ACESSO À JUSTIÇA EM RONDÔNIA: ENTRAVES, INOVAÇÕES E SUPERAÇÃO POR MEIO DO PROJETO FÓRUM DIGITAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE RONDÔNIA

ACCESS TO JUSTICE IN RONDÔNIA: OBSTACLES, INNOVATIONS AND OVERCOMING THROUGH THE DIGITAL FORUM PROJECT OF THE COURT OF JUSTICE OF RONDÔNIA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12213932


Shirley Margarete Alencar de Souza1
Rita de Cássia Pessoa Nocetti2


Resumo

O presente trabalho teve como objetivo identificar os desafios que limitam o acesso à justiça no Estado de Rondônia.  Dessa forma, analisar qual iniciativa o Poder Judiciário de Rondônia adotou para mitigar esses desafios. Ressaltando-se a importância dessa garantia constitucional. A metodologia adotada foi uma abordagem de pesquisa exploratória e procedimentos de pesquisa bibliográfica, por meio de livros, artigos científicos, legislações pertinentes, estatísticas e publicações relacionadas ao tema. Por sua vez, este estudo destacou o Projeto Fórum Digital do tribunal rondoniense como solução eficaz para superar os obstáculos do acesso à justiça no Estado. Por fim, observou-se abrangência nacional deste projeto que aproximou os cidadãos da justiça.

Palavras-chave: Acesso à Justiça. Rondônia. Tribunal de Justiça de Rondônia. Desafios Geográficos, Socioeconômicos e Culturais. Fórum Digital.

Abstract

The present work aimed to identify the challenges that limit access to justice in the State of Rondônia.  Therefore, analyze what initiative the Judiciary of Rondônia adopted to mitigate these challenges. Emphasizing the importance of this constitutional guarantee. The methodology adopted was an exploratory research approach and bibliographic research procedures, through books, scientific articles, relevant legislation, statistics and publications related to the topic. In turn, this study highlighted the Digital Forum Project of the Rondônia court as an effective solution to overcome obstacles to access to justice in the State. Finally, the national scope of this project was observed, bringing citizens closer to justice.

Keywords:  Access to justice. Rondônia. Court of Justice of Rondônia. Geographic, Socioeconomic and Cultural Challenges. Digital Forum.

INTRODUÇÃO

A expressão “acesso à Justiça”, segundo Mauro Cappelletti, refere-se a duas finalidades fundamentais do sistema jurídico: proporcionar um meio pelo qual as pessoas possam reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob a tutela do Estado. Em primeiro lugar, o sistema deve ser acessível de forma equitativa a todos; em segundo lugar, ele deve gerar resultados que sejam justos tanto individual quanto socialmente.

A promoção do acesso à justiça é um elemento fundamental para a consolidação da cidadania e para a efetivação dos direitos humanos. Iniciamos esta pesquisa  com uma rápida explanação da trajetória histórica do acesso à justiça no Brasil.

Esta pesquisa reafirmou a relevância do acesso à justiça como um princípio essencial do sistema jurídico democrático.

Na sequência, apontamos as barreiras geográficas, socioeconômicas e culturais da região que afastam o jurisdicionado da justiça rondoniense. Nessa perspectiva, analisou-se qual medida implementada pelo Poder Judiciário do Estado de Rondônia a fim de enfrentar esses desafios.

Diante disso, o Tribunal de Justiça de Rondônia foi protagonista em uma ação para atender à crescente demanda pela efetivação do direito da população ao acesso à justiça no Estado. Com efeito, idealizou um projeto inovador relacionado ao acesso à justiça: o Fórum Digital se destaca por oferecer plataformas digitais que permitem o acompanhamento de processos, audiências virtuais e outras funcionalidades que facilitam o acesso à justiça, especialmente para aqueles que residem em áreas remotas ou que enfrentam dificuldades para acessar os tribunais físicos.

