante o processo de medida socioeducativa, após o acolhimento, os atendimentos são realizados de forma contínua e baseado na necessidade da demanda apresentada pelo socioeducando e família, onde são referidos em atendimentos psicossociais, psicopedagógico, Sociojurídico, sociopedagógico, psicojurídico, jurídico pedagógico e sociopsicopedagógico.

Vale ressaltar que todos os atendimentos realizados têm como objetivo a construção do Plano Individual de Atendimento (PIA)- como estabelecido na lei n° 12.594/2012 – SINASE art. 56 CAP IV que menciona “Para o cumprimento das medidas de prestação de serviço a comunidade e de liberdade assistida, o PIA será elaborado no prazo de até 15 (quinze) dias do ingresso do adolescente no programa de atendimento”.

Menciona o SINASE em seu artigo 52, o PIA é um instrumento de previsão, registro e gestão das atividades a serem desenvolvidas com o adolescente.

Na construção do PIA do socioeducando há participação da equipe multiprofissional (Advogada, Psicólogo, Pedagoga e Assistente Social) que acompanha o socioeducando no cumprimento de medida socioeducativa de LA e PSC, seu primeiro passo é sobre o Estudo de Caso ( dificuldade, necessidade e potencialidade ) o segundo Projeto de Vida ( seus interesses e suas potencialidades e por último as estratégias de ação do PIA ( ação, metas e prazos) nas áreas da saúde (física e mental), psicológica, social, jurídica, escolarização, educação e trabalho e esporte, cultura e lazer. É de extrema importância a participação dos pais ou responsáveis na construção do PIA do socioeducando.

A grupalização é um método utilizado na execução da medida, e ocorre quinzenalmente, mediada sempre por dois técnicos cujas temáticas são demandadas conforme as necessidades observadas pela equipe técnica e também aquelas trazidas pelos socioeducandos, tendo como objetivos: promover a responsabilização durante cumprimento da medida socioeducativa, reforçar com os adolescentes o que é liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade; possibilitar o relacionamento interpessoal e a interação através de atividades de convivência em grupo e ampliar o conhecimento por meio da participação coletiva. Mediante isto é possível observar que o socioeducando constrói sua identidade e autoconfiança interagindo com os outros adolescentes, sendo essencial nestas atividades, como preparo para vida em sociedade. Há trocas de experiências, de socialização e apoio, buscando despertar nos jovens sentimentos de tolerância e sociabilidade.

Outra prática profissional realizada por um ou mais profissionais é a visita domiciliar, junto aos indivíduos em seu próprio meio social ou familiar. Tem por finalidade fazer acompanhamentos relacionados às condições de moradia e saúde a fim de elaborar o relatório de visita domiciliar e emissão de relatório técnico. Ela deve ocorrer, sempre, como uma entrada consentida no espaço dos sujeitos e, portanto, com agendamento prévio, explicitando-lhes a sua finalidade, devendo ser precedida de planejamento e definição de objetivos, de acordo com as demandas específicas de cada caso.

 As visitas são realizadas aproximadamente em 15 dias após a entrada do socioeducando ao serviço do CREAS para a construção do PIA; para os acompanhamentos no processo de medida socioeducativa; quando há evasão do serviço e para a construção do relatório de encerramento da medida.

Ocorrem também as visitas institucionais que são uma prática profissional realizada por qualquer técnico da medida socioeducativa, junto à rede de serviços de atendimento do socioeducando e sua família (escolas, hospitais, CRAS, projetos sociais, as demais secretarias do município dentre outros). Tem como finalidade realizar a inserção escolar, acompanhamento de desempenho escolar e de cumprimento da prestação de serviço à comunidade, inclusão em programas e projetos que possibilitem o socioeducando a convivência familiar e comunitária, além das demais articulações que sejam necessárias para que haja a garantia das prerrogativas instituídas pelo ECA e pelo SINASE.

Depois de realizado o atendimento do socioeducando e sua família, ambos devem ser encaminhados para acessar serviços, programas, benefícios da rede socioassistencial, das demais políticas públicas e órgãos de defesa dos direitos. Para qualificar a atenção às famílias, a articulação em rede pode comportar, ainda, o planejamento e desenvolvimento de atividades em parceria, além de estudos de casos conjuntos, dentre outras estratégias.

A avaliação do cumprimento da medida é realizada por meio da família e auto – avaliação do adolescente, além de serem consideradas as posturas relacionais do adolescente com: família, escola, profissionalização e comunidade. Essa avaliação é feita pela equipe de referência da medida socioeducativa. 

