ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BENS IMÓVEIS: O IMPACTO DA AUSÊNCIA DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA PARA O FINANCIAMENTO DE IMÓVEIS NO BAIRRO TEOTÔNIO VILELA, ILHÉUS/BA

FIDUCIARY SALE OF REAL ESTATE: THE IMPACT OF THE LACK OF LAND REGULARIZATION FOR PROPERTY FINANCING IN THE TEOTÔNIO VILELA NEIGHBORHOOD, ILHÉUS/BA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411181849


Alisson Conceição Santos1
Orientador: Me. Jackson Novaes Santos2
Coorientadora: Ittana de Oliveira Lins3


RESUMO

O bairro Teotônio Vilela em Ilhéus/Bahia, possui uma trajetória marcada por significativas transformações sociais e econômicas. Inicialmente rural, a área foi habitada no início da década de 1980, impulsionada por um influxo migratório resultante da crise do cacau. Essa migração gerou uma ocupação irregular e um contexto de favelização, onde o acesso à moradia digna e às políticas habitacionais, até então, não foram alcançadas. Apesar das mudanças significativas nas infraestruturas e da ampliação urbana nos últimos anos, a informalidade fundiária persiste. A regularização fundiária urbana (REURB) é apresentada como uma solução para garantir direitos à propriedade, moradia e inclusão social da e para efetivar a promoção de um ambiente mais justo e inclusivo, viabilizando, nesse contexto, acesso ao mercado imobiliário para garantir uma maior possibilidade de venda e a inclusão de direito à propriedade, na compra. A falta de regularização fundiária ocasiona entraves na vida da população e lesa seus direitos fundamentais, pois tendo apenas a posse do bem, impede que os cidadãos obtêm o direito pleno da propriedade, sendo: o uso, gozo e o dispor e reaver do bem. Este estudo tem o objetivo de discutir a situação jurídica do bairro e sinalizar a forma mais adequada para legitimar os imóveis desses ocupantes, mediante a análise na matrícula matriz do Teotônio Viela, registrada em Cartório, e em documentações e normativos da Prefeitura Municipal de Ilhéus.

Palavras-chave: Regularização Fundiária. Alienação Fiduciária de Bens Imóveis. Teotônio Vilela, Ilhéus-BA.

ABSTRACT

The Teotônio Vilela neighborhood in Ilhéus, Bahia, has a history marked by significant social and economic transformations. Initially rural, the area was inhabited in the early 1980s, driven by a migratory influx resulting from the cocoa crisis. This migration led to irregular occupation and a context of slums, where access to decent housing and housing policies had not been achieved until then. Despite significant changes in infrastructure and urban expansion in recent years, land informality persists. Urban land regularization (REURB) is presented as a solution to guarantee rights to property, housing and social inclusion and to effectively promote a fairer and more inclusive environment, enabling, in this context, access to the real estate market to guarantee a greater possibility of sale and the inclusion of property rights in purchases. The lack of land regularization causes obstacles in the lives of the population and violates their fundamental rights, since having only possession of the property prevents citizens from obtaining full property rights, namely: use, enjoyment, disposal and recovery of the property. This study aims to discuss the legal situation of the neighborhood and indicate the most appropriate way to legitimize the properties of these occupants, through the analysis of the main registration of Teotônio Viela, registered in the Notary’s Office, and in documentation and regulations of the Municipal Government of Ilhéus.

Keywords: Land Regularization. Fiduciary Assignment of Real Estate. Teotônio Vilela, Ilhéus-BA.

1 INTRODUÇÃO

O bairro Teotônio Vilela, em Ilhéus/Bahia, de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Desenvolvimento (IBGE), é considerado o mais populoso da cidade, contudo, a informalidade, no que diz respeito à regularização dos imóveis, é algo que deve ser observada, pois trará a segurança jurídica devida a toda população e a instituição de um ambiente mais justo e inclusivo, considerando os direitos basilares da Constituição Federal, sendo: o direito à moradia, propriedade e a dignidade da pessoa humana.

Ante o exposto, discute-se, como a falta da regularização fundiária gera entraves jurídicos para o financiamento de imóveis no bairro Teotônio Vilela, e, em decorrência disso, fere os princípios básicos da Constituição Federal?

A falta de regularização fundiária no bairro pode resultar em obstáculos no financiamento imobiliário, haja vista que, em conformidade com a lei nº 9.514/97, para a obtenção deste tipo de garantia real, o imóvel deve ter a matrícula imobiliária, registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente. Diante dessa insegurança, a população deixar de utilizar este instituto para o seu benefício.

Assim, o objetivo geral desta pesquisa foi identificar os entraves jurídicos que podem está impedindo os registros dos imóveis no bairro e, como consequência disso, inviabilizando o financiamento imobiliário. No que diz respeito aos objetivos específicos, foram observadas as seguintes premissas: I) Analisar a matrícula imobiliária originária do bairro Teotônio Vilela, emitida pelo Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Pessoa Jurídica de Ilhéus-BA; II) Verificar os documentos e normativos da Prefeitura Municipal; e III) Cruzar e comparar os dados coletados visando uma solução para a problemática do bairro.

Diante disso, vale enfatizar que este estudo é de suma importância para fornecer dados concretos a fim entender a problemática jurídica do bairro e embasar propostas de políticas públicas eficazes para solucionar a sua irregularidade. Poderá ser utilizada de fundamento para próximas pesquisas sobre o tema, garantindo um olhar mais detalhado sob os desafios encarados pelos moradores.

