ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL E A POSSÍVEL VIOLAÇÃO DA OBRIGATORIEDADE DA AÇÃO PENAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10119463


Tacinara Tricia Pacheco Marinho;
Orientador(a): Profa. Especialista Lucia Porto Veiga Malavasi.


RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo geral explanar sobre o título do abordado, onde se observa que o mesmo não é bem aceito pelo ordenamento jurídico brasileiro, através de uma análise de estudos sobre a justiça negocial no Brasil. É importante analisar a incorporação do Acordo de Não Persecução Penal no Direito Penal Brasileiro. A regularização desse acordo pela Lei nº 13.964/2019 (pacote anticrime) trouxe relevância ao nosso sistema jurídico, pois oferece uma opção para aliviar a sobrecarga do sistema judicial brasileiro, por meio de um acordo pré-processual e extrajudicial. No entanto, surge a questão de como o Acordo de Não Persecução Penal é recebido no ordenamento jurídico brasileiro. Considerando suas bases na common law e em um sistema jurídico diferente do nosso, é discutível se ele se adequa ao Direito Brasileiro. Portanto, é necessário realizar um estudo sobre conceitos importantes relacionados ao tema, como a definição de sistemas jurídicos e as famílias de tradição jurídica. Por fim, foi realizada uma análise do Acordo de Não Persecução Penal, incluindo um estudo sobre o instituto e a consideração das críticas doutrinárias sobre o tema. Além disso, foi examinada a compatibilidade desse instituto com o sistema acusatório estabelecido na Constituição Brasileira e com a tradição jurídica da civil law. Esta monografia argumenta que o Acordo de Não Persecução Penal e a barganha não são compatíveis com o sistema penal brasileiro. Para o desenvolvimento deste trabalho, foi utilizado o método de pesquisa teórica, com a utilização de fontes bibliográficas, jurisprudências e legislações como instrumentos materiais.

Palavras-chave: Acordo de Não Persecução Penal. Ação Penal. Justiça Negocial.

ABSTRACT

The present work has the general objective of explaining the title of the subject, where it is observed that it is not well accepted by the Brazilian legal system, through an analysis of studies on negotiating justice in Brazil. It is important to analyze the incorporation of the Agreement of Non-Criminal Persecution in Brazilian Criminal Law. The regularization of this agreement by Law No. 13,964/2019 (anti-crime package) brought relevance to our legal system, as it offers an option to alleviate the burden on the Brazilian judicial system, through a pre-procedural and extrajudicial agreement. However, the question arises of how the Criminal Non-Prosecution Agreement is received in the Brazilian legal system. Considering its bases in common law and in a legal system different from ours, it is debatable whether it adapts to Brazilian Law. Therefore, it is necessary to carry out a study on important concepts related to the topic, such as the definition of legal systems and families of legal tradition. Finally, an analysis of the Criminal Non-Prosecution Agreement was carried out, including a study of the institute and consideration of doctrinal criticisms on the topic. Furthermore, the compatibility of this institute with the adversarial system established in the Brazilian Constitution and with the legal tradition of civil law was examined. This monograph argues that the Non-Prosecution Agreement and the plea bargain are not compatible with the Brazilian penal system. To develop this work, the theoretical research method was used, using bibliographic sources, jurisprudence and legislation as material instruments.

Keywords: Non-Criminal Prosecution Agreement. Criminal Action. Negotiable Justice.

INTRODUÇÃO

A pesquisa abordada tem em vista o assunto   “Acordo de não persecução penal e a possível violação da obrigatoriedade da ação penal” tendo como cenário a referida lei, do pacote anticrime (Lei 13.964/2019) aprovada ao final do ano de 2019, o assunto trás consideráveis espaços para dúvidas e questionamentos ao falarmos sobre a presente temática.

Nesse contexto, o Acordo de Não Persecução Penal foi inspirado em um instituto penal dos Estados Unidos chamado Plea Bargain, que também exige a confissão detalhada do acusado. Além disso, ambos os acordos resultam na extinção da punibilidade do réu antes do início do processo penal, após o cumprimento das condições acordadas. O Acordo de Não Persecução Penal também compartilha características com institutos já existentes no Brasil, como a transação penal e a suspensão condicional do processo, estabelecidos na Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95).

Com a implementação da Lei 9099/95, que estabeleceu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, o sistema de justiça penal no Brasil passou a buscar, para crimes menos graves, soluções consensuais visando evitar a prisão de pessoas que tenham cometido ofensas de baixa gravidade.

Avaliando um ponto em comum entre os dois países observa-se que ambos possuem o acordo como evento de que após o cumprimento das condições presentes na negociação levará a aniquilamento da punibilidade do agente antes que o processo penal tenha se iniciado.

Outra característica semelhante com os institutos já existentes no Brasil, onde a ANPP toma na ordem jurídica brasileira, como a transação penal e a suspensão condicional do processo, os quais estão firmados na Lei 9.099/95, nomeada de Lei dos Juizados Especiais.

O objetivo geral do trabalho é explanar sobre o título do abordado, onde se observa que o mesmo não é bem aceito pelo ordenamento jurídico brasileiro, através de uma análise de estudos sobre a justiça negocial no Brasil. Os objetivos específicos são: propor um breve debate sobre o Acordo de Não persecução Penal e sua viabilidade; Sugerir adoção da violação ao Princípio da Obrigatoriedade da Ação Penal.

Será apresentado um breve contexto histórico, de modo a demonstrar a importante influência do sistema Comomm Law dentro do sistema habitual no Brasil, com sua influência na Criação de Leis penais e processuais Penais, especialmente, no Acordo de Não Persecução Penal, do Código de Processo Penal.

A pesquisa se justifica pelo motivo em implantar o Acordo através de discussão, porém, é necessário levantar alguns questionamentos acerca da justiça sobre o ordenamento jurídico brasileiro, pois o modelo consensual tem origens nos Estados Unidos da América, país com tradição jurídica, onde o sistema penal é completamente diferente do Brasil.

A metodologia utilizada teve como base pesquisa teórica através materiais bibliográficos, jurisprudências e legislações. A pesquisa bibliográfica foi realizada após um levantamento de obras já publicadas. Isso porque o assunto está ligado a uma nova  lei que tem gerado nos corredores da ordem jurídica brasileira uma certa reformulação, originando a suspensão de vários artigos, não estando ainda totalmente em vigor, ou, ainda apta a gerar discussão quanto o Acordo, que necessita de jurisprudência definida e consistente dos Tribunais.

O presente trabalho organizado em cinco  seções que podem ser resumidas da seguinte forma: a primeira refere-se a descrever a introdução da pesquisa, assim como uma breve explanação das outras etapas a seguir, a segunda trata o contexto histórico relacionado ao, serão abordados  título os requisitos e conceitos do acordo de não persecução penal, no ultimo tópico será abordado sobre as acusações exageradas e os erros cometidos de forma exagerada, a conclusão e referências.

Capítulo 1:

1. CONTEXTO HISTÓRICO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL

Para uma boa compreensão do tema abordado é importante à apresentação do contexto histórico do surgimento do o Acordo de Não Persecução Penal, essa etapa faz com que o leitor conheça as circunstâncias que originaram o assunto e, sua evolução.

O sistema jurídico é regido pela civil law, de origem romana-germânica, onde o direito brasileiro se expandiu para vários países até chegar ao Brasil. O sistema baseia-se na ideia de codificação,   onde o direito foi aceito e aplicado na Constituição Federal como lei superior e magnifica, ou seja, a Carta Magna (Azevedo, 2014).

O sistema da Civil Law se baseia na lei escrita, onde, quando houver qualquer natureza de conflito, é preparado que os mesmos sejam resolvidos com as respostas encontradas na lei, mas em alguns casos pode haver alguma divergência entre as leis e dentro desse sistema se aplicará a lei mais específica que se ira sobrepor a lei genérica.

