REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202407291657
Bruno Quintiliano Silva Vieira
Paulo Ubiratan Morais Aguiar
Maria Erly Silva Siqueira
RESUMO: O presente trabalho trata-se do estudo analítico da responsabilidade civil do Notário no Acórdão do RE: 842846 do Supremo Tribunal Federal e sua aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro. Essa análise demonstra grande relevância para o meio acadêmico, oportunizando melhor compreensão de sua aplicação no território nacional. Sua análise expõe a dinamicidade do tema no ordenamento jurídico. Dessa forma, verificam-se as ocasiões em que existe a incidência de normas que viabilizam a aplicação no caso concreto. Sob o aspecto legalista serão mostrados os fundamentos jurídicos que justificam sua aplicação na resolução de uma lide no caso concreto. Assim sendo, será objetivado revelar a análise dos fundamentos que justificam a sua aplicação, quanto do deslocamento da própria vontade do legislador sob a interpretação do serviço público em si mesmo. Por fim, pretende-se analisar o tema sobre o aspecto histórico, legal e social, comentando sobre seu impacto na atividade notarial.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Responsabilidade Subjetiva. Notário.
ABSTRACT: This paper is an analytical study of the civil liability of Notaries in the Judgment of Special Appeal No. 842846 of the Federal Supreme Court and its applicability in the Brazilian legal system. This analysis is of great relevance to academia, providing a better understanding of its application in the national territory. Its analysis exposes the dynamic nature of the issue in the legal system. In this way, the occasions on which there is an incidence of norms that enable application in the specific case will be verified. From a legal perspective, the legal foundations that justify its application in the resolution of a dispute in a specific case will be shown. Therefore, the objective will be to reveal the analysis of the grounds that justify its application, as well as the displacement of the legislator’s own will under the interpretation of the public service itself. Finally, the aim is to analyze the issue from a historical, legal and social perspective, commenting on its impact on notarial activity.
Keywords: Civil liability. Subjective Liability. Notaries.
INTRODUÇÃO
A investigação da Responsabilidade Civil Do Notário no Acórdão RE: 842846 do Supremo Tribunal Federal no ordenamento jurídico e sua aplicabilidade no Brasil possui grande relevância Científica, particularmente no que concerne às Ciências Jurídicas Forenses, oportunizando uma super percepção sobre sua aplicação e as normas que efetivam o tema. Além dos anseios que originaram sua criação.
Do exame do tema surge a possibilidade de se analisar a responsabilidade civil do notário no ordenamento jurídico brasileiro.
Dessa forma, pretende-se analisar conceitualmente a responsabilidade civil do notário dentro da investigação científico jurídica, revelando critérios estabelecidos pela doutrina e comparando as normas estabelecidas pelo legislador brasileiro.
O enquadramento teórico utilizado é o legal e doutrinário, tendo como objetivo geral analisar o tema dentro da ciência jurídica forense.
Como métodos científicos, optou-se pelos métodos bibliográficos e analíticos, buscando um cotejo entre o ordenamento jurídico brasileiro que serve de limites interpretativos do tema.
O presente artigo está sistematizado em 02 análises principais, com a apresentação dos aspectos introdutórios, como a análise conceitual e preceitos gerais, e a análise do Acórdão RE n° 842846 do Supremo Tribunal Federal.
DOS FATOS
Da análise do RE 842846 extrai-se que se trata de recurso interposto pelo Estado de Santa Catarina contra acórdão do Tribunal de Justiça local (TJ-SC) que compreendeu que o Estado, na conjuntura de poder delegante dos serviços notariais e/ou registrais, responde objetivamente pela reparação dos danos oriundos da atividade notarial em decorrência do parágrafo 6° do artigo 37 da Constituição Federal.
Conforme exposto, a pessoa física do tabelião/oficial é quem teria que responder pelas malfeitorias causadas a terceiros no exercício da atividade notarial. O caso versa sobre indenização formulada por cidadão em virtude de erro cartorário, que tramitou através de ação ordinária.
