ACOLHIMENTO FAMILIAR E O BEM ESTAR DO MENOR

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202509170938


Marcela Lacerda Macuxi


Resumo

O presente estudo visa analisar o acolhimento familiar em face do bem estar do menor. Apresenta-se com objetivo analisar qual o benefício que o acolhimento familiar pode proporcionar ao menor em prol do seu bem estar respeitando o princípio do melhor interesse da criança. A metodologia proposta foi aplicada com base na doutrina e jurisprudência brasileira. A pesquisa caracterizou-se como qualitativa e exploratória, tendo sido utilizados como procedimento de coleta de dados o estudo da legislação e sua aplicabilidade. Obteve-se com resultado principal a constatação de que ao refletirmos sobre o processo do acolhimento familiar vimos que quando ambas as partes se acolhem, se aceitam e se respeitam se realiza a coexistência e surge o amor que se expande de forma espontânea se firmando como mais alto valor da vida. Assim, ficou evidenciado que o acolhimento familiar deve ser priorizado, diante da impossibilidade de permanência da criança ou adolescente no seio da sua família de origem, não se medindo esforços para que crianças e adolescentes tenham resguardado o direito constitucional à convivência familiar.

Palavras-chave: Acolhimento Familiar. Bem Estar. Menor.

Abstract

This study aims to analyze foster care in light of the child’s well-being. Its objective is to analyze the benefits foster care can provide to minors, respecting the principle of the child’s best interests. The proposed methodology was applied based on Brazilian doctrine and jurisprudence. The research was characterized as qualitative and exploratory, using the study of legislation and its applicability as a data collection procedure. The main result was that, when reflecting on the foster care process, we saw that when both parties welcome, accept, and respect each other, coexistence occurs, and love emerges, expanding spontaneously, establishing itself as the highest value in life. Thus, it was evident that foster care should be prioritized when children or adolescents are unable to remain with their families of origin, sparing no effort to ensure that children and adolescents have their constitutional right to family life safeguarded.

Keywords: Foster Care. Welfare. Minor.

Introdução

Diante das mudanças experimentais no cerne das relações humanas e, em especial das relações familiares no decurso do tempo, sobretudo com o advento da Constituição Federal de 1988, emerge a importância do estudo do tema proposto.

Atualmente, o novo padrão enfrentado no bojo das relações familiares e de filiação alterou todos os parâmetros relativos aos conceitos de poder familiar, de convivência familiar e da própria estrutura familiar de um modo geral.

A consistência moral dos princípios constitucionais, a vigência do novo Estatuto da Criança e do Adolescente, inclusive a ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança representou o delineamento de novos paradigmas no âmbito das relações familiares. 

Nesse contexto, notadamente, surge o cuidado que se deve ter com os valores e princípios jurídicos concernentes ao processo do acolhimento familiar principalmente quanto a valorização do homem como ser que precisa de forma imprescindível dos afetos do seio familiar. O acolhimento familiar e o bem-estar do menor representam a solução do abandono de crianças e adolescentes e suprem a falta da família biológica, e a sua aplicabilidade costumeira no cotidiano da sociedade e aceitação no sistema jurídico, possuem fundamentos de permissão inseridos nos valores e princípios jurídicos. 

Ademais, especialmente no campo do Direito de Família, fica evidente a incapacidade dos textos legais, normas jurídicas positivadas, no sentido de acompanhamento da evolução social da família. Portanto, é certo que a abordagem do cuidado como princípio jurídico só se torna viável diante do reconhecimento da importância e necessidade da aplicação de princípios para a solução de determinados dissídios que escapam ao alcance da letra fria da lei e diante da impossibilidade de se afastar o conteúdo moral do Direito.

É exatamente o cuidado com o processo do acolhimento familiar de menores que a jurisprudência tem se preocupado e tentando assegurar o bem-estar buscando fundamentar suas decisões nas entrelinhas da dignidade da pessoa humana e de todos os direitos fundamentais. Desta forma, diante do ato do acolhimento familiar, tem-se que a mera aplicação de uma norma, muitas vezes, escapa ao cuidado que se pretendeu atingir quando da sua elaboração, logo cabe a aplicação dos princípios como absolutamente necessário para a resolução de casos mais complexos, sem que a lei positivada seja aplicada automaticamente.

