NULLITIES ARISING FROM ILLEGAL EVIDENCE AND CRIMINAL PROCESS IN BRAZIL
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202505082034
Juliano Soares Prado1
Hiago Gontijo Dias2
Orientador Hernando Fernandes da Silva3
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo apresentar uma análise sobre as nulidades resultantes da utilização de provas ilícitas e seus efeitos sobre o Processo Penal no Brasil. Restará demonstrado que em diversos casos, o apontamento de nulidades causadas por provas ilícitas em processos penais é instrumento usado em favor do acusado, como estratégia de defesa, buscando a correção de irregularidades que o prejudiquem. Em outros, se bem manejado por bons advogados e sob o pretexto de garantia da legalidade e da proteção de direitos fundamentais, esse instrumento pode atuar em desfavor da sociedade, anulando, em muitos casos, processos inteiros, por vício insanável na obtenção ilícita de provas, podendo, inclusive, favorecer culpados. É fato que, mesmo diante de vedação constitucional, expressa no Art. 5o., inciso LVI, da Constituição Federal de 1988, o tema gera controvérsia provocando discussões doutrinárias e gerando uma diversidade de jurisprudências nos tribunais superiores. Contudo, faz-se importante salientar que, aqui, a análise desse tema não tem o objetivo de esgotar a matéria, propondo-se a abordar e destacar aspectos que se acredita serem mais relevantes, através da pesquisa legislativa, doutrinária e das jurisprudências. Por fim, faz-se importante destacar que, no desenvolvimento e pesquisa para esse artigo, jamais houve qualquer desvio de rumo, em relação ao regramento que norteia a atividade probatória, assim como, não se cogitou, sob nenhuma hipótese, desconsiderar direitos e garantias constitucionais, que são preceitos fundamentais para a preservação do Estado Democrático de Direito.
Palavras chaves: Processo penal; provas ilícitas; nulidades; Constituição Federal de 1988; Estado Democrático de Direito.
ABSTRACT
This article aims to present an analysis of the nullities resulting from the use of illicit evidence and their effects on Criminal Proceedings in Brazil. It will be demonstrated that in several cases, the pointing out of nullities caused by illicit evidence in criminal proceedings is an instrument used in favor of the accused, as a defense strategy, seeking to correct irregularities that harm him. In other cases, if well handled by good lawyers and under the pretext of guaranteeing legality and protecting fundamental rights, this instrument can act to the detriment of society, nullifying, in many cases, entire proceedings, due to incurable defect in the illicit obtaining of evidence, and may even favor the guilty. It is a fact that, even in the face of a constitutional prohibition, expressed in Article 5, item LVI, of the Federal Constitution of 1988, the subject generates controversy, provoking doctrinal discussions and generating a diversity of case law in the higher courts. However, it is important to emphasize that the analysis of this topic here does not aim to exhaust the subject, but rather to address and highlight aspects that are believed to be more relevant, through legislative, doctrinal and case law research. Finally, it is important to emphasize that, in the development and research for this article, there was never any deviation from the rules that guide the evidentiary activity, nor was there any consideration, under any circumstances, of disregarding constitutional rights and guarantees, which are fundamental precepts for the preservation of the Democratic State of Law.
Keywords: Criminal procedure; illicit evidence; nullities; Federal Constitution of 1988; Democratic State of Law.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo trata das nulidades resultantes da utilização de provas ilícitas e suas consequências para o processo penal no Brasil, que é um tema controverso, apesar de existir vedação legal expressa no texto constitucional.
Para melhor compreensão, faz-se necessário entender o que são nulidades e quais se seus impactos nos processos penais.
Nulidades são falhas processuais que interferem na legitimidade de atos, contrariando leis ou direitos das partes envolvidas, cuja comprovação, conforme sua importância, pode levar a prejuízos processuais sérios, afetando não só o trâmite, mas, também, os resultados do processo, podendo provocar lentidão processual excessiva, repetição de audiências, recorrência de perícias, e, em alguns casos, pode levar à anulação do processo todo, ocasionando, até mesmo, a absolvição de culpados ou a condenação de inocentes.
Lado outro, o apontamento de nulidades também pode ser usado como estratégia de defesa, buscando a correção dos defeitos processuais que prejudiquem o acusado, sendo, nesse caso, instrumento essencial para garantir a legalidade, a justiça e a proteção de direitos fundamentais.
Como nas demais áreas do Direito, no processo penal deve-se evitar descumprir ritos e normas legais, visando a garantia do devido processo legal, e para isso, se faz importante conhecer quais são os princípios que mais influem no processo penal no Brasil.
Entendeu-se necessário, também, a explanação, de forma sucinta, sobre aquela que é considerada a maior operação anti-corrupção realizada no Brasil, a Operação Lavajato, que, apesar de enorme repercussão, teve a grande maioria dos seus resultados jurídicos anulados devido a descoberta da utilização de meios ilegais para a obtenção das provas que a embasaram.
Assim, sem pretensão de esgotar o assunto, busca-se ampliar o debate sobre este tema tão controverso, trazendo mais luz ao fato da obtenção de provas ilícitas ser prática recorrente no Brasil, mesmo tendo vedação legal no texto constitucional.
O método empregado para a realização desse trabalho será o de pesquisa direta, tanto na legislação, quanto na doutrina jurídica, assim como, nas jurisprudências dos Tribunais Superiores.
2 O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E O PROCESSO PENAL
A Constituição Federal de 1988, traz consignado no texto do seu Art. 1º que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, in verbis:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. […] (Brasil, 1988, grifo nosso).
E como Estado Democrático de Direito, o Brasil precisa garantir esses direitos fundamentais para todos os seus cidadãos, sem distinção, inclusive para aqueles investigados no âmbito do processo penal, que se inicia com base num inquérito policial resultante de uma investigação prévia na qual a autoridade policial é responsável por apurar o cometimento de determinado delito, visando demonstrar, com o maior nível de certeza possível, a autoria, a motivação e os meios empregados para o seu cometimento.
Para tanto, faz-se necessário reunir o máximo de informações possíveis sobre o fato ocorrido, seja ouvindo pessoas, diligenciando ou inspecionando o local do delito, em busca de evidências, além de implementar diversas outras ações que poderão contribuir para obtenção de possíveis provas relacionadas ao fato delituoso.
Decerto que, para a obtenção de uma verdade absoluta dentro dos limites da legalidade previsto em lei, é necessário que se faça uma investigação clamorosa, sem erros e ou vícios, não deixando dúvidas acerca do delito e da materialidade, embora esta não seja de suma relevância para a instauração da ação penal, porém acreditamos, que na busca da realidade do crime, deverá a autoridade policial funcionar em perfeita harmonia com o órgão do Ministério Público para a elucidação da verdade real, visando imputar ao infrator delinquente, dentro da legalidade de um processo justo, real e verdadeiro, a sanção penal adequada. O Inquérito Policial é o procedimento destinado a reunir os elementos necessários à apuração da prática de uma infração penal e de sua autoria. É o momento inicial da persecutio criminis. É o conjunto de informações, que no momento oportuno, propiciará o início da ação penal. O IP irá levar, portanto, até o Ministério Público, informes acerca da infração investigada. (Castro Júnior, 2015, p. 6).