1. Breve Histórico do Acesso à Justiça

O conceito de acesso à justiça no Brasil experimentou uma evolução significativa ao longo das décadas, acompanhando as transformações sociais, econômicas e políticas do país. A trajetória histórica desse conceito pode ser segmentada em diversos períodos notáveis, cada um caracterizado por suas particularidades e desafios específicos.

Durante o período colonial e o Império (1500-1889), segundo José Reinaldo de Lima Lopes, o acesso à justiça no Brasil era extremamente restrito e elitista. O sistema judiciário, baseado no modelo português, servia principalmente à elite colonial. A administração da justiça era realizada por ouvidores e juízes nomeados pela Coroa, o que mantinha o controle judicial nas mãos de poucos. A maioria da população, incluindo escravos e indígenas, ficava excluída dos tribunais e, consequentemente, do acesso aos mecanismos formais de resolução de conflitos e proteção de direitos.3

Lopes ainda aponta que com a Proclamação da República em 1889, e ao longo da República Velha (1889-1930), houve algumas tentativas de modernizar o sistema judiciário, mas o acesso à justiça continuou a ser limitado. Durante a Era Vargas4 (1930-1945), o governo implementou reformas que buscavam ampliar o acesso aos direitos trabalhistas, criando a Justiça do Trabalho em 1941. No entanto, essas reformas ainda não garantiam um acesso amplo e equitativo à justiça.

A redemocratização pós-regime militar (1964-1985) representou um marco crucial para o acesso à justiça no Brasil. A Constituição Federal de 1988 introduziu reformas profundas, estabelecendo o acesso à justiça como um direito fundamental. Conforme disposto no artigo 5º, inciso XXXV, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, garantindo a todos o direito de buscar proteção judicial. Esse dispositivo constitucional simboliza a democratização do sistema judiciário, ampliando significativamente a capacidade dos cidadãos de reivindicarem e protegerem seus direitos por meio do Judiciário.

De acordo com Michel Souza, a Constituição de 1988 trouxe importantes garantias jurídicas que reforçam o direito ao contraditório e à ampla defesa, assegurando a imparcialidade por meio do princípio do juiz natural e proibindo a criação de tribunais de exceção. A igualdade entre as partes no processo foi estabelecida, além de prever assistência jurídica gratuita e integral para aqueles que não podem arcar com os custos de um advogado, culminando na criação das defensorias públicas. Com a promulgação da chamada “Constituição Cidadã”5, o artigo 98, inciso I, passou a prever a criação dos Juizados Especiais. Originários dos Estados Unidos em 1913 como Juizados de Pequenas Causas, esses tribunais modernos foram introduzidos no Brasil como uma forma inovadora de facilitar o acesso à justiça e resolver disputas de menor complexidade de maneira rápida e eficiente.6

A normatização dos Juizados Especiais se deu pela Lei nº 9.099/1995, que representou um marco significativo na democratização do acesso à justiça no Brasil. Ao consagrar princípios como oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, esses juizados visam proporcionar uma justiça mais acessível e eficiente, especialmente para aqueles com recursos limitados, que frequentemente encontram dificuldades no sistema judicial tradicional. Dessa forma, os Juizados Especiais contribuem para a resolução de litígios de maneira rápida e eficaz, promovendo uma maior equidade no acesso aos direitos.

2. Acesso à justiça: um preceito constitucional

De acordo com a tipologia de princípios e regras no contexto constitucional elaborada por José Joaquim Gomes Canotilho, o acesso à justiça é considerado um princípio jurídico fundamental.7  O princípio do acesso à justiça, que é caracterizado por uma variedade de termos semelhantes, foi explicitamente estabelecido na constituição de 1946, embora sua presença já estivesse implícita na Constituição de 1891.8

Dessa forma, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, estabelece este direito, assegurando que toda pessoa tenha garantia de solução quando um de seus direitos for violado ou ameaçado.