Como grande influenciador do sistema penal brasileiro, Lopes, 2020, encontra-se o sistema penal inglês denominado de comomm law , o que acaba gerando um sistema misto, já que o direito penal e processual penal possuem suas bases solidificadas na lei escrita, com previsão legal ampliada para todos os atos penais e processuais penais, não obstante foi instituída a figura do júri dentro do processo penal, que prever para os crimes dolosos contra a vida do Código Penal. Segundo Tupinambá Pinto de Azevedo escreveu em seu artigo a seguinte observação sobre o tema:

“O caso brasileiro merece atenção, pois através de se estabelecem os Códigos Penais e Processuais Penais com base do modelo romano-germânico, porém acabamos por institucionalizar um júri, com influência inglesa, embora o sistema cartesiano de quesitos seja claramente inspirado no sistema francês (mas sem o escabinado). Há bem pouco tempo, na reforma processual penal de 2008 (L. 11.689), aproximamo-nos um pouco mais do sistema anglo americano, através de um quesito reducionista sobre absolvição (art. 483, Inciso III, CPP).”

Nos países que são regidos pela Comomm Law, é notório que, são de praxe da justiça negocial a previsão de diversos acordos penais para a transferência da pena em alguns crimes, assim, se evita o colapso no sistema judiciário e prisional, já que o tempo para que haja negociação e para os acordos são considerados um fator de menor tempo demandado em uma ação penal.  

Sendo assim, é perceptível a influência do sistema da Comomm Law dentro do sistema da Civil Law no Brasil, sobretudo na criação das Leis Penais e Processuais Penais, ficando assim, a inserção do Acordo de Não Persecução Penal no Código de Processo Penal como uma das heranças da Comomm Law no Ordenamento Jurídico Brasileiro (Lopes, 2020).

1.1 Justiça Adversaria X Sistema Acusatório

Com a evolução da humanidade, onde se saiu  dos atributos da inquisição para fundamentos de estruturação acusatória trazidas pelo exercício das funções de acusar e julgar atribuídas a órgãos distintos, apontando-se a superação da concepção privativa da ação penal (Reis, 2013).

Entretanto, no campo doutrinário, não há uma concordância que aborde o sistema processual penal seguido no Brasil. Para muitos, se trata do sistema acusatório, porém, para outros, do sistema inquisitivo, e para uma terceira parcela, é um sistema propriamente de forma mista. E, não deixando ainda de excluir os que digam que,   na   verdade,   existe  uma   grande ausência   do sistema.

Assim, destaca-se que, com a chegada da Constituição Federal de 1988, solidifica-se no país um sistema acusatório, onde a Carta prevê abertamente a divisão das funções de acusar, defender e julgar, e não tão longe garantindo os princípios constitucionais, como o contraditório e a ampla defesa. Entretanto, não se define como um sistema puro, visto que o Código de Processo Penal antes abordava o  sistema  considerado  misto.  De  qualquer forma,  o mesmo  é considerado  como  tal,  pois necessita ser interpretado conforme o texto constitucional (Lima, 2020).

É importante salientar  que  na  linha  da  abrangência  da  análise  da  persecução  penal  da  fase extrajudicial à sua fase judicial, se observa que o processo penal em fase judicial é fundamentalmente inquisitório, onde após a investigação, pode ser considerado como acusatório.  

É indispensável o reconhecimento que a prova de um sistema misto se encontra no artigo 385 do Código de Processo  Penal,  ao  admitir  ao  juiz  a  condenação  em  crimes  de  ação  pública,  mesmo  com manifestação do Ministério Público sendo contrário.

Por essa razão, se define que não se trata do sistema acusatório puro, já que, apesar da produção de provas serem ônus específico das partes, existem observações em que o próprio juiz pode determinar de ofício, a realização de atos probatórios para a formação de sua persuasão (Reis, 2013).

Dentro do mesmo raciocínio, a precedência no Brasil pela adoção do sistema acusatório está nítida no artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, apesar disso não é adotado em sua versão pura, ao mesmo tempo em que o magistrado não é um agente estático na persecução penal (Távora, 2018).

Em contrapartida,  para  muitos,  não  existe forma para se  falar  em  sistema  misto,  apenas  em  razão  de  o inquérito ser inquisitivo, porquanto este tem a função apenas de embasar a formação do convencimento ao titular da ação penal (Metzker, 2020).

1.2 Princípio da Obrigatoriedade

Determina-se a atuação do Ministério Público, como titular exclusivo da ação penal pública, enquanto Estado-acusação, consistir em única medida possível de aproveitamento de pena a materialização do processo criminal (Nucci, 2016).

Em consenso, manda o artigo 24 do Código de Processo Penal que a promoção  da  ação  nos  crimes  de  ação  penal  pública  se  dará  por  denúncia  do  Ministério  Público. 

Conclui-se, assim, que o agente ministerial possui o dever e a plena legitimidade da propositura da ação penal pública incondicionada. Conforme Nucci (2016 ) realça que: “o princípio da obrigatoriedade da ação penal significa não ter o órgão acusatório, nem tampouco o  encarregado da investigação,  a  faculdade de investigar e buscar a punição do autor da infração penal, mas o dever de fazê-lo”.  

Sendo assim, esse princípio apraza ao agente ministerial o caráter de indisponibilidade, melhor dizer, que prevalece o dever de acusação e de persecução penal. Dessa forma, existindo justa causa para a deflagração  do  processo  criminal,  quer dizer,  presença  de  elementos  que  sugerem  a  ocorrência  de  fato típico, ilícito e culpável, o Ministério Público ficará obrigado a oferecer a denúncia (Lima, 2020).

Para Andrade (2018, p. 214), o princípio citado consiste no “ que o dever imposto ao seu titular de diligenciar em todos os andamentos em que admitir a notícia de um crime, a partir da presença de elementos de materialidade e indícios de sua autoria”.

Tal principio, sobrevém do interesse público e da fidelidade na ocorrência  de crimes danosos de importantes bens jurídicos, acertando interesse estatal na apuração do caso, penitenciando, por meio do devido processo legal (Nucci, 2015).

Para Lopes  Junior  (2020),  a oportunidade e conveniência não foram adotados no Brasil. Por causa dessa não adoção desses requisitos legais para  o  exercício  da  ação  penal, faz com que o Ministério Público só possa oferecer denuncia, quando não couber cabendo  nenhum  juízo  de  conveniência  e oportunidade, já que a persecução penal é de ordem pública. Ficando, a obrigação no patrocínio do processo, com fulcro no artigo 24 do Código de Processo Penal (Távora, 2018).

Tal situação impossibilita o agente ministerial de decidir ou ajustar a partir de critérios de política criminal com ampla discricionariedade, ao invés disso, essa obrigatoriedade de agir não abre precedente de atuação   em meio a   denuncia,   pedir   diligências   complementares   ou   postular   o arquivamento   (Lopes   Junior,   2020).  

Porquanto  procede   com base na legalidade   constitucional,   e   não   de discricionariedade,  como  aconteceria  episódio  no  princípio  da  ocasião  permanecesse  vigorando,  por  este razão nenhuma  decisão  que  não  a  da  presente denúncia,  deve  ser  fundamentada  na carência da comprovação da materialidade ou da autoria (Nucci, 2015).

Assim, surge a obrigação na mesma medida que é instituída por lei. Por conseguinte, não compete ao  Ministério  Público permitir proposta de ação penal demonstradas por agentes de politica criminal, necessitando  a verificação do fato, onde se o mesmo  é  típico,  ilícito  e  culpável,  assim  como  a existência das condições determinadas por lei para o regular exercício da ação penal (Rangel, 2019).

Então, se observa que o princípio citado permiti questionamento, pelos órgãos  persecutórios  criminais  e até mesmo pelo Ministério  Público  que decidirão se haverá atuação, pois a falta de clareza desse principio, não deixa brecha para critérios políticos ou de utilidade social (Lima, 2020).

Para Capez (2018), que vem na contramão, afirmando que a obrigatoriedade da ação penal está absolutamente ligada à legalidade, onde fala que o titular da ação penal é obrigado a propô-la. Porém, há ligação direta com a oportunidade, de forma sólida na apreciação da oportunidade e da conveniência que oferece a ação penal.