Na análise do tema proposto é apresentado o Direito de Família com seus conceitos, natureza jurídica, princípios e previsão constitucional com o intuito de justificar a necessidade da constituição familiar e a importância de se conviver em família. Em seguida destacamos o instituto do acolhimento familiar com seus conceitos, natureza jurídica, e previsão constitucional balizando a discussão da importância que este ato representa em defesa do bem-estar do menor na família substituta.

Por fim, discutimos o acolhimento familiar relacionado ao bem-estar do menor fundamentando sua regularidade positivada na norma jurídica brasileira, e que tendo em vista o vínculo afetivo e o bem-estar do menor diante do princípio do melhor interesse da criança é aceito na jurisprudência, e que contribui suprimindo parcialmente com o abandono de crianças e adolescentes. 

O presente estudo trata-se de uma pesquisa com o objetivo de analisar o acolhimento familiar e o bem estar do menor. Para tanto a pesquisa abordou o tema em questão de forma qualitativa, os objetivos com pesquisa exploratória e os procedimentos técnicos foram bibliográficos

Direito de família

Na sociedade, e devido a interações, as pessoas tendem a conviver em grupos para satisfazer suas necessidades básicas, seja pessoal ou patrimonial e neste aspecto em especial a família. Nesse contexto a família torna-se o centro irradiador de vida, cultura e experiência onde o homem nasce e durante o seu desenvolvimento forma a sua personalidade para toda a vida. A família trata-se de uma instituição geradora e formadora de pessoas e núcleo essencial para a preservação e o desenvolvimento da nação.

O direito de família representa, segundo Bittar (2006, p. 1) o conjunto de princípios e de regras que regem as relações entre o casal e os familiares, vale dizer, pessoas ligadas por vínculos naturais ou jurídicos, conjugais ou de parentesco.

Neste ramo do Direito regula as relações existentes entre os seus diversos membros e as influências que exercem sobre as pessoas e bens. De acordo com o Código Civil, examina-se sucessivamente o casamento, como base da família, as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges, as relações entre pais e filhos, definindo-se as diversas espécies de filiação e o conceito de poder familiar, união estável e a tutela e a curatela, instituição protetora dos incapazes (WALD, 2005, p. 3).

A noção de família tem variado através dos tempos, podendo mudar seus conceitos, numa mesma época, a palavra tem sido usada em acepções diversas. Nos direito romano não apenas significava o grupo de pessoas ligadas pelo sangue, ou por estarem sujeitas a uma mesma autoridade, como também se confundia com o patrimônio nas expressões actio familiae erciscundae, agnatus proximus familiam habeto e outras (WALD, 2005, p. 3).

Atualmente, conhecemos, ao lado da família em sentido amplo, conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da consanguinidade, ou seja, os descendentes de um tronco comum, a família em sentido estrito, abrangendo o casal e seus filhos legítimos, legitimados ou adotivos.

No direito de família destaca-se a importância primordial do elemento social e ético, dependendo, pois de uma realidade oriunda de contingências históricas. Abrange o direito de família, além de normas essencialmente jurídicas, diretrizes morais que só revestem o aspecto jurídico e passam a ser munidas de sanção quando frontalmente violadas (WALD, 2005, p. 4).

Conceito e noções gerais

O direito de família é conceituado de diversas formas caracterizando a família e sua origem, por exemplo, Venosa (2012, p. 2) considera a família em conceito amplo e em conceito restrito, sendo assim, em conceito amplo, como parentesco o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar compreendendo os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, inclusive do cônjuge que nesse sentido se denominam parentes por afinidade ou afins. No conceito restrito a família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder ou poder familiar.

Já de forma diferenciada Diniz (2009, p. 4) não somente conceitua como também destaca elementos constitutivos em relação ao direito de família. Nesse sentido a autora constitui o direito de família afirmando a existência de um complexo de normas que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal e sua dissolução, a união estável, as relações entre pais e filhos, o vínculo do parentesco e os institutos complementares de tutela e curatela.

De todos os ramos do direito segundo Gonçalves (2011, p. 17) o direito de família é aquele que está ligado de forma mais íntima com a própria vida visto que de modo geral, “as pessoas provêm de um organismo familiar e a ele conservam-se vinculadas durante a sua existência, mesmo que venham a constituir nova família pelo casamento ou pela união estável”. A família constitui a base do Estado tratando-se de uma realidade sociológica e tornando-se o núcleo fundamental em que repousa toda a organização social.

