ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES RENAIS CRÔNICOS SUBMETIDOS À HEMODIÁLISE

Nova Fisio, Revista Digital. Rio de Janeiro, Brasil, Ano 15, nº 88, Setembro/Outubro de 2012.
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Análise da qualidade de vida de pacientes renais crônicos submetidos à hemodiálise

ANALYSIS OF THE QUALITY OF LIFE IN PATIENTS WITH CHRONIC RENAL FAILURE UNDERGOING HEMODIALYSIS

Carla Danielle Tavares; Mayara Sonaly Lima Nascimento
maymaguerita@hotmail.com

Revisado por: Rodrigo Silva Perfeito (rodrigosper@yahoo.com.br)
Nova Fisio, Revista Digital. Rio de Janeiro, Brasil, Ano 15, nº 88, Setembro/Outubro de 2012.

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Resumo

Objetivo: Analisar a qualidade de vida de pacientes com insuficiência renal crônica em tratamento de hemodiálise. Métodos: Trata-se de um estudo transversal e descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no Hospital da Fundação Assistencial da Paraíba. Foram avaliados 8 sujeitos, escolhidos de forma aleatória. Utilizaram-se como instrumentos, a ficha de avaliação sociodemográfica e clínica e o questionário WHOQOL-bref composto por quatro domínios: físico, psicológico, social e meio ambiente, além da qualidade de vida geral. Resultados: O estudo foi composto por 62,5% de mulheres e 37,5% de homens, na faixa etária entre 29 – 59 anos, com predominância do ensino fundamental incompleto (50%), solteiros (62,5%) e aposentados (37,5%), submetidos à hemodiálise. Quanto à qualidade de vida, segundo a escala WHOQOL-bref, obtiveram-se os seguintes valores: domínio psicológico 71,8 ± 15,9, relações sociais 63,1 ± 24,9, o domínio meio ambiente 60,9 ± 10,0 e por último, o domínio físico, com 60,0 ± 6,5. A qualidade de vida geral obteve valor médio de 60,9 ± 14,0. Conclusão: Todos os domínios da WHOQOL-bref obtiveram valores médios acima de 60,0, os melhores resultados foram dos domínios relações sociais e psicológico. O domínio que mais influencia na percepção da qualidade de vida é o domínio físico, o que obteve menor valor médio (60,0).

Palavras Chave: Qualidade de vida; Hemodiálise; Insuficiência renal crônica; WHOQOL-bref.

Abstract

Objective: To assess quality of life in patients with chronic renal failure undergoing hemodialysis. Methods: This was a cross-sectional descriptive study with a quantitative approach, developed at Hospital Healthcare Foundation of Paraíba. Were 8 subjects, chosen at random. It was used as assessment tools, evaluation form and sociodemographic and clinical questionnaire WHOQOL-bref composed of four domains: physical, psychological, social and environmental, as well as overall quality of life. Results: The study was comprised of 62.5% women and 37.5% men, predominantly aged 29-59 years, with a predominance of elementary education (50%), single (62.5%) and retired (37.5%) on hemodialysis. Regarding quality of life, according to the scale WHOQOL-bref, we obtained the following values: the psychological 71.8 ± 15.9, 63.1 ± 24.9 social relations, the environment domain 60.9 ± 10, 0 and finally the physical domain, with 60.0 ± 6.5. The overall quality of life was obtained average value of 60.9 ± 14.0. Conclusion: All domains of WHOQOL-bref had average values above 60.0, the best results were the social relationships and psychological. The area that most influences the perception of quality of life is the physical domain, which had lower average (60.0).

Keywords: Quality of life; Hemodialysis, Chronic renal failure; WHOQOL-bref.

