AÇÃO EDUCATIVA SOBRE A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO DO ASSOALHO PÉLVICO ENTRE MULHERES RIBEIRINHAS EM UMA ILHA DE ANANINDEUA NO PARÁ: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202505090013


Camila do Socorro Lamarão Pereira1; Flávia Rodrigues da Cruz2; Adriane Gabrielle de Oliveira Ataíde3; Samylle Andrade Santiago4; Andreza Mota Tavares5; Eduardo Candido Veloso Ferreira6; Quelly França Alves Schiave7; Silvania da Conceição Furtado8


RESUMO

Introdução: O assoalho pélvico é um conjunto de músculos e estruturas que desempenham funções importantes como suporte visceral e continência, sendo frequentemente negligenciado pelas mulheres, especialmente em contextos de vulnerabilidade. Objetivo: Relatar uma experiência de ação educativa sobre a importância do conhecimento do assoalho pélvico entre mulheres ribeirinhas em uma ilha de Ananindeua, Pará. Descrição da experiência: A atividade foi realizada por acadêmicas de Fisioterapia utilizando o Arco de Maguerez como metodologia, envolvendo observação da realidade, identificação de pontos- chave, teorização, hipóteses de solução e aplicação por meio de roda de conversa e cartilha educativa. Conclusão: A vivência demonstrou que metodologias ativas promovem empoderamento e ampliação do acesso à saúde, estimulando o autocuidado e o rompimento de tabus sobre o corpo feminino.

Palavras-chave: Assoalho pélvico; Educação em saúde; Mulheres ribeirinhas.

ABSTRACT

Introduction: The pelvic floor is a group of muscles and structures responsible for visceral support and continence, often neglected by women, especially in vulnerable contexts. Objective: To report an educational experience on the importance of pelvic floor awareness among riverside women in an island of Ananindeua, Pará, Brazil. Experience description: The activity was conducted by Physical Therapy students using the Maguerez Arch as methodology, involving observation, identification of key points, theorization, solution hypotheses and application through a conversation circle and educational booklet. Conclusion: The experience showed that active methodologies foster empowerment and improve access to health, encouraging self-care and breaking taboos related to the female body.

Keywords: Pelvic floor; Health education; Riverside women.

INTRODUÇÃO

O assoalho pélvico (AP) é composto por músculos, ligamentos e fáscias cuja função é sustentar as vísceras pélvicas, manter o controle esfincteriano da uretra, reto e, no caso das mulheres, da vagina, além de permitir a passagem do feto no parto. Essa complexa estrutura é formada pelos diafragmas pélvicos superior e inferior, septos vesicovaginal e retovaginal, além de estruturas acessórias como os ligamentos cervicais transversos e músculos glúteos (Costa et al., 2021). Sua funcionalidade está diretamente relacionada à integridade anatômica e ao condicionamento muscular da região pélvica.

Mesmo sendo regiões contíguas, pelve e abdome são frequentemente descritas de forma isolada. A pelve, além de estrutura óssea, representa a área de conexão entre tronco e membros inferiores, sendo palco de diversas funções fisiológicas cruciais (Fante et al., 2020). Disfunções do músculo do assoalho pélvico (MAP), como prolapso de órgãos pélvicos (POP), incontinência urinária (IU), fecal (IF) e disfunção sexual, impactam negativamente a qualidade de vida das mulheres, principalmente aquelas em contextos de vulnerabilidade (Lopes et al., 2021).

Estudos indicam que menos da metade das mulheres com alterações pélvicas buscam tratamento. A reabilitação dos MAPs por meio de exercícios perineais, educação em saúde e técnicas conservadoras é considerada a linha terapêutica de primeira escolha (Ribeiro et al., 2023). Contudo, o desconhecimento sobre o tema e o estigma social associado contribuem para a subnotificação e negligência dos sintomas. Dados recentes mostram que o conhecimento prévio sobre a funcionalidade pélvica está associado à maior adesão ao tratamento e à adoção de hábitos saudáveis (Silva et al., 2022).

Nesse contexto, ações educativas em saúde se configuram como instrumentos fundamentais para o empoderamento feminino e promoção da saúde. Uma das metodologias mais eficazes nesse processo é o Arco de Charles Maguerez, que estimula a análise crítica da realidade, identificação de causas e aplicação de soluções contextualizadas (Macedo et al., 2019). Essa abordagem promove a construção coletiva do conhecimento, respeitando os saberes prévios das participantes e incentivando sua autonomia.

