AS DIFICULDADES DO APENADO NA REINSERÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO

THE DIFFICULTIES OF THE CONVICT IN REINTEGRATING INTO THE LABOR MARKET

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10253564


Diorrany Nogueira Cruz1
Thamara Rodrigues Pinheiro Borges1
Cesar Leandro de Almeida Rabelo2


Resumo: O emprego é um fator que pode causar mudanças significativas na vida de qualquer cidadão. No entanto, essa transformação se torna mais poderosa quando um indivíduo que sai do sistema prisional, enquanto busca sua reintegração social, encontra no emprego uma fonte de renda e oportunidade para melhorar sua situação financeira e ganhar aceitação na sociedade. Diante disso a problemática desta pesquisa foi discutir: Quais são os principais obstáculos e desafios que o sistema penitenciário brasileiro enfrenta ao buscar promover efetivamente a ressocialização de indivíduos apenados? O objetivo geral desta pesquisa consiste em avaliar o impacto do emprego na vida dos indivíduos que deixam o sistema penal e sua contribuição para a redução da reincidência criminal. Para a condução deste estudo, será empregada uma abordagem metodológica baseada na pesquisa bibliográfica. A pesquisa identificou que muitos apenados enfrentam barreiras significativas, como falta de educação formal e experiência profissional, tornando ainda mais difícil a busca por oportunidades de emprego. Além disso, os próprios desafios estruturais do sistema prisional brasileiro, como superlotação e falta de programas eficazes de reabilitação, contribuem para a alta taxa de reincidência no país.

Palavras-chave: Emprego; Ressocialização; Reincidência; Sistema Penitenciário; Remição de Pena.

Abstract: Employment is a factor that can bring significant changes to any citizen’s life. However, this transformation becomes more powerful when an individual leaving the penal system, while seeking social reintegration, finds in employment a source of income and an opportunity to improve their financial situation and gain acceptance in society. Given this, the issue of this research was to discuss: What are the main obstacles and challenges that the Brazilian penal system faces in promoting the effective resocialization of incarcerated individuals? The general objective of this research is to assess the impact of employment on the lives of individuals leaving the penal system and its contribution to reducing criminal recidivism. For the conduction of this study, a methodological approach based on bibliographic research will be employed. The research identified that many incarcerated individuals face significant barriers, such as a lack of formal education and professional experience, making the search for employment opportunities even more challenging. Furthermore, the structural challenges of the Brazilian penal system itself, such as overcrowding and a lack of effective rehabilitation programs, contribute to the high recidivism rate in the country.

Keywords: Employment; Resocialization; Recidivism; Penal System; Sentence Remission.

1 INTRODUÇÃO

Um dos principais desafios enfrentados pelos indivíduos que cumpriram pena é a difícil inserção no mercado de trabalho. A estigmatização dos ex-detentos muitas vezes os impede de obter oportunidades de emprego, já que as empresas frequentemente analisam os antecedentes criminais, tornando a obtenção de emprego um obstáculo significativo. Competindo com candidatos que não possuem históricos criminais, os ex-detentos frequentemente se deparam com barreiras que dificultam sua reinserção profissional, mesmo após terem cumprido suas penas.

A sociedade desempenha um papel fundamental nesse cenário, pois a falta de apoio e a relutância em conceder segundas chances prejudicam os esforços de reabilitação dos apenados. Muitos deles enfrentam obstáculos adicionais, como a falta de conclusão do ensino médio e experiência profissional. Esses desafios tornam ainda mais complicada a busca por uma vida melhor em uma sociedade frequentemente marcada pelo preconceito.

Esse conjunto de fatores representa uma barreira significativa para a reintegração humanitária e necessária dos detentos na sociedade, contribuindo diretamente para o aumento da reincidência no Brasil, que já enfrenta altos índices de criminalidade. Diante disso a problemática desta pesquisa foi discutir: Quais são os principais obstáculos e desafios que o sistema penitenciário brasileiro enfrenta ao buscar promover efetivamente a ressocialização de indivíduos apenados?

O objetivo geral desta pesquisa consiste em avaliar o impacto do emprego na vida dos indivíduos que deixam o sistema penal e sua contribuição para a redução da reincidência criminal. Para essa avaliação foram traçados os seguintes objetivos específicos: analisar os desafios enfrentados pelo sistema penitenciário brasileiro na garantia dos direitos dos detentos; investigar as estratégias eficazes para promover o processo de reinserção do preso na sociedade, considerando a capacitação profissional e a educação; examinar a remição de pena como mecanismo de incentivo à reabilitação do condenado, identificando seus potenciais vantagens e desafios.

Para a condução deste estudo, será empregada uma abordagem metodológica baseada na pesquisa bibliográfica, a qual implica a busca de informações e dados em fontes já existentes, tais como livros, artigos científicos e outras publicações pertinentes. Ademais, é adotada uma abordagem de pesquisa qualitativa, cujo propósito é compreender e interpretar os fenômenos investigados por meio da análise de informações não quantitativas, como relatos, descrições e outras formas de expressão linguística.

A justificativa social para esta pesquisa reside na necessidade de melhorar o sistema penitenciário brasileiro para garantir uma reintegração eficaz dos apenados na sociedade. Isso não apenas beneficia os ex-detentos, permitindo-lhes uma segunda chance na vida, mas também contribui para a segurança pública, uma vez que a reincidência criminal é reduzida.  A justificativa acadêmica desta pesquisa reside na lacuna de conhecimento existente no que diz respeito ao impacto do emprego na redução da reincidência criminal no contexto brasileiro. Investigar os desafios do sistema penitenciário brasileiro, as estratégias eficazes de reinserção social e a remição de pena fornece uma base teórica sólida para futuras discussões acadêmicas e contribui para o desenvolvimento de políticas mais informadas na área de justiça criminal. 