Segundo Luiz Guilherme Marinoni,

Tal direito não poderia deixar de ser pensado como fundamental, uma vez que o direito à prestação jurisdicional efetiva é decorrência da própria existência dos direitos e, assim, a contrapartida da proibição autotutela.9

Além disso,  garantindo o acesso à justiça por meio de um dos direitos mais relevantes: o direito de ação, que representa o ponto de partida para o início do processo legal apropriado. Bem como, foram rejeitadas não apenas as violações diretas dos direitos, mas também foram implementadas medidas preventivas contra possíveis violações.10

A promoção do acesso à justiça desempenha um papel crucial na consolidação da cidadania e na realização dos direitos humanos. Griebler, Porto e Reckziegel, coadunam que o acesso à justiça é um direito essencial para todo cidadão, permitindo-lhe obter respaldo jurídico dentro do seu Estado e da sociedade para garantir a proteção e a salvaguarda de seus direitos.11

Portanto, o acesso à justiça pode ser considerado como o requisito essencial, o mais fundamental dos direitos humanos, em um sistema jurídico moderno e igualitário que busca efetivar, e não apenas proclamar, os direitos de todos.12

 3. Desafios geográficos, socioeconômicos e culturais do acesso à justiça em Rondônia

O Brasil é um país de dimensões continentais, considerado o quinto maior país do mundo, cuja região norte corresponde a 45% de todo território nacional, sendo a de maior extensão territorial, porém é a segunda região com menor densidade demográfica, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).13

O Estado de Rondônia localiza-se na Região Norte do Brasil, enfrenta significativos desafios geográficos que impactam diretamente o acesso à justiça.

Os desafios socioeconômicos também são proeminentes em Rondônia. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)14 indicam que há uma significativa parcela da população vivendo em condições de vulnerabilidade econômica.

Além dos desafios geográficos e socioeconômicos, Rondônia enfrenta barreiras culturais no acesso à justiça. A diversidade étnica e cultural da região, que inclui populações indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, requer uma abordagem judicial sensível às suas especificidades.

Para Sadek a efetivação do direito de acesso à justiça depende de fatores econômicos, sociais, culturais e políticos.15

3.1 Desafios geográficos

Os fatores geográficos predominantes na região dificultam o acesso do cidadão aos serviços judiciários. Inserido na mais extensa floresta tropical do mundo, a floresta amazônica, e cercado por duas bacias hidrográficas, diversos rios e terrenos acidentados, Rondônia é um dos sete Estados que compõem a região norte do Brasil. Localizado na faixa equatorial, o Estado possui altos índices pluviométricos, tendo apenas três meses do ano sem chuvas, o que ocasiona cheia dos rios, impossibilitando o acesso a determinados locais16.  Em diversas localidades, o transporte fluvial assume primordial relevância, sendo por vezes inviável em determinadas épocas do ano devido às condições climáticas. Outro fator geográfico fundamental para dificultar o ingresso ao judiciário, é a ampla extensão territorial,  pois muitas comunidades estão localizadas em regiões remotas e de difícil acesso, tornando o deslocamento até os tribunais uma tarefa árdua e dispendiosa.

Todas essas características geográficas criam entraves naturais significativos para o acesso à justiça.

3.2 Desafios socioeconômicos

A geohistória do Estado de Rondônia é marcada por uma série de ciclos econômicos que impulsionaram a migração e ocupação do território. Contudo, foi o projeto de colonização agrícola, iniciado na década de 1970, que teve um papel significativo nesse processo.17

Em decorrência desses ciclos econômicos tanto da borracha, como da cassiterita, do ouro e da agricultura, pessoas de vários cantos do país e do mundo foram atraídas em busca de oportunidades. Esse aumento desordenado da população resultou em um acelerado crescimento das áreas urbanas, acarretando a ausência de infraestrutura adequada, falta de moradias acessíveis, aumento da criminalidade, conflitos agrários e degradação do meio ambiente.