Dessa forma, o inquérito policial assume papel de grande importância no processo penal, uma vez que as informações obtidas durante o procedimento investigatório terão influência no convencimento do juízo, bem como definirão o futuro do investigado, sendo, sua tramitação, acompanhada pelo Ministério Público.
Contudo, essa investigação deve se amoldar aos princípios elencados na Constituição Federal de 1988, que prevê garantias e direitos fundamentais ao investigado no âmbito do processo penal. Tais princípios advém do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que é o princípio direcionador dos demais, citado no Art. 1º da Carta Magna, e que tem caráter impositivo.
Dentre os muitos princípios expressos no texto constitucional, encontra-se o princípio da presunção da inocência, também chamado de princípio da não culpabilidade, que é um dos direitos fundamentais do investigado.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção […]:
[…]
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
[…] (Brasil, 1988, grifo nosso).
Este princípio visa a proteção individual do investigado com a finalidade de não cercear a sua liberdade por motivo de mera suspeita, garantindo a todo indivíduo a presunção da inocência, não lhe impondo pena antes do trânsito em julgado de uma decisão condenatória.
Conforme a doutrina:
Consiste, assim, no direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença transitada em julgado, ao término do devido processo legal, em que o acusado tenha se utilizado de todos os meios de prova pertinentes para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação (contraditório). Comparando-se a forma como referido princípio foi previsto nos Tratados Internacionais e na Constituição Federal, percebe-se que, naqueles, costuma-se referir à presunção de inocência, ao passo que a Constituição Federal em momento algum utiliza a expressão inocente, dizendo, na verdade, que ninguém será considerado culpado. Por conta dessa diversidade terminológica, o preceito inserido na Carta Magna passou a ser denominada presunção de não culpabilidade. (Lima, 2013, p.08).
Vejamos jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais com decisões recentes sobre a garantia da presunção da inocência:
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. DELITO DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DILIGÊNCIAS PROBATÓRIAS. INDEFERIMENTO JUSTIFICADO. ATOS QUE RESULTARIAM EM REVITIMIZAÇÃO. NULIDADE NÃO CONSTATADA. MÉRITO. DECLARAÇÕES DO OFENDIDO. CRIANÇA DE TENRA IDADE QUE APRESENTOU DIFERENTES VERSÕES. MUITOS PONTOS DE CONTRADIÇÃO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. CONSTATAÇÃO. ABSOLVIÇÃO NECESSÁRIA. RECURSO PROVIDO. 01. É lícito ao julgador indeferir diligências probatórias que constituiriam, por via transversa, a realização de nova oitiva da vítima, já inquirida em escuta especializada e por meio de depoimento especial. 02. Constatadas divergências essenciais nos esclarecimentos prestados pela criança, que apresentou versões muito diferentes para os fatos, decide-se a incerteza em favor do acusado, com fincas no princípio de presunção da inocência. 03. Preliminar rejeitada. Apelo provido para absolvição do réu. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.382472-9/001, Relator (a): Des. (a) Beatriz Pinheiro Caires, 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 10/04/2025, publicação da súmula em 10/04/2025)
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – IMPUTAÇÃO LANÇADA CONTRA DOIS RÉUS – INEXISTÊNCIA DE PROVA DE AUTORIA QUANTO A UM DELES – ABSOLVIÇÃO PLENA – AUSÊNCIA DE PROVA DE ASSOCIAÇÃO QUANTO AO OUTRO ACUSADO – ABSOLVIÇÃO – PENA-BASE – ELEVAÇÃO POR FORÇA DOS ANTECEDENTES E DA NATUREZA DA DROGA – INADMISSIBILIDADE – CONDENAÇÃO NÃO TRANSITADA EM JULGADO – QUANTIDADE PEQUENA DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE – REDUÇÃO PARA O MÍNIMO LEGAL – INDENIZAÇÃO PELOS DANOS CAUSADOS PELO VEÍCULO – EXCLUSÃO.
– Se o conjunto probatório não contém elementos suficientes para comprovar o vínculo do réu João C.P.S. com a substância entorpecente que foi apreendida em local distinto de sua residência, impõe-se sua absolvição quanto ao crime de tráfico, pois uma condenação não pode alicerçar-se em mera presunção, exigindo provas concludentes e inequívocas. […] – A existência de processos em curso, sem certificação de trânsito em julgado, não legitima o aumento da pena-base em razão dos antecedentes do réu. […]. – Inexistindo nos autos parâmetros seguros acerca do prejuízo causado à comunidade pela conduta desviante, deve ser excluída da condenação o valor fixado a título de indenização pelos danos causados pelo delito. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.315023-2/001, Relator (a): Des. (a) Beatriz Pinheiro Caires, 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 26/09/2024, publicação da súmula em 26/09/2024, grifo nosso)
Outro princípio importante expresso na Constituição Federal de 1988, é o princípio do devido processo legal.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção […]:
[…]
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
[…] (Brasil, 1988, grifo nosso).
Segundo a doutrina, a garantia do devido processo legal é possível através de uma intrincada combinação de normas, princípios e proibições. (SOARES, 2020).
No que diz respeito diretamente ao inquérito policial, o devido processo legal é extremamente importante, desde os primeiros procedimentos até o seu fechamento, com emissão do relatório final.
Destacada a importância da investigação preliminar levada a efeito pelo inquérito policial e sua imediata correlação com o princípio do devido processo legal, devemos mencionar a realização das diversas diligências para elucidação do fato, de acordo com as peculiaridades do caso concreto, até que chega o momento de encerrar o feito e a autoridade policial elaborar o relatório final para remessa ao juízo. (Martins, 2022, p. 1).
Como já dito, são realizadas no momento do inquérito policial, que é uma preparação para a ação penal, diversas diligências a fim de reconstituir os acontecimentos, buscando uma verdade que possa ser corroborada pelas provas obtidas, uma vez que, no contexto do Estado Democrático de Direito, já a partir das investigações preliminares, é fundamental a garantia do devido processo legal. (MARTINS, 2022).
Outro princípio, tão importante quanto os princípios citados anteriormente, para o processo penal, o princípio da legalidade também está previsto no Art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição de 1988, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção […]:
[…]
XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
[…] (Brasil, 1988, grifo nosso).
O princípio da legalidade é uma das principais garantias aos direitos individuais, uma vez que a legislação, ao passo que define direitos, também estabelece limites à atuação do Estado.
Os órgãos incumbidos da persecução penal não podem possuir poderes discricionários para apreciar a conveniência ou oportunidade da instauração do processo ou do inquérito. No caso de infrações penais insignificantes, não pode ser aplicado o princípio minima non curatpraetor, pois este decorre do princípio da oportunidade, estranho ao processo penal. Assim, a autoridade policial, nos crimes de ação pública, é obrigada a proceder às investigações preliminares, e o órgão do Ministério Público é obrigado a apresentar a respectiva denúncia, desde que se verifique um fato aparentemente delituoso (Capez, 2012, p. 113).