Logo, é notório que a inclusão social dessa população é imprescindível, haja vista que irá incluí-los no mercado imobiliário no sentido de: promover uma maior possibilidade de venda, porque quem não pode comprar um imóvel à vista comprará parcelado; possibilite que dê o imóvel em garantia para realizar empréstimo para reformá-lo; e obter subsídio para financiamento de imóveis, nos moldes da lei nº 14.620/23.

2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Contexto histórico do bairro Teotônio Vilela

Localizado em Ilhéus/Bahia, O bairro Teotônio Vilela tem uma história marcada por transformações ao decorrer do tempo. Inicialmente, a região era predominantemente rural, mas com o passar dos anos e com o avanço da urbanização, o bairro passou por um processo de crescimento e desenvolvimento. Segundo Moreira (2011, p. 22), o bairro foi constituído por cerca dos anos 80, por consequência da migração. Por seu turno, Moreira e Pinto (2022, p. 10,11), relatam que essa área é a consequência de uma ocupação irregular da população de baixa renda, ocorrida no final da década de 70.

Desse modo, frisa-se que a migração, ocorrida entre o final dos anos 70 e o início dos anos 80, aconteceu em decorrência de uma série de fatores econômicos que afetaram diretamente a vida dos trabalhadores e suas comunidades. Consoante com Gonçalves (2016, p. 41), a crise provocada pela queda do preço do cacau no mercado europeu, que se intensificou durante a década de 80, gerou um impacto significativo na renda das famílias dependentes dessa produção, além da competitividade crescente que a região enfrentava dos países africanos produtores de cacau tornou ainda mais desafiadora a manutenção das atividades locais. Diante desse cenário, muitos indivíduos e famílias se viram forçados a procurar novas oportunidades em outras localidades, buscando alternativas que garantissem a subsistência e a melhoria das condições de vida. Gonçalves, em seu estudo, menciona que

[…] em 1980 a cidade contabilizava 82.112 habitantes. Em 2004, a população urbana praticamente dobrou, chegando a 161.898 mil habitantes. Esse crescimento se deve, também, ao êxodo rural dentro de municípios da região cacaueira. [….] A formação do bairro Teotônio Vilela pode ser entendida pela relação que existe entre a migração interurbana e pela valorização territorial no centro urbano da cidade. (Gonçalves, 2016, p. 44, 46)

Moreira, por seu lado, relatou que o bairro

Tratava-se de um espaço totalmente segregado, um lugar em que predominava a favelização generalizada, onde a urbanização se deu na sua forma mais perversa, ou seja, a urbanização sem urbanidade, aqui entendida como a impossibilidade da maioria dos trabalhadores em se apropriar de condições adequadas de sobrevivência (Moreira, 2011, p.25,26).

Durante os últimos anos, o bairro sofreu modificações significantes relacionadas à expansão da área urbana, ao desenvolvimento de novos investimentos comerciais e residenciais e ao fortalecimento de uma variedade de infraestruturas básicas, como a criação de escolas, postos de saúde e estabelecimentos de outras finalidades, em concordância com os dados de coordenadas por endereço do IBGE (2022). Portanto, o Teotônio Vilela representa não só um campo histórico que segue transformados de acordo com a evolução contínua populacional, mas também um aspecto vital associado à falta de políticas públicas efetivas de regularização fundiária.

Ressalta-se que, segundo o IBGE (2022), o bairro possui 17.221 habitantes, digo, é considerado o mais populoso da Cidade de Ilhéus e consequentemente é uma área bastante afetada pela informalidade fundiária que lesa o exercício pleno dos direitos fundamentais à moradia, propriedade e dignidade da pessoa humana. Contudo, percebe-se que toda a problemática que a população enfrenta atualmente é resultado de ações pretéritas. Moreira explana que

Aparentemente as características do Teotônio Vilela remetem a um espaço de ocupação espontânea. Mas, não é isso que se trata, pois, o bairro foi planejado. Os problemas urbanos enfrentados por seus moradores são frutos da negligência do poder público e não da ausência de Planejamento. De acordo com o Coordenador de Projetos da Secretaria de Planejamento e Infraestrutura da Prefeitura Municipal de Ilhéus, Dr. Paulo Machado, nos anos 1980, já havia uma crise habitacional na cidade. No intuito de solucionar o problema o poder público municipal desapropriou uma antiga fazenda localizada na zona oeste da cidade, dividiu a área em pequenos lotes, cadastrou dezenas de famílias carentes e posteriormente distribuiu os lotes à população carente (Moreira, 2011, p.26).

Portanto, a distribuição desses lotes ocorreu sem observar os princípios básicos da Constituição Federal da República, haja vista que o direito à moradia visa garantir a todas as pessoas o acesso a condições dignas de habitação (Brasil, 1988).

2.2 Regularização Fundiária

Elencada no art.6º da Carta Magna, a moradia é um direito social, necessário para que o indivíduo viva em plena dignidade. Entretanto, para garantir esse direito, o poder público deve assegurar a sua efetividade. Para Andrade (2006, p.30), o Estado deve atuar de forma positiva, porém não só reconhecendo o direito à moradia, mas sim, criando políticas públicas habitacionais efetivas.