Introdução

A doença renal crônica consiste em lesão renal e perda progressiva e irreversível da função dos rins (glomerular, tubular e endócrina). Em sua fase mais avançada (chamada de fase terminal de insuficiência renal crônica – IRC), os rins não conseguem mais manter a normalidade do meio interno do paciente (JUNIOR, 2004), o que prejudica essencialmente todos os outros sistemas do organismo (BARBOSA, 2000; BASTOS, 2004). As principais causas da IRC são a hipertensão arterial e o diabetes mellitus (JUNIOR, 2004).
A doença renal crônica constitui hoje em um importante problema médico e de saúde pública. No Brasil, a prevalência de pacientes mantidos em programa crônico de diálise mais que dobrou nos últimos oito anos. De 24.000 pacientes mantidos em programa dialítico em 1994, alcançamos 59.153 pacientes em 2004. A incidência de novos pacientes cresce cerca de 8% ao ano, tendo sido 18.000 pacientes em 2001. O gasto com o programa de diálise e transplante renal no Brasil situa-se ao redor de 1,4 bilhões de reais ao ano (JUNIOR, 2004).
A diálise é utilizada para remover substâncias tóxicas e detritos orgânicos, excretados normalmente pelos rins sadios. É indicada nos casos em que o tratamento conservador não é considerado suficiente (KAMIMURA, 2004).
A hemodiálise é um procedimento no qual o sangue é removido do corpo e circulado através de um aparelho externo denominado dialisador. Exige o acesso repetido à corrente sanguínea, geralmente realizado através de uma fístula arteriovenosa (conexão artificial entre uma artéria e uma veia) que é criada cirurgicamente. Os acessos ainda podem ser designados fisicamente por cateteres, shunts artério- venosos, enxertos e próteses vasculares (BARBOSA, 2000).
Para permanecerem saudáveis, a maioria dos indivíduos com Insuficiência Renal Crônica necessita de hemodiálise três vezes por semana (BARBOSA, 2000).
A doença renal crônica acarreta uma série de questões que marcam a vida do indivíduo logo a partir do diagnóstico, sendo comuns as manifestações psíquicas que promovem alterações na interação social e desequilíbrios psicológicos, não somente do paciente como também da família que o acompanha (ADRETE, 2005).
A doença renal e as complicações decorrentes do tratamento afetam as habilidades funcionais do paciente, limitando suas atividades diárias (BITTENCOURT, 2003). Esse paciente durante hemodiálise é conduzido a conviver diariamente com uma doença incurável que o obriga a uma forma de tratamento dolorosa, de longa duração e que provoca, juntamente com a evolução da doença e suas complicações, ainda maiores limitações e alterações de grande impacto, que repercutem tanto na sua própria qualidade de vida quanto na do grupo familiar (CAIUBY, LEFÊVRE, PACHECI-SILVA, 2004).
Durante a diálise, os pacientes ficam em estado de alerta e tensão, o que desencadeia reações de ansiedade, devido à constante exposição a situações estressantes como dietas, transplante e a permanência frequente em ambiente hospitalar, alterando, portanto, a qualidade de vida. Dentre as manifestações psicológicas estão o humor depressivo persistente, auto-imagem prejudicada e sentimentos pessimistas. As queixas fisiológicas incluem distúrbio de sono, alterações de apetite e peso, ressecamento da mucosa oral e constipação e diminuição do interesse sexual (DAUGIRDAS, BLAKE, ING, 2003).
O termo qualidade de vida (QV), recentemente, tem sido muito usado como um conceito necessário na prática dos cuidados e pesquisa em saúde. A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1948, definiu saúde como não apenas a ausência de doença ou enfermidade, mas também a presença de bem-estar físico, mental e social (MINAYO, HARTZ, BUSS, 2000).
Na conceituação recente adotada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a QV foi definida como “[…] a percepção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (SEIDL e ZANNON, 2004).
Levando isso em consideração o objetivo desse estudo foi analisar a qualidade de vida de pacientes renais crônicos submetidos à hemodiálise no hospital da Fundação Assistencial da Paraíba (FAP) de Campina Grande, PB.