O crescimento populacional desigual acentuou as desigualdades sociais, econômicas e a exclusão de grupos vulneráveis ​​da sociedade.

Além disso, há limitações de conectividade devido à escassa cobertura de redes de comunicação, que impede a comunicação eficaz entre os órgãos judiciários e as comunidades locais.

Outro fator que limita o acesso à justiça, são os custos associados ao sistema judicial, especialmente as pessoas de baixa renda. Honorários advocatícios, taxas judiciais e outros custos processuais podem dificultar o acesso para quem não tem recursos financeiros.18

Sob esse prisma, Mauro Cappelletti afirma que assegurar o acesso à justiça não se resume apenas à existência de tribunais e processos legais; trata-se de garantir que cada pessoa possa realmente fazer valer seus direitos diante do sistema jurídico, sem importar sua condição social, econômica ou status.19

Nesta esteira, fortalecer o Estado de Direito e garantir acesso à justiça para todos, especialmente para aqueles em situação de vulnerabilidade, é o objetivo número 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no Brasil. Intitulado “Paz, Justiça e Instituições Eficazes”, este objetivo visa promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. Esse compromisso é apoiado pela Organização das Nações Unidas (ONU)20.

3.3 Desafios culturais

O Estado de Rondônia apresenta uma sociedade marcada por sua heterogeneidade. Segundo Karina Faria21, a sociedade rondoniense é composta por povos tradicionais, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, bem como por migrantes e imigrantes provenientes de diversas regiões do Brasil.

Rondônia é o Estado com mais culturas indígenas do Brasil, são 54 etnias,  de acordo com dados da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam).22

A falta de intérpretes e profissionais jurídicos familiarizados com as diferentes culturas e línguas locais pode dificultar o acesso à justiça para essas comunidades.

A ocupação populacional de Rondônia é um reflexo direto de seus ciclos econômicos, já citados anteriormente. Desde o ciclo da borracha até as recentes atividades de mineração e agricultura, cada fase trouxe ondas de migração e mudanças socioeconômicas significativas. Com a contínua expansão econômica e urbana, Rondônia enfrenta o desafio de promover um desenvolvimento sustentável que equilibre o crescimento econômico e garanta o acesso à justiça de seus habitantes.23

Essa diversidade de culturas exige ações que considerem as especificidades de cada grupo, promovendo a inclusão e a igualdade de acesso à justiça.

4. Projeto Fórum Digital do Tribunal de Justiça de Rondônia

No contexto de Rondônia, desde o surgimento do Poder Judiciário no Estado, o Tribunal de Justiça de Rondônia tem se dedicado a garantir a prestação jurisdicional às pessoas que vivem em comunidades remotas e de difícil acesso. O deslocamento até as sedes das Comarcas ou municípios exige custos elevados, devido à grande extensão territorial e à distribuição populacional irregular, conforme demonstrado pelo censo demográfico de 201024. Além disso, algumas comunidades dependem de transporte fluvial por não possuírem acesso rodoviário à sede municipal. Dados do IBGE de 202125 indicam uma redução no rendimento mensal domiciliar per capita em Rondônia, agravando ainda mais a dificuldade das pessoas em se deslocar para acessar direitos e justiça.

Além dessa realidade, Rondônia é dividida em 52 municípios e apenas 23 são sede da comarca, e a Justiça Rápida26 que além de não conseguir atender a todas localidades têm características sazonais.

Foi durante a pandemia de COVID-19, que o poder judiciário rondoniense enfrentou desafios significativos devido à necessidade de manter o acesso à justiça enquanto se adaptava às restrições de distanciamento social. Nesse contexto, inovações tecnológicas desempenharam um papel crucial na continuidade das operações judiciais e na prestação de serviços jurídicos.