2. O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO 

O Estado Penal pode ser entendido como um sistema que perpetua as disparidades sociais. Os níveis elevados de marginalização no Brasil são um reflexo da segregação de classes no país. Este sistema se caracteriza pela ausência de políticas sociais e pela preferência por uma abordagem estatal repressiva, que recorre a medidas punitivas para lidar com o crime. O aprisionamento em massa de pessoas de baixa renda, principalmente negras, com pouca educação, ilustra a seletividade do sistema de justiça criminal no Brasil (Neto & Teixeira, 2021). 

Embora o Artigo 7º da Declaração Universal dos Direitos Humanos enfatiza a igualdade de direitos perante a lei, essa igualdade não é uma realidade. A suspensão de direitos em favor de um sistema econômico propicia o encarceramento. Existe uma relação evidente entre uma população economicamente desfavorecida, que inclui negros ou pardos, pessoas de baixa renda, muitas vezes desempregadas e com pouca educação, que, por sua vez, compõem a maioria da população carcerária (Sathler & Ferreira, 2022). 

Portanto, se a orientação da política governamental se concentra na repressão da criminalidade em vez de abordar as causas subjacentes dos crimes, essa política criminal se torna ineficaz. No Brasil, como resultado, a característica central do sistema penal é a seletividade, já que ele não lida com todos os tipos de crimes e crimes, mas apenas com uma parcela dos crimes pela parcela mais vulnerável da sociedade (Sathler & Ferreira, 2022). 

Assim, prevalece no país uma cultura punitiva que está enraizada na ideia de uma suposta democracia racial, apesar das desigualdades estruturais evidentes. A intervenção repressiva do Estado, na realidade, visa reforçar aqueles que são percebidos como uma ameaça às classes dominantes. Por isso, em concordância com Saikali (2022) a imagem do sistema prisional é composta principalmente por jovens, negros, pobres e residentes em áreas periféricas, transformando a vida humana em um objeto sujeito à suspensão de direitos fundamentais. 

A desorganização do sistema prisional mina a substituição dos esforços de prevenção e reabilitação dos condenados, resultando em um ambiente que culminou na precariedade do sistema prisional. Um exemplo disso é a Lei de Execução Penal, que, em seu artigo 88, estipula que o cumprimento de penas privativas de liberdade deve ocorrer em celas individuais com pelo menos 6 metros quadrados de espaço, o que, como amplamente noticiado pela imprensa, não é uma realidade nas prisões do país (Brasil, 1984).

Além disso, o artigo 85 da Lei de Execução Penal estabelece a necessidade de que a capacidade de lotação do presídio seja compatível com sua estrutura física. Entretanto, a superlotação não apenas viola as disposições da Lei de Execução Penal, mas também contraria os princípios constitucionais. De acordo com os artigos 12 e 14 da mesma Lei de Execução Penal, os presos ou internados têm direito a material de assistência, incluindo acesso a instalações higiênicas e atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No entanto, a realidade atual não reflete essas disposições, já que muitos detentos enfrentam condições de higiene extremamente precárias (Brasil, 1984).

Vale ressaltar que a higiene em muitos presídios é inconveniente e, em alguns casos, a assistência médica é completamente inexistente. Além disso, a falta de um acompanhamento médico de segurança pode resultar na falta de investigação e atendimento adequado em situações de abuso e outras formas de violência contra os detentos (Machado & Guimarães, 2014).  

No que diz respeito à superlotação nas prisões, Mattos e Caricalt (2019), faz uma observação importante: as prisões estão sobrecarregadas, não proporcionando a dignidade devida aos presos. Devido à superlotação, muitos deles são obrigados a dormir no chão de suas celas, e, em casos extremos, até mesmo no banheiro ou próximos a buracos de esgoto. Nos locais com superlotação extrema, onde nem espaço no chão está disponível, os presos são obrigados a dormir amarrados às grades das celas ou em redes.

No entanto, essa superlotação prisional no Brasil contrasta com o que está previsto no artigo 85 da Lei de Execução Penal, que especifica que “o estabelecimento penal deve ter uma lotação compatível com a sua estrutura e especificamente”. Em relação à negligência observada nos presídios (Brasil, 1984). 

Machado et al., (2023) destaca que a superlotação das celas, sua falta de condições e a insalubridade tornam as prisões um ambiente propício à propagação de epidemias e à propagação de doenças. Todos esses problemas estruturais, combinados com a má alimentação dos detentos, seu estilo de vida sedentário, o consumo de drogas, a ausência de higiene e a atmosfera sombria das prisões, fazem com que um indivíduo que entre no sistema prisional em boas condições de saúde saia de lá com algum tipo de doença ou com sua saúde física e resistência enfraquecidas.

De forma semelhante, Caetano (2020) observa que o sistema penitenciário brasileiro, em sua grande maioria, consiste em unidades de responsabilidade estaduais, a maioria delas com superpopulação carcerária, o que impossibilita aos administradores a individualização da pena. Muitas vezes, devido à falta de espaço físico, não é possível separar os presos provisórios dos condenados, violando uma norma estabelecida na Lei de Execução Penal, que exige uma custódia separada entre processos e sentenciados, cada um de acordo com seu regime de cumprimento de pena.

Devido à superlotação do sistema prisional brasileiro, torna-se difícil separar os detentos considerados altamente perigosos dos que cometeram crimes menos graves, resultando em sua difícil convivência conjunta. Entretanto, essa realidade está em contradição com o que estabelece o artigo 84 da Lei de Execução Penal, que determina que “os presos provisórios devem ser mantidos separados dos condenados com sentença transitada em julgada, § 1º: Os presos primários devem cumprir pena em áreas diferentes das previstas para as reincidentes.”

O artigo 88 da Lei de Execução Penal estabelece as condições mínimas para a acomodação dos condenados, determinando que estes devem ser alojados em celas individuais equipadas com espaço para dormir, instalações sanitárias e uma pia. Além disso, o parágrafo único desse artigo especifica os requisitos essenciais para as unidades celulares, que englobam a manutenção de um ambiente saudável, assegurando ventilação adequada, exposição solar e controle térmico para garantir a sobrevivência humana. Além disso, é estabelecida uma área mínima de 6,00m² (seis metros quadrados) como padrão para essas celas (Brasil, 1984).

