REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10213913
Stephany Agostinho Colombeli;
Beatriz Martins Cheriato;
Alethea Patricia Assunção dos Santos;
Prof.ª Dr.ª Benedita de Fátima Delbono.
RESUMO: As publicidades enganosas sempre fomentaram as relações jurídicas na área do direito do consumidor. Ademais, é evidente que muitos fornecedores se utilizam deste mecanismo com o objetivo de atrair os consumidores e persuadi-los a fim de que comprem um produto ou se utilizem de um determinado serviço, para que estes gerem lucro às empresas. Visto isso, houve a necessidade de se discutir sobre a responsabilidade civil dos fornecedores no tocante ao tema. Assim, sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro, o presente artigo feito pelo método explicativo, entendeu que a responsabilidade civil dos fornecedores nos casos de publicidades enganosas é objetiva, salvo as excludentes de ilicitude. Ademais, a fim de compreender o tema, o presente explicou o conceito do consumidor e do fornecedor nas relações consumeristas e destacou o princípio da publicidade como uma peça- chave do entendimento sobre o tema.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil, Código de Defesa do Consumidor, Publicidade enganosa, Relação de Consumo, Princípio da Publicidade.
ABSTRACT: Misleading advertisements have always fostered legal relationships in the área of consumer law. Moreover, it is evident that many suppliers use this mechanism with the aim of attracting consumer sand persuading them to buy a productor use a certain service, so that these generate profit for companies. Giventhis, there was a need to discuss the civil liability of suppliers in relation to the subject. Thus, from the perspective of the Brazilian legal system, this article, prepared using the explanatory method, understood that the civil liability of suppliers in cases of misleading advertising is objective, with the exception of exclusions of illegality. In addition, in order to understand the theme, the present explained the concept of the consumer and the supplier in consumer relations and highlighted the principle of advertising as a key part of understanding the theme.
Keywords: Civil Liability, Consumer Protection Code, Misleading Advertising, Consumer Relations, Advertising Principle.
1. INTRODUÇÃO
Desde o advento da internet e o rápido avanço tecnológico, os fornecedores têm atuado de forma constante e precisa no tocante à comunicação. As redes sociais, por exemplo, têm sido grandes propulsores das publicidades e propagandas devido à manipulação dos dados e dos algoritmos. Ademais, não é à toa que os nichos de mercado, ou seja, um segmento específico de pessoas, se torna alvo de um determinado produto ou serviço de acordo com as suas necessidades.
Na lição de Calazans (1992, p. 5), o crescimento surpreendente usado pelas maneiras de comunicação de 1970 até os dias atuais demonstra à sociedade os benefícios e os desafios. Se por um lado há uma vitória no que tange a eclosão de conhecimentos de uma maneira jamais pensada, por outro lado o avanço tecnológico intimida uma revisão e reestruturação do que se entende por comunicação e como ela é propagada.
Nesta senda, as propagandas enganosas têm se destacado nas relações consumeristas e causado danos aos consumidores, pois as estratégias agressivas de marketing causam a difusão de uma publicidade abusiva ou enganosa, vendendo produtos cuja qualidade é duvidosa e tampouco condiz com boas qualidades técnicas.
Sendo assim, o presente trabalho tem por escopo explicar qual é a responsabilidade civil do fornecedor nas relações de consumo. Mas antes, a fim de construir esta vertente, é mister entender o conceito de consumidor e fornecedor.
2. CONCEITO DE CONSUMIDOR E FORNECEDOR
Com o alvo de promover a defesa ao consumidor, a Constituição Federal de 1988 define quem é o consumidor e os seus direitos. Este conceito será encontrado a partir do Código de Proteção e Defesa ao Consumidor que, de forma explícita, dispõe, em seu texto, o conceito de consumidor no artigo 2° e complementa esta conceituação nos artigos 17 e 29.
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.
Importa salientar que o artigo 29 faz uma extensão do conceito de consumidor abarcando todas as pessoas, sendo elas determináveis ou não, expostas às práticas contratuais ou comerciais abusivas.
Maria Helena Diniz (1998, p. 818), em seu dicionário jurídico, dá a seguinte definição sobre o consumidor: 1. Pessoa jurídica ou física que usa ou adquire um produto ou serviço como destinatário final. 2. Coletividade de pessoas que intervêm em uma relação de consumo. 3. Aquele que consome. 4. O que compra produtos para uso próprio, sem intenção de revendê-los para obter lucro.
Note-se que o ordenamento jurídico aduz que o consumidor pode ser uma pessoa jurídica, física ou até mesmo, por meio de equiparação, a coletividade de pessoas, mesmo sem serem determináveis ou não, que utilizam ou adquirem produtos ou serviços, para o seu próprio benefício ou de outro.