Para Lotufo (2002, p. 22) vários são os sentidos atribuídos à palavra família. No Direito Romano as designações também variavam, mas no seu conceito mais referia-se à família communi iure, isto é, aquela formada pelo conjunto de pessoas que estavam sujeitas à pátria potestas e à manus, do mesmo chefe, caso estivesse vivo. De forma genérica entende-se que a família é um grupo formado por todas aquelas pessoas ligadas pelo parentesco, seja consanguíneo, civil ou por afinidade.

Em uma outra acepção, um pouco mais limitada, a autora acima citada entende que a família é composta somente pelas pessoas ligadas pelo vínculo de sangue. Restritamente, contudo, significa o núcleo formado pelo pai, mãe e sua prole, derivado do casamento, da união estável, da formação monoparental ou da adoção. Por outro lado, no que tange ao direito sucessório, a família abrange o parentesco em linha reta até o infinito e a colateral até o quarto grau, ou seja, não ultrapassa os primos-irmãos.

Contudo, podemos considerar que o direito de família é mais amplo, não se refere somente às relações entre pessoas ligadas pelo parentesco, mas também a outras figuras que fazem parte do direito assistencial (muito embora tal instituto não advenha de relação familiar, porém em razão de sua finalidade mantém uma conexão com esse direito), como forma de assegurar proteção àqueles indivíduos, segundo Lotufo (2002, p. 22).

Princípios do direito de família

Com o início do novo milênio, de acordo com Diniz (2009), o direito de família busca soluções para os problemas gerados por grandes mudanças sociais, como a inversão de valores, a libertação sexual e a maior participação da mulher na sociedade. As novas configurações familiares, a desbiologização da paternidade e a rápida independência dos filhos do poder familiar levaram a alterações legais que visam adaptar a legislação à realidade social. O objetivo é preservar a coesão familiar, acompanhar a evolução dos costumes e atender às necessidades de diálogo e bem-estar dos membros da família.

Nesse sentido, Gonçalves (2011, p. 21) afirma que “o Código Civil de 2002 procurou adaptar-se à evolução social e aos bons costumes, incorporando também as mudanças legislativas sobrevindas nas últimas décadas do século passado”.

Surgiu, assim, com ampla e atualizada regulamentação dos aspectos essenciais do direito de família à luz dos princípios e normas constitucionais.

Segundo o autor, essas alterações introduzidas visam preservar a coesão familiar e os valores culturais, conferindo-se à família moderna um tratamento mais apropriado à realidade social, atendendo-se às necessidades da prole e de afeição entre os cônjuges ou companheiros e aos elevados interesses da sociedade.

Gonçalves (2011, p. 21) apresenta os seguintes princípios como base em atender os interesses da sociedade regendo-se o novo direito de família: a) princípio do respeito à dignidade da pessoa humana, b) princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros, c) princípio da igualdade jurídica de todos os filhos, d) princípio da paternidade responsável e planejamento familiar, e) princípio da comunhão plena de vida baseada na afeição entre os cônjuges ou conviventes e f) princípio da liberdade de constituir uma comunhão de vida familiar.

De acordo com Figueiredo (2011, p. 228) é necessário observar que hoje busca-se não só uma igualdade formal, mas sim uma igualdade substancial, na medida em que a lei deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. O tratamento desigual dos casos desiguais é exigência do próprio conceito de justiça.

Natureza jurídica do direito de família

Antigamente a família era considerada uma pessoa jurídica, mas com o passar do tempo essa posição foi superada, pois tal conceito não era preciso. Essa afirmação era feita com base nos direitos extrapatrimoniais que marcavam a personalidade da família, como o nome, o pátrio poder (hoje no Código Civil de 2002 poder familiar) e direitos patrimoniais como a propriedade de bem de família.

Conforme Venosa (2012, p. 279) em nosso direito e na tradição ocidental, a família não é considerada uma pessoa jurídica, pois lhe falta evidentemente aptidão e capacidade para usufruir direitos e contrair obrigações. Assim, os pretensos direitos imateriais a ela ligados, o nome, o poder familiar, a defesa da memória dos mortos, nada mais são do que direitos subjetivos de cada membro da família e da mesma forma se posicionam os direitos de natureza patrimonial. A família nunca é titular de direitos, pois os titulares serão sempre seus membros individualmente considerados.