No entanto, este artigo é frequentemente violado na realidade, pois na maioria das prisões as condições de vida dos detentos são extremamente precárias. Nessa perspectiva, o Estado deveria criar novas unidades prisionais e reformar as já existentes, de modo a acomodar um maior número de detentos, uma vez que muitos deles estão confinados em condições que se assemelham a depósitos de seres humanos. Muitas vezes, esses indivíduos estão sem ocupações ou perspectivas de melhoria (Machado & Guimarães, 2014).  

Tornar a ressocialização dos presos uma realidade é uma tarefa árdua, dado que o sistema prisional frequentemente não fornece as condições permitidas para implementar o que está previsto no artigo 83 da Lei de Execução Penal, que prevê que “o estabelecimento penal, de acordo com sua natureza, deve incluir em suas dependências áreas e serviços destinados a fornecer assistência, educação, trabalho, lazer e atividades esportivas” (BRASIL, 1984). Portanto, na prática, nem todos os estabelecimentos penitenciários cumprem esses dispositivos legais, o que, por conseguinte, dificulta a ressocialização dos detentos.

No que concerne à assistência material e à saúde dos detentos e internados, os artigos 12 e 14 da Lei de Execução Penal estabelecem diretrizes fundamentais. O artigo 12 enfoca o fornecimento adequado de alimentação, roupas e instalações sanitárias como elementos essenciais do suporte material aos presos e internados. Por outro lado, o artigo 14 destaca a relevância da assistência à saúde, com ênfase na prevenção e tratamento, englobando cuidados médicos, farmacêuticos e odontológicos (Brasil, 1984).

É crucial salientar o parágrafo 2 do artigo 14, que determina que, nos casos em que uma unidade prisional não disponha dos recursos necessários para a prestação de assistência médica, essa assistência poderá ser provida em outro local, desde que haja autorização da administração do estabelecimento, evidenciando a importância de garantir cuidados de saúde adequados, independentemente das limitações locais. Esses dispositivos da Lei de Execução Penal refletem a preocupação com a dignidade e o bem-estar dos detentos e internados, buscando assegurar condições humanas dentro do sistema prisional brasileiro (Brasil, 1984).

Conforme previsto nos artigos 12 e 14 da Lei de Execução Penal, os presos e internados têm direito a material de assistência, que inclui higiene e acesso a atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No entanto, é evidente que muitos detentos enfrentam condições de higiene precárias, com instalações frequentemente deficientes, e, em alguns casos, a ausência total de acompanhamento médico.

Expressando sua preocupação com essa situação, o autor Oliveira et al., (2016) enfatiza que aqueles que já estão cumprindo suas penas e são acometidos por doenças recebem tratamento adequado até a recuperação completa de sua saúde, incluindo consultas diárias de um médico para garantir o restabelecimento de sua condição de saúde. De fato, essa situação contraria a lei quando comparada à realidade atual nos presídios brasileiros. É evidente que muitos detentos não recebem uma alimentação adequada, não têm acesso à assistência médica e nem mesmo aos itens básicos de higiene.

Em relação a esses cenários, Oliveira et al., (2016) esclarece que muitos estabelecimentos presos permitem que terceiros enviem pacotes de alimentos para os presos, os quais podem ser consumidos durante os intervalos entre as refeições fornecidas pelo Estado. Portanto, é importante destacar que a distribuição da alimentação é frequentemente desigual entre os detentos, muitas vezes devido a preconceito ou discriminação.

Como resultado do cumprimento da lei, surgem problemas graves, incluindo a propagação de doenças devido à falta de assistência médica e às condições precárias de higiene. Nesse contexto, Barbosa et al., (2014) ressalta que com base na ideia de individualização da pena, as Regras Mínimas para o Tratamento de Presos destacam a importância de estudar a personalidade de cada detento e implementar um programa individualizado de reabilitação. 

Barbosa et al., (2014) enfatizam a classificação de qualquer forma de discriminação, seja com base na cor, raça, língua, religião, etc., como seletivas para separar os presos nas prisões. Além disso, as regras orientam sobre a importância da higiene e dos serviços médicos nas instalações prisionais, das condições físicas e da forma de proteção, proibindo qualquer forma de tratamento desumano, cruel ou degradante, bem como a dupla proteção pelo mesmo crime. Assim, no sistema carcerário, além dos abusos e tratamento cruel, ocorre discriminação e preconceito, seja com base na cor, raça ou religião, resultando em tratamento desigual para pessoas que são iguais perante a lei.

2.2 DIREITO DOS DETENTOS

Compreende-se que a prisão, que originalmente se destinava a privar os indivíduos de sua liberdade, atualmente implica muito mais do que isso para aqueles que experimentam sua condenação (Oliveira et al., 2019). Nesse contexto, é possível identificar diversas formas de violação desses direitos.

Na definição dos Descritores na Área das Ciências da Saúde, a expressão “Direitos dos Presos” abrange os direitos de indivíduos presos, sejam eles civis ou militares, que são regulamentados pelas leis nacionais e acordos internacionais. Esses acordos incluem o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, juntamente com as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Prisioneiros e as normas do Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura e o Tratamento ou Punição Inumanos ou Degradantes (Howard Davis, 2003, p. 157 apud Chaves et al., 2021, p. 984). 

Além disso, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência também tem relevância nesta área. Adicionalmente, na continuação da descrição, o DECs apresenta diversos termos sinônimos em português, tais como: Proteção de Prisioneiros; Proteção para os Prisioneiros; Proteção dos Prisioneiros; Direitos dos Detentos; Direitos dos Presos; Direitos dos Presos Políticos; Direitos de Prisioneiros Políticos; Direitos dos Prisioneiros e Detentos; Direitos dos Prisioneiros e Ex-Prisioneiros (DECs, 2017).

A negligência em relação aos direitos estabelecidos na Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210/1984), especialmente no que diz respeito às garantias de reintegração, que deveriam criar as condições adequadas para a reinserção de prisioneiros na sociedade, pode resultar na propiciação do engajamento de indivíduos locais no tráfico de drogas e, como resultado, na formação de estruturas organizacionais hierarquizadas. Isso ocorre em áreas onde o Estado está ausente ou não exerce seu controle de maneira efetiva. Tal situação abre oportunidade para a manifestação de um assistencialismo tanto dentro das prisões quanto fora delas (Reis Netto; Chagas, 2019).