Conforme alude Paiva et al (2019, p. 25), o direito à moradia tem um aspecto social. Já o direito à propriedade tem um aspecto individual, mas ambos estão correlacionados, porque não sendo proprietário, o indivíduo não poderá gozar, usufruir, dispor e reaver da coisa. Na realidade, o direito à moradia é além de só ceder o imóvel ou deixar que o ocupe, mas, é a garantia da legitimação que por fim converterá o ocupante em proprietário, e, em vista disso, incidirá na promoção de um ambiente urbano mais justo e inclusivo.

Por seu lado, a regularização fundiária “consiste em regularizar a posse dos habitantes e promover a urbanização do local sem recorrer à remoção da população” (Gonçalves, 2009, p. 238). Ou seja, é importante para a efetivação do direito fundamental da dignidade da pessoa humana, moradia e propriedade, uma vez que contribui para a segurança jurídica dos moradores e no avanço da inclusão social naquela região, sem precisar removê-los das suas atuais moradias.

No contexto do bairro Teotônio Vilela, trata-se da solução para os obstáculos que da irregularidade ocasiona. Como aponta Paiva et al (2019, p. 253), pode-se entender que a regularização fundiária é o remédio para a cura de uma doença (que seria a irregularidade), considerando que torna o que é irregular em regular. Ainda, Paiva et al (2019, p.253), afirma que a regularização é o medicamento necessário para uma enfermidade em grau já avançado. Pode-se dizer que é instrumento legalizador, o qual remedia os entraves jurídicos, tendo em vista que o bairro é uma região consolidada (existente desde os anos 80) com áreas urbanizadas e edificadas, mas, que a informalidade fundiária assola.

O poder público tem um papel importante para a realização da regularização fundiária na região estudada, pois, conforme Brasil (2001), no estatuto da cidade, a administração pública tem o objetivo de garantir que as funções sociais sejam plenamente desenvolvidas, como: a regularização fundiária e a urbanização de áreas ocupadas por populações de baixa renda. Essa diretriz é primordial, porquanto propõe o estabelecimento de normas especiais e planejamento para que levam em consideração tanto a situação socioeconômica das comunidades quanto ambientais.

2.2.1 Concessão de uso especial para fins de moradia – CUEM

A concessão de uso especial para fins de moradia (CUEM) representa uma ferramenta crucial disponível ao poder público para regularizar a posse de ocupantes de imóveis situados em áreas dominicais (públicas). Rosenvald (2015), esclarece que a CUEM é um contrato de direito público que possibilita ao Estado conceder a indivíduos o direito de utilização de um bem público. Vale destacar, ainda, que “[…] tais direitos reais referem-se a áreas públicas, geralmente invadidas e urbanizadas por favelas.” (Silva, 2018, p. 1234). Essa medida é especialmente importante, pois, segundo Brasil (1988) a usucapião não pode ser aplicada a bens públicos. A principal finalidade da CUEM é garantir o direito à moradia, uma vez que o instrumento de registro não confere a propriedade, mas assegura a posse do ocupante sobre o imóvel.

Para que uma pessoa se beneficie desse instituto, há requisitos específicos estabelecidos pela Medida Provisória nº 2.220 de 2001. Portanto, serão apreciados: 

Art. 1o. Aquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área com características e finalidade urbanas, e que o utilize para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. (Brasil, 2001, n.p)

O título de concessão é emitido “perante o órgão competente da Administração Pública ou, em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial” (Brasil, 2001). O direcionamento à via judicial permite que a avaliação judicial reconsidere a situação do possuidor, garantindo uma nova oportunidade para que os requisitos sejam verificados de maneira justa.

Portanto, a CUEM é um direito real, constante na lei nº 10.406/2002, no artigo 1.225, resolúvel, ou seja, o concessionário tem a posse direta e a administração pública, a posse indireta, haja vista que se o ocupante descumprir com as exigências estipuladas em norma, a posse direta retorna ao poder público. As possibilidades, estipulada na Medida Provisória nº 2.220, em que morador pode perder a concessão são as seguintes: Se o concessionário destinar o imóvel a uma finalidade diferente da moradia, seja para ele ou para sua família, ou se adquirir a propriedade ou a concessão de uso de outro imóvel, seja urbano ou rural.

Diante desse contexto, Rosenvald (2015) destaca que essa modalidade de legitimação da posse oferece aos titulares do direito de moradia a possibilidade de acessar o financiamento imobiliário. O autor também enfatiza que isso é especialmente relevante, uma vez que a caução real não incide sobre o direito de propriedade em si, mas sim sobre uma situação possessória que foi devidamente regularizada e formalizada por meio de contrato administrativo ou decisão judicial. Assim, em casos de inadimplência por parte do devedor, o credor poderá consolidar apenas o direito possessório, sublinhando a natureza específica da CUEM, na qual não se discute o direito de propriedade, mas sim a segurança da posse e o acesso à moradia.

Nesse sentido, alguns autores tratam desse instituto jurídica como obsoleto, pois

Sem desmerecer a sua importância, a consagração dessa modalidade de direito real, em nosso sentir, não alcançou o resultado social esperado, na medida em que o problema de fundo no âmbito da política governamental de habitação, no Brasil, exige medidas mais amplas e efetivas, de cunho programático e geral. (Pamplona Filho e Gagliano, 2022, n.p).

Considerando a existência de novas legislações efetivas de regularização fundiária, é notório que a CUEM passa ser menos utilizada, tendo em conta que a Lei nº 13.465/17, que diz respeito da Regularização Fundiária Urbana (REURB), traz formas mais inclusivas e completas de regularização de imóveis incluídos em ambientes informais.