A metodologia ativa baseada no Arco envolve cinco etapas: observação da realidade, identificação de pontos-chave, teorização, formulação de hipóteses de solução e aplicação à realidade. Ao considerar o contexto sociocultural das mulheres ribeirinhas, essa ferramenta favorece a abordagem participativa, respeitosa e dialógica, condizente com os princípios da promoção à saúde (Silva et al., 2020).

Nesse sentido, ações educativas desenvolvidas com base na problematização devem favorecer a construção de sujeitos críticos, conscientes e protagonistas do cuidado com seu corpo e saúde. Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo relatar uma experiência vivenciada em uma ação educativa sobre a importância do conhecimento do assoalho pélvico entre mulheres ribeirinhas em uma ilha de Ananindeua, no Pará.

DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA

A experiência foi realizada por meio de uma roda de conversa com entrega da cartilha educativa intitulada “Alterações da Funcionalidade do Assoalho Pélvico: Você sabe o que é?” para mulheres residentes na Ilha de João Pilatos, em Ananindeua/PA. A ação ocorreu no dia 31 de janeiro de 2025, com a participação de uma equipe composta por uma pesquisadora e três acadêmicas do curso de Fisioterapia.

As temáticas abordadas foram definidas a partir de uma pesquisa diagnóstica prévia na comunidade, utilizando questionários validados para identificação de disfunções do assoalho pélvico, como incontinência urinária, fecal e disfunção sexual. Esta etapa correspondeu à primeira fase do Arco de Maguerez – a observação da realidade.

Na etapa seguinte, denominada “pontos-chave”, foram discutidos fatores associados às disfunções identificadas, como número de gestações, tipos de parto, idade, uso de métodos contraceptivos e tipo de ocupação das mulheres. Essas variáveis foram tratadas como determinantes relevantes para os problemas relatados.

A terceira etapa, de teorização, consistiu na busca de evidências científicas que explicassem a relação entre os pontos-chave levantados e as disfunções observadas. Foram utilizadas revisões recentes e artigos originais da área de Fisioterapia Pélvica e Saúde da Mulher, possibilitando uma compreensão técnica dos achados da comunidade.

Com base na teorização, elaboraram-se hipóteses de solução, quarta etapa do Arco. Nessa fase, definiu-se a estrutura da ação educativa e as abordagens metodológicas a serem utilizadas, priorizando estratégias dialógicas, acessíveis e culturalmente sensíveis às mulheres atendidas.

Na quinta e última etapa, aplicaram-se as hipóteses à realidade. A cartilha foi utilizada como suporte pedagógico, facilitando a discussão sobre anatomia, sinais e sintomas, prevenção, autocuidado e possibilidades terapêuticas para as disfunções do AP. A linguagem foi adaptada ao nível de letramento da população local.

Durante a roda de conversa, houve participação ativa das mulheres, que relataram experiências pessoais relacionadas à temática. O ambiente favoreceu a troca de saberes e valorização do conhecimento empírico, contribuindo para a desmistificação de tabus relacionados à saúde íntima feminina.

A atividade foi avaliada de forma positiva pelas participantes, que demonstraram interesse em aprofundar o conhecimento sobre o tema. Algumas mulheres manifestaram desejo de buscar atendimento fisioterapêutico, evidenciando o potencial mobilizador das ações educativas estruturadas.

DISCUSSÃO

A experiência demonstrou que a utilização do Arco de Maguerez como metodologia ativa favoreceu o protagonismo das mulheres no processo educativo, alinhando-se às diretrizes de promoção à saúde preconizadas pelo SUS (Brasil, 2021).

Mulheres em contextos de vulnerabilidade social, como as ribeirinhas, apresentam riscos aumentados para disfunções do assoalho pélvico devido à multiparidade, baixa escolaridade, limitação de acesso a serviços de saúde e falta de conhecimento sobre o próprio corpo (Oliveira et al., 2022). Nesse cenário, intervenções educativas se tornam estratégias eficazes para promoção do autocuidado.

A entrega da cartilha contribuiu para a fixação do conteúdo, atuando como tecnologia leve de educação em saúde. Estudos recentes apontam que materiais impressos aliados à escuta qualificada e ao diálogo são eficazes na transformação de comportamentos (Souza et al., 2023).