O que mostra de forma deteriorada que a proposta da ação penal pública é, para o Estado, uma determinação legal, logo, se não existir persecução penal, não haverá aplicação de pena, então, será extraído  a obrigatoriedade da ação penal pública (Rangel, 2019).

No artigo 24, proíbe que o Ministério Público origine o arquivamento do inquérito policial, onde se limita a apenas propor a essa alternativa, onde fica a disposição do juiz a decisão, o que dá o pleno atendimento ao princípio da obrigatoriedade (Mougenot, 2019).

Consequentemente,  essa obrigação dada  ao  Ministério  Público  em  determinar  do  juiz  a  devida  prestação jurisdicional,  é  um  poder  público  garantido na constituição, aferido  pela  sociedade  pelo  exercício  do  poder constituinte  originário,  com propósito de  satisfazer  a  aspiração  acusatória  estatal,  visando  instaurar  a ordem jurídica infringida (Rangel, 2019).

Ainda que, sobrecarregue o princípio da obrigatoriedade da ação penal em ser considerado como regra,  a  Constituição  Federal  previne  claramente  sobre a autonomia  e  independência funcional  do  Ministério  Público,  assim como , por consequência dizer  que  o mesmo não  está  obrigado  a processar (Mello, 2018).

Perante o exposto, dada a permissão ao posicionamento consolidado e embasamentos levantados, conclui-se que o princípio da obrigatoriedade da ação penal necessita ser observado pelo agente do ministério público, seja de forma totalitária ou não, dado que está diretamente ligado a normas constitucionais que aferem a sua legalidade na persecução penal.

1.3 A Origem e Individualidades Existentes no Acordo de Não Persecução   Penal

A  Justiça  Penal  adversária,  seguida  como  regra  na  jurisdição  penal,  encara  diversas incoerências, como, por exemplo, o excesso de recursos e adiamento, que acarreta um Judiciário sobrecarregado  de  solicitações provocando a demora processual.  Essa é a maior causa do sistema jurídico brasileiro se encontrar congestionado  com  casos  que  encaram  demora  de  respostas estáveis (Valença et al, 2019).

Por meio desse  panorama,  se propõe  abranger  uma  ligeira  e  efetiva  acossamento  penal,  ou seja, o Acordo de Não Persecução Penal, outrora sem lei exclusiva, da mesma forma aconteceu com  outras  entidades de  justiça  negociada  em outros países  onde  foi  implementada,  também, previamente, sem nenhuma previsão legal.

A vista disso, para Valença et al (2019), deve existir garantia de justiça com tutela jurisdicional, com validade plena  de que o atraso pode ser considerado a ausência da justiça, assim, podem advir alternativa, mesmo sendo vias sujeitas de insegurança, são  duradouras  em virtude o que almeja à sociedade moderna, e seu alargamento, que cada vez mais exige celeridade e aceleração na resolução de conflitos.

Para muitos juristas é inaceitável  que o processo tenha mais destaque sobre a formalidade do que a sua eficiência. Foi através do artigo 18 da Resolução n.º 181/2017 que houve a introdução no ordenamento jurídico, algum tempo depois, a mesma sofreu alteração através da  Resolução n.º 183/2018, ambas fazendo parte do Conselho Nacional do Ministério Público (Cunha et al,2020).

Ainda Cunha et al (2020) assegura que o acordo, movido nos modelos de justiça negociada aceitos em outros países, estabeleceu-se por meio da resolução, que consiste em um ato normativo autônomo.

Outro fator a ser acrescentado tendo como modelo de justiça utilizado em outros países, esses muitos semelhantes aos nacionais, como o acordo penal, a suspensão condicional do processo e a colaboração premiada, todos abordando a estratégia de política criminal, onde o Conselho Nacional do Ministério Público se preocupa em debater um assunto relevante, qual seja a justiça negociada (Andrade, 2018).

Tal estratégia  de  política  criminal  libera  o  órgão  ministerial  fazer  acordo  com  o investigado, ainda no procedimento de investigação, em troca de uma confissão e reparação do dano à vítima. A finalidade é uma resolução mais acelerada e eficaz aos problemas analisados como de alta gravidade, sujeitando aos delitos mais leves a não persecução.  

Nesse   contexto,   a   bancada   da   Corregedoria   Nacional   do   Ministério   Público,   no comunicado realizado para um procedimento de estudos em 2017, assinalou como motivação da concepção da citada resolução a relevância do assunto, enquanto avanço ao sistema de Justiça Penal, como o Supremo Tribunal Federal se conservaria à análise de causas ajustadas com a natureza da Corte (Rangel, 2019).

Tem-se ainda,  a  resolução  traz  mais  agilidade  na  ordem  dos  casos analisados  menos  graves,  e  como resultado  se  obtém  maior  empenho  do  Ministério Público e do Judiciário aos casos considerados emergenciais, além da economia dos recursos públicos e da diminuição dos efeitos negativos suportados pelos acusados, derivadas da sentença penal condenatória (Andrade, 2018).

Os mencionados argumentos estão em conformidade com os fundamentos do Tratado Internacional das Regras de Tóquio, designado por meio da Resolução n.º 45/110, aprovado pelo Brasil, tendo como seu assinante o Conselho Nacional de Justiça, debatendo sobre direitos humanos. Conforme o Ministro Ricardo Lewandowski, possuem o compromisso e estímulo à aplicação de medidas não privativas de liberdade (Cunha et al,2020).

Sendo assim, nota-se que sempre  que  aceitável, antecedendo a fase processual, é consentido ao Promotor de Justiça, se o mesmo entender apropriado, adotar medidas não privativas de liberdade, se ponderar desnecessário um processo judicial, desde que tais medidas sejam  originárias  de  um  artifício  que  desenvolve  critérios  estabelecidos  dentro  de  um  sistema legal (Cabral, 2017).  

É de conhecimento geral que não existe um sistema penal perfeito, do mesmo costume quanto uma solução perfeita, apesar disso, conforme doutrina Cabral (2017), a não persecução é o caminho para que se apresente um sério processo de refinamento e de reforma ao sistema convencional. 

Em decorrência, a concepção da Resolução n.º 181/17 (alterada pela Resolução n.º 183/18) pelo Conselho Nacional do Ministério Público, fez brotar a contestação acerca da sua constitucionalidade, confrontada  por  meio  de  Ações  Diretas  de  Inconstitucionalidade (Brandalise, 2018).   

Todavia,  existe  doutrinadores  que protegem  o  adverso,  com  apoio  na  legalidade  do  Conselho  Nacional  do  Ministério  Público  em normatizar regras aos seus membros e pelo entusiasmo da cláusula primária imposta às suas autorizações. Essencialmente,   a   contestação   aborda   sobre   dois   alvos   fundamentais,   a legalidade  do  Ministério  Público  na  investigação,  e  a  abrangência  da  normatização  conferido  aos Conselhos Nacionais (Brandalise, 2018).

Dessa forma, se ressalta, da leitura do artigo 22 da Constituição Federal, a afirmativa de que incumbe privativamente à União legislar sobre Direito Penal e Processual Penal. Respectivamente a esse mandado, se extrai o artigo 130-A, §2º, inciso I, do mesmo atestado, que pertence ao Conselho Nacional  do  Ministério  Público  cuidar  pela  decisão  acionada  administrativamente pelo  Ministério Público,   despachando   atos   regulamentares   ou   advertindo   providências   no   âmbito   de   sua competência ( Garcia, 2017).

Ainda Garcia (2017, p. 264), o legislador “se limita se assegura que o poder regulamentar do  CNMP,  consistir em  exercer  no  ‘âmbito  de  sua  competência’,  o  que  não  lhe  permite  editar  atos regulamentares em matérias não relacionadas no art. 130-A:

[…]”.Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao tratar o poder regulamentar dos conselhos na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) n.º 12, entendeu pelo caráter normativo primário das  resoluções  do  Conselho  Nacional  de  Justiça  (CNJ),  tal  entendimento  se  estende  também  às resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público, por se tratar igualmente de atos autônomos, abstratos e diretamente subordinados à Constituição Federal.