A doutrina apresentava duas teorias sobre a definição e consumidor: a teoria finalista, sendo mais restritiva; e outra, maximalista, ampliando a noção de consumidor, com o objetivo de englobar na proteção legal um maior número de situações jurídicas. Recentemente, surgiu a teoria do finalismo aprofundado, o qual se coloca em uma posição no interregno às duas teorias ordinárias.
Outro agente da relação de consumo é o fornecedor de serviços e produtos, que tem seu significado legal no art. 3° do Código de Defesa do Consumidor, que é toda pessoa física ou jurídica, privada ou pública, nacional ou estrangeira, entes despersonalizados, que promovem atividade de montagem, criação, produção transformação, distribuição, exportação ou comercialização e produtos ou prestação de serviços.
Note-se que no conceito supramencionado o legislador brasileiro conferiu o conceito de fornecedor a maior amplitude possível, a fim de caracterizar a responsabilidade solidária nas relações de consumo, de todos os corresponsáveis por eventuais defeitos de produtos e serviços e vícios.
Fornecedor, na lição de Filomeno (2004, p. 147), é, destarte,
(…) qualquer pessoa física, ou seja, qualquer um que, a título singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma forma, mas em associação mercantil ou civil e de forma habitual.
Assim, o requisito para a conceituação de fornecedor, é o desenvolvimento de atividades tipicamente profissionais, como por exemplo, a comercialização, produção, importação de bens ou serviços indicando também a necessidade de uma certa habitualidade, como a transformação e a distribuição de produtos.
3. O PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR
Não resta dúvidas que o Código de Defesa do Consumidor não só determina e estabelece as diretrizes sobre as relações consumeristas, como também tem como o objetivo de proteger o consumidor dos abusos por parte dos fornecedores no tocante às publicidades enganosas.
Em que pese o Código de Defesa do Consumidor não esclarecera definição de publicidade, ele dispõe especificamente em relação à publicidade enganosa e abusiva.
Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (2010, p. 234-236), autor do anteprojeto que originou o Código de Defesa do Consumidor norteia alguns princípios que abordam sobre a publicidade:
Princípio da identificação da publicidade – pois não se admite a publicidade clandestina ou subliminar.
Princípio da vinculação contratual da publicidade – diante da regra estampada no art. 30 do Código de Defesa do Consumidor que aduz que o tem o dever de cumprir as obrigações oferecidas por meio da publicidade.
Princípio da veracidade da publicidade – pela vedação da publicidade enganosa.
Princípio da não abusividade da publicidade – pela proibição da publicidade abusiva, tida também como ilícita.
Princípio da inversão do ônus da prova – diante da regra do art. 38 do CDC, segundo a qual o conteúdo da publicidade deve ser provado por quem a patrocina.
Princípio da transparência da fundamentação da publicidade – a publicidade deve estar sintonizada com a boa-fé objetiva e a lealdade negocial.
Princípio da correção do desvio publicitário – além da reparação civil, presente o desvio, cabem medida administrativas e penais, bem como a necessidade de veiculação de uma contrapropaganda (art. 56, XII, CDC).
Princípio da lealdade publicitária – retirada do artigo 4°, VI, do CDC que dispõe como fundamento da Política nacional das Relações de consumo a “coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores”.
Princípio da identificação publicitária – pela vedação da publicidade mascarada ou simulada/dissimulada.
A fim de sintetizar os estudos no que tange aos princípios jurídicos, Bruno Miragem (2008, p. 163) faz uma análise de três princípios com o alvo de fundamentar a publicidade como objeto de direito: o princípio da vinculação o princípio da identificação e o princípio da veracidade.
Na lição do autor (MIRAGEM, 2008, p. 163), é essencial que a publicidade tenha um fundamento científico ou técnico para o que consumidor consiga identificar os benefícios dos produtos e dos serviços dispostos pelo fornecedor.
Bruno Miragem (2008, p. 163) aduz:
[…] origina-se para o fornecedor o dever de caracterizar a publicidade, seja ela uma determinada peça ou toda uma campanha publicitária, a qual deve ser apresentada de tal modo que o público a quem se dirija possa identificá-la […].
Assim, os três princípios abordados pelo autor compõem a publicidade juntamente com suas peculiaridadesfazendo parte do processo de identificação, imediata ou espontânea, da campanha publicitária. Caso isso não aconteça, não é somente o consumidor que está sendo vítima, mas tambémo ordenamento jurídico pátrio brasileiro.