Concretamente, o erro cometido pelo cartório teria ocorrido no momento da emissão de certidão de óbito, precisamente no nome da falecida. Tal situação impossibilitou o viúvo de receber a pensão previdenciária oriunda da morte da esposa junto ao INSS.
A negativa de concessão do benefício previdenciário impulsionou o prejudicado a acionar o poder judiciário, através de seu advogado, para ingressar com a ação para retificação do registro. Fato este que retardou o recebimento do benefício.
Vendo o direito obstado pelo INSS, e sendo o dano causado pelo cartório o viúvo impetrou ação de indenização por danos materiais tendo por demandado o Estado de Santa Catarina.
Os pedidos do demandante foram acolhidos em instância inicial. Tendo tal sentença sido objeto de recurso, que após tramitar obteve do TJ/SC sentença ratificatória atribuindo ao Estado de Santa Catarina responsabilidade objetiva direta, e não subsidiária, por atos praticados por tabeliães por força do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal (Brasil, 1988).
Para o Tribunal de Santa Catarina, o Estado, na condição de delegante dos serviços notariais, responde objetivamente pela reparação dos danos que os tabeliães e registradores vierem a causar a terceiros em razão do exercício de suas funções.
Aspectos Introdutórios
Conforme exposto, a presente análise do julgado levanta a temática da responsabilidade civil do notário e/ou registrador, sendo necessárias explicações iniciais para enriquecer o estudo do julgado.
Doutrinariamente, a responsabilidade civil pode ser entendida como meio de se designar a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente causado a outrem conforme ensina Silva (2008). Surge da ofensa ou da violação de direito, que resulta em dano ou prejuízo a outrem. Pode se originar de ação ou ato ilícito, como, também, o fato ilícito de outrem, por quem, em virtude da lei, se tornou legalmente responsável.
Para a análise do acórdão RE: 842846 do STF, com repercussão geral, que trata da Responsabilidade civil do poder Estatal em decorrência de danos causados a terceiros por tabeliães e oficiais de registro no exercício de suas funções será necessário a análise do artigo 236 da Carta Magna brasileira:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. (Regulamento)
§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
(Brasil, 1988, art. 236).
Da mera leitura resta claro a fundamentação para a regulamentação dos serviços notariais e de registro.
Note-se ainda o que diz o artigo 37 da mesma carta Constitucional:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Pertinente à análise do caso, surge a Lei n°13.286, de 10 de maio de 2016 (Brasil, 2016), que modifica a responsabilidade civil dos notários e registradores no exercício de sua atividade própria, alterando a redação do art. 22, da lei 8.935/1994 (Brasil, 1994), conhecida como Lei dos Cartórios.
Art. 22. Os notários e oficiais de registro, temporários ou permanentes, responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, inclusive pelos relacionados a direitos e encargos trabalhistas, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos (Redação dada pela Lei nº 13.137, de 2015).
Tendo sido alterado para a seguinte redação:
Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016).
Em razão desta última alteração legal, temporariamente foi posto fim à discussão acerca da responsabilidade de tabeliães e registradores.
A tese sobre a responsabilidade civil pelos atos praticados por notários e registradores é controversa, e durante muito tempo foi objeto de discussões acirradas, sobretudo quanto à necessidade de demonstração da culpa dos sujeitos incumbidos do exercício da atividade eminentemente pública por delegação, nos termos do art. 236 da Carta Constitucional. Nesse contexto, surgiram diferentes correntes que buscavam explicar a natureza dessa responsabilidade.
Inicialmente há de se notar que o posicionamento majoritário dos acórdãos do Supremo Tribunal Federal, acompanhado por parte da doutrina, é de que os tabeliães e oficiais de registro são funcionários públicos, ainda que o exercício de seus serviços se dê em caráter privado. Conforme exposto, o Estado deve responder objetivamente pelos danos causados por estes sujeitos aos usuários do serviço público, porque quanto ao destinatário deste serviço, ou seja, o cidadão, para todos os efeitos, tais atos são de fato exercidos pelo Estado.