Garcia (2017), ainda aborda  a ação declaratória se recomenda a capacidade ao Conselho para edição de atos normativos relacionados a matérias de sua competência. Indo na mesma direção encontra-se Ziesemer (2018), que avaliar-se a resolução necessita ser analisada como instrumento legítimo de investigação criminal do Ministério Público, permitida pela Constituição e pela legislação infraconstitucional. 

Contradizendo com  o  preparado,  Cabral  (2018)  propõe que  a  resolução  procura  a  realização dos  princípios  constitucionais,  e  não  determina  prestação  jurisdicional  do  Estado  por  se  abordar  um negócio  jurídico  extrajudicial,  ajustado  para política  criminal,  que  não  há  natureza  de  norma processual, por esse motivo não infringe a competência legislativa da União.

Em concordância, Ziesemer (2018)aconselha através de forma administrativa e pré-processual da resolução, sem a concepção da relação processual, e por isso não violação ao artigo 22 da Constituição Federal. De outro modo, a ADI n.º 5.790, lavrada pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), defende a inconstitucionalidade da resolução assinalando, em apertada síntese, que a resolução contravém formalmente  o  artigo  22,  inciso  I,  da Constituição  Federal  (Cunha  et  al,  2020).   

Sendo assim, se observa que a resolução possui patente caráter processual, e não pode sobrepõe a lei ao articular pelo não exercício da ação penal e como significará a atividade estatal exercida na administração da justiça, analisando o Conselho Nacional do Ministério Público que não detém legitimidade para legislar na matéria processual e procedimental penal (Brandalise, 2018).

Do mesmo modo,  são  os  contextos  que  se  retiram  da  ADI  n.º  5.793,  indicada  pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do  Brasil  (OAB),  assinalando que os  artigos 1º, caput, §2°, inciso V, §7º, incisos I, II, e III, e o artigo 18 da Resolução n.º 181/2017 atravessam a competência privativa da União, ofendendo os princípios fundamentais e exageram no poder regulamentar do Conselho Nacional do Ministério Público (Cunha et al, 2020).

É  respeitável  adicionar  que  o  Conselho,  por  não  compor  o  Poder  Legislativo,  não  está aprovado  a  julgar  e  legislar  além  dos  poderes  constitucionalmente  instituídos.  Assim sendo,  a resolução  transgredi  ao  processo  legislativo  constitucional  consagrado  no  artigo  130-A,  §2°, (Brandalise, 2018).

Destaca-se ainda,  que atualmente,  o  Ministro  da  Justiça  e  Segurança  Pública,  Sérgio Fernando Moro, implementou a Lei Anticrime, estabelecendo alterações pertinentes ao sistema penal e processual  penal  brasileiro,  antecipando  a  implementação  do  Acordo  de  Não  Persecução  Penal, conforme artigo 28-A da Lei Anticrime. Averigua-se:

Art.   28-A.   Não   constituindo   o   caso   de   arquivamento   e   tendo   o   investigado   confessado circunstanciadamente a prática de infração penal, sem violência ou grave ameaça, e com pena máxima  não  superior  a  quatro  anos,  o  Ministério  Público  poderá  propor  acordo  de  não persecução penal, desde que necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, mediante  as  seguintes  condições,  ajustadas  cumulativa  ou  alternativamente  […]  (BRASIL, 2019).

Ressalta-se que o instituto delineado tanto na resolução n.º 181/2017 quanto na Lei Anticrime há muitas semelhanças baseadas na essência de reparação do dano, de abdicação de bens e direitos, na  prestação  de  serviços,  na  prestação  pecuniária  e  em  outras  condições  a  critério  do  Ministério Público (Brandalise, 2018).  

Por essa perspectiva, Esteves (2020) discursa que, a edição da Lei n.º 13.964/2019, com a presciência do acordo de não persecução penal desocupa a principal crítica que recaía no instituto, no sentido da demanda de previsão legislativa.

Da mesma forma, Lima (2020) adiciona que é notório que, com o aparecimento da Lei Anticrime, fora superada a incerteza jurídica originária da natureza da resolução n.º 181/2017 devido à realização do acordo pela via legislativa.

Já Tavares (2020), ressalta que o acordo de não persecução penal consiste em negócio jurídico planejado pelo  Ministério  Público,  em  correta  exceção  ao  princípio  da obrigatoriedade  da  ação  penal, ofertado  ao  sujeito  passivo  da  persecução,  desde  que  com  a  sua  necessitada  admissão  da  prática  da infração penal, e execução das condições ajustadas, em troca da não apresentação da denúncia. Nesse sentindo, o citado instituto é resultado da convergência de vontades, com participação ativa das partes, fundamentalmente entregue pelo consenso (Lima, 2020).

Com relação ao assunto, onde o  Grupo  Nacional  de  Coordenadores  de  Centro  de  Apoio Criminal (GNCCRIM), no proferido (Lima, 2020,p. 6), constitui que “o acordo de não persecução penal  é  capacidade  do  Ministério  Público,  que  medirá,  inclusive  em  última  análise  (§14),  se  o instrumento é necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime no caso concreto”.

Além disso,  a justiça  transacional  tem  freios  e  contrapesos,  a medida que  que  a  liberdade  de negociar  insinua  a  relativa  liberdade  do  teor  do  acordo,  que  não  pode  ser  comparado  a  um conteúdo  de  ajuntamento  com  fixação  de  condições  formais,  e  até mesmo não  deve  se ater as  condições  que infrinjam direitos basais ou ao bem jurídico tutelado da norma infringida (Cunha, 2020).

Porém,  alguns acordos  consistir em  firmação  e  execução  previamente  à  citada  previsão  legal, auxiliados   somente   nas   resoluções   do   CNMP,   dependentes   da   concordância   dos representantes  do  Ministério  Público,  provocando  grande  insegurança  jurídica  e  aversão  de tratamento  aos  investigados  (Rosa,  2020). 

A respeito da GNCCRIM, é possível extrair a oferta de acordo  para  fatos  passados sobre à  vigência  da  Lei  n.º 13.964/19, se estes consistir em pendencias de denúncia (Lima, 2020).  

Do mesmo modo está  posicionamento de Cunha (2020, p. 124), ao ressaltar que é inegável o acordo de não persecução penal acarretará na economia de tempo e recursos para que o sistema penal se cumpra, com a aplicação devida, uma tutela penal mais eficaz nos crimes que merecem esse tratamento.

No  que se refere ao  oferecimento,  uma  parcela  do  ensinamento  entende  que  se  trata  de  direito subjetivo do acusado, por isto, é de oferecimento obrigatório caso preenchidos os requisitos, não havendo  margem  interpretativa  ao  Ministério  Público. 

Entretanto,  no que se refere a outra  parcela  dos ensinamentos,  o mencionado  acordo  é  um  instrumento  de  política  criminal,  e  a oferta fica  a  critério  do Ministério  Público,  que  necessitará analisar  a  suficiência  e  a  necessidade  do  acordo  para  retribuição  e prevenção da infração penal cometida.

Na perspectiva de Lima (2020), a proposição do acordo não se aborda o direito subjetivo do acusado, todavia  na  verdade  de  uma  discricionariedade  legal  apenas  ao  Ministério  Público  na  comemoração  do acordo  se  atestados  os  requisitos  legais.  Por  causa desse  motivo,  essa  discricionariedade  é  coerente, observância necessária da lei.

Da mesma forma, Esteves et al, (2020), o acordo de não persecução penal incide em um  instrumento proveniente do exercício da discricionariedade pautada pelo Ministério Público, assim, torna-se indispensável  a  fundamentação  das  causas  de tal maneira  que, na  opção  pelo  não  aproveitamento  do  instituto,  como  a respeito da sua aceitação, carecendo ter por referência os limites claramente previstos em lei, tudo isso tendo em vista que figura como prerrogativa exclusiva do agente ministerial.