O autor afirma que a família é uma coletividade humana subordinada à autoridade e condutas sociais como instituição, denominando-a como entidades de grupos com personificação anômala.

As relações de família, embora envolvam direitos e interesses que são protegidos pelo Estado, acontecem entre os particulares, no próprio grupo familiar, não importando que a maioria das normas que as circundam seja cogente e de natureza estatutária não se pode desconsiderar que as relações nascem de atos de vontade e interessam diretamente aos particulares, que são as partes envolvidas, e só indiretamente devem interessar à sociedade (LOTUFO, 2002, p. 24).

Farias (2012, p. 52) reconhece o enquadramento da relação de Direito das Famílias fundamentalmente no âmbito do direito privado, por se tratar da mais particular de todas as relações que podem ser estabelecidas no âmbito da ciência jurídica. Por certo, a relação familiar diz respeito a interesses particulares e está incluída na estrutura do Direito Civil porque o interesse fundamentalmente presente diz respeito, essencialmente, à pessoa humana. Exatamente por isso, possuem as relações familiares um caráter acentuadamente privado, destinando-se à tutela do ser, em seus múltiplos interesses morais e materiais.

O direito de família na constituição de 1988

Sabemos que a partir do século XIX os Códigos eram elaborados dedicando normas sobre a família e que naquela época a sociedade era rural e patriarcal, pois guardava traços profundos da família da antiguidade, por exemplo, o Código Civil de 1916. Uma das características, por exemplo, é que a mulher se dedicava aos afazeres domésticos e na Lei a mesma não tinha os mesmos direitos do homem. Logo, o marido era considerado o chefe, administrador e o representante da sociedade conjugal. Já os filhos submetiam-se à autoridade paterna, como futuros continuadores da família. 

Em determinada época o Estado absorveu da Igreja a regulamentação da família e do casamento sem, no entanto, afastar muito sua autoridade. Com isso manteve-se a indissolubilidade do vínculo do casamento e a incapacidade relativa da mulher, bem como a distinção legal de filiação legítima e ilegítima. Ocorre que gradativamente a partir da metade do século XX a legislação foi sendo modificada e atribuiu direito aos filhos ilegítimos e tornando a mulher plenamente capaz.

Atualmente a família socioafetiva tem sido priorizada na doutrina e na jurisprudência, visto que, como comentamos anteriormente, no século passado o Código Civil de 1916 e as leis posteriores vigentes na época, regulavam a família constituída unicamente pelo casamento, de modelo patriarcal e hierarquizada. Nos tempos modernos o enfoque dado ao Direito de família é identificado tem indicado novos elementos que compõem as relações familiares, destacando-se os vínculos afetivos que norteiam a sua formação segundo Gonçalves (2011, p. 33).

Segundo Farias (2012, p. 83) a Constituição Federal de 1988 conduz ao raciocínio de que “a milenar proteção da família como instituição, unidade de produção e reprodução dos valores culturais, éticos, religiosos e econômicos, dá lugar à tutela essencialmente funcionalizada à dignidade de seus membros”. Trata-se de entidade de afeto e solidariedade, fundada em relações de índole pessoal, voltadas para o desenvolvimento da pessoa humana, que tem como diploma legal regulamentar a Carta Magna.

Segundo Venosa (2012, p. 16) “a Constituição de 1988 consagra a proteção à família no art. 226, compreendendo tanto a família fundada no casamento, como a união de fato, a família natural e a família adotiva”.

A mediação nas ações processuais de família

Litígios familiares são complexos e exigem flexibilidade do Judiciário para evitar maiores danos às partes. A mediação no direito de família surge como uma forma de solucionar ou ao menos amenizar esses conflitos, incentivando o acordo e a cooperação entre os envolvidos. Essa abordagem promove uma mudança de perspectiva, onde as partes aprendem a ver o conflito de forma construtiva, facilitando a conciliação (Cachapuz, 2003, p. 137). 

Como resultado, o relacionamento familiar pode ser preservado, evitando novos desentendimentos. Além disso, a mediação traz benefícios práticos, como a celeridade processual, resolvendo casos que, de outra forma, levariam anos no sistema judiciário. Dessa forma, as partes são preparadas para tomar decisões de forma consensual, superando as disputas emocionais (Cachapuz, 2003, p. 137). 