2.2.2 Regularização Fundiária Urbana – REURB

Por sua vez, a Regularização Fundiária Urbana (REURB), de acordo com Paiva et al (2019, p.49) é um processo fundamental que abrange a adoção de diversas medidas jurídicas, ambientais, urbanísticas e sociais, com o objetivo de harmonizar a titularidade fática e jurídica de um imóvel pertencente a um núcleo informal, localizado em áreas urbanas ou rurais do município. Essa regularização busca promover a inclusão social, garantindo que os ocupantes de áreas informais possam ter acesso à propriedade de forma legal.

Os objetivos da REURB, conforme estabelecido no artigo 9º da Lei 13.465/2017, incluem:

Criar unidades imobiliárias compatíveis com o ordenamento territorial urbano e constituir sobre elas direitos reais em favor dos seus ocupantes; Ampliar o acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, priorizando a permanência dos ocupantes nos próprios núcleos urbanos informais que são regularizados; Promover a integração social e a geração de emprego e renda, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida nas comunidades; Estimular a resolução extrajudicial de conflitos, reforçando a consensualidade e a cooperação entre o Estado e a sociedade civil; Garantir o direito social à moradia digna e assegurar condições de vida adequadas para todos os cidadãos; Assegurar a efetivação da função social da propriedade, respeitando a função social da cidade e promovendo o bem-estar de seus habitantes; Concretizar o princípio constitucional da eficiência na ocupação e no uso do solo, promovendo um desenvolvimento urbano sustentável; Prevenir e desestimular a formação de novos núcleos urbanos informais, evitando a reiteração de problemas habitacionais; Conceder direitos reais preferencialmente em nome da mulher, promovendo a igualdade de gênero no acesso à propriedade; Garantir a participação dos interessados nas diferentes etapas do processo de regularização fundiária, assegurando transparência e envolvimento comunitário.(Brasil, 2017, n.p).

Assim, para que um imóvel possa ser regularizado sob a REURB, deve atender a certos requisitos. Um dos principais critérios, de acordo com Brasil (2017), é que a propriedade esteja sob a posse de alguém que detiver em área pública ou que possua, como sua, uma unidade imobiliária com destinação urbana, pertencente a um núcleo urbano informal consolidado que exista desde 22 de dezembro de 2016.

Vale salientar que há duas modalidades de regularização fundiária: a regularização fundiária de interesse social (REURB-S) e a regularização fundiária de interesse específico (REURB-E). De acordo com Paiva et al (2019, p.52), a REURB-S é a modalidade que regularização fundiária que é voltada à população de baixa renda, desde que reconhecido pelo poder executivo municipal. Essa modalidade também possibilita a isenção de custas e emolumentos, como é visto no art. 13, § 1º da lei nº 13.465/2017, facilitando ainda mais o acesso à regularização para as camadas mais vulneráveis da população. Segundo Bahia (2024), para ser beneficiado por essa modalidade o beneficiário não poderá ter um salário superior a 5 salários mínimos vigente no país. Por outro lado, para Silva (2018, p. 1126), a REURB-E é a modalidade destinada aos demais núcleos informais que não se enquadram nos critérios da REURB-S.

Por sua parte, Cunha (2019, p. 41) narra que a instauração da REURB ocorrerá após a apresentação do requerimento, por parte dos legitimados, para o Município ou na própria decisão do ente público municipal que subsequentemente iniciará o processamento. Entende-se como legitimados para requerer a REURB, em conformidade com a Lei nº 13.465, art. 14:

[…] a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, diretamente ou por meio de entidades da administração pública indireta; os seus beneficiários, individual ou coletivamente, diretamente ou por meio de cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público ou outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de desenvolvimento urbano ou regularização fundiária urbana; os proprietários de imóveis ou de terrenos, loteadores ou incorporadores; a Defensoria Pública, em nome dos beneficiários hipossuficientes; e o Ministério Público. (Brasil, 2017, n.p).

O processamento da REURB é voltado de trabalhos técnicos que envolve, conforme Brasil (2017), desde demarcações urbanística, estudo técnico, notificação dos proprietários e/ou confrontantes, levantamento planimétricos e memoriais descritivos que, em seguida, após ser aprovado pelo Município, a documentação será devidamente apresentada ao Cartório de Registro de Imóveis para análise e, estando apto, registrar-se-á. Vale evidenciar, ainda, que de acordo com Bahia (2024), os imóveis em que os ocupantes tenham registrado anteriormente os títulos da concessão de uso especial para fins de moradia, a REURB poderá converter a posse em propriedade e, nesse sentido, será expedido um título hábil para o registro no Cartório competente.

Após o registro do parcelamento do solo e da titulação final na matrícula matriz, conforme o art. 1.231, § único, do Provimento Conjunto n. º CGJ/CCI 04/2024, o Oficial de Registro de Imóveis dará seguimento ao processo, procedendo à abertura de matrículas individualizadas para cada uma das unidades imobiliárias. Essas matrículas serão registradas em nome dos beneficiários finais, garantindo que cada proprietário tenha sua propriedade formalmente reconhecida e identificada com todos os direitos relacionados. Além disso, a individualização das matrículas possibilita que os proprietários realizem operações formalmente reconhecidas como a venda, financiamento e alteração na utilização dos imóveis com maior facilidade e segurança jurídica.