Além disso, a abordagem da oferta do Acordo, o Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais, do Júri e de Execuções Penais do Paraná (CAOP), ordenou uma proposta de Protocolo de Atuação  e  Aplicação  do  Acordo  de  Não  Persecução,  no  qual  se  consegue  que,  para  que  se  considere  a incidência  de  interesse  público  para  que  tenha  a  negociação  penal,  se faz  necessária  a  presença, simultaneamente, da existência do equilíbrio no cálculo negocial, da força da via negocial para a reparação do dano causado à vítima e, por fim, da suficiência da via negocial para a reprovação e prevenção do delito (Tavares, 2020).

Além disto, a privacidade da ação penal pública na instituição do Ministério Público, é nutrida mais ou menos no Acordo, porquanto mesmo diante da sua negativa de celebração, não é permitido que a figura do juiz das garantias o conceda um suplente, pois desencadearia verdadeira afronta à estrutura acusatória  do  processo  penal.   

Desse modo,  no caso  de  recusa,  na  forma  do artigo 28, o averiguado poderá solicitar a remessa dos autos ao órgão superior. Afinal, na elaboração da negociação, o Ministério Público necessita compreender e dominar os aspectos  sinistro,  jurídicos,  indiciários  e  probatórios  presentes  no  procedimento,  para  impedir  uma precipitação  na  deflagração  do  processo  negocial,  e  ainda  a  fim  de  obter  todos  os  critérios  e dados que servirão de base nas condições da combinação (Esteves, et al, 2020).

Apesar de afetar os  recursos  econômicos  do  Estado,  a  principal vítima  afetada  pelo  fato delituoso, lugar que captura o bem jurídico lesado, e ainda necessita de uma resposta oportuna, como objetivos de comemoração do acordo, o legislador se atentou, conforme artigo 28-A, consecutivamente que possível, seu dano reparado ou a sua coisa restabelecida.

De acordo com Moreira  (2020),  se engana  quem  defini o  Acordo  de  Não  Persecução  Penal somente pelos benefícios ao réu visto que uma das particularidades do acordo de não persecução penal é a reparação do dano à vítima, que incide em uma das qualidades para a propositura da composição.  Significando um importante aspecto do instituto a prevenção de intimação da vítima tanto da homologação do acordo quanto de seu eventual descumprimento (ROSA, 2020).

Para  Cunha,  et  al,  (2020)  a instituição  não  deriva  da  desvantagem  ao  injuriado,  necessitando de reparação de danos, como condição de negociação, o que consente aos interesses do injuriado, e por consequência fortalece a revalorização da vítima no processo penal. Ficando assim, a notoriedade  da  inclusão  da  vítima  com  participação  ativa  no  processo-crime, reverenciando-se  seu  interesse  no  processo  (Nucci,  2020). 

Nota-se que,  muito  embora  a  vítima  não possa impedir  o acordo, sua presença  é imprescindível para  dar significado aos parâmetros das condições  a  serem  cumpridas. 

Outro ponto, é que se vislumbra  a  necessidade  de  intimação  do acusado, no caso de não homologação, tende assegurar a possibilidade de sugerir a ação penal privada subsidiária (Lopes Junior, 2020).

Assim, se pode extrair o encontro do princípio da transparência, já visto que a maior interessada no assunto é a própria  vítima que necessita acompanhar os despachos das demandas a serem executadas (Pereira,  2020).

A  citada  previsão  legal destaca  a  atual  e  crescente participação  da  vítima  na  implementação  de  institutos  penais  e  processuais,  devido  à  intenção  da privatização do Direito Penal (Barbosa, 2020).

Segundo Lima  (2020), se deve acrescentar que,  perante a  omissão  legal  a  restrições,  a expectativa  de  reparação  de  dano  à  vítima  é  extensa,  sendo  ampliada  a  qualquer  espécie,  dano estético, material, moral dentre outros.

Nota-se que o objetivo incide na reparação dos danos ocasionados, com disposição ao modelo de restauração, no qual os defensores possuem papel de destaque de negociadores objetivando alcançar os interesses de seus constituintes (Moreira, 2020).

Já Cunha (2020, p. 130) assegura que,  em outras frentes de instrumentos que retiram as penas, o ANPP contempla a a vítima, colocando a reparação do dano, ou a devolução do objeto do crime como condição para o ajuste.

Conforme Junior (2020), o acordo de não persecução penal na ação penal em expectativas futuras  significará  implementação  também  na  ação  penal  de  iniciativa  privada,  uma  vez  preenchidos  os requisitos legais, visto do ponto onde a ação penal de iniciativa privada é essencialmente disponível.

Barbosa (2020), ressalta que, a qualidade da confissão formal da prática do crime pelo investigado se trata de insulto ao princípio da presunção de inocência, pois analisando que inexiste persecução penal e o devido processo legal, não se justifica, para fins de negócio jurídico processual, a necessidade da assunção da responsabilidade criminal.

Por  ultimo,  destaca-se que  existe a necessidade do  processo  penal  brasileiro  reconsidere a figura do Ministério Público na persecução penal, pois, através da via negocial, não existe mais espaço para os princípios da obrigatoriedade, indisponibilidade da acusação, uma vez que não existem mais concepção tradicional vigente (Lopes Junior, 2020).

Através das considerações apresentadas, a instituição aparece como fruto de uma disposição mundial em que se procuram soluções por meios de consenções, como tentativa de fôlego em frente ao colapso existente e cada vez mais inevitável no sistema processual penal atual. Para isso, se propõe que o Acordo de Não Persecução Penal é uma excelente alternativa de otimização da persecução penal brasileira.

Capítulo 2:

2. OS REQUESITOS E CONCEITOS DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL

O Pacote Anticrime foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro na Lei 13.964/2019, sendo caracterizado como polêmico, porém, mesmo com toda recusa fez inovação e gerou drásticas mudanças na execução das leis penais e processuais penais (Moreira, 2020).

Nesse paragrafo apresenta-se  uma das inovações advindas do Acordo de Não Persecução Penal, onde se trata de mais uma das espécies de medida que despenaliza a vitima, já existindo em sistemas penais de diferentes países como Alemanha e Estados Unidos (Barbosa,2020).

O Acordo de não persecução penal no Brasil teve seu primeiro esboço, mp ano de 2017 quando o Conselho Nacional do Ministério Público editou a Resolução 181/2017, e depois foi modificada em seguida pela Resolução 183/2018, onde foi implementada o ato normativo primário (Resolução Número 181/2017).

Essa Resolução buscou suprimir algumas dificuldades que são encaradas todos os dias no âmbito do judiciário, dificuldades ligadas com a demora da resolução de processos na justiça criminal, trazendo assim a rapidez para as negociações processuais penais.

O que mais chama atenção na resolução é que pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro houve a possibilidade real da realização de um acordo direto através do Ministério Público e o imputado, onde o ANPP teve sua previsão no capítulo VII da mesma, sobrepujando redação muito parecida com a do artigo 28-A da Lei 13.964/2019, a qual foi:

Artigo 18: ‘Não sendo o caso de arquivamento, o Ministério Público poderá recomendar ao investigado acordo de não-persecução penal, quando, imposta pena mínima inferior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, o investigado tiver confessado formal e circunstanciadamente a sua prática”(RESOLUÇÃO NÚMERO 181/2017).

A mesma resolução também foi objeto de Ação direta de inconstitucionalidade (n° 5790 e n° 57939 ) indicadas pela Associação de Magistrados Brasileiros e pela Ordem dos Advogados do Brasil, onde o CNMP legislou sobre material penal e processual penal, na qual é competência privativa da União (artigo 22, I CF) golpeando a Carta Magna, com a seguinte observação(Nucci, 2020):

Antes de tudo, faz-se imprescindível destacar que a inovação legislativa, no que tange à regulamentação do acordo de persecução penal supera a antiga discussão acerca da possível inconstitucionalidade formal das resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público que previam o instituto do acordo de não persecução penal no Brasil até 2019[2]. Ainda, a previsão de tal instituto se alinha com a pretensão da formação de um sistema de justiça criminal pautado na consensualidade.

Destaca-se como importante que para a propositura do acordo, a investigação não seja caso de arquivamento, pois necessita ser considerada como viável a instauração da persecução penal para que o acordo seja celebrado (Lima,2020).