Consequentemente, na sociedade contemporânea, muitos indivíduos veem-se compelidos a ingressar em organizações criminosas ou milícias devido às dificuldades que enfrentam para reintegrar-se socialmente. Esse fenômeno gera uma nova força que desafia o Estado, provocando danos à sociedade civil. Além disso, um aspecto relevante ressaltado na Lei de Execução Penal (LEP) nº 11.942/09 envolve a garantia de condições mínimas de assistência à saúde para mães encarceradas e seus bebês, reconhecendo a necessidade de atendimento diferenciado e especializado para o cuidado materno-infantil. O sistema prisional do Brasil, no entanto, enfrenta graves problemas em várias áreas, como deficiências estruturais, assistência médica, educação, apoio jurídico, e não oferece qualidade adequada para atender às necessidades dos detentos (Félix et al., 2017).

Diante de grupos sociais que são privados de seus direitos, não é viável falar em liberdades pessoais ou escolhas individuais que não estejam intrinsecamente ligadas aos contextos em que ocorrem. Isso implica em considerar esses direitos como princípios democráticos que estão relacionados à cidadania e ao âmbito das políticas públicas. De forma inseparável, essas políticas devem garantir tanto os direitos humanos individuais quanto os sociais (Diuana et al., 2016). Portanto, o que se observa é uma falta de incentivo por parte do Estado para transformar essa realidade sombria que mantém uma população carcerária numerosa e inativa, privando-a das condições necessárias para exercer sua cidadania. As condições em que esses indivíduos se encontram não podem justificar a negação de seus direitos.

2.3 O PROCESSO DE REINSERÇÃO DO PRESO COM O OBJETIVO DE REINTEGRÁ-LO À SOCIEDADE

A instituição penal no Brasil concebe a reinserção dos detentos como um meio de reintegrá-los à convivência social”. Nesse sentido, o processo de reintegração, visando tornar o indivíduo mais consciente e apto a viver em sociedade, é, sem dúvida, algo desejável e factível, desde que o sistema carcerário seja capaz de fornecer todos os recursos essenciais conforme estabelecido pela lei. Atividades como emprego e educação, por exemplo, possibilitam que a pessoa recupere sua utilidade para a sociedade e garanta sua subsistência. Assim, pelo menos no que tange ao aspecto material, não haveria motivos para a prática de delitos (Chaves et al., 2021).

A pena, em especial quando aplicada no regime fechado e ainda mais nos superlotados e insalubres presídios, não promove a ressocialização, não restaura a sensibilidade, a humanidade, a compreensão e a empatia. Pelo contrário, ela “desensina”, endurece o caráter e incita a raiva. Existem diversas concepções acerca da punição. Uma das primeiras e historicamente influentes considera a pena como uma forma de retribuição pelo mal causado, um castigo ou punição pelo delito – são as teorias absolutas ou retributivas da pena (Chaves et al., 2021).

Essas teorias não tinham preocupações com o futuro; seu foco estava no passado. Muitas das sanções eram brutais e degradantes, não assegurando que o infrator não reincidisse, já que o Estado não se empenhava em educá-lo ou torná-lo uma pessoa melhor. Seu objetivo era, exclusivamente, reprimir o crime e responder ao mal com outro mal. Portanto, Sousa (2018) argumenta que frequentemente a pena infligida era pior e mais severa do que o próprio delito, resultando em falta de proporcionalidade na sua aplicação. Posteriormente, surgiram as teorias relativas ou preventivas da pena, onde a pena adquire um caráter preventivo.

De acordo com as teorias relativas, a punição não tem como finalidade retribuir o ato criminoso cometido, mas sim prevenir a sua ocorrência futura. Enquanto nas teorias absolutas, o castigo ao infrator é imposto unicamente porque ele cometeu um delito, nas teorias relativas, a pena é aplicada com o propósito de evitar que o indivíduo reincida em práticas delituosas. Em outras palavras, a pena deixa de ser vista como um fim em si mesma, sua justificação não mais se baseia em eventos passados, passando a ser encarada como um meio para alcançar objetivos futuros, sendo justificada pela necessidade de prevenir a ocorrência de novos delitos. Desse modo, sob a perspectiva dessas teorias, o principal objetivo do Direito Penal seria dissuadir a prática de futuras infrações penais e evitar a reincidência (Oliveira, 2018).

A reintegração social destaca a importância de criar condições ideais para os detentos se reabilitarem, possibilitando-lhes voltar à convivência na sociedade sem reincidir em crimes, o que assegura o pleno exercício de direitos, incluindo a preservação da dignidade humana (Gomes, 2019). Enfatiza-se o seu papel como agente de reintegração, salientando os benefícios evidentes que o trabalho prisional proporciona na preservação da integridade do indivíduo condenado e na promoção do autocontrole físico e moral que são necessários e essenciais para sua futura vida em liberdade.

Os programas, tanto educacionais quanto de empregabilidade, implementados nas instituições carcerárias, desempenham um papel crucial ao capacitar os ex-reclusos, visando facilitar sua reintegração ao mercado de trabalho após sua libertação e prevenir reincidências criminais (Chaves et al., 2021). O artigo 22 da Lei de Execução Penal estabelece que a assistência social tem como objetivo amparar os detentos e prepará-los para seu retorno à sociedade. Isso fortalece a premissa do artigo 10 da mesma lei. Além disso, a assistência social não apenas provê suporte aos presos e internos, mas também se concentra em prepará-los para sua reintegração à sociedade (Cunha, 2010).

O Artigo 25 da legislação prevê que a assistência aos ex-detentos inclui: I – orientação e apoio para facilitar sua reintegração à vida em liberdade; II – concessão, se necessário, de alojamento e alimentação em instalações adequadas, por até 2 meses, com a possibilidade de uma única prorrogação se o assistente social comprovar esforços na busca de emprego (Lei de Execução Penal, Art. 25), O Artigo 27 estipula que o serviço de assistência social colaborará com os ex-reclusos para ajudá-los a obter emprego (Lei de Execução Penal, Art. 27) (Novais et al., 2021). 