Adalberto Pasqualloto (1997, p. 85-86) ensina que a identificação da publicidade como tal, naturalmente, retira muito da credibilidade da mensagem, levando alguns anunciantes a mascará-la. Neste sentido, não é à toa que os fornecedores fazem uso ilícito das estratégias de marketing com o alvo mascarar a publicidade, infringido o princípio da identificação, no qual o Código de Defesa do Consumidor dispõe sobre a violação por meio das espécies de publicidade subliminar, clandestina e dissimulada.
Na leitura do artigo 6°, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, os direitos fundamentais do direito do consumidor não só possuem a proteção contra a publicidade abusiva e enganosa, como também dispõe sobre as cláusulas abusivas compulsórias pelo fornecedor quando ele oferta seus serviços e bens.
Segundo Abreu (2016, p. 13), essa responsabilidade objetiva não é absoluta, pois não pode ser aplicada nas situações que tenham a ocorrência da força maior ou do caso fortuito e da culpa exclusiva da vítima. Além do mais, forçoso lembrar que o princípio da veiculação impõe que o fornecedor/comerciante disponha sobre o produto ou serviço as condições que ele ofereceu ao consumidor por meio da publicidade.
Logo, é evidente que, a fim de assegurar este direito fundamental nas relações consumeristas, o Código de Defesa do Consumidor afere a responsabilidade objetiva aos fornecedores/comerciantes. Assim, não há a necessidade de comprovar a culpa no tocante à responsabilidade civil. É mister que o consumidor lesado faça prova do dano e do nexo de causalidade entre o prejuízo e a prestação de serviço ou o dano.
Na inteligência do artigo 37, § 1°, não resta dúvidas de que a publicidade enganosa induz o consumidor ao erro.
Art. 37 § 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.
O Tribunal do Rio Grande do Sul o qual o relator foi o Desembargador Ricardo Torres Hermann, julgou um caso em concreto que o fornecedor, ao realizar uma campanha publicitária, divulgou um produto que não continha uma peça ou acessório. Assim, o entendimento foi que o fornecedor tem a responsabilidade de ajustar o dano que prejudicou ao consumidor. Logo, a decisão foi favorável ao consumidor.
Na íntegra:
CONSUMIDOR. PUBLICIDADE ENGANOSA. CÂMERA FOTOGRÁFICA DIGITAL. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. DEVOLUÇÃO DO VALOR DESPENDIDO. DANO MORAL OCORRENTE.
- Tendo em vista que o consumidor foi induzido em erro ao pensar que estava adquirindo uma câmera capaz de gravar vídeos com áudio, quando, em realidade, o produto não possuía tal função, ficou comprovada a publicidade enganosa autorizadora de rescisão contratual com devolução do valor pago pelo bem.
- Não comprovando, a ré, a existência de valores em aberto, referentes à última parcela da máquina digital, deverá ressarcir todo o valor constante da nota fiscal acostada pelo demandante. Caso, de fato, a última parcela não tenha sido paga, nada obsta posterior cobrança pelos meios cabíveis.
- O dano moral, sofrido pelo autor, decorre da arbitrariedade da conduta da ré, que veiculou publicidade enganosa, em total desrespeito com o consumidor. O quantum arbitrado está de acordo com as circunstâncias do caso concreto (R$ 1.000,00). Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Recurso Improvido.
O caso em tela faz jus ao artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor sobre quando há a omissão essencial sobre algum serviço ou produto. Logo, é imperioso que o fornecedor divulgue todas as informações necessárias.
Outra decisão proferia pelo mesmo Tribunal foi sobre o fornecedor ficar silente diante das informações indispensáveis, como por exemplo, nos serviços que não tem cobertura de sinal e regiões específicas. Neste caso, o fornecedor não informou ao comprador/consumidor que não tinha disponibilidade do serviço em questão.
CONSUMIDOR. SERVIÇO DE INTERNET 3G. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. PUBLICIDADE ENGANOSA. CANCELAMENTO DO CONTRATO SEM A INDICÊNCIA DE MULTA.
- Não tendo a ré comprovado efetivamente a utilização do serviço, bem como a disponibilidade do sinalna região onde reside o autor, tem-se que houve falha na prestação do serviço em questão. Salienta-se, ainda, que, apesar de ser a mobilidade principal característica do serviço de Internet 3G, é obrigação da ré disponibilizar o produto na região onde é residente o consumidor, o que, no presente caso, não ocorreu.
- Assim, havendo falha na prestação do serviço contratado, impõe- se o cancelamento do contrato sem qualquer ônus ao consumidor. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Recurso improvido.