Mediante a propositura do acordo é igualmente necessário que o investigado confesse de modo formal e circunstanciado, ou seja, precisamente na prática do delito, cuja pena mínima seja inferior a quatro anos, levando-se em consideração as causas de aumento e de diminuição aplicadas ao fato, onde o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça:

Na sistematização adotada pelo art. 28-A do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n. 13.964/19 (Pacote Anticrime), cuida-se de negócio jurídico de natureza extrajudicial, basicamente homologado pelo juízo competente – pelo menos em regra, pelo juiz das garantias (CPP, art. 3º-B, inciso XVII, incluído pela Lei n. 13.964/19) –, exaltado entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso – devidamente assessorado por seu defensor –, que confessa formal e circunstanciadamente a prática do delito, obedecendo ao cumprimento de certas condições não privativas de liberdade, em troca do compromisso do Parquet de não perseguir judicialmente o caso penal extraído da investigação penal, leia-se, não oferecer denúncia, declarando-se a extinção da punibilidade caso a avença seja integralmente cumprida. (LIMA, p. 274, 2020).

Em comparação à confissão do acusado, o dispositivo do Código de Processo Penal exibe como requisito fundamental para a concessão do Acordo de Não Persecução Penal, em que deve ser formalizada com detalhamento da prática da infração penal.

Por consequência disso, Nucci (2020) no Código de Processo Penal Comentado pronuncia que essa confissão é uma representação de admissão de culpa, abrangendo ser inconstitucional, pois caso o investigado não cumpra as condições do acordo, o Ministério Público pode denunciar o réu com base nessa confissão, originando danos somente ao investigado.

Para Lima, p 283, 2020, a aceitação da barganha entre as partes é necessário decidir as condições que poderão ser aplicadas de forma opcional ou simultaneamente. A primeira condição que o art. 28-A do Diploma de Processo Penal ostenta é a reparação do dano ou restituir a coisa à vítima, a não se nos casos em que é impossível ser realizada. Esta condição vale qualquer que seja o tipo de dano sofrido pela vítima:

“Como o dispositivo em tese não faz qualquer observação, parecendo possível a reparação de qualquer espécie de dano, seja ele material, moral, estético, etc. Evidentemente, quando o delito não causar danos à vítima (v.g., crimes contra a paz pública), esta condição não será imposta. Também não se admite a imposição desta condição quando restar evidenciada a impossibilidade de o investigado reparar o dano ou restituir a coisa à vítima (v.g., vulnerabilidade financeira)” .

Todavia, Nucci, p. 223, 2020,  tem uma visão ríspida sobre essa condição, pois percebe que tal circunstância pode ser incluída como útil para aqueles investigados que possuem alto poder aquisitivo:

“trata-se de um discurso completo e preparado para incluir-se em quase todas as leis penais e processuais penais, especialmente as que se voltam a conceder benefícios aos agentes criminosos. No Brasil, apesar disso, considera a criminalidade de baixo poder aquisitivo, se pode assegurar que quase nunca ocorre a indenização. Poderá ser útil para a criminalidade de alto poder aquisitivo.”

Outra condição é a renúncia voluntária de bens e direitos que serão apontadas pelo representante do Ministério Público, que foram utilizados como instrumentos, produtos ou proveito do crime praticado. O próximo passo foi, apresentar o dispositivo de prestação de serviço à comunidade ou entidade pública pelo andamento correspondente da pena mínima conferida a infração penal. O que torna essa condição atrativa para o investigado é a diminuição de um a dois terços que a pena sofre (Moreira, 2020).

Apresentando o art. 45 do Código Penal, a entidade pública com a função de proteger os bens jurídicos parecidas com as que foram lesadas pelo delito praticado. A última expõe uma liberdade ao Parquet de indicar outra condição, com a advertência de ser proporcional e compatível com a infração imputada. Em razão disso, Nucci, p. 223, 2020, faz duras críticas a respeito dessa condição, pois segundo ele esse inciso não andou bem:

“Nunca deu certo uma condição aberta para se fixar qualquer coisa. Note-se o disposto no art. 79 do Código Penal: “a sentença poderá descrever outras condições a que fica subjulgada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado”. O referido art. 79 refere-se à suspensão condicional da pena. Em três décadas de magistratura, jamais vi uma condição advinda da mente do juiz que fosse razoável e aceita pelo Tribunal. Portanto, dentro do princípio da legalidade, esperamos que o membro do Ministério Público não cometa os mesmos erros que os juízes já realizaram por conta do art. 79 do CP.”

Enfim, é importante ressaltar que o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM), despontando que o Acordo de Não de Persecução Penal não estabelece penas, mas direitos e compulsões decorrentes da negociação, pois as medidas são voluntariamente acordadas e não causa qualquer efeito a partir daí, como a reincidência (Lima,2020).

O entendimento sobre o assunto é confirmado no §12 do art. 28-A da lei processual penal, onde mostra que o acordo não constará na certidão de antecedentes criminais, salvo para dizer se nos últimos 5 (cinco) anos, não foi outorgado com tal benefício ao autor da infração (Moreira, 2020).

Uma observação sobre o art. 28-A do Código de Processo Penal são os estancamentos, podendo se destacar os exemplos: o da ANPP que não pode ser aplicado quando no caso concreto for cabível a transação penal da Lei 9.099/95; A reincidência do investigado ou quando houver elementos probatórios de conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, salvo quando as passadas infrações penais forem consideradas como pretéritas (Barbosa,2020).

Além do mais, o acordo não poderá ser nomeado se o investigado tiver sido beneficiado com outro meio de justiça negocial, como a barganha penal, o próprio acordo de não persecução penal e a suspensão condicional do processo, nos 5 (cinco) anos anteriores ao praticar a infração (Lima,2020).

Tem-se como última proibição para a aplicação do Acordo de Não Persecução Penal de forma inicial onde não ressalva que a vítima da violência doméstica ou familiar deve ser mulher, consentindo importar se o delito foi praticado contra homem ou mulher (Nucci,2020).

Na ultima parte do inciso, o legislador delimita a vítima sendo mulher para não concessão da barganha, não envolvendo a infração penal quando cometida ou não no âmbito de violência doméstica e familiar. Nucci, p.225,220, diz sobre esse assunto:

“Finalmente, proibe-se esse acordo no cenário da violência doméstica ou familiar, assim como, praticados contra a mulher, o que confirma a meta da legislação brasileira de excepcionar a agressão de homens contra mulheres, pretendendo estancar um dos pontos nevrálgicos da criminalidade no Brasil.”

Logo após acordo firmado entre as partes envolvidas, incidirá a homologação realizada em audiência, na qual o juiz averiguará a voluntariedade com a oitiva do investigado junto ao seu defensor, e a legalidade.

Na audiência, o magistrado pode ponderar as condições como inadequadas, insuficientes ou abusivas, o que levará na devolução dos autos ao Ministério Público para uma reformulação da proposta, devendo o investigado e seu defensor analisar se possui a necessidade de complementar as investigações ou oferecer a denúncia (Lima,2020).

Destaca-se que o juiz poderá recusar a homologação, caso perceba que os requisitos não foram preenchidos. Em caso de homologação, a vítima será intimida e os autos serão devolvidos ao Parquet para que a execução seja iniciada no juízo da execução penal (Lima,2020).

O descumprimento do acordo em qualquer que seja a condição estipulada, o órgão acusador informará ao juízo para que seja rescendida a negociação e posterior oferecimento da denúncia, podendo servir como eventual não oferecimento da suspensão condicional do processo. Entretanto, com o seu cumprimento será decretado à extinção da punibilidade do investigado (Nucci,2020).

Ainda na discussão se a proposta do Acordo de Não Persecução Penal é uma discricionariedade do Ministério Público ou um direito subjetivo do investigado, onde o dispositivo que trata sobre a negociação proporciona a possibilidade de o investigado requerer a remessa dos autos a órgão superior, ou seja, ao Procurador Geral, de acordo com art. 28 do Código de Processo Penal, caso não seja sugerido (Lima,p.276, 2020):   

“A partir da premissa de que o acordo de não persecução penal deve resultar da convergência de vontades, com necessidade de participação ativa das partes, não nos parece correta a assertiva de que se trata de direito subjetivo do acusado, sob pena de se admitir a possibilidade de o juiz determinar sua realização de ofício, o que, aliás, lhe retiraria sua característica mais essencial, qual seja o consenso.” 