Quanto à responsabilidade pessoal dos notários e registradores, há duas correntes centrais. A primeira aponta para responsabilidade objetiva com fundamento na redação e na interpretação gramatical do art. 22 da lei 8.935/1994, posteriormente alterada pela lei 13.137/2015 (Brasil, 2015, art. 22):
Os notários e oficiais de registro, temporários ou permanentes, responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, inclusive pelos relacionados a direitos e encargos trabalhistas, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direitos de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.
Nesse sentido, Carvalho Filho (2018) ensina que a regra constitucional faz referência a duas categorias de pessoas sujeitas à responsabilidade objetiva: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.
Em relação à primeira categoria, não há novidade. São objetivamente responsáveis as pessoas jurídicas de direito público: as pessoas componentes da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), as autarquias e as fundações públicas de natureza autárquica.
A segunda categoria constituiu inovação no mandamento constitucional – as pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. A intenção do Constituinte foi a de igualar, para fins de sujeição à teoria da responsabilidade objetiva, às pessoas de direito público e aquelas que, embora com personalidade jurídica de direito privado, executassem funções que, em princípio, caberiam ao Estado.
Havendo então, na realidade, um deslocamento da análise da prestação do serviço, antes focado no realizador do serviço por procuração, e agora passando a ser considerado a efetivação deste serviço para o cidadão como polo de análise e verificação. Em outras palavras, ao cidadão, destinatário final do serviço, pouco importa a natureza jurídica da relação do Estado para com seus delegados.
Com efeito, se tais serviços são delegados a terceiros pelo próprio Poder Público, não seria justo nem correto que a só delegação tivesse o efeito de alijar a responsabilidade objetiva estatal e dificultar a reparação de prejuízos pelos administrados.
Desta feita, a redação supracitada possibilitava a interpretação de que a responsabilidade dos oficiais de registro e tabeliães independia de aferição da culpa na contratação dos prepostos, bem como da negligência destes durante a prática dos atos. Assim sendo, verifica-se que na legislação estava presente a teoria do risco, imputando ao titular da serventia a responsabilização objetiva e garantindo regressividade contra quaisquer dos seus auxiliares apenas em caso de dolo (culpa lato sensu) ou culpa stricto sensu (leve ou levíssima).
Nesse sentido, Gonçalves (2019) argumenta que, na responsabilidade objetiva, prescinde-se totalmente da prova da culpa. Sendo ela reconhecida, como mencionado, independe de culpa. Bastando, assim, que esteja presente a relação de causalidade entre a ação e o dano.
A segunda corrente sustentava a incidência de responsabilidade pessoal subjetiva de notários e registradores, mediante uma interpretação contextual com fulcro principalmente no art. 38, da lei 9.492/1997 (Brasil, 1997, art. 38), interpretando-o analogamente aos oficiais de registro:
Os Tabeliães de Protesto de Títulos são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou Escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.
Por ser a Lei 9.492/97 superveniente, incidiria para todos os titulares de delegação, alterando, portanto, a teleologia da lei 8.935/94, cuja redação originária remonta a 1994.
A crítica que pode resultar dessa corrente vai no sentido de que na medida em que a lei 9.492/1997 regula em especial os Tabeliães de Protesto de Títulos, o art. 22 da lei 8.935/94 ainda continua em vigor em relação aos oficiais de registro e demais tabeliães, porquanto não expressamente revogado pela lei posterior, bem como não conflitante com suas disposições, no que tange os outros delegatários dos serviços notariais e registrais.
Com o advento do novo texto ao art. 22 da lei 8.935/1994, pela lei 13.286/16, considerou-se que se cessaria a polêmica quanto à responsabilidade pessoal do oficial de registro e notário, os quais responderão subjetivamente oriundos do exercício da atividade típica:
Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso (Brasil, 2016, art. 22).
Importante salientar a distinção do dano decorrente do exercício de atividade típica de registro e o dano em razão da relação de consumo.
