REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202408152245
Edimarcos Velasque Cardoso de Souza¹
Thamyres Bandoli Tavares Vargas²
Matheus Garcia Coelho³
RESUMO
Este artigo científico teve como propósito principal fomentar o desenvolvimento socioemocional de alunos com baixo desempenho acadêmico do ensino fundamental em uma escola periférica da rede pública em Itaperuna-RJ. Através da aplicação da pesquisa-ação, foram conduzidas oficinas com o intuito de promover a autorreflexão coletiva dos estudantes, incentivando-os a explorar suas vivências como meio de desenvolver habilidades emocionais e valorizar suas experiências sociais individuais. Nesse contexto, as teorias de Piaget, Vygotsky, Rogers e Wallon reforçaram a relevância do afeto e das emoções no processo de aprendizagem, demonstrando sua influência na formação integral dos alunos. Buscou-se, por meio deste estudo, criar um ambiente propício ao desenvolvimento socioemocional no contexto escolar, de modo a gerar um impacto positivo no desempenho acadêmico dos estudantes com dificuldades. O objetivo foi capacitá-los a enfrentar os desafios acadêmicos e sociais com efetividade e resiliência. Acredita-se que, ao promover o desenvolvimento socioemocional, a escola pode ter contribuído significativamente para a formação de indivíduos mais preparados para lidar com as demandas do mundo contemporâneo, tornando-se cidadãos mais autônomos, conscientes e colaborativos.
PALAVRAS-CHAVES: Psicologia escolar; Emoções; Grupos; Afetividade.
ABSTRACT
This scientific article had as its main purpose to promote the socio-emotional development of students with low academic performance in elementary school in a peripheral public school in Itaperuna-RJ. Through the application of action research, workshops were conducted with the aim of promoting the students’ collective selfreflection, encouraging them to explore their experiences as a means of developing emotional skills and valuing their individual social experiences. In this context, the theories of Piaget, Vygotsky, Rogers and Wallon reinforced the relevance of affection and emotions in the learning process, demonstrating their influence on the integral formation of students. The aim of this study was to create an environment conducive to socio-emotional development in the school context, in order to generate a positive impact on the academic performance of students with difficulties. The objective was to enable them to face academic and social challenges with and resilience. It is believed that, by promoting socio-emotional development, the school may have significantly contributed to the formation of individuals who are better prepared to deal with the demands of the contemporary world, becoming more autonomous, aware and collaborative citizens.
KEYWORDS: School psychology; Emotions; Groups; affectivity.
INTRODUÇÃO
“Como poderão as novas gerações aprender a viver juntas no mundo do amanhã? Muitas respostas a estes desafios podem e devem vir dos próprios jovens, se lhes for dada a oportunidade de se manifestar em conjunto. O potencial é considerável” (Cuéllar, 2002).
Houve uma grande disparidade do modelo primordialmente clínico biologizante no que se refere a saúde pública dos séculos passados para a contemporaneidade. A partir da ruptura com o antigo modelo, dos finais dos anos 80, que era tradicionalmente clínico biologizante, a saúde pública passa a ser compreendida como um estado dinâmico, socialmente produzido.
Essa transformação de modelos na saúde pública é vista por Ramos (2001, p.15) como:
Um processo histórico e social, problematizando a organização das práticas, enfatizando a promoção de saúde a partir da reorganização da vida social e não apenas a partir dos serviços de saúde, articulando, portanto, estratégias mais amplas de construção da cidadania e de transformação da cultura da saúde.
Neste contexto, o ser humano é percebido através de uma ótica que reconhece que tudo ao seu redor pode influenciar seu desenvolvimento e a construção de sua subjetividade e emoções. Sob essa perspectiva, não se enxerga o homem meramente como um “ser-biológico”, mas também como um “ser-social”. Nesse sentido, há uma interação complexa entre o indivíduo, seu corpo e o ambiente, abrangendo uma perspectiva biopsicossocial.
Desde o final do século XIX, Charles Darwin (1872) validou, através de ponderada e significativa pesquisa, a expressão das emoções, tanto no homem quanto nos animais, inclusive evidenciando a questão da universalidade das pressões emocionais, e como elas se desdobram visto o meio que o sujeito está inserido. Utilizando para isso, estudos de diversas partes do mundo, que sustentam suas considerações a respeito das expressões das emoções. As emoções fornecem informações sobre a importância dos estímulos exteriores e interiores do indivíduo, e também, sobre as situações-problema onde os indivíduos se encontram envolvidos num determinado contexto.
De acordo com Ausubel, citado por Ronca (1980, p. 59), “as emoções são um
dos principais fatores de influência da aprendizagem, sendo a aprendizagem o conjunto de ideias presentes no indivíduo, bem como a suas propriedades organizacionais, num assunto específico, num determinado momento”. Assim, ao dispor de uma estrutura afetiva e emocional organizada, a pessoa terá facilidade na aprendizagem de um assunto novo.
Segundo Vitor da Fonseca (2016) a “emoção é uma informação que se acumula no cérebro do indivíduo a partir da sua experiência, e usa essa informação para agir com vantagem adaptativa e estratégica em situações futuras”. Neste sentido, a emoção é uma ferramenta de instrução e supervisão da aprendizagem como “processo neurológico básico”, que consolida a administração e coordena os processos cognitivos, além de executar os processos conceituais, cognitivos, e práticos que constituem a aprendizagem.
As emoções afetam todas as aprendizagens, quanto mais envolvidas forem com elas, mais mobilizadas são as funções cognitivas da atenção, da percepção e da memória, e mais bem geridas e fortes serão as funções executivas que envolvem planificação, priorização, monitorização e verificação das respostas (Fonseca, 2014).