No entanto, de acordo com a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal de número 696, o Acordo de Não Persecução Penal pode ser encaminhado ao Procurador-Geral caso o Ministério Público rejeite sua proposta, desde que preenchidos os requisitos legais. Essa analogia com o artigo 28 do Código de Processo Penal tem como objetivo beneficiar o investigado. (Moreira, 2020).

Deste modo, se entende que não é uma liberdade discricionária do membro do Ministério Público, mas sim um poder-dever, pois se deve analisar os requisitos do acordo, e caso estejam devidamente preenchidos, o benefício deve ser proposto ao investigado.

Dessa forma, é possível apresentar recurso administrativo ao Procurador-Geral ou a um órgão de revisão ministerial, conforme estabelecido na nova redação do artigo 28 do Código de Processo Penal, quando não for oferecida a oportunidade de acordo. (Moreira, 2020).

2.1 A Ruina do Sistema Penitenciário

Conforme o relatório do Infopen referente ao ano de 2017, publicado em 8 (oito) de dezembro do mesmo ano, alcança-se à melancólica constatação de que o sistema penal brasileiro se encontra em estado crítico (Brandalise, 2018).    

Perante o exposto, existe uma necessidade de maior atenção quanto à situação atual da conjuntura da justiça criminal pátria, pois os números que se apresentam são contundentes em demonstrar a urgência por renovações legislativas e procedimentais, a fim de atenuar os demasiados defeitos existentes.   

Segundo as estatísticas desanimadoras do BNMP. O Brasil ultrapassou a Rússia e subiu ao sombrio pódio dos países com as maiores populações carcerárias do mundo. De acordo com o estudo, em 2017 eram 726.712 pessoas presas conforme a figura 1 abaixo, data limite para a análise (BNMP,2017).

Figura 1: Banco Nacional de Monitoramento de Prisões.

FONTE: O BNMP dá conta que esse total atualmente é de 812.000 detentos. Disponível em . Acesso em out.2023.

Dos indivíduos privados de liberdade, quase 690.000 estão detidos nos sistemas penitenciários estaduais, aproximadamente 36.000 estão nas secretarias de segurança ou carceragens de delegacias, e pouco mais de 400 estão em prisões federais. No entanto, é importante ressaltar que havia apenas 368.049 vagas disponíveis na época. A superlotação é evidente, com uma taxa de ocupação de 197,4% (Brandalise, 2018).   

Além disso, é importante destacar que o Brasil se destaca em relação a outras nações concorrentes, como os EUA, China e Rússia, por estar aumentando significativamente o número de presidiários.

No entanto, ao contrário de seus concorrentes nessa tendência preocupante, o Brasil tem visto uma redução em seus números. Comparando com o ano de 1990, quando o país tinha 90 mil presos, houve um aumento de mais de 700% na população carcerária até junho de 2016. É importante ressaltar que 32% dos detentos atuais não possuem condenação (Brandalise, 2018).   

No entanto, as empresas concorrentes nessa competição mórbida estão diminuindo sua participação. Com base em dados de 1990, quando o país tinha uma população carcerária de 90 mil pessoas, houve um aumento de mais de 700% até junho de 2016. É importante ressaltar que 32% dos detentos atuais não possuem condenação formal (Binder,2017).

Em relação à classificação por tipos de crimes, o tráfico de entorpecentes é o mais comum, representando 28% das incidências penais que resultaram na privação de liberdade dos detentos (Binder,2017).

Além disso, quando somamos furtos e roubos, eles representam 37% dos detentos brasileiros. Os homicídios, por sua vez, são responsáveis por 11% das prisões. Embora existam análises abrangendo diversos outros aspectos do sistema prisional nacional, como estudos sobre cor, gênero, tempo de pena, modalidades de regime, nacionalidades dos presidiários e escolaridade, é importante destacar o objetivo deste trabalho em relação à combinação da superlotação com o tipo de crime cometido.

Isso ocorre devido à Resolução 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público, que trouxe várias inovações, incluindo a possibilidade de celebrar acordos de não persecução penal. Essa medida tem como objetivo transformar o sistema judicial criminal brasileiro, a fim de reduzir a superlotação de processos criminais nos tribunais do país (Nucci,2020).

Com a implementação do acordo de não persecução penal, o Ministério Público ganha a capacidade de propor medidas alternativas nos casos de crimes menos graves, o que agiliza o andamento dessas causas. Isso permite que crimes mais graves, como homicídios, latrocínios e estupros, recebam a devida atenção necessária (Lima,2020).

Dentro dessa perspectiva, o Conselho Nacional do Ministério Público estabeleceu a resolução como um ato normativo infralegal, definindo os parâmetros para a proposta de celebração do acordo. Isso visa evitar o desperdício de tempo, recursos policiais e judiciais, dinheiro público e, muitas vezes, prisões ilegais e desnecessárias em casos de menor impacto. Essa abordagem vai de encontro às necessidades do Brasil em busca da melhoria do sistema judicial criminal e do sistema carcerário.   

Essa conclusão é obtida ao analisar a parte final do estudo mencionado, na qual é observado que 13,5% da população carcerária consiste em presos condenados com penas de 2 a 4 anos. Mantendo a taxa de crescimento da população carcerária em 8,3% ao ano, o Brasil alcançará a preocupante marca de 1,5 milhão de presos até 2025 (Brandalise, 2018).

A figura 2 abaixo é uma reproduz parcialmente, as penas até 15 anos de reclusão.

Figura 2: Banco Nacional de Monitoramento de Prisões

Fonte: https://www.gov.br/senappen/pt-br/pt-br.

Assim, ao tomar como referência os sistemas jurídicos de países como Alemanha, Itália e Estados Unidos, o Brasil pode buscar uma nova realidade nos setores mencionados, especialmente no que se refere a crimes de menor gravidade. O aumento do uso do acordo de não persecução penal nessas situações pode contribuir para reduzir a lentidão do sistema judiciário penal e aliviar a superlotação das prisões do país, evitando prisões desnecessárias ou até mesmo ilegais (Brandalise, 2018).     

Como uma forma de reforçar, é evidente que, apesar das críticas que possam surgir, como o viés utilitarista a ser discutido posteriormente neste trabalho, a implementação do acordo de não persecução penal, com a flexibilização do princípio da obrigatoriedade da ação penal, pode apresentar uma alternativa viável para lidar com essa situação lamentável, concentrando esforços jurídicos na busca por uma persecução penal de qualidade.   

2.2 Sobre a inconstitucionalidade do Acordo de Não Persecução Penal

No sistema jurídico do Brasil, é fundamental que todas as leis estejam em conformidade com a Constituição, independentemente de terem sido promulgadas antes ou depois dela. Se uma lei não cumprir os princípios constitucionais, ela poderá ser considerada inconstitucional, tanto em aspectos formais quanto materiais (Lenza,2020).

A inconstitucionalidade formal, como o próprio nome indica, refere-se à violação das formalidades no processo de elaboração da lei, conforme apontado pelo autor Canotilho Lenza em 2020.

A inconstitucionalidade formal refere-se à invalidade do ato normativo em si, independentemente de seu conteúdo, levando em consideração apenas a forma de sua manifestação. Nesse caso, o ato é afetado por vícios em seus pressupostos, no procedimento de sua elaboração e em sua forma final.

É evidente que o legislador constituinte considerou tanto o conteúdo quanto a forma ao elaborar a norma, uma vez que, para evitar irregularidades, a formação da lei deve seguir o devido processo legislativo, a fim de que essa lei seja considerada válida em termos de formalidade.