O dano decorrente do exercício típico a atividade extrajudicial pode surgir dos atos de qualificar títulos, devolvê-los ou assentá-los; ou, no caso do tabelião, instrumentalizar a vontade das partes de modo a gerar eficácia, da atividade atípica, anexa ao serviço registral e notarial. Nessa situação aplicam-se as regras do art. 22, da lei 8.935/1994 (responsabilidade subjetiva).
Agora, ocorrendo o dano em razão oriundo da relação de consumo criada entre os prestadores e o usuário (por exemplo, se o usuário ao se deslocar no interior do cartório escorrega e se machuca), aplicam-se as regras de responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor.
Do exposto, faz-se necessário o conhecimento da teoria do diálogo das fontes conforme ensina Flávio Tartuce (2017) que expõe em sua essência que as normas jurídicas não se excluem, supostamente porque pertencentes a ramos jurídicos distintos, mas se complementam.
O notário rompe o liame causal no exercício da atividade e, portanto, mitiga efeitos indenizatórios quando informa minuciosamente os efeitos ao usuário, fazendo constar informações adicionais nas escrituras públicas. Já o registrador, para quebrar o nexo causal, pode qualificar negativamente o título por estar submisso à dúvida registral, ocasião em que a responsabilidade passa ao Estado.
Concluindo, a nova redação dada ao art. 22, da lei 8.935/1994 até este momento põe fim à controvérsia acerca da responsabilidade civil de notários e registradores por dano causado aos usuários do serviço na prática da atividade pública a eles delegada pelo poder estatal.
Tratando-se, porém, de dano causado por atividades anexas à atividade notarial e registral, muitas vezes criadas em razão de uma relação jurídica de consumo entre oficial e usuário, a responsabilidade será objetiva, nos termos do art. 14, do Código de Defesa do Consumidor (Brasil, 2017).
O tema: responsabilidade civil dos Notários e Registradores foi e ainda é bastante controverso.
ANÁLISE CRÍTICA
Em 27 de fevereiro de 2019, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou, em sede de repercussão geral, o Recurso extraordinário n° 842.846, assim intitulado: “Responsabilidade civil do Estado em decorrência de danos causados a terceiros por tabeliães e oficiais de registro no exercício de suas funções”.
O Ministro Luiz Fux no momento de expor tema objeto desta repercussão geral, afirmou que o recurso em análise teria objeto mais amplo e largo que o estampado no acórdão da repercussão geral. Assim sendo, o Relator assinalou que se tratava de:
Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 37, § 6º, e 236 da Constituição Federal, a extensão da responsabilidade civil do Estado em razão de dano ocasionado pela atuação de tabeliães e notários. Debate-se ainda sobre o tipo de responsabilidade civil, se objetiva ou subjetiva, que rege a atuação dos registradores e tabeliães (STF, 2019).
Após o momento das sustentações orais, o Ministro Luiz Fux esclareceu que o tema em debate no recurso extraordinário seria mais restrito que aquele anteriormente descrito, devendo a análise ser limitada a Responsabilidade civil do Estado em consequência de danos causados a terceiros por tabeliães e oficiais de registro no exercício regular de suas funções.
Em razão desta limitação no objeto do julgamento, o Ministro trouxe para sessão um novo voto, não anteriormente distribuído aos demais Ministros.
Finalizado os debates, o Plenário do STF consolidou a tese de que Estado responde objetivamente pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções típicas ocasionarem danos a terceiros, assentado o dever de regresso contra o legalmente responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de configuração de improbidade administrativa.
Esse novo entendimento revoga aquele atualmente reinante no Superior Tribunal de Justiça. Dessa forma, o Estado deve ser acionado diretamente pela parte que se sinta prejudicada em razão de prática de ato notarial e/ou de registro.
Conforme exposto, o notário e/ou o registrador deve ser acionado pelo Estado por meio de ação regressiva, nos termos da parte final do art. 37, §6º, da Constituição da República, nos casos de dolo ou culpa na prática do ato danoso.