De acordo com Wallon, a afetividade desempenha um papel fundamental na aprendizagem. Para ele, o desenvolvimento cognitivo e emocional do indivíduo são indissociáveis, e a afetividade exerce influência direta na forma como aprendemos e nos engajamos nas atividades de aprendizagem. Wallon afirma que as emoções e os afetos estão intrinsecamente ligados aos processos de pensamento, sendo essenciais para a construção do conhecimento. Conforme Wallon (1973), “a aprendizagem ocorre de forma mais efetiva quando o sujeito está emocionalmente envolvido e motivado”.
Sob essa perspectiva, o indivíduo que não processa de forma harmoniosa as informações emocionais e sociais, terá um processamento dificultoso de aprendizagem. Dessa forma, mesmo que estudem ou memorizem, os conteúdos acadêmicos deixam de ser emocionalmente significativos para eles, acarretando nas dificuldades de aprendizagem (Wallon, 1973). Assim, a compreensão da afetividade é essencial para a concepção de práticas pedagógicas que promovam um ambiente de aprendizagem emocionalmente seguro e estimulante.
Mesmo as emoções sendo um ponto fundamental da aprendizagem, elas não são colocadas em evidência no dia a dia das escolas. Os fatores de influência sociais por vezes não são considerados dentro do processo de aprendizagem, e por vezes a escola se torna um ambiente opressor/inibidor e não acolhedor das questões pertinentes às emoções. Dentro do ambiente educacional público brasileiro o conceito de educação humanizada é polarizado, e o desdobramento das emoções em relação a cognição acaba se tornando precário e pouco ramificado entre os educadores (Leal; Nogueira, 2015).
Potencializar aos indivíduos escolares um ambiente que estimule o desenvolvimento das emoções e seus pontos norteadores de influência, propiciará que a aprendizagem ocorra nesse ambiente de forma fidedigna.
É dentro desta perspectiva que se dá a opção para refletir sobre as potencialidades do papel das emoções no processo de aprendizagem em uma prática de grupo desenvolvida com alunos da rede pública municipal de Itaperuna-RJ em uma escola localizada dentro de um contexto periférico. Para isso se faz necessário ampliar o olhar sobre os educandos e seus grupos como um sistema aberto, dinâmico, permeado por contradições e conflitos sociais, que impactam tacitamente o processo de aprendizagem.
AS EMOÇÕES NA ESCOLA
Em pesquisa realizada pela UNICEF, em 2018, as principais causas do fracasso escolar, no Brasil, são oriundas de dificuldades do sistema de ensino, pois este não consegue atender às diversidades de necessidades presentes nas escolas. O mesmo órgão em 2021 realizou a pesquisa “Trajetórias de sucesso escolar”, a qual traz os principais dados de reprovação, abandono e distorção idade-série no país. Foi constatado na pesquisa que a taxa de reprovação é maior em regiões mais pobres chegando a 34% de reprovação dos estudantes de comunidades empobrecidas. Estudantes pretos e pardos acumulam 42% dos reprovados no âmbito nacional, sendo que pessoas com deficiência também têm percentual expressivos, em comparação a média nacional.
De acordo com Bourdieu (1998), o desempenho escolar do aluno não está apenas relacionado às suas habilidades pessoais, mas também à sua origem social, o que coloca o aluno em diferentes condições diante das demandas escolares. Para o autor, as estruturas sociais influenciam o comportamento do indivíduo de dentro para fora, e não o contrário. Cada pessoa possui uma formação inicial proveniente de seu ambiente social e familiar, ocupando uma posição específica na estrutura social. Nesse contexto, o conceito de “habitus” emerge, representando um conjunto de disposições para ação típica dessa posição ocupada, que guiam as ações do sujeito ao longo do tempo. Em outras palavras, a estrutura social de onde o indivíduo vem influencia suas ações individuais, não de forma rígida ou mecânica, mas por meio de princípios de orientação que são adaptados pelo sujeito diante das diversas circunstâncias de sua vida. Assim, para a compreensão de processos de aprendizagem, é preciso compreender toda a estrutura social na qual o sujeito se constituiu.
Junto à questão social, não se pode subestimar a dimensão afetiva no processo de ensino-aprendizagem. Nas teorias piagetiana, vygotskiana, walloniana, rogeriana e golemaniana, o afeto e as emoções são elementos necessários para o processo de aprendizagem. Segundo Silva (2002), o indivíduo é um ser social e comunicativo, cujo raciocínio e a afetividade têm desenvolvimento equidistante, ou seja, se expressam paralelamente. Isso é, tanto a dimensão cognitiva, quanto a social, quanto a emocional, influenciam em como o indivíduo aprende, compreende, criticar e recria o mundo.
Entretanto, percebe-se a vigência de uma valorização cultural da racionalidade nos dias atuais (SILVA, 2O02). Segundo Beaivois (1999), tem-se negligenciado quase que inteiramente pesquisar e debater sobre relações entre o processo afetivos e os processos cognitivos.
A necessidade de se dedicar atenção à questão afetiva e emocional é reconhecida na legislação brasileira e encontra-se na própria Constituição Federal (Brasil,1988), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (MEC, 1996) e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (MEC, 2007). Na Constituição Federal – Capítulo da educação – Sessão I – Da Educação no art. 205 pode-se ler
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Brasil,1988).
Complementarmente a LDB coloca que:
A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, da convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa. Os movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais (MEC, p. 83).
Por sua vez os PCNs ressaltam que é preciso:
Explicitar a necessidade de que as crianças e os jovens deste país desenvolvam suas diferentes capacidades, enfatizando que apropriação, dos conhecimentos socialmente elaborado é base para construção cidadania e da sua identidade, e que todos São capazes de aprender e mostrar que é escola deve proporcionar ambiente de construção de seus conhecimentos e desenvolvimento de suas inteligências, com suas múltiplas competências (MEC,1998).