Ambos os dispositivos regulamentam a assistência aos indivíduos que deixam o sistema prisional. O Artigo 25 destaca a importância da reintegração social para evitar a reincidência criminal, estabelecendo um período de dois meses para fornecimento de abrigo e alimentação. Adicionalmente, admite uma única extensão desse prazo, se a necessidade for comprovada. Por sua vez, o Artigo 27 da mesma legislação determina que os serviços sociais devem cooperar com os ex-reclusos para auxiliá-los a encontrar emprego (Gomes, 2019).

As adversidades sociais, como a falta de habitação adequada, educação e capacitação profissional, são fatores que levam as pessoas a serem encarceradas. Essa carência de suporte resulta em ex-detentos enfrentando as mesmas carências após sua liberdade, devido à ineficácia do processo de reintegração e à inadequação do sistema de apoio jurídico e social. Sem meios de subsistência, muitos acabam reincidindo no crime (Barbosa et al., 2014).

Diante de todas essas lacunas, fica claro que o sistema prisional, em sua atual condição, não está cumprindo adequadamente a responsabilidade de cuidar dos detentos, desde o momento de sua entrada na instituição penitenciária até a sua saída. Isso ocorre frequentemente devido à falta de empenho e interesse social e político por parte do Estado (Barbosa et al., 2014).

A superlotação e a carência de instalações prisionais significam que apenas um número reduzido de prisioneiros tem acesso à educação ou ao trabalho no interior das prisões, retirando completamente o elemento humanitário da pena e transformando-a em uma medida meramente punitiva, incapaz de cumprir sua função de reintegração social (Sousa, 2018).

A liberação do detento não deve se limitar à mera obtenção da liberdade física. O Estado tem a responsabilidade de fornecer o suporte necessário para reintegrar o indivíduo à sociedade, proporcionando às instituições prisionais as condições ideais para desenvolver atividades e programas que facilitem a reintegração do preso na comunidade, efetivamente cumprindo os objetivos propostos pela execução da pena (Novais et al., 2021).

2.4 A RELEVÂNCIA DO EMPREGO PARA O INDIVÍDUO QUE DEIXA O SISTEMA PENAL

O emprego é um fator que pode causar mudanças significativas na vida de qualquer cidadão. No entanto, essa transformação se torna mais poderosa quando um indivíduo que sai do sistema prisional, enquanto busca sua reintegração social, encontra no emprego uma fonte de renda e oportunidade para melhorar sua situação financeira e ganhar aceitação na sociedade (Novais et al., 2021).

É evidente que o Estado remove aqueles que infringem a lei do convívio social por meio da pena de prisão. No entanto, ao libertá-los após cumprir suas penas, muitas vezes não lhes oferece a devida reabilitação ou preparação profissional para enfrentar o mercado de trabalho e a vida em sociedade. Consequentemente, quando são libertados, eles retornam ao ambiente familiar sem perspectivas de emprego, o que frequentemente os leva a retomar o comportamento criminoso, perpetuando um ciclo vicioso e contribuindo para o aumento das taxas de reincidência criminal (Feliciano, 2019).

Para garantir a reintegração do ex-detento na sociedade, é imperativo que o Estado cumpra suas obrigações legais. O emprego oferece à pessoa a oportunidade de adquirir uma profissão e reduz significativamente as chances de reincidência. Além disso, o trabalho também possibilita a remissão da pena, ou seja, a redução do período de prisão do detento, o que, por sua vez, contribui para a diminuição da população carcerária. Isso não apenas reduz os gastos do Estado nessa área, mas também melhora as condições dos indivíduos detidos (Chaves et al., 2021)

É crucial estabelecer um canal de comunicação e conexão entre o sistema prisional e a sociedade, no qual os detentos possam se identificar com a sociedade e, reciprocamente, a sociedade possa se reconhecer no contexto da prisão. Além disso, enfatiza-se a importância de assegurar e implementar os direitos dos presos a oportunidades de trabalho, educação e assistência. Também se considera de grande relevância uma relação mais estreita entre o ambiente carcerário e a sociedade em geral (Muraro, 2017).

De acordo com Dias (2015, p. 17), “A prática do trabalho, como um processo de reintegração social, deve ser constante e digna para efetivamente transformar a vida daqueles que almejam abandonar a criminalidade.” O trabalho proporciona uma sensação de reintegração e auxilia no processo de aceitação por parte da sociedade.

Da mesma forma, as intenções em relação à educação dos detentos como uma ferramenta de ressocialização buscam ser louváveis. No entanto, o problema reside nas condições adversas em que os presos vivem atualmente no sistema penitenciário. Conforme já mencionado, essas condições são frequentemente precárias, especialmente devido ao grande número de pessoas ali presentes, o que coloca o sistema carcerário brasileiro em circunstâncias desumanas e carentes, sobretudo, de capacitação adequada para os profissionais que o compõem. Essa realidade é a principal razão para o sistema ser amplamente ineficaz, sobretudo no que diz respeito ao processo de ressocialização (Sartório, 2016).

É notável que a integração de ex-detentos do sistema prisional no mercado de trabalho enfrenta uma notável escassez de oportunidades. Em grande parte dos casos, esse grupo possui níveis educacionais e qualificações profissionais baixos e enfrenta o estigma social, o que torna desafiador o estabelecimento de vínculos com empregadores e a adaptação às normas do mercado de trabalho. Isso tem efeitos prejudiciais não apenas na busca de emprego, mas também em outras áreas da vida, como na comunidade, na família e na saúde mental (Lopes Souza; Silveira, 2017).