2.2.3 Alienação Fiduciária de Bens Imóveis como Promoção ao Direito à Propriedade e Inclusão ao Mercado Imobiliário

A alienação fiduciária de bens imóveis é o instituto ao qual popularmente chamamos de financiamento imobiliário. As partes desse instituto são: o fiduciante (devedor) e o fiduciário (credor). Portanto, ao adquirir um imóvel mediante um financiamento imobiliário, o fiduciante e o fiduciário terão a propriedade resolúvel que “[..] constitui aquela que pode ser extinta quer pelo advento de condição (evento futuro e incerto) ou pelo termo (evento futuro e certo), quer pela superveniência de uma causa capaz de destruir a relação jurídica” (Silva, 2018, p. 1058), isso significa que o fiduciante após quitar a dívida se torna o proprietário pleno do bem, ou em caso de inadimplência, o fiduciário pode consolidar a propriedade em seu nome, nos moldes do art. 26 da lei 9.514/97.

Nesse contexto, a alienação fiduciária permitirá que o cidadão: dê o imóvel em garantia, por exemplo, para reformar/construir sua casa; aumente a possibilidade da venda, porque quem não podia comprar um imóvel à vista poderá comprar parcelado; ou utilize de programas habitacionais de financiamento, como subsídios do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), para viabilizar as formas de pagamento às pessoas que possuem baixa renda. A Lei 14.620/23 aborda o tema das subvenções econômicas, com o propósito de complementar os recursos necessários para garantir o equilíbrio econômico-financeiro das operações efetuadas por instituições ou agentes financeiros, no âmbito do PMCMV.

De acordo com as diretrizes da Caixa Econômica Federal (CEF), para o financiamento imobiliário existem algumas exigências básicas que deverão ser observadas para a aprovação, sendo: O solicitante ter mais de dezoito anos ou dezesseis, caso emancipado; ser brasileiro ou estrangeiro, com o visto permanente; capacidade civil financeira; e não está inscrito no Serviços de Assessoria S.A. (SERASA); e que o valor da prestação mensal não ultrapasse a 30% da renda familiar bruta.

Ainda, poderá ser utilizado os recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), desde que: o solicitante não seja proprietário, cessionário ou ter direitos sobre outro imóvel residencial urbano, não tenha outro financiamento em vigor nos moldes do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e que o imóvel financiado seja destinado à moradia.

Segundo Brasil (2023), o PMCMV somente atenderá as seguintes faixas: Faixa Urbano 1: renda bruta familiar mensal até R$ 2.850,00; Faixa Urbano 2: renda bruta familiar mensal de R$ 2.850,01 a R$ 4.700,00 e; faixa Urbano 3: renda bruta familiar mensal de R$ 4.700,01 a R$ 8.000,00. Essa medida tem o objetivo de assistir a cada classe social na medida da sua necessidade econômica.

Outrossim, vale deixar claro que o financiamento imobiliário “Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título” (Brasil, 1997, n.p). Nota-se que crédito imobiliário é condicionado ao registro do contrato da garantia fiduciária, no Cartório de Registro de Imóveis, onde o Oficial dará publicidade ao ato registrando o gravame na matrícula do imóvel dado em garantia. 

Por essa razão que toda problemática da irregularidade fundiária frusta a contratação da garantia real, tendo em vista que a matrícula imobiliária é um requisito para aprovação do contrato. Essa medida fará com que o negócio jurídico tenha segurança tanto para o fiduciário, quanto para o fiduciante, pois trará segurança para a instituição bancária que o pagamento será efetivado e, para o devedor, nos termos do art.960 do provimento conjunto n. º CGJ/CCI 04/2024, ao quitar a dívida receberá o termo de quitação o qual será averbado na matrícula do imóvel (Bahia, 2024), e por fim, tornando-o proprietário pleno do bem.

3 METODOLOGIA

Os dados desta pesquisa foram obtidos através de análise da matrícula imobiliária matriz do Teotônio Vilela, arquivada no Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Ilhéus; e por documentações e normativos da Prefeitura Municipal de Ilhéus.

Sendo assim, este estudo tem a natureza documental, que pode ser considerada como “a fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias.” (Marconi; Lakatos, 2003, p. 174).

Os resultados serão apresentados por meio de uma pesquisa qualiquantitativa, tendo em vista que foi utilizada das duas abordagens para apontar uma análise mais ampla sobre a regularização fundiária e a existência da obtenção de imóveis através do financiamento imobiliário na região em questão. Segundo, Gil (2002, p. 134) As pesquisas qualitativas tem um aspecto narrativo, enquanto a quantitativa, na sua maior parte, necessita de organizações em tabelas.

Para tanto, foi solicitado ao Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Ilhéus-BA a autorização do acesso (anexo 1) das informações relacionada ao bairro, responsabilizando-me com a manipulação destas, conforme a lei de proteção de dados (LGPD).

A expectativa foi descobrir os diferentes modos de aquisição da propriedade ou posse dos imóveis, identificando a situação jurídica em que a matrícula se encontra, no sentido da regularização fundiária.

A primeira etapa consistiu no levantamento da documentação necessárias para o estudo e, posteriormente, na segunda e última etapa, necessitou-se de visitas no Cartório e na Prefeitura para a realização das análises e coleta das documentações, registros e informações públicas.