As PCNs também afirmam que a “Dignidade da pessoa humana implica respeitar os direitos humanos, repúdio á discriminação de qualquer tipo, acesso a condições de vida digna, respeito muito as relações interpessoais, públicas e privadas” (MEC,1998).
Lindomar Silva (2002) comenta que, os textos legais e normativos indicam implicitamente a necessidade de que a educação contemple, em suas atividades, o pleno desenvolvimento da pessoa. Assim, há de ser levada em conta que a sadia convivência humana pode permitir um ambiente favorável à construção do conhecimento, do desenvolvimento e do real respeito à dignidade humana.
A escola e a sociedade ganham mais com alunos emocionalmente mais desenvolvidos. No campo da aprendizagem, a emoção não pode continuar a ser concebida, em comparação com a cognição, como secundária, ou pior ainda, a ser entendida como um obstáculo para que a mesma ocorra. Para Teresa Nunes (2018) a importância da emoção na aprendizagem é crítica, uma vez que “só com emoção há aprendizagem”.
Neste contexto, se torna necessário dialogar sobre a temática das emoções dentro do processo de aprendizagem com alunos da rede pública de educação. Buscando a preservação desses alunos na escola, em seu pleno desenvolvimento e desempenho cognitivo, através de compreensão das questões sociais expressas no ambiente escolar e de intervenções sobre as vivências das emoções..
METODOLOGIA
A presente pesquisa caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, de caráter exploratório. Para coleta de dados, foi utilizado o método de pesquisa-ação, com ênfase na observação da interação grupal, conforme indicado por Lewin (1978) para a construção da resolução do problema social estudado. A escolha deste tipo de pesquisa foi considerada em virtude da necessidade de maior inserção no contexto grupal procurando, em um primeiro momento, uma aproximação com a realidade, com os sujeitos envolvidos e com a problemática a ser estudada.
Lewin (1978) ao fundamentar essa abordagem, realça que a pesquisa-ação deve considerar dois fatores que são indissociáveis: o entendimento da sociedade na qual os sujeitos da pesquisa estão inseridos e a análise da situação problema. Considerando isso, monta-se um plano de ação, o qual é moldado e conduzido pelo grupo e suas demandas, orientando a solução da problemática. Com esta estratégia, indica-se que as pessoas passem a trabalhar em grupo, enfrentando em conjunto os problemas comuns. Assim, lhes é facultado desenvolver métodos e criar vínculos.
Para isso, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Itaperuna, foi selecionada uma escola da rede pública municipal localizada em um bairro periférico da zona urbana da cidade de Itaperuna, RJ. A gestão escolar indicou 20 alunos, do 6º ao 9º ano do ensino fundamental 2, que apresentavam alguma dificuldade de aprendizagem, baixo rendimento ou em defasagem escolar, identificadas pela equipe pedagógica da referida escola.
Como o número de alunos indicados pela escola foi superior à capacidade da pesquisa, os mesmos foram submetidos a uma entrevista individual, com o objetivo de avaliar sua compatibilidade com o estudo. No final, 14 alunos foram selecionados para participar de uma oficina grupal com encontros semanais. Essas oficinas basearamse em uma construção coletiva, e a participação de todos os participantes. Para alcançar esse objetivo, utilizaram-se as dinâmicas de grupo como ferramenta para lidar com as demandas e potencializar as emoções. Além disso, trabalharam-se as experiências individuais vividas pelos alunos fora das escolas, visando identificar como essas vivências influenciaram o processo educacional.
A participação dos alunos foi condicionada à assinatura do Termo de Compromisso Livre e Esclarecido pelos responsáveis e Termo de Anuência, pela instituição, onde souberam sobre os objetivos da pesquisa, seus riscos, da garantia de sigilo e da possibilidade de desistirem da participação a qualquer momento
SOBRE OS PARTICIPANTES DA PESQUISA
Considerando a imbricação do campo social e do campo dos afetos, essa seção propõe-se a apresentar brevemente os participantes da pesquisa. Os 14 alunos selecionados para participar do estudo são residentes do mesmo bairro em que a escola está localizada e pertencem à mesma classe socioeconômica. Os relatos a seguir são derivados das entrevistas individuais conduzidas com os alunos antes do início das oficinas em grupo. Para preservar o sigilo e a integridade de suas identidades, utilizaremos nomes fictícios.
O participante designado como Igor, de 14 anos de idade, encontra-se matriculado no 7º ano do ensino fundamental. Ele reside em uma kitnet com sua mãe, que exerce atividade de faxineira, e seu irmão mais novo. Igor relata não ter afinidade com o ambiente escolar, manifestando sentimentos de incompetência acadêmica e sendo desencorajado por uma das professoras a ler durante as aulas devido às suas dificuldades na leitura e com a gagueira. Adicionalmente, ele relata não possuir conexões de amizade com seus colegas de turma.
Jonathan, de 15 anos de idade, encontra-se matriculado no 8º ano e mora na residência de seus avós maternos, junto com sua mãe e irmão mais velho. Jonathan relata que não tem contato com seu pai há mais de 6 anos, pois ele está cumprindo pena por tráfico de drogas. Ele afirma ter boas relações com seus colegas na escola, porém enfrenta dificuldades em se concentrar durante as aulas, pois não as considera interessantes.
Suellen, de 13 anos de idade, cursa o 6º ano. Ela reside com sua avó materna, que é aposentada, e tem uma irmã. A mãe de Suellen está cumprindo pena em regime fechado há mais de 3 anos, e seu pai é falecido. Suellen relata que não possui interesse pela leitura e que frequenta a escola por obrigação. Ela também menciona que sofre bullying dos colegas de turma devido ao seu cabelo, o que a torna agressiva em algumas ocasiões. Suellen prefere ficar sozinha a interagir com seus colegas de classe devido a essa situação. Além disso, ela enfrenta dificuldades para assistir às aulas ministradas por professores do sexo masculino devido a traumas passados.