Na fase de inquérito policial, o investigado somente pode ser submetido às diligências previstas no ordenamento jurídico, observando-se o princípio da legalidade.
3 DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL
Segundo Capez (2024), o objeto da prova engloba circunstâncias, alegações ou fatos que guardam relação com a demanda e necessitem de comprovação para que a questão seja adequadamente resolvida.
De início, faz-se de extrema relevância definir com bastante clareza o que são provas para o Direito Penal, uma vez que o ponto focal deste trabalho é a análise das nulidades resultantes da utilização de provas ilícitas no contexto do processo penal brasileiro.
De acordo com Guilherme de Souza Nucci:
A prova é a demonstração lógica da realidade, no processo, por meio dos instrumentos legalmente previstos, buscando gerar, no espírito do julgador, a certeza em relação aos fatos alegados e, por consequência, gerando a convicção objetivada para o deslinde da demanda. (Nucci, 2011, p. 17).
Em regra, todos os meios de prova são aceitos no processo penal, desde que não tenham restrição expressa em lei e que respeitem os direitos fundamentais dos envolvidos na demanda.
Sem dúvida alguma, o tema referente à prova é o mais importante de toda a ciência processual, já que as provas constituem os olhos do processo, o alicerce sobre o qual se ergue toda a dialética processual. Sem provas idôneas e válidas, de nada adianta desenvolverem-se aprofundados debates doutrinários e variadas vertentes jurisprudenciais sobre temas jurídicos, pois a discussão não terá objeto. (Capez, 2024, p. 221)
Segundo Capez (2024), o termo “prova” deriva do latim probatio e é o conjunto de atos praticados pelas partes, juiz e terceiros com a finalidade de formar a convicção sobre determinado fato, servindo para a fundamentação das decisões do magistrado.
No processo penal, deve-se buscar reconstruir historicamente um fato e todas as suas circunstâncias, com o objetivo de que a instrução probatória se aproxime o máximo possível da forma como esse fato ocorreu. (Capez, 2024, p. 20).
Esse é o princípio da liberdade probatória que é fundamental para o processo penal, uma vez que o juiz tem a prerrogativa de considerar qualquer elemento que possa ajudar a formar a sua convicção sobre a verdade dos fatos.
Contudo, não se deve perder de vista o equilíbrio entre a liberdade probatória e a proteção dos direitos e garantias individuais.
3.1 DAS PROVAS ILÍCITAS
Além dos princípios já citados, um outro, de grande importância para o processo penal, é o princípio da vedação das provas ilícitas, que, anteriormente no ordenamento jurídico era citado apenas no artigo 223 do Código de Processo Penal, in verbis:
Art. 233. As cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos, não serão admitidas em juízo.
Parágrafo único. As cartas poderão ser exibidas em juízo pelo respectivo destinatário, para a defesa de seu direito, ainda que não haja consentimento do signatário. (Brasil, 1941).
Na Constituição de 1988, foi incluído no Art. 5º, com a seguinte redação:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção […]
[…]
LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
[…] (Brasil, 1988).
E, posteriormente, com redação dada pela Lei n°. 11.690 de 2008, também passou a constar no Código de Processo Penal, em seu artigo 157, in verbis, “Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.” (Brasil, 1941).
A utilização, no processo penal, de provas obtidas de forma ilegal, e portanto, provas ilícitas, suscita dúvidas sobre qual a correta medida para, em não se comprometendo a garantia dos direitos fundamentais, alcançar a eficácia desejada do sistema de justiça.
[…], as chamadas provas ilícitas não constituem meios de provar a inocência do acusado, mas colocam em suspeição o julgamento, pelo fato de apontarem para a probabilidade de existência de conluio entre o juiz e a parte acusatória, prática esta considerada imprópria pelo Código de Processo Penal. Discute-se que tais provas poderiam, em casos específicos, anular o julgamento, visto que o direito tutelado tem sido considerado mais importante que o direito processual, uma vez que se está “em jogo” a liberdade e inocência dos indivíduos. (Berleze, 2019, p.2).
A não admissibilidade de provas ilícitas, expressa na legislação brasileira, demonstra o alto grau de valor que é dado à dignidade da pessoa humana e à prevenção de abusos que possam ser cometidos pelo Estado, buscando equilibrar, de um lado da balança, a busca pelo combate à criminalidade, e, de outro, a preservação dos direitos individuais e das garantias constitucionais.
No mesmo sentido, há que se falar das provas ilícitas por derivação, que foram produzidas a partir de outra prova ilegalmente obtida.
Segundo Capez (2024), “Essa categoria de provas ilícitas foi reconhecida pela Suprema Corte norte-americana, com base na teoria dos “frutos da árvore envenenada” (fruits of the poisonous tree), segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos.”.
Atualmente, o CPP, considera em seu Art. 157, § 1º, como inadmissível esse tipo de prova obtida através de meios ilegais, ou como resultado de outras provas ilícitas, e obriga o seu desentranhamento do processo penal.
Também, o Art. 573, do CPP, prevê:
Art. 573. Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores, serão renovados ou retificados.
§ 1 o A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam conseqüência.
§ 2 o O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende. (Brasil, 1941).
No entanto, a aplicação dessa inadmissibilidade, na prática, pode ensejar dificuldades reais importantes, levando a resultados indesejados, especialmente quando a não aceitação dessas provas compromete a busca pela “verdade real” no processo penal, podendo, em certos casos, resultar em absolvição de culpados ou em condenação de inocentes, podendo, ainda, gerar, na sociedade, preocupações relacionadas a insegurança individual, além de percepções de impunidade.
Segundo Pacelli (2020), o princípio da vedação das provas ilícitas protege direitos individuais.
Em relação ao inquérito policial, caso seja reconhecida a ilicitude das provas, estas devem ser declaradas nulas.