A elaboração dos relatórios é realizada em conjunto com a equipe técnica deste serviço, sendo facultativa a participação do adolescente e seus responsáveis neste processo de construção. Esses relatórios são encaminhados ao Poder Judiciário para informar quando há descumprimento, encerramento e os acompanhamentos dos socioeducandos durante o processo de medida socioeducativa.

3.1 –ACOMPANHAMENTO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA

O acompanhamento da Liberdade Assistida – LA se dá através de 04 atendimentos por mês com a equipe multiprofissional, as visitas domiciliares/institucionais e os encaminhamentos acontecem de acordo com a demanda apresentada, as grupalização são realizadas quinzenalmente.

As buscas ativas são realizadas quando o socioeducando evade das grupalização ou atendimentos, sendo realizada por qualquer profissional da equipe de referência de medida socioeducativa, através de visitas domiciliares ou contato telefônico.  Evitando a evasão do socioeducando para um possível descumprimento.

Sobre isto Tavares (2012) pontua que as manutenções dos laços familiares, da escolaridade e do amadurecimento do socioeducando dependem de um acompanhamento bem referenciado e monitorado proporcionando a ele uma preparação profissional.

O acompanhamento da Prestação de Serviço à Comunidade – PSC é feito por meio do instrumental chamado de “ficha avaliativa da medida socioeducativa de prestação de serviço à comunidade” onde são especificados os seguintes itens: nome, local da medida, dias, horário, mês, frequência e as descrições das atividades, e tal instrumento é avaliado pelo supervisor de campo do socioeducando; são feitas visitas de acompanhamento institucional mensalmente para avaliar e desempenho e o desenvolvimento do socioeducando na prestação de serviço.

Vale ressaltar que, de acordo com Tavares (2012) tal medida tem o caráter altruísta, nunca para fins lucrativos e sim socioeducativo, o qual o supervisor do socioeducando possui papel de extrema importância na avaliação da medida.

4- A PERCEPÇÃO DO SOCIOEDUCANDO SOBRE AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

No ano de 2017 estiveram cumprindo medida no CREAS, 15 socioeducandos, sendo que 03 para cumprir LA (Liberdade Assistida) e PSC (Prestação de Serviço à Comunidade), outros 02, PSC, e 10 para LA. Destes 15, apenas 07 cumprem assiduamente. Entre estes 15 socioeducandos, foram escolhidos 03, E.B.M.  com 17 anos que está em cumprimento medida socioeducativa  de Liberdade Assistida, G.A.P.P com  16 anos e R.S.A com 16 anos, estes dois últimos cumprindo medida socioeducativa  de Prestação de Serviço a Comunidade e Liberdade Assistida. Destaco que os socioeducandos acima foram escolhidos por serem os mais participativos, comprometidos, assíduos e sempre interagiam com os outros adolescentes. Haja vista que ambos exerciam um domínio de suas falas e de suas colocações ao ponto de conduzir os diálogos no grupo.

        Sobre a história de vida dos socioeducandos eles relataram:

“é um testemunho vivo, foi Deus que transformou minha vida, ele é capaz de tudo, só ele pode fazer isso, às vezes fico me perguntando como foi que eu sobrevivi. Se estivesse ainda no mundo do crime, já teria morrido, não estaria mais vivo com certeza” (E.B.M) 

“sempre fui um menino calmo, mas fui pegando uma idade e fui crescendo junto com os meninos de perto de casa, me envolvi no meio deles, fui me seguindo, comecei a roubar, queria dinheiro pra ir para festas, queria ter roupa boa e minha mãe não podia me dar, daí fui pego a primeira vez dentro de casa, prometi para minha mãe que não ia mais roubar. Dois meses depois fui apreendido novamente, graças a Deus hoje eu parei com isso” (G.A.P.P)

“ minha história de vida é um pouco triste, minha mãe teve 05 anos de depressão, passava o dia todo deitada na cama dentro de um quarto, daí nesse período com 14 anos  comecei a não querer nada com a vida, me envolvi nesse mundo aí perdido, comecei a roubar com frequência, não tinha apoio do meu pai, a única pessoa que se importava comigo era minha irmã, fiquei revoltado com a vida, vendo minha mãe quase morta em cima de uma cama, dopada de remédio controlado, pra mim a vida não tinha mais sentido. Hoje graças a Deus vivo em paz, e minha mãe está se recuperando aos poucos” ( R.S.A)

Com relação ao o convívio familiar eles mencionaram que:

  “ sempre me relacionei muito bem com os meus pais e irmãos, apesar de eles estarem separados , eles sempre foram presentes na minha vida , eles possuem uma relação boa, são amigos, meu pai mora do lado da minha casa, e ajuda financeiramente  nossa família quando precisamos, apesar dele ter uma nova família, graças a Deus não tenho problema com a minha madrasta “( E.B.M)

“é boa, todos trabalham, me dou bem com os meus pais e irmãos, eles se separaram quando eu era pequeno, eu moro com a minha mãe, meus pais se dão bem, mas o assunto deles é mais referente a minha pessoa, pra saber como eu estou, se cumprindo direitinho a medida” ( G.A.P.P)

“minha relação é boa sim, moramos em um sítio, minha mãe, irmã, tios, tias, primos e meu avô, me dou bem com todos eles, meu pai nunca foi presente na minha vida, nunca se preocupou comigo, ele mora em Macapá, se separou da minha mãe quando eu era pequeno, vi ele somente três vezes, ele nem liga pra mim pra saber como eu tô, e muito menos sabe que eu andava roubando, a minha vida não interessa pra ele” ( R.S.A)

No que diz respeito à vida amorosa os socioeducandos pontuaram: 

“Hoje eu estou noivo. Deus me deu uma companheira   que me ajuda demais, uma pessoa que gosta de mim, que sempre tá do meu lado, a minha família se dá muito bem com a família dela, Deus está abençoando nosso relacionamento, além de tudo ela me dá apoio para continuar no cumprimento de medida” ( E.B.M)  “Não tenho namorada não, só fico mesmo” ( G.A.P.P)  

 “Vivo junto há 02 anos com a Nayra, gosto dela e respeito muito, tenho uma enorme gratidão por ela, pois mesmo sabendo que eu era errado, roubava por aí, ela não me deixou. Sofria quando eu estava preso, mas lutou por mim e acreditou que eu poderia mudar, hoje estamos juntos e felizes graças a Deus”  ( R.S.A)

Sobre a percepção da medida socioeducativa antes de cumpri-la, os socioeducandos verbalizaram:

 “A visão que a maioria dos jovens tem não é o que ele quer na realidade , pra mim não representava uma coisa boa, algo ruim que o juiz poderia mandar me apreender a qualquer momento. A primeira vez não fui por medo, eu era ameaçado constantemente devido meu envolvimento com o tráfico de drogas, não gostava de sair de casa, minha família queria que eu fosse residir em outro município, quando vocês vieram pela segunda vez aqui em casa, daí pensei tenho que me apresentar porque senão vai piorar minha situação” ( E.B.M)

“eu pensava que era um trabalho pesado, limpando a rua, no primeiro dia fiquei muito nervoso, mas eu to gostando é bacana”  ( G.A.P.P)

“as pessoas me metiam medo, eu achava que se eu fosse no CREAS vocês iriam me prender, eu tinha muito medo de vim” (R.S.A)

Sobre a forma com que os socioeducandos são vistos pela sociedade:

 “Hoje eu conquistei a sociedade novamente, as pessoas que não confiavam em mim, hoje já confiam, já olham diferente, inclusive a minha noiva, ela morria de medo de mim, atravessava a rua e segurava a bolsa quando me via. As grupalização que ocorrem no CREAS, ajudam também a gente, a se preparar diante da sociedade’ ( E.B.M)

“eu sou visto de forma normal, na rua da minha casa só são meus familiares, não tenho problema com isso não” ( G.A.P.P)

“eu sou visto como marginal, eles pensam que eu ainda sou, porque me viram ser preso, eu sei que até hoje eles tem dúvida, mas eu aprendi na grupalização que a sociedade tem que diferenciar o adolescente do ato que ele cometeu, não esquento com isso não” ( R.S.A)

Com relação a acesso programas sociais, documentações, saúde e cursos profissionalizantes os socioeducandos relataram: 

   “não vou mentir não estou participando dos grupos do CRAS, por motivo que estou sem tempo, mas a minha irmã de 06 anos participa e tá gostando muito, lá ela brinca e desenha. Ela queria ficar o dia todo lá, mas tem a escola e ela não pode faltar. Não precisei ter acesso a saúde e nem minha família. Possuo todas as minhas documentações e além disso estou fazendo curso de informática e estou gostando muito” (E.B.M)