Por ser um instituto antigo, a mediação tem sua origem e utilização em vários países como, por exemplo, na Europa e América do Norte, sendo aplicada há mais de 50 anos apresentando resultados satisfatórios e com um grande número de acordos. Recém sancionada no Brasil a mediação já solucionou inúmeras ações judiciais sendo reconhecida pelos operadores do direito (CACHAPUZ, 2006, p.24).

A mediação para apresentar resultados precisar ter suas técnicas bem utilizadas pelo mediador, bem como ser reconhecida pela sociedade como um instrumento processual na facilitação da resolução dos litígios amadurecendo o relacionamento das partes e prevenindo danos emocionais, pois dessa forma o sucesso da mediação não será apenas e exclusivamente um acordo formal assinado entre as partes, mas também apresentará resultados positivos no resultado justo e que desmotive sentimento de vingança e ressentimento.

A mediação não é uma terapia a ser desenvolvida pelo mediador, nem uma competição, apenas sinaliza um novo contexto em meio à divergência em que as partes podem expandir sua compreensão para alcançar a harmonia emocional e uma possível coexistência.

As chamadas ações de famílias abrangem os processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação. 

Em relação às ações de divórcio e separação, a regra prevista no Código de Processo Civil de 1973 estabelecia como foro competente o da residência da mulher (art. 100, inc. I), o que acabou gerando algumas discussões em especial no campo constitucional, por suposta ofensa ao princípio da isonomia.

Em relação as ações de reconhecimento e extinção de união estável, como não havia previsão expressa no Código de Processo Civil de 1973, a jurisprudência passou a considerar como foro competente a residência da companheira, por aplicação análoga do comando inserto no art. 100, inc. I, do Código de Processo Civil de 1973.

De acordo com o Código de Processo Civil de 2015, art. 53, inc. I, o foro competente deixará de ser o da residência da mulher para ser o do domicílio do guardião de filho incapaz e não existindo filho incapaz, será competente o foro do último domicílio do casal.

Se, no entanto, nenhuma das partes residir no antigo domicílio, será competente o foro de domicílio do réu (regra geral do artigo 46 do CPC/2015), sendo assim a nova redação da lei retira o foco da proteção dos interesses da mulher e o dirige, em um primeiro momento, para a proteção dos interesses do incapaz, ou, na inexistência de filho incapaz, o do casal.

Nas ações envolvendo pedido de guarda prevalece a regra insculpida no art. 147, inciso I do Estatuto da Criança e do Adolescente e na Súmula nº 383 do STJ, ou seja, o foro de domicílio de quem exerce a guarda será competente para julgar ações sobre interesse de menores.

O mesmo entendimento se aplica aos pedidos de visitação e filiação, sendo que as questões sobre filiação de filhos não menores deverão em via de regra ser propostas nas seguintes ocasiões: a) do domicílio do réu, como regra, nos termos do art. 46, caput, do CPC/2015; b) do domicílio do autor, se for cumulada com pedidos de alimentos (artigo 53, inciso II); e c) do foro do inventário, caso o pedido seja cumulado com petição de herança.

O Código de Processo Civil de 2015 em todos os tipos de ação processual promove a oportunidade acerca da mediação e da conciliação na resolução de conflitos litigiosos e consensuais. 

Em demandas que envolvem a mediação ou a conciliação é de suma importância a presença e participação de profissionais de outras áreas como, por exemplo, psicólogos e assistentes sociais para que a orientação das partes na busca da solução do conflito seja mais adequada possível ao caso concreto, além de considerar os aspectos jurídicos do caso concreto, bem como os reflexos sociais e psicológicos que poderão ser gerados como, por exemplo, pela ruptura da estrutura familiar.

A ideia de inserir a autocomposição no direito de família é apreciável, principalmente quando promove a participação de profissionais de outras áreas, devidamente nomeado pelo juiz, ao caso concreto com o objetivo de melhor compreender os sentimentos emotivos de cada parte envolvida no processo e na dinâmica familiar, com vistas a encontrar a solução que melhor atenda às peculiaridades do caso concreto.

De acordo com o artigo 694 c/c o art. 6951, a tentativa da conciliação é uma fase obrigatória nesse tipo de procedimento, refletindo inclusive no trâmite processual, pois até o momento da audiência não se exigirá a contestação da parte ré, que só deverá apresentá-la quando não for possível a conciliação (art. 6972). Nessa hipótese, a parte ré será intimada na própria audiência, passando a incidir, a partir de então, o prazo de 15 dias para a apresentação de sua defesa.