Métodos

Foi realizado um estudo transversal e descritivo, de abordagem quantitativa. Este estudo foi desenvolvido no setor de hemodiálise do Hospital da Fundação Assistencial da Paraíba (FAP) da cidade de Campina Grande – PB. A amostra foi selecionada de forma aleatória, sendo composta por 8 pacientes, de ambos os gêneros, que recebem hemodiálise três vezes por semana, durante quatro horas. A coleta de dados foi obtida através de uma entrevista após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por parte dos sujeitos.
Quanto aos instrumentos para coleta de dados, primeiramente, caracterizou-se os dados sociodemográficos e clínicos. Logo após foi aplicada a escala WHOQOL-bref para avaliar a qualidade de vida desses indivíduos que se trata de uma versão abreviada do WHOQOL-100, o Instrumento de Avaliação de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde (KLUTHCOVSKY e KLUTHCOVSKY, 2009).
Esse instrumento foi validado no Brasil por Fleck, em 2000. Contém 26 questões, das quais as duas primeiras são genéricas e não entram no cálculo dos escores de nenhum dos domínios, as demais questões são distribuídas em quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente (FLORIANO e DALGALARRONDO, 2007). Cada domínio é composto por questões cujas respostas variam entre 1 e 5, possuindo quatro tipos de escalas de resposta, a saber: intensidade, capacidade, frequência e avaliação. Essas escalas são do tipo Likert, sendo que a escala de intensidade varia de nada a extremamente; a escala de capacidade varia de nada a completamente; a escala de avaliação de muito insatisfeito a muito satisfeito e muito ruim a muito bom e a escala de frequência varia de nunca a sempre. As questões de número 3, 4 e 26 apresentam os escores invertidos em função de 1=5, 2=4, 3=3, 4=2 e 5=1 (MICHELONE e SANTOS, 2004; ZANEI, 2006).
A escala não possui uma classificação numérica quanto à qualidade de vida, e sim uma escala analógica de 0 a 100, sendo o critério utilizado a comparação: quanto maior o escore, maior é a qualidade de vida, e quanto menor o escore, menor será a qualidade de vida. Os dados foram analisados através do software Graph Pad Prism, versão 4.0, sendo expressos na forma de porcentagem, média e desvio padrão da média.

Resultados

Relacionado aos dados sociodemográficos e clínicos o estudo foi composto por 8 pacientes, com idade variando entre 29 e 59 anos  e média de 41,1 ± 9,7 anos. Quanto ao sexo, evidenciou-se que a maioria da amostra foi do sexo feminino (62,5%), predominantemente com ensino fundamental incompleto (50%) (Tabela 1). Com relação ao estado civil, a maioria relatou ser solteiro (62,5%) e considerando-se a profissão 37,5% relataram ser domésticas, equivalendo-se aos que são aposentados (37,5%) (Tabela 2).

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No que diz respeito à qualidade de vida, segundo a WHOQOL-bref, observou-se, de acordo com a escala de valores (0 – 100) que, quando analisado o resultado nos valores mínimos, o domínio relações sociais recebeu o menor escore (25,0), quando comparado aos demais domínios; o psicológico obteve 50,0; o meio ambiente, 45,0 e o físico, 52,5. Em contrapartida, quando foram analisadas os valores máximos, há predominância no domínio psicológico (100); relações sociais com 82,5 e os aspectos físico e meio ambiente, com 70,0. Portanto, na média entre domínios, no aspecto relações sociais os pacientes vivenciam melhor as questões, quando comparadas aos outros domínios (físico, psicológico e meio ambiente) como se observa na Tabela 3.

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Quanto ao valor médio e desvio padrão, o domínio social obteve 75,0, o domínio psicológico 72,5, o domínio meio ambiente 65,0 e por último, o domínio físico, com 60,0 indicando, portanto, que o domínio físico, que obteve os menores escores e que compreende a dor, o desconforto, a energia, a fadiga, o sono e o repouso, é o que mais influencia a qualidade de vida do sujeito submetido à hemodiálise. A qualidade de vida geral obteve valor mínimo 50,0, valor máximo 87,5 e valor médio 56,0.