Raphaela, de 12 anos de idade, está matriculada no 7º ano do ensino fundamental. Ela mora com seu pai, que é pedreiro, e seus dois irmãos, desde o divórcio dos pais ocorrido há 8 meses. Raphaela relata que seu desempenho nas provas tem sido afetado negativamente e que tem experimentado irritação desde o acontecimento do divórcio. Na sala de aula, ela tem dificuldade em se concentrar, uma vez que fica pensando em como reunir seus pais novamente. Ela menciona que os professores têm reclamado de seu comportamento e que ela tem se tornado cada vez mais desorganizada.
Enzo, de 14 anos de idade, está cursando o 7º ano do ensino fundamental. Ele reside com sua mãe, que está desempregada, sua avó aposentada e seus três irmãos. Enzo relata ser uma pessoa facilmente estressada e que não tem paciência com seus colegas de turma, chegando a agredi-los em alguns casos. Além disso, ele trabalha em uma oficina de bicicletas no turno oposto às aulas e, às vezes, prefere faltar às aulas para ir trabalhar, pois “ganha dinheiro” lá. Enzo não gosta da escola porque precisa ficar sentado por longos períodos e enfrenta dificuldades ao realizar exercícios de matemática.
Tiago, de 13 anos de idade, está no 6º ano. Ele reside com seus avós paternos, que são aposentados, e seus dois irmãos. Os pais de Tiago estão separados e moram em outra cidade. Tiago relata que tem dificuldade em prestar atenção nas aulas, exceto nas aulas de educação física. Ele diz que se relaciona bem com todos os colegas de turma, mas enfrenta dificuldades em obter um bom desempenho nas provas, o que resultou em um apelido desagradável dado pelos colegas.
Bernardo, de 13 anos de idade, está cursando o 8º ano. Ele reside com sua mãe, que é costureira, seu pai, que é padeiro, e seus dois irmãos. Bernardo relata que gosta da escola, porém tem enfrentado falta de ânimo desde que seu avô faleceu. Ele presenciou seu avô sofrendo um infarto, o que impactou seu desempenho escolar. Apesar de dedicar horas ao estudo em casa, ele relata dificuldades em absorver o conteúdo.
Ítalo, de 13 anos de idade, está no 7º ano do ensino fundamental. Ele mora apenas com sua mãe, que está desempregada. Ítalo relata que depende constantemente da ajuda dos vizinhos e do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) para realizar as compras e pagar as contas da casa. Ele menciona que não gosta de ir à escola devido às dificuldades em manter a concentração durante as aulas. Além disso, Ítalo relata que os funcionários da escola são rigorosos, chegando a mandá-lo de volta para casa por não estar usando tênis, pois ele possui apenas um par e às vezes precisa utilizar chinelo. No entanto, ele destaca que a única parte positiva da escola é poder estar com seus dois melhores amigos.
Sarah, de 13 anos de idade, está cursando o 6º ano do ensino fundamental. Ela mora com sua mãe e sua tia, que trabalham como manicures, e sua prima. Sarah relata que não gosta de conversar e prefere realizar os trabalhos escolares de forma independente. Ela expressa desinteresse pela escola, afirmando que prefere passar o tempo jogando no celular durante as aulas.
Eliane, de 15 anos de idade, está no 9º ano.. Ela mora com sua mãe, que é do lar, seu padrasto, que é mecânico, e sua avó. Eliane relata que vive constantemente triste demais para se concentrar nos estudos, preferindo ficar em casa. Em momentos de dificuldade para entender a matéria, ela busca refúgio no banheiro da escola e se machuca. Ela expressa a falta de ouvir palavras de valorização e importância. Eliane diz que não se sente aceita pelos colegas de turma e frequentemente é deixada de lado nos trabalhos em grupo. Além disso, ela menciona ter ouvido de uma das merendeiras que é um problema para a escola.
Tales, de 13 anos de idade, está cursando o 7º ano do ensino fundamental. Ele mora com sua mãe, avô e avó, que são aposentados. Tales relata ter dificuldade em aprender adequadamente e teme ter que fazer uso de medicamentos psicotrópicos, assim como sua mãe. Suas maiores dificuldades são nas disciplinas de ciências e matemática. Ele se considera tímido e prefere se relacionar apenas com seu pequeno grupo de amigos.
Antônio, de 17 anos de idade, está cursando o 9º ano do ensino fundamental. Ele mora com seu pai, que trabalha como entregador de gás, sua mãe, que é dona de casa, e seus 4 irmãos. Antônio relata que gosta de frequentar a escola, mas não tem interesse em estudar, pois considera tudo muito difícil e não vê a aplicação prática do conteúdo. Ele acredita que a vida seria mais fácil sem a escola, pois seu pai conseguiu ganhar dinheiro sem ter estudado. Antônio menciona não gostar de alguns professores e sentir vergonha quando é solicitado a ler em voz alta, pois tem dificuldades na leitura.
Júnior, de 13 anos de idade, está cursando o 6º ano do ensino fundamental. Ele mora com sua tia, que é cozinheira, e com seus dois irmãos, além de três primos. Junior relata que gosta de conversar com seus colegas e tem apreço pelos professores, mas, enfrenta dificuldades em compreender o conteúdo. Ele apresenta dificuldades tanto na leitura quanto em matemática. Júnior menciona que tem a menor nota da turma, mas sonha em se tornar o melhor aluno, embora considere quase impossível, pois não consegue estudar em casa devido ao ambiente desorganizado.