A pesquisa foi delimitada na região originária do bairro, onde tem uma extensão consideravelmente ampla, haja vista que o bairro surgiu de uma área pública, mas, atualmente, é constituído por outras áreas que são particulares e invadidas em razão da expansão desordenada do bairro em localizações em que devem ser observadas a sua dominialidade. A partir desse entendimento, foi possível discutir não apenas as formas de aquisições das posses, mas também o motivo dos imóveis estarem irregulares.

A análise dos dados coletados teve como objetivo responder à problemática central da pesquisa: como a falta da regularização fundiária gera entraves jurídicos para o financiamento de imóveis no bairro Teotônio Vilela, e, em decorrência disso, fere os princípios básicos da Constituição Federal?

Em última análise, os objetivos do trabalho estavam relacionados à busca de um conhecimento que pudesse contribuir para a formulação de políticas públicas e estratégias de regularização fundiária efetiva para a região estudada. Assim, essa pesquisa não só trará à luz os aspectos jurídicos relacionados à matrícula imobiliária, mas também proporcionará uma reflexão sobre as implicações sociais da propriedade no bairro.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 Regularização Fundiária e a matrícula imobiliária do bairro Teotônio Vilela

De acordo com a matrícula imobiliária de número 16.995, registrada em 1994, referente ao bairro Teotônio Vilela, este local foi formado a partir de uma área total de 78 hectares, 31 ares e 1 centiare, resultante da desapropriação de três propriedades denominadas “Graças”, “Todos os Santos” e “Rancho Alegre”. As terras foram desapropriadas do domínio de particulares pelo Estado da Bahia e, subsequentemente, transferidas ao município de Ilhéus.

A matrícula imobiliária apresenta, até o momento da pesquisa, 388 atos, sendo o primeiro, o registro a titulação do Município e as 387, as averbações de encerramento parcial de matrícula, realizadas em função das aberturas de matrículas autônomas. O procedimento de averbação de encerramento parcial de matrícula é exigido pela legislação vigente e, segundo expõe Helena (2002), é essencial em casos de desdobro ou desmembramento de uma área maior. Assim, desde a constituição legal do bairro, em 1994, até 2019, foram registrados apenas 469 imóveis na área pesquisada, frutos do destacamento da região originária. Essa situação decorreu da legitimação das posses pela Prefeitura, uma vez que os imóveis são de propriedade pública e, portanto, não podem ser comercializados, exceto se forem desafetados, ou adquiridos por meio de usucapião, conforme estipulado pela Constituição Federal.

Adicionalmente, em relação à edificação dos imóveis (figura 01), um aspecto relevante identificado é que, dos 469 imóveis registrados, 113 estão descritos como residências edificadas, enquanto 356 são classificados apenas como lotes de terreno. Isso indica que, do ponto de vista legal, muitas edificações não possuem o reconhecimento formal adequado, o que pode resultar em complicações futuras quanto às benfeitorias e na possibilidade de financiamento ou venda.

Figura 01 – Edificação dos imóveis na região estudada

            Fonte: Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Ilhéus (2024)

Além disso, ao analisar a questão do financiamento dos imóveis, observou-se que 21 imóveis foram adquiridos por meio da Alienação Fiduciária (figura 02). Importante destacar que, dentre esses imóveis fiduciários, nenhum foi financiado sem que a edificação estivesse presente, evidenciando uma tendência de que o mercado financeiro considere a construção como um requisito para a segurança do negócio jurídico.

Figura 02 – Imóveis financiados na região estudada

Fonte: Registro de imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Ilhéus (2024).

No que se refere ao procedimento cartorário, ao analisar as matrículas autônomas, verificou-se que para o registro do título de legitimação de posse e para as averbações, há custos associados as taxas cartorárias. Essas taxas variam de acordo a avaliação do imóvel para o registro do título e em função do valor da construção para a averbação da edificação. A norma estabelece que, para a averbação da construção, é considerado o fator da metragem quadrada da edificação, o que pode impactar diretamente nos custos para os moradores. A norma estipula que:

Será considerado como parâmetro objetivo para averbação de construção o índice estabelecido pelo SINAPI (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil) do metro quadrado da construção, divulgado pelo IBGE. Para efeito do cálculo do DAJE incidente da averbação, será considerado o Custo Médio do m², do Estado da Bahia, vigente na data da prenotação do requerimento, nas categorias residencial ou comercial, conforme o caso.  (Bahia, 2024, n.p)

Já o registro do título será calculado com base no “valor econômico” do imóvel, em concordância com item I da Tabela de Custas do TJBA e em conformidade com o Art. 785-A do Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registro do Estado da Bahia (CNPBA). Uma vez que, para fins de cálculo do emolumento, será considerado o valor declarado pela parte, todavia, se for irrisório, o Oficial de Registrador poderá impugnar o valor declarado mediante uma nota devolutiva, demonstrando a necessidade da apresentação do valor real de mercado ou de negócio.

No Estado da Bahia, as custas são recolhidas por meio do Documento de Arrecadação Judicial e Extrajudicial (DAJE), que são calculados conforme a tabela de custas do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) (anexo 2), onde, por exemplo, se imóvel foi avaliado em 60 mil, o possuidor pagará um DAJE no valor R$ 840,32 (oitocentos e quarenta reais e trinta e dois centavos) para o registro do título, e, se for o caso, o valor tabelado, da mesma forma, da averbação da construção, de acordo o valor estabelecido. Considerando a origem do bairro, questiona-se, essas custas são acessíveis para todos os moradores que ocupam a região estudada?