Diante desse cenário, o Tribunal de Justiça de Rondônia – TJ-RO criou o Projeto Fórum Digital. Idealizado pelo magistrado Rinaldo Forti Da Silva, juiz secretário geral do TJ-RO, cujo desafio era assegurar a toda a população de Rondônia o pleno exercício da cidadania, o acesso efetivo à justiça, a segurança jurídica e a paz social27.

Os Fóruns Digitais têm como objetivo proporcionar serviços judiciais à população de maneira eletrônica e remota, em parceria com as Prefeituras, Tribunal Regional do Trabalho, Tribunal Regional Federal, Tribunal Regional Eleitoral, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública Estadual e outras instituições públicas. Essa iniciativa visa garantir direitos e cidadania para aqueles que não podem se deslocar até a sede da Comarca e para os que se encontram em situação de vulnerabilidade digital, em sintonia com os princípios do acesso à justiça, celeridade e efetividade processual, previstos no art. 5o, incisos XXXV e LXXVIII, da Constituição da República Federativa do Brasil28.

Os Fóruns Digitais estão presentes em espaços físicos nas localidades, oferecendo atendimento aos vulneráveis digitais e conferindo maior credibilidade e legitimidade à prestação desse serviço público. Esta prática aprimora o acesso aos serviços de atermação, conciliação e até mesmo audiências e julgamentos, sem a necessidade de deslocamento às sedes das Comarcas, aliviando tanto os jurisdicionados quanto os cofres públicos.29

Os destinatários deste projeto incluem indivíduos que residem em comunidades remotas e de difícil acesso, pessoas sem equipamentos ou internet adequados, aquelas que necessitam de alfabetização digital, os vulneráveis digitais e, de modo abrangente, toda a sociedade rondoniense.

Para a instalação dos Fóruns Digitais, são necessários, além do espaço físico, alguns recursos, incluindo computadores, rede de internet, modems, roteadores, impressoras, mobiliário, ar-condicionado, servidor e estagiários. Esses recursos são essenciais para garantir o acesso da comunidade à justiça e a demais serviços públicos digitais.

O atendimento nos Fóruns Digitais começa com um servidor ou estagiário, que realiza a triagem do caso. Em seguida, o cidadão é encaminhado para uma sala onde recebe assistência para acessar a instituição via videoconferência.

Este projeto oferece múltiplos benefícios, como a eliminação da necessidade de deslocamento dos cidadãos, baixo custo de manutenção, economia tanto para o cidadão quanto para o Estado, acesso fácil e rápido a uma variedade de serviços em um único local, e a ampliação do alcance dos serviços do sistema de justiça.

Em outubro de 2021, por meio do Ato Conjunto 026-2021-PR-CGJ do CNJ30 foi inaugurado o primeiro Fórum Digital no município de Mirante da Serra Extrema, pertencente à Comarca de Ouro Preto do Oeste.

Com apenas seis meses de funcionamento, a unidade teve muitos atendimentos.

Figura 1 – Gráfico de atendimento.

Fonte: Portal CNJ31

Em parceria entre a Prefeitura de Porto Velho e o Poder Judiciário rondoniense, no mês de dezembro de 2021, foi  inaugurado no Distrito de Extrema, pertencente à Comarca de Porto Velho, a segunda unidade do Fórum Digital. Regulamentado por meio do Ato Conjunto nº 028-2021-PR-CGJ do CNJ32. Extrema fica localizada a quase 400km da capital Porto Velho. Estimou-se que na época da inauguração, quase 40 mil pessoas seriam beneficiadas com a implantação do serviço33.

Figura 2 – Gráfico de atendimento.

Fonte: Portal CNJ34

O projeto ainda está em andamento, e em 2023 foram inaugurados os Fóruns digitais de Candeias do Jamari, Itapuã do Oeste e Cujubim. Alto Paraíso, Monte Negro, Campo Novo de Rondônia e Chupinguaia devem ser entregues à população em breve.