No entanto, é cada vez mais evidente que os ex-detentos enfrentam dificuldades significativas na sua reintegração à sociedade. O cumprimento de penas em regime fechado, por si só, torna-se um desafio para esses indivíduos, e o método de ressocialização estabelecido pelo Estado não consegue acompanhar as atuais condições nas prisões. A única certeza é que a eficácia da lei tem sido questionada, em particular no que diz respeito ao respeito pela dignidade da pessoa humana (Chaves et al., 2021)

2.5 REMIÇÃO DE PENA COMO INCENTIVO À REABILITAÇÃO DO CONDENADO

A instituição da remição de pena apresenta um aspecto de grande importância para os condenados que buscam alternativas durante o cumprimento de suas penas. Essa possibilidade beneficia aqueles que se envolvem em atividades de estudo ou trabalho, vinculando essas atividades ao processo de ressocialização e reabilitação do condenado (Gomes, 2014).

Para uma compreensão mais clara, é relevante destacar a etimologia da palavra “remição”, que se origina do latim “redimere”, significando reparar, compensar ou ressarcir. É importante não confundir “remição” com “remissão”, uma vez que esta última se refere ao ato de perdoar. Em termos simples, a remição, no contexto da lei penal, implica resgatar, compensar ou abreviar parte da pena de prisão por meio do trabalho ou estudo (Gomes, 2014).

O direito à remição é exclusivo dos condenados cumprindo suas penas em regime fechado ou semiaberto, não se aplicando aos presos em prisão albergue. Isso ocorre porque esses indivíduos já têm a liberdade do trabalho contratual como parte de sua reabilitação, de acordo com os papéis sociais e as expectativas do regime a que estão submetidos (Novais et al., 2021).

Da mesma forma, a remição não é concedida a indivíduos em liberdade condicional, nem àqueles submetidos a penas de prestação de serviços à comunidade, uma vez que o trabalho nesse tipo de sanção constitui essencialmente o cumprimento da pena. Uma questão relevante a ser abordada é se os detentos provisórios podem fazer uso da remição pelo trabalho em relação a penas que lhes sejam impostas posteriormente. Embora o artigo 126 faça menção ao “condenado”, o direito a essa prática parece não se aplicar aos presos provisórios, apesar de eles poderem trabalhar dentro do estabelecimento (Souza; Costa; Lopes, 2019).

Quando o trabalho prisional é concedido, o detento deve receber as contraprestações estipuladas pela legislação para suas atividades laborais, incluindo remuneração e remição. É importante destacar que entre os direitos do preso está o princípio da igualdade de tratamento, conforme estabelecido no artigo 41, XII da lei, o que se aplica mesmo àqueles que estão sob prisão provisória (artigo 42) (Novais et al., 2021).

A contagem do tempo para efeito de remição pelo trabalho ocorre na proporção de um dia de redução da pena a cada três dias de trabalho (artigo 126, § 1º). Vale ressaltar que somente os dias efetivamente trabalhados são computados, excluindo-se os dias de descanso obrigatório, como os domingos e feriados (artigo 33, caput, segunda parte). Em casos de horários especiais de trabalho impostos aos presos em atividades de conservação e manutenção da instituição penal, os dias de descanso podem ocorrer em outros momentos da semana (Novais et al., 2021).

A remição pelo trabalho só considera os dias em que o condenado desempenha suas atividades laborais durante uma jornada completa, a qual deve ter duração de no mínimo seis horas e, no máximo, oito horas, respeitando as regulamentações locais em relação à jornada mínima (Novais et al., 2021).

Uma inovação significativa introduzida pela Lei nº 12.433/2011 foi a inclusão da possibilidade de remição da pena por meio do estudo, mantendo, ao mesmo tempo, a remição pelo trabalho. O cálculo da remição pelo estudo é realizado da seguinte maneira: a cada doze horas de frequência escolar, devidamente documentada, um dia da pena é reduzido, desde que ocorra dentro de um período mínimo de três dias. Essa perspectiva é complementada por Nucci (2013, p. 1040):

No entanto, não há impedimento para que o detento estude durante oito horas por dia, comprovando sua frequência em dois cursos simultâneos. Nesse cenário, terá o direito de computar “dois dias de estudo” a cada período de 24 horas em que cumprir uma carga horária de oito horas diárias. Além disso, é permitido que o preso exerça trabalho e estudo de forma concomitante, desde que os horários sejam compatíveis, conforme estabelece o artigo 126, § 3º, da Lei de Execução Penal (LEP), e a remição será cumulativa.

Vale ressaltar que a remição, seja por meio do trabalho ou do estudo, está condicionada ao mérito do condenado. No caso de comprovação de falta grave registrada no prontuário, o condenado pode perder até um terço do tempo remido. Quando a perda é decretada, inicia-se uma nova contagem a partir da data da ocorrência desse comportamento (Gomes, 2014). 

De acordo com Nucci (2013), essa mudança de entendimento, que anteriormente implicaria na perda de todos os dias remidos, encerra a discussão sobre a constitucionalidade dessa prática, por outro lado, um aspecto positivo é o direcionamento normativo para uma execução individualizada, que se alinha cuidadosamente com o princípio constitucional da individualização da pena. Não existe uma perda predefinida aplicável a todos os condenados. Cabe ao juiz avaliar cada situação com base na natureza da infração disciplinar, seus motivos, circunstâncias, consequências, bem como considerar a personalidade do infrator e o período de sua prisão.

Dessa forma, a penalização pode variar de um condenado para outro, com um perdendo um terço dos dias remidos e outro apenas um sexto, dependendo das circunstâncias específicas de cada caso. Essa nova abordagem promove a individualização da execução penal, permitindo uma análise mais justa e precisa de cada situação. Uma outra mudança relevante introduzida pela revisão da lei foi a imposição de um limite máximo para a perda dos dias remidos. Na legislação anterior, a prática de uma falta grave resultaria na perda de todos os dias remidos, o que era considerado injusto, uma vez que uma única infração poderia levar à perda de muitos anos de trabalho cumpridos (Novais et al., 2021).

No contexto da ressocialização, além das opções mencionadas anteriormente, Bitencourt (2017) acrescenta que, com base nessas modernas teorias e abordagens garantistas do Direito Penal, alinhadas com a visão do Estado Democrático de Direito, que busca ser pluralista, justo e solidário, conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988.