No que diz respeito aos aspectos jurídicos observados, é importante destacar que foram utilizados dois institutos de legitimação das posses: a) Aforamento e b) Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM). O aforamento, que é um instituto de natureza jurídica que conferia ao possuidor um direito de uso e gozo sobre o imóvel, foi revogado pela Lei nº 10.406, que trata do novo Código Civil brasileiro. Com a revogação do aforamento, a CUEM se destaca como a principal alternativa atualmente disponível, permitindo que ocupantes legitimem suas posses lhe dando segura jurídica.

Além disso, observou-se que o último registro de legitimação de posse foi datado de 2019. Nesse mesmo ano o Cartório de Registro de Imóveis desta Comarca enviou à Prefeitura Municipal de Ilhéus o ofício de nº 295/2019(anexo 3),que também pode ser visto no mural setor de patrimônio da Prefeitura. Este documento ressaltou uma importante diretriz estabelecida após a visita do Juiz Corregedor: os registros que envolvem desmembramentos de propriedades só podem ocorrer mediante a apresentação de planta da área destacada e da área total. Essa exigência visa garantir a regularidade da área remanescente e a conformidade com o Código de Normas atual.

Devido a isso, verificou-se que, para cada abertura de matrícula autônoma não foi informada a área remanescente na matrícula matriz, consoante com o Código de Normas da Bahia:

Para regularização de glebas urbanas, nos casos de áreas que sofreram desmembramento ou sucessivos desmembramentos sem que fossem devidamente indicados os remanescentes, deverá ser feito o procedimento de apuração de remanescente adotando o mesmo procedimento do artigo 213, II da Lei Federal n. 6.015/1973, e o quanto previsto neste Código de Normas para retificação administrativa de área, com inclusão e alteração de medidas e confrontantes. (Bahia, 2024, n.p).

Destarte, isso impede que a Serventia Extrajudicial prossiga com os registros dos títulos de legitimação de posse, o que, por sua vez, inviabiliza o exercício de um direito fundamental para os habitantes dessa área.

Em virtude do que foi visto, observa-se que a falta de regularização gera diversos entraves para a população, ocasionado fatores jurídicos, ambientais e urbanísticos que precisam de uma certa atenção. Portanto, é fato que essa situação deve ser sanada para garantir a esta população a devida segurança jurídica e um ambiente justo.

4.2 Planejamento e Regularização Fundiária no município de Ilhéus

Na Bahia, a corregedoria das comarcas do interior (CCI) estabeleceu o projeto chamado: “Área Legal”, que “objetiva proporcionar orientação aos municípios interessados em realizar a regularização fundiária urbana, ordenando núcleos informais existentes nas localidades, através de Termo de Cooperação Técnica” (TJ-BA, 2019, n.p). Em sua análise, Cardozo (2019, p.75) verificou que, na maior parte, o requerimento para a participação do projeto teve contrapartida pelos os Oficiais de Registos, ainda que esse requerimento poderia ser feito pelos gestores municipais, associações ou organizações em que tem o objetivo a atividade nas áreas de habitação social.

Ilhéus, até o momento, não faz parte desse projeto, todavia, pôde ser visto que o bairro Nossa Senhora da Vitória foi agraciado com a Regularização Fundiária Urbana de Interesse Social (REURB-S), em 2020, sendo um marco importante na promoção da cidadania e na garantia de direitos aos seus moradores.

O processo teve início a partir de um requerimento feito à Prefeitura pela Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER) (anexo 4), o qual foi aceito, resultando na instauração do procedimento de regularização. Esse esforço culminou na legitimação fundiária de 352 lotes (anexo 5), conferindo titulação de propriedade aos ocupantes da área, o que representa um avanço significativo na segurança jurídica dos moradores.

Dentre os beneficiários da REURB-S, destaca-se que esses tiveram suas matrículas individualizadas e devidamente regularizas, onde constam desde a perfeita descrição do imóvel até o registro do título de transmissão em seu nome.

Portanto, agora podem usufruir de seus direitos de propriedade com segurança legal, representando um passo importante na inclusão social e no empoderamento dos moradores de Ilhéus. Com a titulação, os habitantes da comunidade agora possuem a oportunidade de realizar melhorias em suas propriedades e a proteção contra despejos, garantindo acesso a direitos fundamentais que antes lhes eram negados.

No que diz respeito ao bairro estudado, foi buscado documentos na Prefeitura Municipal, e foi possível a localização de plantas e alguns normativos que concerne à regularização fundiária na Cidade. Verificando as plantas, pôde ser observado a extensão do bairro (anexo 6) que é constituído, hoje em dia, por áreas alodiais (particulares) e dominicais (públicas). Vale mencionar, também, que o arruamento e a forma que os lotes foram separados, foi bem organizada (anexo 7). O desenho do bairro deixa a entender que a área realmente foi planejada para ser um loteamento, contudo, é notório que o planejamento não funcionou, levando em consideração as condições já expostas neste estudo.

Infelizmente não foi possível obter dados exatos sobre o número de lotes existentes na área dominical, uma vez que, até o momento desta pesquisa, não há uma demarcação urbanística da região, o que pode complicar, visualmente, na distinção da área pertencente ao poder público da do particular.