Segue jurisprudência recente:
EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍCIO QUALIFICADO – PRELIMINAR – NULIDADE PROCESSUAL – NÃO OCORRÊNCIA – INTERROGATÓRIO EXTRAJUDICIAL DECLARADO NULO – DESENTRANHAMENTO DO ELEMENTO PROBATÓRIO ILÍCITO – NECESSIDADE – IMPRONÚNCIA DOS RÉUS – IMPOSSIBILIDADE – INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADOS – EXAME APROFUNDADO DO MÉRITO A CARGO DO TRIBUNAL DO JÚRI – RECURSO NÃO PROVIDO. Não há que se falar em nulidade de todos atos subsequentes ao elemento probatório declarado nulo, uma vez que o fato de haver um ato no processo que esteja revestido de ilicitude não contamina, automaticamente, todos os outros. A permanência de prova ilícita nos autos, especialmente, em processo que será submetido ao Tribunal do Júri, gera risco de prejuízo à defesa, uma vez que tal elemento pode influenciar a convicção dos jurados. Verificados nos autos elementos que comprovem a materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria do crime de homicídio qualificado, mostra-se correta a sentença de pronúncia, a fim de que seja entregue ao Tribunal do Júri a análise do crime doloso contra a vida. (TJMG – Rec em Sentido Estrito 1.0000.24.502643-0/001, Relator (a): Des. (a) Mauro Riuji Yamane (JD Convocado), 1ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 15/04/2025, publicação da súmula em 22/04/2025, grifo nosso)
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINAR. NULIDADE DAS PROVAS. VIOLAÇÃO DO DIREITO AO SILÊNCIO. REJEIÇÃO. MÉRITO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. FINALIDADE MERCANTIL EVIDENCIADA. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA-BASE AQUÉM DO MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE. PRIVILÉGIO. REQUISITOS PREENCHIDOS. FRAÇÃO REDUTORA CORRETA. 1. Como já foi determinado o desentranhamento da prova ilícita pelo juiz a quo, e o acusado foi devidamente cientificado pela Autoridade Policial, na delegacia, quanto aos seus direitos e garantias fundamentais, inclusive o de ficar em silêncio, não há que se falar em afronta a essa garantia, tampouco em nulidade do feito. 2. Comprovadas a autoria, materialidade e finalidade mercantil do entorpecente, deve ser mantida a condenação pelo crime de tráfico. 3. A incidência de circunstância atenuante não autoriza a redução da pena-base aquém do mínimo legal. Inteligência da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. 4. Preenchidos os requisitos do artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, deve ser mantido o reconhecimento do privilégio, bem assim a fração redutora eleita na origem, adequada e proporcional à hipótese. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.3889086/001, Relator (a): Des. (a) Dirceu Walace Baroni, 8ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 12/12/2024, publicação da súmula em 13/12/2024, grifo nosso)
EMENTA: APELAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. PROVA ILÍCITA. ABSOLVIÇÃO. I. Caso em exame […] 3. A entrada dos policiais na residência do réu sem autorização judicial ou fundada suspeita caracteriza prova ilícita, violando o artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal. 4. A divergência nos lacres das drogas apreendidas e periciadas compromete a materialidade do delito, impossibilitando a responsabilização do réu. […] 1. A apreensão de drogas mediante violação de domicílio, sem fundada suspeita, é ilícita. 2. A divergência nos lacres compromete a materialidade do delito, justificando a absolvição.” Legislação citada: Constituição Federal, art. 5º, XI; Código de Processo Penal, art. 157, § 1º, art. 386, III e VII. Jurisprudência citada: STJ, HC n. 620.515/CE, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 2/2/2021, DJe de 8/2/2021. (TJSP; Apelação Criminal 150221023.2024.8.26.0126; Relator (a): Nelson Fonseca Junior; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Criminal; Foro de Caraguatatuba – Vara Criminal; Data do Julgamento: 22/04/2025; Data de Registro: 22/04/2025, grifo nosso)
Segundo Eugênio Pacelli:
Na realidade, a vedação da prova não ocorre unicamente em relação ao meio escolhido, mas também em relação aos resultados que podem ser obtidos com a utilização de determinado meio de prova. Uma interceptação telefônica, enquanto meio de prova, poderá ser lícita se autorizada judicialmente, mas ilícita quando não autorizada. No primeiro caso, a afetação (o resultado) do direito à privacidade e/ou intimidade é permitida, enquanto, no segundo, não, disso resultando uma violação indevida daqueles valores. (Pacelli, 2020, p. 438).
Ainda, de acordo com Pacelli:
É o que ocorre, por exemplo, em relação ao sigilo da correspondência, cuja inviolabilidade é até prevista como crime, conforme o disposto no art. 40 da Lei nº 6.538, de 22 de junho de 1978. Desde que presente autorização judicial, poderá haver quebra do mencionado sigilo (da correspondência), porque devidamente prevista em lei (art. 240, § 1º, f, CPP), justificada por necessidade cautelar, no curso de investigação ou instrução criminal, tal como ocorre em relação às comunicações telefônicas (art. 5º, XII, CF). (Pacelli, 2020, p. 448).
3.2 DAS NULIDADES
Conforme já descrito, nulidades são falhas processuais que interferem na legitimidade de atos, contrariando leis ou direitos das partes envolvidas, cuja comprovação, conforme sua importância, pode levar a prejuízos processuais sérios, afetando não só o trâmite, mas, também, os resultados do processo, podendo provocar lentidão processual excessiva, repetição de audiências, recorrência de perícias, e, em alguns casos, pode levar à anulação do processo todo, ocasionando, até mesmo, a absolvição de culpados ou a condenação de inocentes.
Segundo Guilherme de Souza Nucci, “[…] nulidade: é o vício, que impregna determinado ato processual, praticado sem a observância da forma prevista em lei, podendo levar à sua inutilidade e consequente renovação. ” (Nucci, 2024, p. 1109).
Contudo, o CPP determina em seu artigo 563, in verbis, “Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. ” (Brasil, 1941)
As nulidades são classificadas conforme a sua importância e suas consequências para as partes no processo penal. Dividem-se em absolutas e relativas. As nulidades absolutas, ocorrem com a violação de normas fundamentais ou de garantias constitucionais que comprometem a essência do processo, tornando o ato inválido desde a origem. Esse tipo de nulidade é insanável, devendo o ato ser, obrigatoriamente, anulado, não dependendo de arguição das partes, podendo ser reconhecida de ofício pelo juiz em qualquer fase do processo. Já as nuIidades relativas, referem-se a violações de normas processuais, mas que não comprometem direitos fundamentais de forma irreparável, podendo o ato jurídico, nesse caso, ser corrigido. Porém, as nulidades relativas precisam ser apontadas em momento oportuno, sob pena de preclusão, podendo serem sanadas, desde que não haja prejuízo comprovado.
Além das nulidades, outras duas figuras do processo penal, apesar de menos importantes do ponto de vista processual, merecem rápida citação. São elas, o “ato inexistente” e o “mero vício formal”. O primeiro, é um ato que nunca produziu efeito jurídico, porque afronta completamente a legalidade, devendo ser cancelado, e, o segundo, é um erro processual irrelevante para o direito das partes, podendo ser reparado sem anulação do ato.
Diante disso, vê-se que a identificação de nulidades tem papel essencial no processo penal, contribuindo para evitar que falhas processuais prejudiquem injustamente as partes envolvidas.
Todavia, em alguns casos, se bem manejadas por bons advogados, sob o pretexto de garantia da legalidade e da proteção de direitos fundamentais, o apontamento das nulidades poderá atuar em desfavor da sociedade, anulando, em muitos casos, processos inteiros, por vício insanável na obtenção ilícita de provas, podendo, inclusive, favorecer culpados.
De mais a mais, a própria declaração de nulidade poderá servir a fins espúrios ao modelo acusatório, como sucede com a nulidade, motivada principalmente pelo refazimento da colheita probatória e pela possibilidade de ingresso de novo material apto a ensejar vínculos fáticos de culpabilidade do imputado. (Gloeckner, 2017, p. 318).
3.3 DAS PROVAS ILÍCITAS E A OPERAÇÃO LAVAJATO
Como forma de melhor ilustrar a relevância do tema das provas ilícitas no contexto do processo penal brasileiro, optou-se por apresentar impressões sobre fatos ocorridos na história recente do Brasil, que dizem respeito a Operação Lava Jato, que apesar de não ser o foco do nosso trabalho, teve grande importância na cena jurídica brasileira entre os anos de 2014 e 2021.