Inara, de 16 anos de idade, está cursando o 9º ano do ensino fundamental. Ela mora com sua irmã mais velha, que trabalha como doméstica. Inara reconhece a importância de estudar para ter um futuro melhor, mas considera a escola um lugar pouco atrativo que dificulta sua vida. Ela relata que precisa impor respeito aos colegas que a incomodam e, às vezes, chega a agredi-los. Além disso, Inara não apresenta um bom desempenho escolar, pois precisa ajudar sua irmã em casa e não tem tempo para estudar além do horário escolar.
Todos esses alunos, provenientes de contextos familiares diversos e com histórias de vida únicas e subjetivas, encontram-se reunidos no mesmo ambiente escolar, compartilhando não apenas o espaço físico, mas também o contexto geográfico e social. A partir dessa diversidade de participantes, foram desenvolvidas oficinas que levaram em consideração suas respectivas experiências e necessidades, as quais foram identificadas durante as entrevistas individuais.
TECENDO AS EMOÇÕES
As oficinas foram conduzidas através de encontros semanais com duração média de 70 minutos, realizados no contra turno. Todos os participantes receberam orientações explícitas sobre a importância da participação ativa e da construção coletiva, bem como da necessidade de manter sigilo em relação às informações compartilhadas. Os encontros subsequentes foram planejados com base nas observações e demandas registradas no encontro anterior, sendo feita uma análise comparativa dos resultados alcançados em relação aos objetivos estabelecidos. Esse cuidado foi adotado para assegurar que a pesquisa mantivesse sua trajetória alinhada com seus propósitos.
No primeiro encontro, foi proposto aos participantes que preenchessem uma silhueta humana dividida verticalmente ao meio. De um lado, deveriam escrever como eles desejavam se ver e quais objetivos esperavam alcançar daqui a 10 anos. Do outro lado da silhueta, deveriam identificar as dificuldades que anteviam no caminho para atingir tais metas futuras. Em seguida, os demais participantes tiveram a oportunidade de expressar suas opiniões e sugerir possíveis estratégias e caminhos a serem tomados para a concretização dos objetivos apresentados. Além de ser solicitado que escrevessem no verso da folha o que esperavam dos encontros.
Após a análise cuidadosa das contribuições de todos os participantes, destacam-se algumas falas que merecem especial atenção. Por exemplo, Bernardo expressa sua aspiração de se tornar advogado, no entanto, suas palavras revelam uma preocupação em seguir os passos de seu pai, o que parece ser uma dificuldade percebida por ele em relação à construção de seu próprio caminho profissional
Acho que minha maior dificuldade é ser filho do meu pai, talvez eu tenha que seguir os mesmos passos (BERNARDO, 13 ANOS).
Por outro lado, Antônio compartilha sua visão sobre o futuro profissional, afirmando o desejo de atuar em uma ocupação que não demande a obrigatoriedade de estudar, o que sugere uma resistência ou dificuldade em relação ao ambiente acadêmico
Eu quero ser qualquer coisa que não seja obrigado a estudar (ANTÔNIO, 17 ANOS).
Além disso, Tiago relata uma percepção de falta de perspectivas para o seu futuro, expressando uma crença de que não possui as habilidades intelectuais necessárias para se tornar alguém na vida
Eu não vejo nenhuma perspectiva para mim, não sou inteligente para ser alguém na vida (TIAGO, 13 ANOS).
Podemos observar que as percepções e crenças de Bernardo, Antônio e Tiago podem estar influenciando suas vivências emocionais e comportamentais no contexto educacional. As experiências de vida, as interações familiares e as expectativas sociais podem contribuir para a construção de uma autopercepção que impacta a forma como eles enxergam suas possibilidades e limitações. Como enfatizado por Fritz Perls (1979), a compreensão e conscientização desses aspectos podem abrir caminhos para a promoção do autoconhecimento e para o desenvolvimento de recursos pessoais, auxiliando-os a explorar e enfrentar desafios de forma mais satisfatória.
No segundo encontro, os participantes trouxeram objetos pessoais que consideravam importantes, conforme solicitado previamente no encontro anterior. Cada participante teve a oportunidade de apresentar seu objeto, compartilhando seu significado e associando-o a algum sentimento específico. Esse experimento permitiu que eles explorassem suas vivências emocionais de forma mais aberta e autêntica. Em seguida, foram apresentadas algumas situações projetadas, e o grupo foi convidado a descrever conjuntamente os sentimentos que cada situação evocava em cada indivíduo. Observou-se que uma mesma situação podia ser representada por sentimentos e emoções distintas para cada participante, evidenciando a singularidade do grupo e a diversidade do ambiente escolar. Essa percepção, de acordo com Fonseca (2016), ressalta a importância de considerar as particularidades e experiências individuais dos estudantes no contexto educacional, promovendo um ambiente inclusivo e empático que valorize a diversidade emocional presente na comunidade escolar.
No terceiro encontro, os participantes receberam cartões contendo diferentes palavras que representavam diversos sentimentos. A tarefa proposta consistia em expressar, por meio de mímica, o sentimento correspondente ao cartão que cada um recebeu. Após a apresentação das mímicas, os demais participantes foram convidados a compartilhar situações vivenciadas na escola em que estiveram envolvidos com o sentimento expressado. Entre os sentimentos mencionados, destacam-se a admiração e o medo.
No caso da admiração, as alunas Eliane e Inara mencionaram as aulas da nova professora de matemática, ressaltando que a professora costuma fazer perguntas simples e sempre elogia quem responde, incentivando os alunos e encorajando-os a participar, enfatizando que são inteligentes. Além disso, a professora utiliza exemplos rotineiros durante a dinâmica das aulas, o que aumenta o interesse dos alunos e melhora o ambiente de aprendizagem.