Nos termos do art. 82, inc. II do CPC/1973, o membro do Ministério Público deveria intervir nas causas concernentes ao estado da pessoa, ao pátrio poder, à tutela, à curatela, à interdição, ao casamento, à declaração de ausência e às disposições de última vontade.

Não há necessidade de intervenção obrigatória do órgão ministerial em todas as ações de família, mas somente quando houver interesse de incapaz, tal qual é a ideia inserida no art. 698 do CPC/2015: “Nas ações de família, o Ministério Público somente intervirá quando houver interesse de incapaz e deverá ser ouvido previamente a homologação de acordo”.

O regime de atendimento de acolhimento familiar passou a ser importante com a promulgação da Lei 12.010/2009 que dispõe sobre a Adoção, pois ao lado da guarda e da tutela, o acolhimento familiar desempenha um importante papel temporário de manter a criança e ao adolescente enquanto se busca a reestruturação da família natural. Portanto, são medidas de proteção aplicáveis em situações de risco à criança ou ao adolescente.

É importante frisar que o acolhimento familiar não se confunde com a colocação familiar, pois está direciona-se à inserção da criança e do adolescente em família substituta quando não é possível a reinserção no grupo familiar de origem, enquanto que a primeira tem o objetivo de propiciar meios para que ocorra esse retorno, trabalhando aspectos ligados à família, à criança e ao adolescente (ROSSATO, 2012).

Contudo o acolhimento familiar também pode ser feito sem que haja a intervenção da entidade de atendimento, como ocorre, por exemplo, quando o magistrado promove a entrega da criança ou do adolescente diretamente à família acolhedora, sendo o acompanhamento realizado pelos técnicos do Juízo, por ser uma forma mais usual (ROSSATO, 2012).

O princípio do melhor interesse da criança foi estabelecido pela primeira vez na Declaração dos Direitos da Criança de 1959. O Artigo 2º dessa declaração afirma que as crianças devem ter proteção e oportunidades para se desenvolverem de forma saudável e com dignidade. A partir desse princípio, todas as leis relacionadas às crianças devem priorizar seus melhores interesses (Organização das Nações Unidas, 1959).

O princípio do melhor interesse da criança foi estabelecido na Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e reafirmado na Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 1989. O Brasil ratificou essa convenção em 1990. Esse princípio determina que os interesses de crianças e adolescentes devem ser priorizados pelo Estado, sociedade e família, tanto na criação quanto na aplicação de leis. Isso é especialmente relevante nas relações familiares, onde a criança é vista como uma pessoa em desenvolvimento e com dignidade. No Brasil, o princípio foi formalizado para que todas as ações de instituições públicas e privadas, tribunais e autoridades administrativas considerem, acima de tudo, o melhor interesse da criança (Pereira, 2008, p. 45).

Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o princípio é encontrado no art. 227, que estabelece ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade. O mesmo princípio também é encontrado no Estatuto da Criança e do Adolescente nos arts. 4º e 6º. (Assis, 2012).

Considerações Finais

Ao refletirmos sobre o processo do acolhimento familiar vimos que quando ambas as partes se acolhem, se aceitam e se respeitam se realiza a coexistência e surge o amor que se expande de forma espontânea se firmando como mais alto valor da vida.

No processo do acolhimento familiar é extremamente relevante o cuidado e o afeto como valores que interessam não só ao direito como a outras ciências humanas, reconhecendo limites, conquistas e sensações. É importante o carinho e a delicadeza em todos os momentos do acolhimento.

É fundamental que sejam promovidas campanhas de conscientização sobre o processo do acolhimento familiar, pondo fim a preconceitos e despreparos da sociedade em geral. Sabemos que muito se tem a fazer para combater a violência, o abandono e o desrespeito aos direitos da criança e do adolescente.

O acolhimento familiar deve ser priorizado, diante da impossibilidade de permanência da criança ou adolescente no seio da sua família de origem, não se medindo esforços para que crianças e adolescentes tenham resguardado o direito constitucional à convivência familiar. Na luta contra o abandono há de se buscar rapidez e eficiência nos processos do acolhimento familiar, prevalecendo o Princípio do Melhor Interesse como ferramenta essencial na garantia do bem-estar do menor.