Segundo a Enciclopédia Wikipédia (2025),
A Operação Lava Jato foi um conjunto de investigações realizadas pela Polícia Federal do Brasil, que cumpriu mais de mil mandados de busca e apreensão, de prisão e de condução coercitiva, visando apurar um esquema para lavar dinheiro que movimentou bilhões de reais em propina […]. A operação teve início em 17 de março de 2014 e contou com mais de 80 fases autorizadas, entre outros, pelo então juiz Sérgio Moro, durante as quais prenderam-se e condenaram-se mais de cem pessoas, tendo seu término em 1º de fevereiro de 2021. (Wikipédia, 2025)
Ainda, segundo a mesma fonte, a Operação Lava Jato, considerada pela Polícia Federal como a maior investigação de corrupção do país e investigou políticos, funcionários da administração da Petrobrás e empresários, dentre outros, que estariam supostamente envolvidos em diversos crimes, dentre os quais se destacavam, corrupção, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, organização criminosa e recebimento de vantagens indevidas.
Apesar dos resultados positivos obtidos pela Lavajato, diversos questionamentos, quanto aos métodos empregados nas investigações, surgiram desde o seu início, em 2014, e se intensificaram muito a partir de junho de 2019, após a divulgação de gravações obtidas pelo site “The Intercept“, de fonte anônima, com conversas no aplicativo “Telegram” entre o ex-juiz Sérgio Moro e o promotor Deltan Dallagnol.
Segundo a Enciclopédia Wikipédia (2025),
Em junho de 2019, o periódico virtual “The Intercept” publicou matéria com vazamento, de fonte anônima, de conversas no aplicativo “Telegram” entre o ex-juiz Moro e o promotor Deltan Dallagnol no âmbito da Operação Lava Jato com evidências de “discussões internas e atitudes altamente controversas, politizadas e legalmente duvidosas da força-tarefa da Lava Jato”. As transcrições sugerem que Moro cedeu informação privilegiada à acusação, auxiliando o Ministério Público a construir casos, além de orientar a promotoria, sugerindo modificação nas fases da operação Lava Jato.
Também mostram cobrança de agilidade em novas operações, conselhos estratégicos, e antecipação de pelo menos uma decisão. Moro teria ainda fornecido pistas informais e sugestões de recursos ao Ministério Público. Segundo alguns juristas, tal prática viola o código de ética da magistratura e a Constituição brasileira, por desrespeitar os princípios da imparcialidade, independência e equidistância entre defesa e acusação. As transcrições demonstrariam ainda que a promotoria teria receio da fragilidade das acusações feitas contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que teria buscado combinar previamente elementos do caso. (Wikipédia, 2025)
As gravações divulgadas pelo site “The Intercept”, que expuseram os métodos investigativos adotados na Operação Lava Jato, trouxeram mais luz sobre o tema das provas ilícitas, e, fizeram ressurgir questionamentos importantes sobre a atuação parcial de Juizes e Promotores e sobre como provas ilícitas puderam ser utilizadas, num caso de tamanha repercussão, se existe vedação constitucional expressa contra essa prática.
Tais gravações levantaram diversas dúvidas sobre os procedimentos utilizados pelos investigadores da Lava Jato, no sentido de que estes teriam utilizados métodos ilegais para obtenção de provas, utilizando grampos telefônicos não autorizados, forjando a legalidade de provas obtidas ilegalmente e coagindo testemunhas, sem qualquer limite, com o propósito de condenar quem bem entendessem, atropelando vedação constitucional expressa e desprezando os direitos individuais dos acusados.
Além disso, os métodos de investigação fiscal utilizados pela Lava Jato levaram diversas empresas a paralisarem suas atividades, e até mesmo encerrá-las definitivamente, devido a aplicação de pesadas multas, ao confisco de bens e ativos, e devido ao bloqueio de seus recursos financeiros, dentre outras sanções.
Segundo estudo conduzido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a Operação Lava Jato, desde o início, resultou no cancelamento de mais de 4,4 milhões de empregos no Brasil, onde o setor da construção civil foi o mais atingido sofrendo a perda de 1,1 milhão de postos de trabalho, e provocou uma perda de aproximadamente R$ 172 bilhões em investimentos.
Em relação aos procedimentos revelados à época e sobre as gravações divulgadas, aconteceram diversas manifestações de apoio à Lava Jato, inclusive de membros do Ministério Público Federal, entendendo não haver qualquer ilicitude, seja na forma de obtenção das provas ou na atuação dos juizes e promotores, ao passo que, na mesma medida, em linha oposta, críticos da Lava Jato opinaram em favor da anulação de processos ou da própria operação como um todo, embasados na ilicitude das provas e na suposta parcialidade dos juízes, expondo uma clara divergência de opiniões sobre o tema da admissibilidade de provas ilícitas.
Em fevereiro de 2021, a Operação Lava Jato foi encerrada oficialmente e, após quase oito anos de existência, diversas provas, processos e condenações, conseguidas no âmbito da operação, foram anuladas, principalmente devido a utilização de meios ilícitos para a obtenção de provas.
É importante salientar que devido a existência de vedação constitucional ao uso de provas ilícitas, ou de provas obtidas de forma ilícita, é praticamente impossível que uma investigação, que siga ritos e trâmites processuais corretamente, consiga reunir o volume de provas que a Lava Jato obteve ilegalmente.
4 JURISPRUDÊNCIAS
A admissibilidade de provas ilícitas no processo penal brasileiro, apesar de ter vedação expressa no texto constitucional e no Código de Proesso Penal, é tema controvertido e provoca discussões doutrinárias importantes, produzindo grande diversidade jurisprudencial no tratamento do tema.
Da mesma forma, as provas derivadas de outras ilícitas, segundo a teoria dos frutos da árvare envenenada, também devem ser consideradas imprestáveis e desentranhadas do processo penal.
Porém, duas outras teorias apregoam a possibilidade de utilização dessas provas, sendo a primeira, a teoria da descoberta inevitável, que é quando, de qualquer forma a prova é produzida, como resultado inevitável das atividades investigativas ordinárias e lícitas, e, a segunda, a teoria da fonte independente, que se enquadra quando não há qualquer vínculo causal da prova obtida com a prova ilícita.
Segundo publicação no site do Superior Tribunal de Justiça,
Embora a teoria dos frutos da árvore envenenada seja amplamente aplicada pela Justiça brasileira – e também pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) –, ela encontra limites em outras duas teorias. Uma é a da descoberta inevitável, segundo a qual é possível a utilização de uma prova ilícita por derivação, caso fique demonstrado que ela seria, de qualquer modo, descoberta por meios lícitos no curso normal da investigação. A outra é a da fonte independente, para a qual a prova derivada de uma ilícita não deve ser descartada se tiver também uma origem lícita, sem relação com a primeira. (STJ, 14.mai.2023).
A seguir, serão apresentadas jurisprudências do STJ que ilustram a aplicação dessas teorias e reforçam a controvércia em relação à admissibilidade de provas ilícitas.