Essa abordagem reforça a importância da relação afetiva entre professor e aluno no ambiente educacional, corroborando com a perspectiva de Wallon (1971, p. 117), segundo o qual “a relação afetiva entre professor e aluno é um fator crucial no processo de ensino-aprendizagem, pois influencia diretamente na motivação e no envolvimento dos estudantes com o conteúdo apresentado”. A partir dessas observações, percebe-se que uma postura afetiva e encorajadora do professor pode impactar positivamente a motivação e o desempenho dos alunos, contribuindo para um ambiente de aprendizagem mais estimulante e eficaz.
Dentro do contexto do medo, Tales relatou sua apreensão em relação à hora da merenda, devido ao comportamento intimidador da merendeira que frequentemente grita com os alunos. Essa atitude cria um ambiente de desconforto e insegurança para Tales, impactando negativamente sua experiência na escola (Wallon, 1971). Nesse sentido, é fundamental que os sujeitos envolvidos no ambiente escolar compreendam o papel crucial que desempenham na vida dos estudantes e reconheçam o poder de suas interações afetivas no processo de aprendizagem. A empatia e a sensibilidade por parte de todos os membros da escola podem contribuir para um ambiente mais acolhedor e propício ao desenvolvimento emocional e intelectual dos alunos, potencializando assim suas experiências educacionais de forma positiva (Silva, 2022).
No quarto encontro, os participantes foram desafiados a escolher um membro de sua família para interpretar. Em duplas, eles desenvolveram um diálogo em que deveriam incorporar exatamente o tom de voz, as manias, a personalidade e os costumes do parente escolhido. Essa atividade proporcionou uma oportunidade para que os participantes se colocassem no lugar de outra pessoa e vivenciassem as características e peculiaridades de seus familiares de forma mais profunda e empática, evidenciando os traços familiares que atravessam cada um dos alunos.
Italo imitou sua mãe ao dizer:
Eu já falei para o Ítalo que ele precisa estudar, respeitar as professoras, que ele é inteligente e somente estudando poderá ter um futuro brilhante e uma vida melhor, diferente da minha (ÍTALO, 13 ANOS).
Já Sarah, ao imitar sua avó materna, afirmou:
Professora, a Sarah é uma excelente menina, tenho certeza que será uma mulher incrível quando adulta, e irá se formar na faculdade. E, por sinal: Saraaaaaah, já foi fazer o dever de casa?(SARAH, 13 ANOS)
As falas de Ítalo e Sarah refletem o incentivo familiar projetado de forma sentimental nas narrativas, ressaltando a importância da educação para o futuro dos estudantes. Por outro lado, ao imitar seu tio, Igor demonstra um encontro sentimental negativo, em que a forma como é tratado por esse membro de sua família afeta sua autoestima e confiança. As palavras de Igor imitando o tio foram:
Igor, pelo amor de Deus muleque, fala direito, parece que é retardado (IGOR,13 ANOS).
Essas diferentes interações afetivas no ambiente familiar podem exercer influência significativa sobre a forma como os alunos lidam com suas experiências escolares. Sobre isso Coutinho (2008) menciona que através das vivências socioemocionais, internaliza-se crenças sobre si mesmo e sobre o próprio valor como estudantes, o que pode refletir no desempenho acadêmico na percepção do ambiente escolar. O reconhecimento desses aspectos afetivos pode fornecer subsídios valiosos para a construção de um ambiente escolar mais acolhedor e inclusivo, que promova o desenvolvimento emocional e intelectual dos alunos de forma positiva.
No quinto encontro, os participantes foram convidados a trazer fotos de lugares significativos em seu bairro. Após coletar as imagens dos alunos, cada foto foi apresentada individualmente, e os alunos foram solicitados a expressar verbalmente o que cada imagem remetia para eles em relação ao bairro. Quando mostrada a foto do campinho do bairro, Jonathan verbalizou sua angústia, dizendo:
Eu odeio esse lugar porque foi onde meu pai foi preso, e todo dia tenho que passar por aqui para vir à escola, e sinto muito falta dele, às vezes nem consigo prestar atenção na aula, só fico pensando nisso (JONATHAN, 15 ANOS).
Já Suellen reagiu à foto do rio que passa pelo bairro com o seguinte discurso:
A cachoeira do macaco é um lugar traumático para mim, porque meu pai morreu afogado ali. Às vezes, a professora de ciências nos leva para realizar aula externa próximo ao rio, e é sempre um pesadelo. Eu peço para ficar aqui na escola, mas ela nunca me entende. Acha que estou fazendo drama e não quero andar, mas é um sentimento horrível ter que me aproximar daquele rio, é sempre um chororo (SUELLEN, 13 ANOS).
As experiências compartilhadas por Jonathan e Suellen mostram como os lugares do bairro podem estar carregados de significados emocionais profundos para os alunos e impactar de forma intrínseca o processo aprendizagem. O trabalho com as emoções e a compreensão da singularidade de cada indivíduo podem contribuir significativamente para promover um ambiente escolar mais inclusivo e favorável ao desenvolvimento integral dos estudantes (Ausubel, 1968).
No sexto encontro, os participantes foram divididos em grupos e receberam uma cartolina. A tarefa era expressar, em um lado da cartolina, uma situação que representasse uma dificuldade na aprendizagem dentro da escola. No outro lado da cartolina, deveriam propor uma solução para aquela dificuldade. O grupo formado por Ítalo, Junior e Inara apresentou sua situação. Ítalo foi o porta-voz e compartilhou:
Para nós, uma dificuldade é conseguir prestar atenção nas aulas antes do recreio, porque às vezes não temos o que comer no café da manhã e ficamos com muita fome. Não dá para prestar atenção na aula com fome. Então, achamos que deveria ter um café da manhã na escola, onde todos pudessem estudar sem fome (ÍTALO, 13 ANOS).