A inconstitucionalidade material ocorre quando o conteúdo da norma viola diretamente preceitos, normas ou princípios da Constituição. Conforme explicado por Lenza em 2020, essa violação refere-se ao desrespeito às disposições fundamentais da Carta Magna:

“A inconstitucionalidade material revela uma incompatibilidade substancial de conteúdo entre a lei ou ato normativo e a Constituição. Isso significa que há uma contradição entre as disposições da norma e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição. Pode traduzir-se no confronto com uma regra constitucional — e.g., a fixação da remuneração de uma categoria de servidores públicos acima do limite constitucional (art. 37, XI) — ou com um princípio constitucional, como no caso de lei que restrinja ilegitimamente a participação de candidatos em concurso público, em razão do sexo ou idade (arts. 5.o, caput, e 3.o, IV), em desarmonia com o mandamento da isonomia. O controle material de constitucionalidade pode ter como parâmetro todas as categorias de normas constitucionais: de organização, definidoras de direitos e programáticas”.

A inconstitucionalidade material é mais evidente, uma vez que é lógico pensar que uma lei não pode contrariar, direta ou indiretamente, a Constituição. Nesse contexto, não se trata de questões procedimentais ou processuais, mas sim do conteúdo. A Constituição estabelece, em certo sentido, que é inadmissível que as leis infraconstitucionais determinem algo em sentido oposto.

O acordo de não persecução penal foi incorporado ao sistema jurídico brasileiro pela lei 13.964/19, também conhecida como Pacote Anticrime. No que diz respeito à forma, essa lei atendeu a todos os requisitos legais, não apresentando nenhum vício de formalidade, o que exclui a discussão sobre sua inconstitucionalidade em relação à forma (Tavares, 2020).

No entanto, em relação ao conteúdo abordado na nova lei, pode haver possíveis conflitos com a Constituição, uma vez que o acordo em questão entra em choque direto com diversos princípios constitucionais vigentes no sistema jurídico brasileiro. Diante disso, é possível constatar que, se a norma entrar em conflito com princípios vigentes, pode ocorrer inconstitucionalidade material.

Capítulo 3:

3. AS ACUSAÇÕES EXAGERADAS E OS ERROS COMETIDOS DE FORMA EXAGERADA

Uma questão de extrema importância refere-se às situações em que o acordo de não persecução penal não é cabível devido ao excesso de acusação ou erro. Essas circunstâncias só podem ser reconhecidas durante a sentença ou na fase recursal, seja por meio da desclassificação da imputação ou por uma absolvição parcial.

Em ambas as situações, seja na sentença ou no acórdão, será necessário cumprir o requisito objetivo de uma quantidade mínima de pena estabelecida para o crime, o que irá levar o Ministério Público a oferecer a proposta do acordo de não persecução penal.

Dessa maneira, é importante compreender o instituto não apenas como um acordo para evitar a persecução penal integral, mas também como uma possibilidade de interromper o prosseguimento de uma persecução penal já em curso (Nucci,2016).  

O reconhecimento pelo Poder Judiciário do excesso na acusação não deve causar prejuízo ainda maior ao réu do que o já ocorrido no processo, nem inviabilizar o exercício de seu direito público subjetivo, assim como o poder-dever do Ministério Público. Por outro lado, caso haja uma alteração na imputação devido ao reconhecimento pelo juiz, o Ministério Público passa a ter a obrigação de analisar a possibilidade de oferecer o acordo (Faria, 2020).

Há discussões sobre como deve ser conduzido o procedimento para instruir o expediente do acordo de não persecução penal. Para evitar que uma decisão seja proferida e encerre a jurisdição, o juiz, ao absolver parcialmente o acusado ou desclassificar a imputação, deve solicitar ao Ministério Público que avalie a possibilidade de oferecer o acordo de não persecução penal (Lima,2020).

O assunto mencionado acima não é novo, embora o instituto em si seja. Uma situação semelhante já ocorre com a suspensão condicional do processo, que também possui como um de seus requisitos a pena estabelecida no tipo penal imputado.

Portanto, considera-se  que se trata de uma hipótese de interpretação análoga àquela estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula 337, a qual estabelece que é possível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.

Além disso, é ainda mais importante não protelar a apreciação de uma denúncia apresentada, seja no momento do recebimento inicial ou na análise dos argumentos apresentados na Resposta à Acusação.

Da mesma forma, é necessário realizar uma análise cuidadosa ao julgar um Habeas Corpus impetrado para questionar a decisão de recebimento da denúncia e/ou a recusa em rejeitá-la ou absolver sumariamente o réu (Faria, 2020).

Ser submetido a um processo indevido é uma situação que causa constrangimento ilegal, conforme previsto na Revista da Defensoria Pública. No caso específico, além disso, isso resultaria na inviabilização prática do acordo de não persecução penal (Lima,2020)

Em qualquer uma das situações, o fato de o réu não ter admitido a prática do crime imputado durante o processo não pode ser utilizado como justificativa para negar o acordo de não persecução penal, pelos motivos mencionados anteriormente ao abordarmos os requisitos para a oferta.

Após o reconhecimento da possibilidade de acordo devido a um excesso acusatório, é necessário permitir que o réu efetive o acordo, independentemente da estratégia defensiva adotada durante o processo. O exercício legítimo de um direito constitucionalmente garantido não pode, em nenhuma circunstância, ser interpretado de forma prejudicial ao réu (Lima,2020).

CONCLUSÃO

Com base nos resultados apresentados na pesquisa em questão, pode-se concluir que a Justiça Negocial no sistema jurídico brasileiro passou por uma série de desenvolvimentos até chegar ao estágio atual, desde a implementação da transação penal pelos Juizados Especiais até a introdução do Acordo de Não Persecução Penal.

Essa abordagem pode ser definida como uma maneira de aliviar a carga do Poder Judiciário com o grande volume de processos que são apresentados diariamente. Além disso, busca-se adotar medidas que visam sanções diferentes da prisão, como a prestação de serviços à comunidade e a reparação do dano, desde que sejam cumpridos os requisitos legais. Ficou evidente que os acordos firmados com o acusado não têm o propósito de descriminalizar, mas sim oferecer alternativas à prisão.

É incontestável que a sanção penal está intrinsecamente ligada à jurisdição. A resposta penal oferecida a um litígio criminal processualmente apresentado situa-se entre o poder punitivo do Estado e o direito à liberdade do indivíduo. Ao longo deste estudo, se chegou à conclusão de que o exercício do direito de ação em tribunal não ocorre de forma invariável em todos os casos de conduta criminosa, e nem poderia,  mas sim nos casos em que a resposta penal deve ser obrigatoriamente aplicada.

É indiscutível que a criminalidade nos dias de hoje não é mais a mesma desde a adoção do sistema acusatório, conforme estabelecido na Constituição Federal. Portanto, atualmente, não pode ser enfrentada exclusivamente por meio do sistema processual, que se limita ao princípio mandamental de apresentação da denúncia, desconsiderando outras circunstâncias que frequentemente resultam em uma resposta estatal ineficaz para as partes envolvidas em um processo judicial.

No entanto, é necessário percorrer um caminho cauteloso para que o Ministério Público possa tomar decisões sobre política criminal sem comprometer a justiça consensual. Isso requer a observância cuidadosa dos princípios fundamentais que devem ser respeitados, independentemente do sistema processual adotado, para evitar violações aos mandamentos constitucionais, como o princípio da dignidade da pessoa humana, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, entre outros.

Ao final da pesquisa se observou o alcance do objetivo geral do trabalho em explanar sobre acordo de não persecução penal, e se observa que ainda existe um longo caminho para a aceitação no ordenamento jurídico brasileiro, ainda será necessário várias análises e estudos sobre a justiça negocial no Brasil. Os objetivos específicos foram debatidos e vários fatores foram mostrados sobre a viabilidade do tema para justiça brasileira.

É imprescindível a incorporação adequada do Acordo de Não Persecução Penal no sistema jurídico brasileiro, uma vez que o legislador se preocupou em alinhar a prática da barganha ao sistema acusatório previsto na Constituição e à tradição jurídica da civil law, por meio da promulgação da Lei nº 13.965/2019. Observa-se também a relevância desse instituto, pois garante a agilidade na resolução de conflitos de média gravidade, ao mesmo tempo em que evita o uso excessivo e desnecessário do encarceramento.

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