Essa iniciativa está fomentando cada vez mais a realização de parcerias entre órgãos públicos, com o intuito de disponibilizar outros serviços essenciais, como orientação jurídica, por exemplo. Isso reduz a burocracia e os custos para os cidadãos, promovendo maior eficiência administrativa e melhorando a qualidade do serviço prestado para se ter acesso à justiça.

4.  Repercussão no território nacional

O Projeto Fórum Digital foi vencedor do 19ª Prêmio Innovare35, na Categoria CNJ/Inovação e Acesso à Justiça. Alinhado com os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas – ODS, o projeto foi inspiração para o CNJ criar os Pontos de Inclusão Digital (PID) no Poder Judiciário, que visam incentivar a expansão de hubs de acesso aos portais e balcões virtuais de todos os tribunais da jurisdição. Esses pontos consistem em salas ou espaços situados em órgãos públicos locais, equipados com computadores e câmeras fornecidos em cooperação pelos tribunais, permitindo o acesso dos cidadãos. Deste modo, o CNJ publicou a Resolução nº. 508 de 22/06/2023 que normatiza os PIDs para as demais Cortes do país.

Até o momento atual, conforme dados do painel disponibilizado no site do CNJ, atualizado a cada meia hora, aproximadamente 481 Pontos de Inclusão Digital (PIDs) já foram instalados nos tribunais brasileiros, abrangendo as esferas estadual, federal e do trabalho. Esses pontos têm desempenhado um papel crucial na democratização do acesso à justiça, proporcionando recursos tecnológicos para comunidades com limitações de acesso.

 Considerações finais

Portanto, o acesso à justiça é imprescindível para preservar a ordem democrática, proteger os direitos humanos e promover o progresso de uma sociedade. No decorrer deste estudo, elucidamos os avanços e as iniciativas positivas no campo do acesso à justiça, destacando os progressos significativos realizados pelo Poder Judiciário rondoniense, para tornar os sistemas legais mais acessíveis e inclusivos.

Apesar dos obstáculos geográficos e socioeconômicos enfrentados pela região amazônica, identificamos o Projeto Fórum Digital, como uma prática bem-sucedida no Estado de Rondônia, que tem contribuído para superar as barreiras tradicionais ao acesso à justiça. No entanto, em relação ao aspecto cultural, ainda há espaço para o aprimoramento, que pode ser realizado por meio do Projeto Justiça Rápida, com o intuito de atender aos povos indígenas cujos direitos estão resguardados conforme disposto nos artigos 231 e 232 da Constituição da República Federal/198836, que prevê o acesso pleno à Justiça por indígenas, suas comunidades e organizações. Visto que geralmente estão localizados em áreas remotas e de difícil acesso.

As barreiras enfrentadas na região amazônica estimulam a criatividade e a inovação, do Poder Judiciário de Rondônia, que desenvolveu esta solução inovadora que não só beneficia só o Estado, mas também tem o potencial de contribuir para todo o país.

Além disso, reconhecemos os esforços colaborativos entre os órgãos do Poder Judiciário para promover uma cultura de acesso à justiça. Essas parcerias têm sido fundamentais para ampliar o alcance dos serviços jurídicos e garantir que aqueles que mais precisam de ajuda recebam o suporte necessário.

Desse modo, concluímos que garantir o acesso à justiça em Rondônia, requer uma abordagem holística que leve em consideração não apenas as questões legais e institucionais, mas também as realidades sociais, culturais e geográficas únicas da região amazônica. Isso pode envolver o fortalecimento do sistema judiciário, o apoio a organizações da sociedade civil e movimentos sociais e o desenvolvimento de políticas públicas que promovam a inclusão e a equidade.

Além disso, é imperativo aprimorar os indicadores para mensurar o alcance do projeto em implementação, visando assegurar sua eficácia, eficiência, transparência e prestação de contas. Esses indicadores são essenciais para promover uma tomada de decisão baseada em evidências e para garantir a melhoria contínua do projeto. A criação desses parâmetros permitirá uma avaliação objetiva e sistemática dos resultados, contribuindo para o aperfeiçoamento das práticas judiciárias e para a otimização dos recursos aplicados.