Eliane, Igor e Enzo representaram o respeito às diferentes inteligências. Enzo começou:
Os professores precisam entender que a gente não é burro. Talvez a forma como eles dão a aula não seja a melhor para cada tipo de aluno, já que somos todos diferentes. Uns entendem melhor história, outros matemática. O professor não pode chamar a gente de burro ou fazer a gente se sentir incapaz de ler um texto (ENZO, 14 ANOS).
Eliane complementou:
Daí a gente acha que para melhorar isso, tinha que ter uma aula ou palestra para os professores sobre os vários tipos de inteligências, e para os alunos também, pra daí ninguém ficar triste achando que não pode aprender (ELIANE, 15 ANOS).
Igor finalizou:
Até porque somos “singulares”, né? (IGOR,14 ANOS).
Os trechos mencionados, revelaram a importância de dar voz aos alunos para expressarem suas dificuldades de aprendizagem e proporem soluções. Sendo possível perceber que aspectos emocionais, como a fome e o respeito às diferentes inteligências, exercem um papel significativo na experiência escolar dos estudantes. Essa abordagem corrobora com a perspectiva de Wallon sobre o desenvolvimento emocional, que afirma que a afetividade é um aspecto fundamental para um aprendizado significativo e eficiente. Ao reconhecer e acolher as necessidades emocionais dos alunos, a escola pode criar um ambiente mais propício ao desenvolvimento integral, promovendo um ensino mais inclusivo e efetivo. (Wallon, 1975 apud Mahoney; Almeida, 2005).
No sétimo encontro, foi solicitado que os alunos escrevessem em um cartão um medo que tinham; em seguida, todos os medos escritos foram depositados em uma “caixa dos medos”. Após chacoalhar a caixa, cada um foi convidado a pegar um medo e propor intervenções para o mesmo. Raphaella pegou a carta “medo de perder de ano” e sobre o medo comentou:
Olha, eu acho que esse medo é normal, todo mundo deve ter, mas assim, eu vou falar por mim, eu sei que não é fácil ficar focada em todas as aulas, mas ter atitude de um ‘bom aluno’ é importante. Se tu sabe que tem dificuldade em matemática, faz todos os exercícios, senta longe de gente que vai conversar com você e deixa claro pra professora o que não está entendendo. Às vezes, os professores precisam escutar da gente nossa dificuldade (RAPHAELLA, 12 ANOS).
E completou:
Nossa, estou impressionada de estar dando esse conselho, mas fica claro que ele serve também para mim (RAPHAELLA, 12 ANOS).
Sobre o medo de ficar sem amigos, Tales comentou:
Se você for amigo das pessoas, não precisa ficar com medo de ficar sem amigos, porque eu sinto que meus amigos não vão me abandonar, porque eu sou parceiro e amigo deles, e na escola tem um monte de gente para ser amigo, que pode até te ajudar a estudar (TALES, 13 ANOS).
Visualizando as narrativas de Raphaela e Tales, a inteligência emocional envolve o reconhecimento e a compreensão das próprias emoções e das emoções dos outros, bem como a capacidade de lidar com elas de forma eficaz. Ao expressar seus medos e discutir soluções, os alunos estão desenvolvendo habilidades importantes para o autoconhecimento e o autogerenciamento emocional, o que pode contribuir para um melhor desempenho acadêmico e bem-estar geral. Além disso, a empatia demonstrada por Tales ao falar sobre o medo de perder amigos ressalta a importância das relações sociais na formação emocional dos estudantes, conforme discutido por Silva (2002).
No oitavo e último encontro, os alunos revisitaram as cartas escritas no primeiro encontro, onde expressaram suas aspirações em relação às atividades e expectativas para o programa. Eles fizeram uma comparação entre suas expectativas e a realidade vivenciada ao longo dos encontros, constatando que alcançaram os objetivos esperados. No quadro negro, cada um resumiu o significado dos encontros, destacando as palavras “emoções”, “sentimentos” e “inteligência emocional”, que surgiram repetidamente. A partir dessa reflexão, foram desafiados a pensar coletivamente em como poderiam colaborar para tornar a escola um espaço de influência cognitiva e emocional.
Em consenso, decidiram propor à direção da escola a criação de um grêmio estudantil, onde alunos, corpo pedagógico, professores e demais membros da comunidade escolar pudessem estabelecer um canal de diálogo, respeito e promoção das emoções no ambiente escolar. Essa iniciativa visa promover um ambiente mais acolhedor, empático e propício ao desenvolvimento emocional e intelectual dos estudantes, contribuindo para uma educação mais abrangente e significativa para todos.
CONCLUSÕES
As emoções desempenham um papel fundamental no processo educacional. O reconhecimento e a compreensão do aspecto afetivo é essencial para um aprendizado significativo e eficiente. Durante as oficinas realizadas nos encontros semanais, os participantes puderam explorar e expressar suas emoções em relação ao ambiente escolar e suas aspirações para o futuro. As atividades propostas permitiram aos alunos desenvolver habilidades importantes de inteligência emocional, como o autoconhecimento e o autogerenciamento emocional, que são fundamentais para um melhor desempenho acadêmico e bem-estar geral.
A realidade das periferias apresenta desafios específicos na educação, como a falta de recursos e oportunidades, que podem impactar negativamente a experiência escolar dos estudantes. As histórias compartilhadas pelos alunos durante os encontros refletem vivências marcantes relacionadas a traumas e expectativas familiares, as quais podem influenciar na autopercepção e desempenho acadêmico. Nesse contexto, é fundamental que a escola reconheça essas dificuldades e se esforce para criar um ambiente mais acolhedor e inclusivo, que valorize a diversidade emocional presente na comunidade escolar.