 “Minha mãe conseguiu tirar o CADÚNICO e ela conseguiu ser beneficiária do Bolsa Família, não estou participando dos grupos do CRAS, porque estou fazendo curso de auxiliar administrativo e não tenho tempo. O curso é bem interessante e já conta pro meu currículo. É muito bom ter essas coisas de graça pra gente. Eu  consegui tirar meu título de eleitor e CPF e fui encaminhado para fazer tratamento odontológico. (G.A.P.P)

“ minha mãe já recebe o bolsa família, não estou participando dos grupos do CRAS, mas minha irmã está participando do grupo de capoeira e tá gostando muito, já foi disputar em algumas cidades. Estou fazendo o curso de informática e to gostando muito, pois eu não sabia mexer no computador, é legal porque a gente pode entrar na internet. Precisei fazer tratamento odontológico, restauração em alguns dentes. Tenho todas as minhas documentações, mas minha irmã não tinha identidade, ela foi encaminhada para secretaria de assistência e conseguiu” ( R.S.A)

Sobre suas expectativas quanto ao futuro, os jovens  ressaltaram :

“minhas expectativas são muitas, quero fazer uma faculdade de direito, estou  terminando o meu curso de teologia, isso já está me deixando bastante feliz, Deus vai me capacitar ainda mais,  já estou exercendo a pastoral, mas não tenho ainda a carteirinha, e estou construindo minha casa, irei casar final do ano. São sonhos que estão sendo realizados aos poucos” ( E.B.M)

“hoje só quero o melhor pra minha vida, acabar meus estudos, estou com trabalho em vista, meu pai me convidou para trabalhar, ele vai me ensinar como trabalhar como representante de vendas, quero também fazer curso de mecânica de altas, quero ter o meu próprio dinheiro, garantir o meu futuro, me qualificar” ( G.A.P.P)

“ quero trabalhar pra ter minha casa,  fazer um curso de mecânica“ (R.S.A)

Sobre a percepção atual sobre as medidas socioeducativas, os socioeducandos afirmaram:

 “uma coisa boa para o jovem, a questão é se a juventude vai querer ser tratada, aceitar o acompanhamento dos pais durante o  cumprimento, porque muita das vezes eles são separados, e é importante que eles acompanhem seus filhos, se o jovem quiser ele muda, não são todos que querem, mas alguns querem mudar de vida sim, melhorou meu convívio familiar, devido aos acompanhamentos familiares que minha família participa no CREAS, na escola também, pois eu retornei aos estudos com a articulação da pedagogia. Sobre a minha liberdade assistida , não é somente ir lá e assinar um simples papel, eu recebia todo atendimento necessário da equipe,  no começo do cumprimento eu vivia  em uma pior, sempre ia lá e voltava pra casa me sentindo melhor, gosto demais das grupalização , é um momento de interação com os outros socioeducandos, a gente conhece a realidade de cada um, e além disso os temas são bons, envolvendo o nosso dia a dia, aprendo muito e com certeza hoje sou uma pessoa melhor  ” ( E.B.M)

“é muito bom, o local onde eu estou , conheci pessoas diferentes, fiz amizades, eu estou prestando serviço em uma escola entregando ofícios, com isso aprendi a ter responsabilidade por causa do horário, eu tinha que chegar na hora certa, aprendi a manusear o computador, a digitar, a utilizar a máquina de Xerox, coisas que já servem pra mim no futuro, o meu supervisor me disse se eu continuar assim eu poderia ser contrato futuramente. Os atendimentos também serviram para aproximar meus pais, pois eles tinham pouco contato, as meninas se preocupam comigo se estou bem ou não, tratam a gente com atenção sem ter medo da gente, isso é muito bom, gosto de participar das grupalização, eu me divirto lá, nós temos a chance de aprender o que é certo” ( G.A.P.P)

“Ela educa a gente de novo, corrige, penso que quando acabar de cumprir meu nome vai ficar limpo, vou poder arranjar um emprego. Eu gosto de prestar serviço na secretaria de meio ambiente, eles são bacanas comigo, brincalhões, gosto muito de lá, eles não me discriminam pelo o que eu fiz, me tratam como uma pessoa normal, eu ajudo o rapaz que trabalha  com muda de planta, to gostando do que eu faço. Sobre a minha medida de liberdade assistida, gosto de vir pros atendimentos, acho muito legal, as meninas me tratam bem, não me desrespeito, sempre me dão conselho e ajudam sempre no que eu peço, não só eu e sim minha família também, gosto também das grupalização é o momento que eu tenho pra aprender e tirar minhas duvidas sobre um determinado tema, é bom poder participar com os outros adolescentes, assim um vai ajudando um outro no cumprimento” ( R.S.A)

Diante disso, percebe-se que com os relatos dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa no CREAS os objetivos estabelecidos no ECA estão sendo  de alguma forma alcançados e com isto ocorre a responsabilização. A forma de condução pela equipe multiprofissional é o diferencial do trabalho, pois reflete nos adolescentes o sentimento de se sentir novamente como integrante da sociedade, e principalmente, um cidadão de direitos e deveres que possuem importância para sua família, sociedade e para o Estado.