Porém quanto  a questão cultural ainda é um desafio para o Estado. Embora já esteja disposto nos artigos o CNJ aprovou Resolução CNJ 287/2019, estabelecendo procedimentos especiais para pessoas indígenas acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade no âmbito criminal do Poder Judiciário. O referido normativo assegura a presença de intérprete que será preferencialmente membro da própria comunidade indígena, em todas as etapas do processo em que a pessoa indígena figure como parte.


3LOPES, José Reinaldo de Lima, História da Justiça no Brasil: A Justiça como Problema. São Paulo: Editora Max Limonad, 1999, p. 45.

4A Era Vargas é um período significativo da história do Brasil, marcado pela liderança de Getúlio Vargas, que governou o país em duas fases distintas: de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954.Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/era-vargas.htm

5O termo “Constituição Cidadã” foi popularizado por Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, durante a promulgação da Constituição em 5 de outubro de 1988. Ele usou essa expressão para destacar o caráter inclusivo e democrático da nova Carta Magna, que buscava corrigir injustiças históricas e promover a cidadania plena.Disponível em:https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2008/10/01/constituicao-de-1988-fortaleceu-a-cidadania-do-trabalhador

6SOUZA, Michel.A História do Acesso à justiça no Brasil. Revista do Curso de Direito da FACHA. Direito & Diversidade Ano 03, nº 05 – ISSN: 2316-1280

7CANOTILHO, Direito Constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993, p. 171-80.

8MARTINS, Ives Gandra; BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1988-1989.

9MARINONI, Luiz Guilherme. O Direito à Tutela Jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos Direitos fundamentais. Disponível em http://marinoni.adv.br/artigos.php, Acesso em: 10/05/24.

10SOUZA, Michel. A História do Acesso à justiça no Brasil. Revista do Curso de Direito da FACHA. Direito & Diversidade Ano 03, nº 05 – ISSN: 2316-1280, pag.41

11GRIEBLER, Jaqueline Beatriz; PORTO, Rosane Teresinha Carvalho; RECKZIEGEL, Tânia Regina Silva. O Panorama Dos Direitos Humanos No Acesso À Justiça Pela Via Dos Direitos Sociais: A Justiça Restaurativa Trabalhista Uma Realidade Possível? Revista Cidadania e Acesso à Justiça | e-ISSN: 2526-026X | Evento Virtual | v. 6 | n. 1 | p. 55-71 | Jan/Jun. 2020

12CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant – “Acesso à Justiça”, trad. de Ellen Gracie Northfleet, Porto Alegre, l988 p.5

13Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. “Dados Estatísticos da Região Norte”, 2022 Disponível em: https://www.ibge.gov.br. Acesso em: 14 jun. 2024.

14Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. “Rendimento Mensal Per Capta”, 2021. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/busca.html?searchword=rendimento+mensal+2021. Acesso em: 10 jun. 2024.

15SADEK, M. T.; OLIVEIRA, F. L. Estudos, pesquisas e dados em justiça. In: OLIVEIRA, F. L. (org.). Justiça em foco: estudos empíricos. Rio de Janeiro: FGV, 2012.

16MATIAS, Átila. “Região Norte”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/brasil/regiao-norte.htm. Acesso em 01 de junho de 2024.

17SILVA, Ricardo Gilson da Costa; MICHALSKI, Amanda; SANTOS, Tiago Roberto Silva. Geografias de Rondônia : território, fronteira e educação / : Temática Editora e PPGG/UNIR, 2021.