Segundo Maria Helena Diniz (2004, p. 40), a responsabilidade civil é cumprimento das medidas que coagem uma pessoa a reparar um dano moral ou patrimonial que é causado a terceiros, pelo ato dela mesmo praticado, por pessoa ou quem ela responde, por alguma coisa que pertence a ela ou simplesmente de uma imposição legal.
Flávio Tartuce (2012, p. 367) entende que, ao analisar o tema juntamente com o Código Civil, no que tange à publicidade abusiva por ação ou omissão, a simetria entre elas deve ser feita em relação ao tratamento desse vício do consentimento, disposto entre os artigos 145 a 150 do Código Civil. Como retirado do próprio comando transcrito, a publicidade enganosa pode acontecer nos casos de ação ou mesmo por omissão.
Assim, com os artigos trazidos à baila pelo autor, ele reforça a ideia que o ordenamento jurídico pátrio brasileiro dispõe de elementos legais para impugnar a publicidade abusiva, no âmbito dos negócios jurídicos que causem dolo ao consumidor, em análise do artigo 154 do Código Civil (BRASIL, 2002), aduzindo que serão anuláveis os negócios jurídicos quando há o dolo como consequência para a sua anulação.
Em termos gerais, a publicidade abusiva por ação tem o seu alicerce no dolo positivo, que é aquele que acontece de uma ação ao ato que é conduzido de maneira fraudulenta, pelo fato de que o indivíduo que foi enganado executa o ato que se quer, contra os seus próprios interesses em benefício da pessoa que o persuadiu ou de terceiros.
5. AS PUBLICIDADES ENGANOSAS NO CONTEXTO BRASILEIRO
A publicidade não é uma obrigação do fornecedor, mas um direito, por sua conta e risco. Mas ao se tratar do controle da publicidade é da competência do Poder Público. Nesta senda, há quem entenda que esta regulação é dada pelo próprio mercado concorrente com até mesmo com a intervenção do consumidor. Todavia é ingênuo pensar desta forma, pois o Poder Público dispõe de órgãos privados de autorregulamentação, como por exemplo o Código brasileiro de Autorregulamentação Publicitária – Conar. Ademais, a própria Constituição Federal faz este controle de acordo com o artigo 220, § 3° e § 4°, conforme aponta Bagatini (2005, p. 77).
Como muito bem exposto no tópico anterior, segundo o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor, toda publicidade abusiva consiste nas propagandas com cunho discriminatório ou de qualquer natureza que encoraje a violência, medo ou superstição, se aproveite da capacidade de julgamento e experiência da criança, desrespeito aos valores ambientais ou até mesmo uma publicidade enganosa de forma moral no tocante a informação ou comunicação de caráter publicitário etc.
Com base nos requisitos supramencionados, o Judiciário condenou o canal brasileiro de televisão MTV a pagar uma indenização aos consumidores por um dano coletivo, devido a utilização de mensagens subliminares no teor das suas vinhetas.
O site Consultor Jurídico publicou a seguinte matéria:
A MTV Brasil, empresa ligada ao Grupo Abril, deve retirar do ar um clipe institucional em que são veiculadas “mensagens subliminares, consistentes em cenas de sadomasoquismo”. Além disso, deve pagar danos morais difusos, quantificados no mínimo de R$ 1,00, para cada um dos 7,4 milhões de telespectadores que assistiram as cenas do clipe. O juiz da 12ª Vara Cível de São Paulo, Paulo Alcides Amaral Salles, concedeu liminar a pedido do Ministério Público. Os promotores Deborah, Pierri, MotauriCiochett e Vidal Serrano, que atuam em defesa dos consumidores e da infância e adolescência, ingressaram com ação civil pública contra a MTV Brasil. A emissora ainda pode recorrer. De acordo com o MP, a vinheta ‘no plano consciente veicula imagens regulares com o logotipo da MTV, mas quando as imagens do referido clipe são submetidas a velocidade mais lenta, percebe-se que as mesmas trazem cenas explícitas de prática sexual chamada de sadomasoquismo’. Segundo os promotores, a liberdade de expressão não pode chegar a ponto de ferir outros delitos fundamentais: liberdade de escolha, liberdade de informação, integridade e psíquica, proteção ao consumidor, todos consagrados na Constituição Federal, Estatuto da Infância e Adolescência e Código de Defesa do Consumidor. O juiz afirmou que a ‘manutenção da publicidade poderá causar danos irreparáveis às pessoas, em especial aos menores, que assistem à programação’. Salles considerou ‘grosseiras’ as imagens do clipe. ‘O direito à falta de observação dos usos e costumes da sociedade e, principalmente, com a falta de observação da dignidade das pessoas humanas. A exposição da população e dos menores às imagens veiculadas pela ré, como ressaltado, poderá criar sérios problemas de comportamento na medida em que as imagens subvertem os valores que a sociedade procura a todo custo salvaguardar’. A MTV não poderá veicular ‘qualquer outro programa ou evento em que haja publicidade clandestina, subliminar, especialmente quando houver insinuações de práticas sexuais, sob pena de suspensão de sua programação no mesmo dia e horário da semana subsequente’. Caso descumpra a decisão, terá de pagar multa de R$ 10 mil. (CONJUR, 2002)
Outro caso de publicidade enganosa foi o caso do “Quer pagar quanto?” pela loja no formato varejista denominado “Casas Bahia”. O comercial televisivo apresentado pelo comerciante mostrava pessoas “namorando” o eletrodoméstico dentro da loja sendo abordadas pelo vendedor questionando se iriam ou não comprar o produto. O indivíduo que fazia o papel do consumidor respondia que não tinha condições de levar o produto por não ter a quantidade de dinheiro suficiente e o vendedor respondia: “Quer pagar quanto? O que você quer, aqui você pode”.