Referências

ASSIS, Zamira de; RIBEIRO, Wesllay Carlos. A base principiológica do Melhor Interesse da Criança: apontamentos para análise da (im) propriedade da expressão “Guarda de Filhos” quando do rompimento da conjugalidade dos genitores. Revista Síntese Direito de Família. v. 14, n. 71, abr/maio 2012.

BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Família. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília, 2002. In: ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum Universitário Rideel. 12. ed. São Paulo: Rideel, 2012.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de Outubro de 1988. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: março, 2021.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília, 1988. In: ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum Universitário Rideel. 12. ed. São Paulo: Rideel, 2012.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069 de 1990. Brasília, 2002. In:

ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum Universitário Rideel. 12. ed. São Paulo: Rideel, 2012.

BRASIL. Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm> Acesso em: março, 2021.

BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. DOU 17.3.2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 018/2015/Lei/L13105.htm> Acesso em: março, 2021.

BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública; altera a Lei 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei 9.469, de 10 de julho de 1997.

BRASIL. Manual de Mediação Judicial. Conselho Nacional de Justiça. 2016. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/07/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf> Acesso em: março, 2021.

CACHAPUZ, Rozane Rosa. Mediação nos conflitos e Direito de Famílias. 1. ed. (ano 2003), 4ª tir. Curitiba: Juruá, 2006.

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988.

CARMONA, Carlos Alberto. Ar bitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/76. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

CINTRA, Antonio Carlos de Araujo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. São Paulo: Editora Saraiva, 1983.

DELFINO, Morgana. O Princípio do Melhor Interesse da Criança e o Direito à Convivência Familiar: os efeitos negativos da ruptura dos vínculos conjugais. Rio Grande do Sul: FDPU, 2009.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. ed., São Paulo: Atlas, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. Vol. 5. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

DONIZETTI, Elpídio. Curso Didádito de Direito Processual Civil. 2017.

FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de Direito Civil: direito de família. Vol. 6. 4 ed. Salvador: JusPODIVM, 2012.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen juris, 2010.

FIGUEIREDO, Fábio Vieira. Direito Civil. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 11. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2004.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. Vol. 6. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

GRECO, Leonardo. Jurisdição voluntária moderna. São Paulo: Dialética, 2003.

GRINOVER, Ada Pellegrini; LAGASTRA NETO, Caetano; WATANABE, Kazuo (Coord.). Mediação e gerenciamento de processos: revolução da prestação jurisdicional. 2a reimp. São Paulo: Atlas, 2008.

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 14 ed. São Paulo: Rideel, 2011.

ISHIDA, V. K. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2014.

LOTUFO, Maria Alice Zaratin. Curso avançado de direito civil: direito de família. Vol. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

MELLO GONÇALVES, Camila de Jesus. Breves considerações sobre o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Disponível em:<http://www.lexeditora.com.br/doutrina_23385195_BREVES_CONSIDERACOES_S

OBRE_O_PRINCIPIO_DO_MELHOR_INTERESSE_DA_CRIANCA_E_DO_ADOLESCENTE.aspx> Acesso em: mar. de 2021.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – Volume único. 8. Ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2016.

PARKINSON, Lisa. Mediação Familiar. Belo Horizonte: Del Rey, 2016.

PEREIRA, Tânia da Silva (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

PEREIRA, Tânia da Silva.; OLIVEIRA, Guilherme de. (coord.). O cuidado como valor jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

QUEIROZ, Antônio Augusto de. Cartilha políticas públicas e o ciclo orçamentário. Brasília, DF: DIAP, 2016. Disponível em: <https://www.diap.org.br/images/stories/cartilha_pp.pdf> Acesso em: março, 2021.

RAMALHO, Fabiana. A mediação no âmbito do direito das famílias. 2017. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/60291/a-mediacao-no-ambito-do-direito- das-famílias> Acesso em: abril, 2021.

RIZZINI, I. Acolhendo crianças e adolescentes. São Paulo: Cortez; Unicef, 2006.

ROSSATO, L. A. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

SILVA JUNIOR, Nilson Nunes da. O conceito de Estado. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 68, set 2009. Disponível em: <http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6742&revista_caderno=9>. Acesso em: abr 2021.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo Cautelar. 25. ed. São Paulo: LEUD, 2009.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2012.

WALD, Arnoldo. O novo direito de família. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo: RT, 2011