Com destaque para os relatos daqueles socioeducandos que cumprem PSC (Prestação de Serviços à Comunidade), nota-se que o contato com o mundo do trabalho, embora seja o do serviço público, proporcionou aos adolescentes certa reflexão sobre suas aptidões e interesse em estar trabalhando naquela determinada atividade, o que é positivo, pois a intenção da medida não é apenas punitiva, mas de “reexaminar sua conduta, avaliar as consequências dela derivadas e propor mudança de comportamento, com indicação de que não mais irá praticar atos ilícitos”. (LIBERATI, 2012, p.125)

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Analisa-se que a medida socioeducativa cumprida no CREAS de Marituba funciona como instrumento eficaz no sentido de inibição da prática de novos atos infracionais na percepção dos socioeducandos. Nesse sentido, diante de todos os delineamentos legais e entrevista com os adolescentes, pode-se perceber que está havendo uma reflexão sobre o caráter ilícito da conduta que cometeram e apresentam comportamento de mudança com novas perspectivas de vida. 

Deste modo, considerando que a adolescência é uma fase peculiar em termos de desenvolvimento biopsicossocial, os atos infracionais cometidos por adolescentes devem ser compreendidos como resultado de circunstâncias que podem ser transformadas e de problemas passíveis de superação e de inserção social com verdadeiras oportunidades para estes adolescentes.

Com a revogação do antigo Código de Menores e do paradigma da situação irregular e o estabelecimento da Doutrina da Proteção Integral por meio do artigo 227 da Constituição Federal de 1988 e consequente promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo esta última, toda criança e adolescente passam a ser sujeitos de direitos, devendo isto ser garantido pelo Estado, Sociedade e Família. No contexto da medida socioeducativa, mesmo que o adolescente cometa um ato infracional, por mais grave que seja, não pode ser motivo para supressão de direitos. 

Pelas falas dos socioeducandos nota-se também que estes conseguem se perceber em um processo de responsabilização por meio do cumprimento da medida socioeducativa no CREAS, pois têm que seguir todas as regras determinadas para tanto, é que caso descumpram, isso poderá gerar revisão ou prorrogação da medida socioeducativa. 

Em suma, com base nesta pesquisa verifica-se a execução do que preconiza a lei alcançando os objetivos estabelecidos para responsabilização do socioeducando por meio do cumprimento da L.A ou PSC. E pelos relatos dos adolescentes pode-se perceber a intenção de uma mudança de perspectiva de vida, o que irá refletir na não-reincidência do ato infracional cometido. 

REFERÊNCIAS

BARROSO FILHO, José. Do ato infracional. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/2470>. Acesso em: 22 ago. 2017.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Diário Oficial da União. Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990. Brasília – DF. 1990     

_______. Lei Orgânica da Assistência Social. Diário Oficial da União.  Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Brasília – DF. 1993

_______, Resolução nº109, de 11 de novembro de 2009. Dispõe sobre Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Brasília – DF. 2009

_______. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo . Diário Oficial da União. Lei  nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012.  Brasília – DF. 2012

Informações sobre o CREAS.  Disponível em:<http://www.mds.gov.br/falemds/perguntas-frequentes/assistencia-social/pse-protecaosocial-especial/creas-centro-de-referencia-especializado-de-assistencia-social/creasinstitucional>. Acesso em 22 ago. 2017.

LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e ato infracional: medida socioeducativa é pena?. 2º ed.São Paulo: Malheiros Editores, 2012.

MINAYO, M. C. S. & SANCHES, O. Quantitativo-Qualitativo: Oposição ou Complementaridade? Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 1996.

Orientações técnicas: Centro de Referência Especializado de Assistência Social- CRE AS / Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome- Brasília, DF – 2011.

TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente.8 ed.Rio de Janeiro: Forense, 2012.

VOLPI, Mário (org.). O adolescente e o ato infracional. São Paulo: Cortez, 1997.p.127.


1Assistente Social. Bacharela em Serviço Social pela Universidade da Amazônia. Pará. jucy_elem@hotmail.com