Discussão

O modo como cada paciente vive e se relaciona com a doença renal crônica depende de vários fatores como o perfil psicológico, as condições ambientais e sociais e o apoio familiar, sendo por isso, visto de forma única e pessoal (PEREIRA et al, 2003).
A forma de enfrentamento da doença é influenciada pelas percepções da qualidade de vida de cada indivíduo: as positivas estão mais relacionadas a estratégias racionais, como traçar uma meta ou conhecer mais sobre a doença, enquanto as negativas relacionam-se a estratégias evitativas, como negação da doença, agindo como se ela não existisse (PEREIRA et al, 2003).
A média de idade do presente estudo está em concordância com estudo de Martins et al. (2003), o qual teve amostras com a média de idade de 53,1 anos, variando entre 18 e 81 anos.
Quanto ao sexo, esse estudo apresentou predominância do sexo feminino, dado esse que corrobora com estudos de CHEPP (2006), no qual foi encontrada prevalência do sexo feminino (60,6%), em relação ao masculino (39,4%).
Observando-se o grau de instrução desses pacientes, verificou-se que estudos de Bittencourt et al. (2004) encontraram resultados semelhantes aos nossos ao estudar uma população de transplantados renais, onde 40,4% dos pacientes possuíam 1º grau incompleto, que corresponde hoje ao ensino fundamental incompleto. Um outro estudo realizado por Abreu (2005), buscando avaliar a qualidade de vida de pacientes em hemodiálise no Paraná, mostra que 69% possuíam nível fundamental incompleto.
Em relação à situação conjugal, observou-se a prevalência de pacientes solteiros entre a população estudada, dados estes que estão em discordância com os achados de Bittencourt (2003), quando constatou ao trabalhar com pacientes renais, que 580 (58%) se declaravam em união estável seguidos de 390 (39%) solteiros. O mesmo ocorreu com a pesquisa realizada por Silva (2003) onde 13 (61,9%) eram casados e 8 (31,8%) solteiros.
Quanto à variável ocupação, a maioria da população declarou-se como catego¬ria aposentada, assim como, do lar, sendo visto esta expectativa laboral em estudo de Martins et al. (2003), no qual foi verificado que 52,8% dos pacientes estão inativos (aposentadoria ou licença-saúde); situação esta, que, segundo os autores, dete¬riora os aspectos físicos desses pacientes quando suas atividades laborais são reprimidas. Neste sentido, deve-se ressaltar que, no proces¬so de adoecer, algumas pessoas manifestam ser mais confortável e menos comprometedor atribuir a outras pessoas a capacidade de lhes promover a saúde, as¬sim, os renais crônicos permitem esta dinâmica psico¬lógica, em que o diagnóstico se torna sinônimo de in¬capacidade, interrompendo seus trabalhos ou mesmo a busca para melhorar suas condições de vida (DINIZ, 2007).
Quanto à qualidade de vida, esse estudo apresentou o domínio social com valor mínimo, dado esse que não corrobora com estudos de HIGA et al. (2008), que mostram o domínio físico com valor mínimo (25). O mesmo foi observado para o valor médio, que no presente estudo, foi o domínio social e em estudos de HIGA et al. (2008), correspondeu ao domínio psicológico (76,4). Com relação ao valor máximo existe uma concordância entre esse estudo e o de HIGA et al. (2008), que apresentaram os domínios psicológico e social (100) com valor máximo.
Com relação ao valor médio da qualidade de vida, esse estudo corrobora com os estudos de HIGA et al. que demonstraram o domínio físico com o menor valor médio, sendo, portanto, o que mais influencia a qualidade de vida do sujeito submetido à hemodiálise.

Considerações finais

Observou-se que os pacientes em hemodiálise apresentaram valores médios acima de 60 em todos os domínios do WHOQOL-bref. No entanto, os melhores resultados foram nos domínios social e psicológico (médias: 75,0 e 72,5, respectivamente).
A maioria dos sujeitos encara o tratamento como uma modalidade dolorosa, sofrida, angustiante, com limitações físicas, sociais e nutricionais, dificultando, muitas vezes, a interação paciente-sociedade-familia. Consideram-se vulneráveis à morte, diariamente, sendo os riscos numerosos, desde a periodicidade da condução aos centros de hemodiálise até o decorrer das sessões.
Verificou-se, a partir disto, que o domínio que mais influencia na qualidade de vida é o domínio físico, o que obteve menor pontuação média (60,0).

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