Analisando a documentação disponível no portal da transparência, constata-se que, desde 1990, a regularização dessa área tem sido um objetivo para a prefeitura, como estabelecido no artigo 17, do Título VIII, da Lei Orgânica do Município de Ilhéus. Este artigo determina que o Poder Executivo, dentro de um prazo de doze meses após a promulgação da Lei Orgânica, que é data de 05 de abril de 1990 “[…] promoverá as condições necessárias para regularizar as áreas decorrentes de ocupações autorizadas dos bairros Nelson Costa, Nossa Senhora da Vitória, Vila Nazaré, Teotônio Vilela, Vila Lídia, Nova Brasília e outros” (Ilhéus, 1990, n.p).

Além disso, consta nos arquivos da prefeitura a Lei nº 2.951, de 2001, que regula as concessões de uso de terrenos públicos, estabelecendo os seguintes requisitos próprios para a aquisição dos títulos de legitimação:

Art. 3º. Em casos de terrenos não edificados, exige-se, previamente, a apresentação e aprovação do projeto de construção, que deverá ser ultimado no prazo de 05 anos, sob pena de extinção da concessão.

Art. 4º. Considera-se, para efeito da concessão de direito real de uso de que trata esta Lei, inexigível a licitação (art. 25, da Lei nº 8666/93), quando o concessionário já se encontre na posse do terreno há mais de cinco anos ou haja promovido alguma edificação.

Art. 5º. Só poderão firmar o contrato de concessão de que trata esta Lei aqueles que não possuem outro imóvel no Município de Ilhéus.

Art. 6º. Não se dará a concessão em caso de interesse da Administração sobre o imóvel. (Ilhéus, 2001, n.p).

Levando em consideração que a norma municipal da CUEM é do ano de 2001, é notório que com o passar do tempo surgiram novas legislações que abordam sobre a regularização fundiária de bens públicos com medidas atualizadas e eficazes, e o município de Ilhéus não poderia ficar obsoletado nesse sentido. Atualmente foi publicado o decreto nº 22/2024, o qual dispõe sobre o Programa Municipal de Regularização Fundiária Urbana no Município de Ilhéus. Este decreto é baseado na lei nº 13.465/2017, a lei da REURB, onde se pode concluir que é a forma excepcional para a resolução da problemática do bairro, assim como o bairro Nossa Senhora da Vitória, por ser a ferramenta apropriada para a legitimação de núcleos informais de forma técnica, e o Teotônio Vilela, por seu turno, preenche os requisitos para tal, por ser uma “[…] unidade imobiliária com destinação urbana, integrante de núcleo urbano informal consolidado existente em 22 de dezembro de 2016” (Ilhéus, 2024, n.p).

Também se pode observar, em última análise, a existência da recente portaria n°. 099, de 12 de março de 2024, que estabeleceu uma comissão especial dedicada à regularização fundiária em Ilhéus. Essa comissão é de extrema importância, pois poderá facilitar um diálogo eficaz entre os envolvidos no processo e acelerar a análise de novos pedidos, além de buscar parcerias e recursos para implementar melhorias na infraestrutura das áreas irregulares. Dessa maneira, espera-se que o Município adira este instrumento para realmente efetivar os direitos constitucionais dos moradores do bairro Teotônio Vilela em um futuro bem breve.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, analisar a situação jurídica desta região é excepcional para compreender os entraves que os moradores enfrentam para a regularização dos imóveis ao qual habitam, além observar que existe uma tendência das instituições financeiras em firmar contrato com imóveis que estejam devidamente matriculados e regularizados, haja vista que, como já visto, para a utilização desse instituto é necessário o devido registro no Cartório de Registro de Imóveis competente.

Foi verificado que os entraves jurídicos para o financiamento imobiliário na região delimitada são decorrentes de uma cadeia de situações que podem ser listados como a: (I) Falta de documentos técnicos da área, para apresentação ao Cartório de Registro de Imóveis; e (II) Falta de políticas públicas efetivas e adequadas à realidade fática do bairro.

A partir disso, observa-se, de fato, que há uma desproporcionalidade referente a dimensão da região, a quantidade populacional e a quantidade de registros dos imóveis e das suas edificações. A área estudada tem um déficit com relação a regularização fundiária e urbanística, a qual merece um amparo do poder público para garantir os direitos fundamentais entranhado na Constituição Federal da República Federativa do Brasil e nas normas correlatas que têm o objetivo da efetivação do direito à cidade e propriedade.

O uso da ferramenta correta de regularização, neste caso, a REURB, também pode ajudar na efetivação da promoção de um ambiente formalizado e inclusivo, tendo em vista que promoverá a regularização de imóveis de pessoas que não têm condições financeiras para arcar com taxas do processo de regularização que vão além de documentos técnicos (plantas, memoriais descritivos, etc…) às custas cartorárias.  

Dessa forma, saliente-se que, promovendo essas políticas públicas de regularização fundiária, o município também irá se beneficiar, haja vista que a formalização dos imóveis incidirá o imposto de transmissão intervivos (ITIV) que serão recolhidos nos atos de transmissões. A população, por seu lado, irá ser inclusa no mercado financeiro imobiliário, garantindo ao vendedor uma maior possibilidade da compra e para o comprador que após a quitação da dívida esse se torne proprietário pleno da residência até então fiduciária.

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1Discente da Faculdade de Direito da Faculdade de Ilhéus, Centro de Ensino Superior de Ilhéus,
e-mail: santos98.alisson@gmail.com

2Docente da Faculdade de Direito da Faculdade de Ilhéus, Centro de Ensino Superior de Ilhéus,
e-mail: novaisjn@hotmail.com

3linsittana@gmail.com