Contudo, o Supremo Tribunal Federal adotou a tese da responsabilidade subjetiva dos delegatários dessa função pública; a ilegitimidade do notário e/ou do registrador para figurar em ação de responsabilização civil ajuizada pelo usuário que se considere lesado; e a legitimidade do notário e/ou do registrador para figurar em ação regressiva, a ser ajuizada pelo Estado, em razão de condenação judicial imposta ao poder estatal pelo ato danoso produzido pelo agente delegado, caso em que sua condenação exigirá a demonstração da sua responsabilização subjetiva.
Após sacramentada a repercussão geral pelo STF, através do mencionado acórdão, algumas questões reflexas devem ser levantadas, pois resultam desse atual entendimento:
I) na hipótese do notário e/ou o registrador arguir sua ilegitimidade em ação de responsabilização civil que lhe tenha sido ajuizada e que esteja, presentemente, em curso?
II) na situação hipotética de condenação judicial passada em julgado, fundada na responsabilização civil objetiva do notário e/ou do registrador, pode ser objeto de ação rescisória?
III) No caso da ação regressiva ser proposta contra o notário e/ou o registrador exige a instauração de prévio processo administrativo, de forma a se apurar a existência de ato ilícito praticado com dolo ou culpa pelo delegatário, e, em sendo isto feito, atestar a oposição do notário e/ou registrador ao pagamento dos valores mensurados pelo Estado, revelando a existência de uma pretensão resistida?
IV) a que título se pode presumir a ocorrência de improbidade administrativa em razão da ausência da propositura da ação de regresso, nos termos assentados pelo STF? Pela ausência da instauração de processo administrativo ou, tendo ele sido concluído e estando caracterizada a responsabilidade civil do delegatário, pela ausência da propositura da correspondente ação judicial de regresso?
O Supremo Tribunal Federal pretendeu encerrar a discussão do tema em repercussão geral, mas, ao fazê-lo, fez surgir outros questionamentos que podem gerar novas controvérsias no ordenamento jurídico brasileiro nos próximos anos.
CONCLUSÃO
O presente estudo partiu com o tema da análise da responsabilidade civil no notário no Acórdão RE: 842846 do Supremo Tribunal Federal no ordenamento jurídico brasileiro.
Pretendeu-se revelar as diversas questões relacionadas com as formas de se analisar a responsabilidade civil do notário no Brasil.
Sabe-se, que a doutrina criou diversos critérios para se analisar a responsabilidade civil no notário. Entretanto, como demonstrado, no Brasil existe o critério objetivo e subjetivo para a responsabilização deste profissional.
A pesquisa mostrou que os posicionamentos legais influenciaram na responsabilidade civil do notário, ao passo que, ao modificar o polo observacional da legislação aplicável aos casos concretos, insculpindo aí os resultados obtidos pela atuação notarial aos cidadãos comuns, destinatários da atuação estatal, ainda que delegada, como diretamente atrelada à atuação direta do Estado, não quanto a relação entre Estado e seus delegados, mas em relação ao Estado para com os destinatários da atuação do Estado.
As premissas lançadas ao longo deste trabalho autorizam afirmar que a responsabilidade civil do notário no ordenamento jurídico e sua aplicabilidade no Brasil é subjetiva. Isto porque, sob o enfoque da ética verificou-se que os anseios do legislador que criou a norma, são repletos dos princípios legalistas necessários para o convívio harmônico e justo na sociedade. Dessa forma, a interpretação objetiva da responsabilidade restringe a possibilidade do prejudicado buscar reparação para um prejuízo sofrido.
Podem ser considerados pontos fracos na análise do tema os diversos entendimentos sobre a responsabilidade civil do notário/registrador que surgiram no decorrer dos anos. Assim sendo, o aspecto temporal também representa oportunidade de mudança, representando dúvidas quanto à responsabilidade do notário.
Por fim, diante do exposto surge a necessidade de um estudo mais aprimorado sobre a criação e modificação de normas técnicas para facilitar a atividade jurisdicional, no momento da aplicação da lei. Sendo esta análise possível tese de doutorado.
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