Por causa desta publicidade, vários consumidores recorreram aos órgãos de proteção e defesa do consumidor e até mesmo a justiça, pois ao irem até às lojas para comprar um produto com o preço fosse melhor e devido as condições econômicas favoráveis, o vendedor negava a venda.
Note-se que a Casas Bahia possui lojas em todo o território brasileiro, não só vendendo produtos, mas também dispondo de serviços como crediário, seguro-garantia estendida dentre outros. Ademais, a loja tem como público-alvo as classes mais populares como prioridade, mesmo investindo de forma massiva em sua publicidade.
Sobre o caso, Oliveira e Arantes (2008, p. 16-17) afirmam que:
a mensagem que os proprietários da loja estavam passando era evidente: foco no cliente, seus desejos e sonhos. Todas as atenções, todos os mimos, todos os detalhes. O cliente das Casas Bahia é pobre, mas sonha em mobiliar sua casa, sonha em ter uma vida de novela, sonha em prover sua família com muito mais do que móveis e eletrodomésticos: o sonho é a dignidade, o conforto. O único problema é que esse cliente precisa de crédito, descontos, prazo. Precisa acreditar que aquilo tudo que ele deseja está ao alcance do seu salário de trabalhador. ‘Quer pagar quanto?’ soou como música.
É evidente que muitas vezes, o comportamento do consumidor é influenciado por aquilo que ele vê na mídia, principalmente quando se trata de clientes das classes mais baixas que são isentos de conhecimento dos seus próprios direitos. Em que pese, todas estas questões são somadas à influência de ações impróprias, como atos enganosos, conduzindo o consumidor ao encontro da empresa.
Abreu (2016) entende que o Código de Defesa do consumidor permite ao consumidor a escolha livre de reivindicar o que foi prometido pelo fornecedor, fazendo com que inúmeros consumidores recorressem à justiça e também permite o direito de reivindicar o cumprimento forçado da obrigação; substituição por serviço ou produto equivalente sem prejuízos monetários, corretamente corrigidos por índices monetários vigentes.
Assim, a empresa renunciou a prática danosa ao consumidor por meio da publicidade comercial na televisão e optou por um formato mais padrão para uma empresa no seu devido segmento de atuação.
6. CONCLUSÃO
Diante do exposto, insta salientar que os fornecedores têm feito proveito dos meios de comunicação com o alvo de expandir seus serviços, produtos e bens por meio das publicidades. Em que pese, muitos fornecedores fazer o uso de propagandas enganosas a fim de que os consumidores sejam persuadidos a adquirir esses bens e/ou serviços, é uma atitude ilegal dos comerciantes, sendo vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, na inteligência o artigo 37, §1°, seja por ação ou por omissão.
Outrossim, o ordenamento jurídico brasileiro entende que quando há a publicidade enganosa, o fornecedor responderá de forma objetiva no tocante à responsabilidade civil, salvo as excludentes de ilicitude, pois a lei protege o consumidor a fim que não sofra abuso ou engano. Ademais, o princípio da vinculação, o princípio da identificação e o princípio da veracidade, são mecanismos amplos e essenciais de garantia, assegurando os direitos do consumidor.
Por fim, o consumidor lesado por uma publicidade enganosa possui o direito e o poder de requerer que seja reparado o seu dano, da mesma maneira que o fornecedor tem a responsabilidade jurídica pela publicidade abusiva e enganosa.
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