Nesse sentido, para ilustrar a aplicação da teoria da descoberta inevitável, apresenta-se jurisprudência do STJ, relativa ao agravo “AgRg no HC783183/CE”:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ART. 12 DA LEI 10.826/03. MUNIÇÕES ENCONTRADAS NA RESIDÊNCIA DO RÉU. ARMA ENCONTRADA EM OUTRO LUGAR. INDICAÇÃO DO RÉU. TEORIA DA DESCOBERTA INVITÁVEL. INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Consoante se extrai da teoria da descoberta inevitável, positivada no art. 157, § 1º e 2º do CPP, caso demonstrado que a prova derivada daquela reconhecida ilícita seria produzida de qualquer modo, independentemente da prova ilícita originária, deve aquela ser considerada válida. 2. Na hipótese, a apreensão da arma na residência do menor foi decorrência direta da já intitulada ilegal abordagem relacionada ao paciente. Nesse contexto, não se pode afirmar que a arma seria encontrada de outra forma que não mediante a informação passada pelo paciente, sendo inaplicável, assim, a teoria da descoberta inevitável à hipótese. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 783.183/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/12/2022, DJe de 14/12/2022.)
Para ilustrar a aplicação da teoria da fonte independente, apresenta-se jurisprudência do STJ, relativa ao habeas corpus “HC829344/SP”, onde a defesa do condenado alegou ilicitude da prova decorrente de condução coercitiva irregular, ocorrida mediante prisão para averiguação, sem ordem judicial, arguindo sua nulidade.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. CONCURSO DE PESSOAS. ALEGAÇÃO DE PROVA ILÍCITA. CONDUÇÃO PARA AVERIGUAÇÃO. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE OU ORDEM JUDICIAL. IRREGULARIDADE QUE NÃO CONTAMINA AS DEMAIS PROVAS. IMAGENS DA PRÁTICA DELITIVA CAPTURADAS POR CÂMERA DE SEGURANÇA. FONTE INDEPENDENTE. RECONHECIMENTO COM SEGURANÇA NAS FILMAGENS. AUSÊNCIA DE ILICITUDE DERIVADA. IRREGULARIDADES NA FASE INQUISITÓRIAL QUE NÃO CONTAMINAM A AÇÃO PENAL. NULIDADE DA PROVA NÃO VERIFICADA. DOSIMETRIA DA PENA. SEGUNDA FASE. COMPENSAÇÃO. CONFISSÃO. REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA DE OFÍCIO. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado em favor de condenados por furto qualificado (art. 155, § 4º, IV, do Código Penal), com penas fixadas pelo Tribunal de origem em 2 anos e 4 meses de reclusão e 11 dias-multa, em regime inicial semiaberto. A defesa alega ilicitude da prova decorrente de condução coercitiva – “prisão para averiguação” […] 6. No caso, houve condução coercitiva irregular de um dos pacientes, mas, mesmo que considerada a sua ilicitude, este ato não contaminou as provas posteriores, que foram obtidas de forma independente, em decorrência de imagens da câmera de segurança que captaram a ação delitiva possibilitando seu reconhecimento. […] IV. Dispositivo 9. Habeas corpus não conhecido, […]. (HC n. 829.344/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 26/11/2024, DJEN de 10/12/2024.)
Outra jurisprudência, agora referente ao “AgRg no AREsp2581785/RS”:
PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JURI. PROVA ILÍCITA. NULIDADE. PROVAS DERIVADAS. ANULAÇÃO. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE VENENOSA. IMPOSSIBILIDADE, NA HIPÓTESE. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. “A teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree) e a doutrina da fonte independente (independent source doctrine) são provenientes do mesmo berço, o direito norte-americano. […] o próprio aresto impugnado consigna expressamente que “com o depoimento de Tamires, irmã de Nathalia, o quadro se alterou. Foi ela quem revelou à autoridade policial o envolvimento dos demais apelantes no crime. Só então a polícia apreendeu o celular”, o que evidencia a existência de provas independentes a embasar a condenação.
[…]. 7. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.245.220/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 11/3/2025, DJEN de 19/3/2025.)
Mais uma jurisprudência do STJ. Agora, o “AgRg no AREsp n.2.581.785/RS”:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO. EXAME DE NEXO DE CAUSALIDADE. INVIABILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO D O ART. 619 DO CPP. INEXISTÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. I. Caso em exame. 1. Agravo regimental interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul contra decisão monocrática que conheceu do agravo para conhecer em parte do recurso especial, negando-lhe provimento na parte conhecida. 2. O acórdão recorrido concluiu pela nulidade das provas valoradas em sentença condenatória já que diretamente derivadas de provas declaradas nulas no âmbito de operação que tramitou perante a Justiça Militar. […]. 6. No caso dos autos, a Corte local concluiu, de forma bem fundamentada, pela nulidade das provas valoradas pela sentença condenatória, já que diretamente derivadas de provas declaradas nulas, […]. 9. Agravo desprovido. Tese de julgamento: “1. A ilicitude da prova alcança aquelas delas derivadas, salvo se não houver vínculo causal com a prova ilícita ou, mesmo que haja, seria produzida como resultado inevitável das atividades investigativas ordinárias e lícitas. 2. O exame acerca da existência de nexo de causalidade com a prova ilícita encontra óbice na Súmula n. 7/STJ. 3. Não há violação ao art. 619 do CPP quando o Tribunal de origem se pronuncia sobre os aspectos relevantes da causa.” […]. (AgRg no AREsp n. 2.581.785/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 11/2/2025, DJEN de 18/2/2025.)
A seguir, no “HC 695895 / MS”, foi declarada a nulidade das provas colhidas com a absolvição do acusado:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. POLICIAL QUE ATENDE O CELULAR DE INVESTIGADO E SE PASSA POR ELE PARA INDUZIR CORRÉU A ERRO E EFETUAR PRISÃO EM FLAGRANTE. SIGILO DAS COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS. VIOLAÇÃO. ILICITUDE DAS PROVAS COLHIDAS. TEORIA DA DESCOBERTA INEVITÁVEL. INAPLICABILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. Ao dispor que “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”, o art. 5º, XII, da Constituição estabeleceu uma regra geral de proteção ao sigilo das comunicações telefônicas e criou a possibilidade excepcional da sua relativização, na forma da lei. Vale dizer, enquadrar-se nos termos da lei (no caso, a Lei n. 9.296/1996) é um requisito para que a quebra do sigilo de comunicações telefônicas seja válida, como ressalva à regra geral de inviolabilidade, pois é só dentro dos limites legais que se admite a relativização da garantia fundamental. Em contrapartida, violar esse sigilo fora das hipóteses previstas pelo legislador implica a ilicitude da diligência, e não a sua validade. 2. No caso, o paciente foi abordado pela polícia em uma rodovia, mas nada de ilícito foi encontrado no veículo por ele conduzido. […]. 11. Na espécie, o fato de os acusados já serem previamente investigados pela polícia, a qual tinha informações de que eles fariam o transporte de entorpecentes, não bastava para assegurar que as drogas seriam apreendidas e eles, presos de qualquer forma. Cabe lembrar, por oportuno, que o objetivo da ligação do corréu José Carlos ao paciente – “interceptada” pelo policial – era justamente o de verificar com ele, que atuava como batedor, se era seguro prosseguir no transporte da droga ou se havia fiscalização policial, a evidenciar que o desfecho poderia ter sido completamente diverso – fuga, desvio de rota, desfazimento das drogas etc – se o militar não houvesse atendido a ligação e, fazendo-se passar pelo réu, garantido ao comparsa que ele poderia continuar sem receios por aquele caminho. 12. Ordem concedida para anular toda as provas colhidas e absolver o paciente. (HC n. 695.895/MS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 8/11/2022, DJe de 16/11/2022.)