Quando se determina o tipo e o regime de pena a ser aplicado, é fundamental levar em conta o propósito de ressocialização (prevenção especial). Por razões de prevenção especial, é justificável a variação no tipo de pena a ser executada e, em certos casos, até mesmo a redução da quantidade de pena, desde que esse ajuste esteja dentro dos limites estabelecidos originalmente pela noção de proporcionalidade.  No entanto, o oposto, ou seja, aumentar a quantidade de pena com base na finalidade de ressocialização, não é permitido, uma vez que o limite máximo da pena é definido pelo princípio da proporcionalidade e pelo respeito a outras garantias individuais (Bitencourt, 2017)

De acordo com Bitencourt (2017) a redução de pena e sua diversificação em prol da ressocialização têm um limite, que é a necessidade de manter a estabilidade do sistema (prevenção geral positiva). Portanto, embora haja uma tendência clara de reduzir a intensidade da intervenção estatal, isso não pode levar à completa ineficácia da função preventiva geral da pena. Portanto, a reintegração social requer uma avaliação da maneira como a pena é executada, possibilitando a redução da pena em situações específicas, desde que os limites legais sejam respeitados. O objetivo é permitir que o indivíduo retorne à sociedade com a capacidade de viver em harmonia com os outros membros da comunidade.

Sempre se deve considerar as disposições legais para evitar que o sistema penal perca sua eficácia, resultando em um impacto mínimo na mentalidade da sociedade, o que seria prejudicial para a própria comunidade, pois as pessoas não teriam receio de cometer crimes. No entanto, para alcançar a ressocialização do indivíduo, é fundamental ter um sistema eficiente, apoiado por leis que possibilitem a reintegração do condenado à convivência social, fornecendo os recursos necessários para essa transformação (Vale, 2019). Segundo Bitencourt (2017, p. 161):

A reintegração do infrator na sociedade envolve um processo de comunicação e interação entre o indivíduo e a comunidade. Não é possível reinserir o infrator na sociedade sem questionar, ao mesmo tempo, o conjunto de normas sociais ao qual ele está sendo reintegrado. Caso contrário, estaríamos erroneamente assumindo que a ordem social é impecável, o que é, no mínimo, questionável. 

Portanto, para efetivar a ressocialização, a estrutura normativa e física do sistema penitenciário deveria estar inteiramente alinhada com esse objetivo central. No entanto, o sistema penal do Brasil enfrenta desafios consideráveis devido à superlotação nas prisões e à elevada taxa de reincidência entre os ex-detentos. As políticas públicas relacionadas ao sistema prisional são inadequadas e não demonstram um compromisso efetivo por parte das autoridades em alcançar resultados mais significativos na reintegração dos condenados (Gomes, 2014).

3 METODOLOGIA

Para o desenvolvimento do artigo, foi utilizado uma abordagem de revisão da literatura. Na elaboração do texto bibliográfico, utilizaram-se diversos recursos, como livros, teses, dissertações, artigos científicos e anais. É de destaque que as bases de pesquisa selecionadas incluíram o Google Acadêmico, Scientific Electronic Library Online (SciELO) e CAPES.

Com o objetivo de proporcionar uma pesquisa enriquecedora e relevante, procedemos à análise de artigos publicados nos últimos dez anos, os quais apresentam pertinência para o estudo em questão. As palavras-chave adotadas foram: Emprego; Ressocialização; Reincidência; Sistema Penitenciário; Remição de Pena.

Os critérios de inclusão estabelecidos abrangeram a seleção de artigos publicados nos últimos dez anos, disponíveis nos idiomas português, espanhol e inglês, levando em consideração sua relevância e pertinência para a pesquisa. Além disso, foram considerados artigos que abordam o tema proposto.

Por outro lado, foram excluídos os artigos que não eram integralmente acessíveis, que não eram redigidos em língua portuguesa, espanhola ou inglesa, bem como aqueles que não estavam diretamente relacionados ao tema em análise. Para garantir a confiabilidade e a validade dos resultados, foram considerados apenas os estudos que apresentam metodologias claras e específicas, além de resultados significativos e consistentes com a temática abordada (Marconi e Lakatos, 2015).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Lei de Execução Penal de 1984 e o Código Penal Brasileiro estabelecem a necessidade de que os detentos trabalhem nas prisões do Brasil, entre outras diretrizes. As normas contidas na Lei de Execução Penal (LEP) são muito elaboradas ao abordar os propósitos e objetivos do trabalho dentro das prisões, abrangendo os artigos do 28 ao 37 para regulamentações esse assunto (BRASIL,1984).

Entretanto, Vale (2019) essa abordagem isolada é insuficiente, visto que um dos problemas recorrentes enfrentados pelas prisões no Brasil, amplamente destacado por especialistas e pesquisadores, é a falta de uma política de trabalho terapêutico eficaz nas instituições prisionais.

Infelizmente, não existem escritórios ou instalações em número suficiente para atender a todos os detentos. Mesmo que houvesse oportunidades de trabalho em quantidade adequada, os desafios das prisões não desapareceriam instantaneamente, mas pelo menos seriam limitados.

Novais et al., (2021), essa confirmação se baseia nas orientações condicionais da LEP. O artigo 28 da lei afirma que o trabalho do condenado é um dever social e uma condição para preservar a dignidade humana, com propósitos educativos e produtivos.

Portanto, Cavalcante e Souza, (2023) o trabalho não é apenas uma forma de proteção, mas também desempenha um papel importante na reintegração dos condenados à sociedade. É importante lembrar que as prisões modernas são concebidas com duas funções principais: como um meio de dependência e, ao mesmo tempo, como um meio de reabilitação para os condenados. Além disso, a atividade laboral, conforme definido no texto legal, está intrinsecamente ligada ao processo de reabilitação.

Através da disciplina adquirida pelo trabalho repetitivo e da internalização de valores sociais por meio do trabalho em regime fechado, mesmo sob privação de liberdade, fica evidente que o trabalho deve ser considerado uma obrigação para os detentos (Sartório, 2016).