A metodologia utilizada respeitou os saberes prévios das mulheres, permitindo a construção coletiva do conhecimento. Essa abordagem favorece a horizontalidade das relações e fortalece o vínculo entre profissionais e comunidade, como sugerido por Santos et al. (2022).

Outro ponto relevante foi o acolhimento das experiências individuais, que favoreceu a criação de um espaço seguro para relatos e esclarecimento de dúvidas. O ambiente colaborativo incentivou o empoderamento feminino e o rompimento de tabus relacionados à sexualidade e ao envelhecimento.

Do ponto de vista acadêmico, a atividade proporcionou às estudantes vivência prática em ações de educação popular em saúde, fortalecendo competências importantes para atuação humanizada e ética. Além disso, evidenciou a importância da interdisciplinaridade no cuidado em saúde.

A ação educativa não apenas disseminou conhecimento, mas também mobilizou as mulheres para o exercício de seus direitos à saúde. O impacto observado reforça a importância da continuidade de ações com esse perfil, priorizando populações historicamente negligenciadas.

Por fim, o sucesso da experiência reforça a relevância de metodologias participativas e sensíveis ao contexto sociocultural na promoção da saúde pélvica feminina, especialmente em territórios de difícil acesso. Recomenda-se a replicação da atividade em outras comunidades ribeirinhas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Caderno de Educação Popular em Saúde da Mulher. Brasília: Ministério da Saúde, 2021.

COSTA, L. A. et al. A importância da educação em saúde sobre as disfunções do assoalho pélvico: relato de experiência. Revista Cuidarte, v. 12, n. 1, p. e2903, 2021.

FANTE, J. F. et al. Será que as mulheres têm conhecimento adequado sobre as disfunções do assoalho pélvico? Uma revisão sistemática. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 41, p. 508-519, 2019.

LOPES, L. A. C. et al. Disfunções do assoalho pélvico e sua relação com fatores obstétricos: uma revisão integrativa. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 43, n. 2, p. 114-120, 2021.

MACEDO, V. L. M. et al. A utilização do Arco de Maguerez como ferramenta de promoção em saúde. Revista Baiana de Enfermagem, v. 33, e35153, 2019.

OLIVEIRA, S. B. et al. Fatores associados às disfunções pélvicas em mulheres de comunidades ribeirinhas. Cadernos de Saúde Pública, v. 38, n. 3, e00211321, 2022.

RIBEIRO, A. C. F. et al. Atuação fisioterapêutica nas disfunções do assoalho pélvico: abordagem preventiva e reabilitadora. Fisioterapia em Movimento, v. 36, e36123, 2023.

SANTOS, J. M. et al. Educação em saúde como ferramenta de empoderamento feminino no contexto ribeirinho. Interface – Comunicação, Saúde, Educação, v. 26, e210234, 2022.

SILVA, L. A. R. et al. Arco de Maguerez e educação popular: contribuições para a formação em saúde. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 12, n. 1, p. e7032, 2020.

SILVA, M. C. R. et al. Conhecimento sobre o assoalho pélvico e adesão ao tratamento fisioterapêutico em mulheres. Journal of Physical Therapy Science, v. 34, n. 2, p. 95–101, 2022.

SOUZA, J. L. et al. Materiais educativos impressos como ferramentas em saúde da mulher: um estudo de intervenção. Saúde em Debate, v. 47, n. 137, p. 267-276, 2023.


1 Graduada em Fisioterapia pela Universidade do Estado do Pará – UEPA. Docente da Universidade da Amazônia. Mestranda em Cirurgia – UFAM E- mail: lamaraocamila@gmail.com
2,3,4 Graduandas em Fisioterapia. Universidade da Amazônia – UNAMA
5 Fisioterapeuta pela Universidade da Amazônia – UNAMA
6 Fisioterapeuta pela Universidade da Amazônia – UNAMA. Mestre em Neurociências pela Universidade Federal do Pará – UFPA.
7 Graduada em Fisioterapia pelo Centro Universitário Nilton Lins. Doutora em Tocoginecologia pela Universidade Estadual de São Paulo – UNESP
8 Graduada em Odontologia pela Universidade Federal do Amazonas – UFAM. Doutora em Bases Gerais da Cirurgia pela Faculdade de Medicina de Botucatu -UNESP