Agora, vejamos algumas jurisprudências do TJ-MG:
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E RESISTÊNCIA. ILICITUDE DA PROVA. CONTEXTO FÁTICO QUE REVELA TORTURA OU VIOLÊNCIA NO PROCEDIMENTO ADOTADO PELOS POLICIAIS MILITARES. ORIGEM ILÍCITA DA PROVA QUE CONTAMINA OS ELEMENTOS DELA DECORRENTE (NEXO DE CAUSALIDADE). TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. PROVA REMANESCENTE INSUFICIENTE. ART. 157 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ABSOLVIÇÃO PROFERIDA. – Condenado o réu pelo crime de tráfico de drogas e resistência exclusivamente pelas declarações dos policiais militares (único meio de prova dos delitos), mas sendo a prova derivada do flagrante, cuja nulidade ora se reconhece em decorrência da violência policial, deve ser proferida a decisão absolutória em favor do acusado. – Conforme o art. 157 do Código de Processo Penal, “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”. – Recurso provido. V.V. – Considerando as discrepâncias apresentadas nas versões apresentadas pelo réu e pela testemunha da defesa, somadas ainda à indicação de que ela seria uma das moradoras recrutadas por grupo voltado para a prática do tráfico de drogas que atua na região dos fatos, em contraposição aos relatos firmes e harmônicos prestados tanto em delegacia quanto em juízo pelos policiais militares que atuaram no feito, impõe-se a rejeição da tese de ilicitude de provas por violência policial, devendo ser mantida a condenação proferida em primeira instância. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.464293-0/001, Relator (a): Des. (a) Nelson Missias de Morais, 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 20/03/2025, publicação da súmula em 20/03/2025)
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO – PRELIMINAR – EXCEÇÃO DE LITISPENDÊNCIA – NÃO CABIMENTO – TESE ANTECEDENTE AO MÉRITO – NULIDADE DA SENTENÇA – NULIDADE DA PROVA – POSTERIOR CONSTATAÇÃO DO ESTADO DE FLAGRÂNCIA – IRRELEVÂNCIA – ATUAÇÃO POLICIAL INICIALMENTE EIVADA DE ILICITUDE – APLICAÇÃO DA TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA – ILICITUDE DAS PROVAS DERIVADAS – RECONHECIMENTO DA NULIDADE DAS PROVAS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA- ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS – NECESSIDADE – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – CONDENAÇÃO NOS EXATOS TERMOS DA DENÚNCIA – PEDIDO PREJUDICADO. 1.Tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida no julgamento de habeas corpus nº 868230-MG, declarou a nulidade da decisão que decretou a busca e apreensão, que deu origem às provas iniciais em face dos acusados, e inexistindo outras provas independentes àquelas para comprovar a autoria e materialidade delitiva em desfavor dos réus, mister a absolvição por ausência de provas.02. Sendo as provas existentes nos autos tidas como ilícitas, não há como acolher o pedido ministerial de condenação, restando prejudicada a sua pretensão recursal. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.265494-5/001, Relator (a): Des. (a) Enéias Xavier Gomes, 5ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 11/03/2025, publicação da súmula em 12/03/2025)
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ATOS INFRACIONAIS ANÁLOGOS AOS DELITOS DE TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO – ABSOLVIÇÃO – NECESSIDADE – ILICITUDE DAS PROVAS – OCORRÊNCIA – MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DO MENOR INVÁLIDO E VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. Uma vez constatadas a invalidade do mandado de busca e apreensão do menor e a violação de domicílio, é necessário reconhecer a ilegalidade dessas provas e de todas as provas dela derivadas, nos termos da teoria dos frutos da árvore envenenada e, como consequência, absolver o representado. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.237990-7/001, Relator (a): Des. (a) Walner Barbosa Milward de Azevedo, 9ª Câmara Criminal Especializa, julgamento em 02/10/2024, publicação da súmula em 02/10/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – PRELIMINAR REJEITADA DE NULIDADE DAS PROVAS – ALEGADA NÃO VALORAÇÃO DO DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA DE DEFESA – TEORIA DO FRUTO DA ÁRVORE ENVENENADA – ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO – AUTORIA E MATERIALIDADE SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS – ANÁLISE DETIDA DAS PROVAS, SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO – DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME PREVISTO NO ART. 28 DA LEI 11.343/06 – NÃO CABIMENTO – RECONHECIMENTO DA MINORANTE DO ART. 33, §4º, DA LEI 11.343/06 – INVIABILIDADE – AFASTAMENTO DA ANÁLISE DESFAVORÁVEL DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ARTIGO 42 DA LEI 11.343/06 – IMPOSSIBILIDADE – REDUÇÃO DA PENA-BASE – NECESSIDADE – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.- Não há invalidação da prova oral produzida pela testemunha de Defesa quando ela é apreciada conjuntamente com todos os fatos e provas dos autos, com valoração de cada prova apresentada em juízo, considerando todo o arcabouço probatório, sopesando cada elemento sob o crivo do contraditório e, assim, formando a convicção que conduziu o Juiz de primeiro grau na r. sentença. – Quando firmes e coerentes, os depoimentos prestados pelos policiais possuem reconhecido valor probante, não podendo ser desconsiderados tão somente em razão da condição funcional dos depoentes, ainda mais quando ausente qualquer evidência de má-fé, abuso de poder ou suspeição.- Sendo fartos os elementos de prova que indicam a venda de drogas pelo acusado e não o uso da droga exclusivamente para consumo pessoal, não há que se falar em desclassificação para a conduta prevista no art. 28 da Lei 11.343/06.- Inaplicável ao caso o reconhecimento do privilégio previsto no §4° artigo 33 da Lei 11.343/2006, tendo em vista que não foram preenchidos todos os requisitos, que são cumulativos.- O Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que na fixação da pena-base, o Magistrado, ao analisar negativamente as circunstân cias judiciais, pode utilizar de critério de valoração baseado nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (TJMG – Apelação Criminal 1.0000.24.311799-1/001, Relator (a): Des. (a) Rinaldo Kennedy Silva, 5ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 01/10/2024, publicação da súmula em 02/10/2024)
EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO – NULIDADE DO RECONHECIMENTO PESSOAL – INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES CONTIDAS NO ART. 226 DO CPP – ILICITUDE DAS PROVAS – TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA – NÃO OCORRÊNCIA – MATERIALIDADE COMPROVADA – INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – IMPRONÚNCIA – IMPOSSIBILIDADE – 01. Havendo o reconhecimento do réu observado a fórmula prevista no art. 226 do CPP, não há falar-se em nulidade dos atos praticados e em ilicitude das provas colhidas, sendo os indícios de autoria corroborados por outros elementos de prova. 02. Tratando-se a pronúncia de mero juízo de admissibilidade da acusação pública, cumpre ao juiz togado – comprovada a materialidade, havendo indícios suficientes da autoria e inexistindo causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade – remeter o julgamento do crime doloso contra a vida ao Tribunal Popular (art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal). (TJMG – Rec em Sentido Estrito 1.0000.24.244240-8/001, Relator (a): Des. (a) Fortuna Grion, 3ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 17/09/2024, publicação da súmula em 19/09/2024)
Diante da farta coletânea de jurisprudências apresentada até aqui, resta claro que não há consenso em relação ao padrão de entendimento dos magistrados em relação à admissibilidade de provas ilícitas nos processos penais, uma vez que mesmo diante de vedação constitucional expressa, o tema tem tratamento muito pouco uniforme, dependendo de análise subjetiva à cada caso.