18DIAS, André Luís Mendes e REZENDE, Paulo Izidio da Silva. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação. São Paulo, v.10. n.05.maio. 2024. ISSN – 2675 – 3375 1474

19CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant – “Acesso à Justiça”, trad. de Ellen Gracie Northfleet, Porto Alegre, l988 p.6

20Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são um conjunto de 17 metas globais estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2015, como parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em:  https://brasil.un.org/pt-br/sdgs

21FARIA, Karina Rodrigues De. Dissertação de Mestrado. Linguagem e Educação: Estudar, Ensinar e Aprender Para Viver no Ambiente Pluri-Linguístico-Dialetal da Amazônia e Valorizar o Outro.Guajará-Mirim. 2010.

22Governo do Estado de Rondônia. Disponível em: https://rondonia.ro.gov.br/criada-em-rondonia-a-semana-cultural-dos-povos-indigenas-abordara-a-realidade-dos-povos-originarios. Acesso em 12/06/24.

23Governo do Estado de Rondônia. “História e Economia”. Disponível em: https://rondonia.ro.gov.br/portal/. Acesso em 12/06/24.

24Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9662-censo-demografico-2010.html. Acesso em 15/06/24.

25Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE  https://www.ibge.gov.br/busca.html?searchword=rendimento+mensal+2021. Acesso em 17/06/24.

26Justiça Rápida é a justiça móvel, que leva os serviços prestados pelo Poder Judiciário aos lugares menos acessíveis e às pessoas mais carentes, coloca em evidência o princípio da cooperação das instâncias administrativa e judicial na concretização e na universalização do direito de acesso à justiça. Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/direitos-humanos/justica-itinerante/#:~:text=Justi%C3%A7a%20Itinerante%20%C3%A9%20uma%20forma,dos%20direitos%20individuais%20e%20coletivos. Acesso em 10/06/24.

27CNJ. Apresentação do Fórum Digital. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/06/apresentacao-forum-digital-16-de-junho-2022-juiz-secretario-geral-tjro.pdf. Acesso em 15/06/24.

28art. 5o, inciso XXXV –  a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; inciso LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.Constituição da República Federativa do Brasil(1988). Disponível em:    http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 18/06/24

29Portal CNJ de Boas Práticas disponível em: https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/560.Acesso em 10/06/24.

30Portal CNJ de Boas Práticas disponível em: https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/560.Acesso em 10/06/24.

31Portal CNJ . Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/06/apresentacao-forum-digital-16-de-junho-2022-juiz-secretario-geral-tjro.pdf. Acesso em 10/05/24

32Portal CNJ de Boas Práticas disponível em: https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/560.Acesso em 10/06/24.

33SABINO, Carlos. Prefeitura e TJRO inauguraram Fórum Digital no distrito de Extrema. Portal da Prefeitura de Porto Velho. Disponível em: https://www.portovelho.ro.gov.br/artigo/33499/distritos-prefeitura-e-tjro-inauguraram-forum-digital-no-distrito-de-extrema. Acesso em 16/05/24

34Portal CNJ . Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/06/apresentacao-forum-digital-16-de-junho-2022-juiz-secretario-geral-tjro.pdf. Acesso em 10/05/24

35O Prêmio Innovare tem como objetivo identificar, divulgar e difundir práticas que contribuam para o aprimoramento da Justiça no Brasil. Sua criação foi uma dessas raras oportunidades em que uma conjunção de fatores conspira a favor do bem público.Participam das Comissão Julgadora do Innovare ministros do STF, STJ, TST, desembargadores, promotores, juízes, defensores, advogados e outros profissionais de destaque interessados em contribuir para o desenvolvimento do nosso Poder Judiciário. Disponível em: https://www.premioinnovare.com.br/. Acesso em 10/06/24.

36Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,1988.

Referências

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1Graduanda em Direito pela Faculdade Católica de Rondônia, Porto Velho, shirley.souza@sou.fcr.edu.br

2Professora Universitária, Especialista em Direito e Processo do Trabalho PUC/MG, Mestre em Direito Socioeconômico PUC/PR e Doutora em Educação UNIVALI/SC, Porto Velho, rita.nocetti@fcr.edu.br