A promoção da inteligência emocional pode desempenhar um papel significativo na criação de um ambiente escolar mais acolhedor e propício ao desenvolvimento integral dos alunos. Durante as atividades propostas nos encontros, os participantes tiveram a oportunidade de expressar seus sentimentos e vivências emocionais de forma autêntica, incentivando a empatia e a compreensão das perspectivas dos outros. Essa abordagem contribuiu para a formação de um grêmio estudantil, no qual alunos, corpo pedagógico, professores e demais membros da comunidade escolar podem estabelecer um canal de diálogo, respeito e promoção das emoções no ambiente escolar.
A abordagem afetiva e encorajadora dos professores também foi destacada durante os encontros. A ênfase na valorização das conquistas dos alunos e o incentivo para superar desafios se mostraram cruciais, impactando positivamente a motivação e o desempenho dos estudantes. A relação afetiva entre professor e aluno é um fator crucial no processo de ensino-aprendizagem, influenciando diretamente na motivação e no envolvimento dos estudantes com o conteúdo apresentado (Wallon, 1975 apud Mahoney; Almeida, 2005). Portanto, investir na formação emocional dos professores pode contribuir para um ambiente de aprendizagem mais estimulante e eficaz.
As relações sociais na escola também exercem uma influência significativa na formação emocional dos estudantes. Durante as atividades dos encontros, os participantes puderam expressar seus sentimentos em relação aos colegas e ao ambiente escolar, destacando a importância das relações interpessoais para o bemestar e desenvolvimento dos estudantes. A empatia e a sensibilidade de todos os membros da comunidade escolar são fundamentais para criar um ambiente acolhedor e favorável ao desenvolvimento emocional e intelectual dos alunos. Promover a inteligência emocional e valorizar as particularidades de cada estudante pode contribuir para um ambiente mais inclusivo, que respeita a diversidade emocional presente na comunidade escolar e valoriza o crescimento integral de cada indivíduo (Silva, 2002).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Adorno, T. W. (1995). Educação e Emancipação (3a ed). São Paulo: Paz e Terra.
Ausubel, D. P. (1968). Educational psychology. A cognitive view. New York: Holt, Rinehart and Winston, Inc.
BARBIER, R. A pesquisa-ação na instituição educativa. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1985.
Beauvais, A. M., Brady, N., O’Shea, E. R., & Griffin, M. T. (2011). Emotional intelligence and nursing performance among nursing students. Nurse education today, 31(4), 396-401. https://doi.org/10.1016/j.nedt.2010.07.013
BOURDIEU, Pierre; CHAMPAGNE, P. Os excluídos do interior. In: NOGUEIRA, M. A. e CATANI, A. (Org.). Escritos de educação. p. 218-227. Petrópolis: Vozes, 1998.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996. BRASIL.
BRASIL. Lei no 11.274, 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 7 fev. 2006. Disponível em: https://www.gov.br/mec/pt-br
BRASIL. MEC. Plano de Desenvolvimento da Educação. Brasília: MEC, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/livro/index.htm
BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil. Brasília: MEC/ SEB, 2006. Disponível em: https://www.mec.gov.br/cne
BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Política nacional de educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à Educação. Brasília: MEC/SEB, 2006. Disponível: https://www.mec.gob.br/seb
Coutinho, Kátia Regina Roseiro. A psicologia da gestalt: aplicabilidade a prática pedagógica da educação de jovens e adultos. Teoria e Prática da Educação, v. 11, n. 1, p. 33-40, 2008. Disponível em: http://hdl.handle.net/11449/126929.
COSTA, Heloniza O. G. and RANGEL, Maria Ligia. Desafios do Ensino da Saúde Coletiva na Graduação dos Profissionais de Saúde. Ciênc. saúde coletiva [online]. 1997, vol.2, n.1-2, pp.164-171. Available from: http://old.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381231997000100164&lng=en&nrm=iso
FONSECA, Vitor da. Importância das emoções na aprendizagem: uma abordagem neuropsicopedagógica. Rev. psicopedag. [online]. 2016, vol.33, n.102, pp. 365-384. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010384862016000300014&lng=pt&nrm=iso.
FORTANA, David. Psicologia para professores. 2ª ed. São Paulo: Manole 1991.
GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. 2ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.
JOSÉ, Elizabeth da Assunção; COELHO, Maria Teresa. Problemas de aprendizagem. 10ª ed. São Paulo: Ática, 1999.
LEAL, Nogueira. David Paul Ausubel e Cark Rogers. In: Teorias da aprendizagem: Um encontro entre os pensamentos filosófico, pedagógico e psicológico. 2 ed. Curitiba: Intersaberes, 2015.
MAHONEY, Abigail Alvarenga e ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. Psicologia da educação [online]. 2005, n.20, pp. 11-30.
Melo, Armando Sérgio Emerenciano de, Maia, Osterne Nonato e Chaves, Hamilton Viana. Lewin e a pesquisa-ação: gênese, aplicação e finalidade. Fractal : Revista de Psicologia [online]. 2016, v. 28, n. 1, pp. 153-159. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1984-0292/1162
RONCA, Antonio Carlos Caruso. Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel. Temas psicol. [online]. 1994, vol.2, n.3, pp. 91-95. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413389X1994000300009&lng=pt&nrm=iso
SILVA, Lindomar Coutinho da. Emoções e sentimentos na escola: uma certa dimensão do domínio afetivo. Orientador: Profa Dr. Alda Muniz Pêpe. 2002. 374 p. Dissertação (Mestrado em educação) – Universidade Federal da Bahia, Ilheus – BA, 2002.
THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 2000.
Wallon, Henri. As origens do caráter na criança. São Paulo: Difusão europeia do livro, 1971. 256p.
____________, (1973/1975). A psicologia genética. Trad. Ana Ra. In. Psicologia e educação da infância. Lisboa: Estampa (coletânea).
Perls, Fritz. (1969). Gestalt Therapy Verbatim. Real People Press.