Pode-se comprovar facilmente que há inúmeros casos na jurisprudência brasileira em que provas produzidas com violação ao direito individual de alguém foram admitidas em processos.
Para Guilherme Nucci,
Provas ilicitamente conseguidas devem ser expurgadas para a condenação de alguém. Para a absolvição, no entanto, pode-se aceitá-las, pois o que está em jogo é a liberdade individual, valor muito acima, axiologicamente, do que o bem jurídico tutelado pelo crime, embora se possa punir o autor da ilicitude. (Nucci, 2025, artigo-site)
Contudo, essa prática também levanta preocupações, pois, a criação de precedentes que enfraqueçam as garantias constitucionais pode acarretar consequências graves aos direitos individuais.
É ponto pacificado da doutrina jurídica que nenhum delito criminal, seja de qual tipo for, deva ser enfrentado utilizando métodos ou recursos que promovam qualquer lesão à direitos individuais.
Todavia, a jurisprudência brasileira, ao admitir em algumas circunstâncias o debate sobre o tema da admissibilidade de provas ilícitas em processos penais, reflete as dificuldades práticas que tem o sistema de justiça brasileiro para manter o imprescindível equilíbrio entre os princípios da eficiência processual e da legalidade jurídica.
A solução não reside em sacrificar um princípio em favor do outro, mas, sim, em encontrar um ponto de equilíbrio que assegure tanto a efetividade do sistema de justiça quanto a proteção dos direitos fundamentais.
Segundo entendimento de Guilherme Nucci,
Sob o ponto de vista da dignidade da pessoa humana, princípio regente das ciências criminais, não importa quem seja o agente criminoso, pois, todos tem direito a ter preservadas as salvaguardas previstas no artigo 5º da Constituição Federal. (Nucci, 2025, artigo-site)
Portanto, é imprescindível que essa discussão transcorra com muita cautela e apenas em situações excepcionalmente justificadas.
5 CONCLUSÃO
Ao fim deste trabalho de pesquisa, identificou-se que a legislação brasileira procurou garantir que a busca pela eficiência na aplicação da sanção penal, crucial para manutenção da ordem social e responsabilização de criminosos, não venha prevalecer sobre o respeito absoluto aos direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal de 1988.
O apontamento das nulidades resultantes da admissibilidade de provas obtidas de forma ilícita, no processo penal, transcende a mera regra processual, constituindo uma salvaguarda vital contra a arbitrariedade estatal e a violação das liberdades individuais.
O conflito entre eficiência processual e legalidade jurídica é realidade inegável no sistema de justiça brasileiro.
A solução não reside em sacrificar um princípio em favor do outro, mas, sim, em encontrar o equilíbrio que assegure tanto a efetividade do sistema de justiça quanto a proteção dos direitos fundamentais.
A jurisprudência firmada, ao admitir em algumas circunstâncias o debate sobre o tema da inadmissibilidade de provas ilícitas em processos penais, reflete as dificuldades práticas que tem o sistema de justiça brasileiro para alcançar esse equilíbrio.
Contudo, essa prática também levanta preocupações, pois, a criação de precedentes que enfraqueçam as garantias constitucionais pode acarretar consequências graves aos direitos individuais.
Portanto, é imprescindível que essa discussão ocorra com muita cautela, e apenas em situações excepcionalmente justificadas.
Para garantir que a busca pela verdade e pela justiça no processo penal não se desvirtue em abusos que comprometam a legitimidade do sistema jurídico, o desenvolvimento de mecanismos de controle rigorosos sobre a atuação das autoridades responsáveis pela investigação é essencial e se faz imperativo.
Somente assim será possível construir um processo penal que seja eficaz na punição dos crimes, ao mesmo tempo em que respeita e protege os direitos de todos os cidadãos, promovendo um sistema de justiça que reflita verdadeiramente os valores do Estado Democrático de Direito.
REFERÊNCIAS
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ARAUJO, G. B. de; LOPES, H. T. A utilização de provas obtidas ilicitamente e sua admissibilidade no processo penal. CONTRIBUCIONES A LAS CIENCIAS SOCIALES, [S. l.], v. 17, n. 10, p. e11914, 2024. DOI: 10.55905/revconv.17n.10-342. Disponível em: https://ojs.revistacontribuciones.com/ojs/index.php/clcs/article/view/11914. Acesso em: 18 abr.2025.
AVENA, Norberto Claudio Pâncaro. Processo Penal Esquematizado. 3° ed. Atual e ampl. Brasília: Fortium, 2016.
BERLEZE. Michele. Validade das provas ilícitas obtidas em aplicativos de mensagens: o caso intercept brasil e as denúncias sobre Sergio Moro, Deltan Dallagnol e demais procuradores. In: 5º CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO E CONTEMPORANEIDADE – UFSM-Univ. Federal de Sta. Maria – Dias 2 e 3 de setembro de 2019 – Santa Maria / RS. Disponível em: https://www.ufsm.br/app/uploads/sites/563/2019/09/7.6.pdf – Acesso em: 27.abr.2025.
BRASIL. [Constituição (1988) ]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 27.abr.2025.
BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, RJ: Presidência da República, 1941. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 27.abr.2025.
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1Graduando em Direito.
Instituição: Centro Universitário UNA – Campus Divinópolis
Endereço: Divinópolis – Minas Gerais, Brasil
E-mail: jspdiv@yahoo.com.br
2Graduando em Direito.
Instituição: Centro Universitário UNA – Campus Divinópolis
Endereço: Divinópolis – Minas Gerais, Brasil
E-mail: hiagogontijo2015@gmail.com
3Professor Universitário Orientador.
Advogado.
Mestre em Educação.
Especialista em Direito e Processo do Trabalho.
Especialista em Direito Administrativo.
Especialista em Gerenciamento de Micro e Pequena Empresa.
Especialista em Direito Civil e Processo Civil.
Bacharel em Direito.
Especialista em Advocacia no Direito Digital e Proteção de Dados.
Graduado em História.
E-mail: hernando.advocacia@hotmail.com.