Quadro 1 – Dificuldade na reinserção no mercado de trabalho

DIFICULDADES QUE OS APENADOS ENFRENTAM NA REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO
Dificuldades na Reintegração no Mercado de TrabalhoExplicação
EstigmaOs apenados muitas vezes são estigmatizados devido à sua história criminosa, o que pode resultar em preconceito por parte dos funcionários e colegas, tornando difícil conseguir um emprego.
Antecedentes CriminaisTer um registro criminal pode resultar na exclusão de candidatos a empregos, especialmente em ocupações que excluam responsabilidade e confiança, como cargas de segurança ou financeiras.
Falta de Qualificações ProfissionaisMuitos apenados possuem pouca ou nenhuma qualificação profissional devido à falta de acesso a educação e treinamento enquanto estavam encarcerados, o que limita suas opções de emprego.
Restrições GeográficasAlguns apenados têm restrições geográficas devido a condições de liberdade condicional ou liberdade vigiada, o que pode limitar suas opções de emprego, forçando-os a permanecer em áreas específicas.
Falta de Experiência de TrabalhoA falta de experiência de trabalho anterior ou lacunas significativas no currículo podem tornar os apenados menos competitivos no mercado de trabalho, dificultando a obtenção de emprego.
Acesso Limitado a Recursos de ApoioA falta de acesso a programas de reabilitação, aconselhamento e formação profissional pode dificultar uma reintegração bem sucedida no mercado de trabalho e na sociedade em geral.
Barreiras de TransporteA falta de transporte confiável e acessível pode limitar a capacidade dos apenados de chegar ao local de trabalho, tornando difícil manter o emprego, especialmente em áreas com transporte público limitado.
Falta de Rede de ContatosA ausência de uma rede de contatos profissionais pode dificultar a busca de emprego e a obtenção de recomendações, já que os abertos não podem ter conexões na indústria que desejam trabalhar.
Discriminação SalarialAlguns apenados podem enfrentar discriminação salarial e receber níveis mais baixos do que seus colegas de trabalho, mesmo realizando o mesmo trabalho, devido à sua história criminosa.
Ameaças de RecidivaO medo de reincidir no crime pode variar em termos de autoconfiança e de estabilidade emocional dos apenados, tornando mais difícil a manutenção do emprego e a adaptação à sociedade.

Fonte: adaptado de Cavalcante e Souza, 2023.

O quadro apresentado resume as diversas dificuldades que os indivíduos que cumprem penas de prisão enfrentam ao tentar reintegrar-se no mercado de trabalho. Essas barreiras são multifacetadas e abrangem desde o estigma social associado aos antecedentes criminais até a falta de qualificações profissionais devido à limitação de acessibilidade à educação e treinamento durante o período de encarceramento. 

Além disso, Machado et al., (2023) comenta que as restrições geográficas, a falta de experiência de trabalho, a discriminação salarial e o temor de reincidir no crime são desafios adicionais que complicam a procura de emprego e a adaptação à sociedade.

A discriminação e o estigma associados a antecedentes criminais podem resultar na exclusão de empregos, especialmente aqueles que exigem confiança e responsabilidade. A falta de qualificações profissionais deixa muitos ex-detentos com opções de emprego limitadas, enquanto as restrições geográficas podem confinar suas escolhas em áreas específicas  (Sathler & Ferreira, 2022).

A falta de experiência de trabalho prévia e a falta de acesso a recursos de apoio, como programas de reabilitação e aconselhamento, dificultam uma reintegração eficaz no mercado de trabalho. Portanto, é evidente que uma reintegração bem sucedida de apenados no mercado de trabalho requer esforços significativos para superar essas barreiras e proporcionar oportunidades justas de emprego (Chaves et al., 2021).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema penitenciário brasileiro enfrenta desafios significativos na promoção da ressocialização de apenados. Um dos principais obstáculos para a reintegração de ex-detentos na sociedade é a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho. A estigmatização de pessoas que já cumpriram pena torna-se um entrave, com empresas frequentemente recusando a contratação com base em antecedentes criminais. A sociedade, muitas vezes, não oferece a segunda chance necessária para que esses indivíduos possam recomeçar suas vidas, o que é essencial para uma reabilitação bem-sucedida.

A pesquisa identificou que muitos apenados enfrentam barreiras significativas, como falta de educação formal e experiência profissional, tornando ainda mais difícil a busca por oportunidades de emprego. Além disso, os próprios desafios estruturais do sistema prisional brasileiro, como superlotação e falta de programas eficazes de reabilitação, contribuem para a alta taxa de reincidência no país.

Para abordar esses problemas complexos, é crucial que haja uma revisão abrangente das políticas e práticas atuais. Isso deve incluir a criação de programas de capacitação profissional e educação dentro das instituições penais, bem como uma mudança de mentalidade da sociedade em relação aos ex-detentos. A remição de pena, quando aplicada com eficácia, pode servir como um incentivo importante para a reabilitação, permitindo que os detentos adquiram habilidades e educação enquanto estão cumprindo suas penas.

Em última análise, a pesquisa destaca a necessidade de uma abordagem multifacetada para enfrentar os desafios da ressocialização de apenados no Brasil. Isso envolve a colaboração de autoridades, instituições, empresas e a sociedade em geral para garantir que a reintegração seja possível e eficaz. A segunda chance é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e segura, e é imperativo que o país tome medidas concretas para torná-la uma realidade. A presente pesquisa oferece uma base sólida para uma compreensão mais aprofundada desses problemas e serve como um chamado à ação para a melhoria do sistema penitenciário e, consequentemente, para a promoção de uma sociedade mais inclusiva e resiliente.

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1 Acadêmico do curso DIREITO da Instituição de Ensino Superior (IES) da rede nima Educação. E-mail: diorranyn@gmail.com e thamarapinheiros@hotmail.com endereço de e-mail do Autor do artigo. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de Graduação em DIREITO da Instituição de Ensino Superior (IES) da rede nima Educação. Ano. 2023
2 Orientador: Prof. Nome Completo, Cesar Leandro de Almeida Rabelo Titulação. Mestre