ABORDAGEM JURÍDICA DO ABORTO EM CASOS DE ESTUPRO BILATERAL DE VULNERÁVEIS: CONFLITOS DE VONTADE E SOLUÇÕES JURÍDICAS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202411200731


Francisca Das Chagas Da Silva Araújo;
Orientador(a): Profa.: Leonisia Moura


RESUMO

O debate sobre casos de estupro bilateral de vulneráveis suscita discussões jurídicas, éticas e morais em diversos países, especialmente quando resulta em gestação, complexificando o quadro. No Brasil, esse debate ganha destaque, considerando o Código Penal e suas disposições sobre estupro de vulnerável. Neste contexto, o presente estudo visa compreender a abordagem jurídica do aborto nos casos de estupro bilateral de vulneráveis, avaliando possíveis conflitos e soluções. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023 revelam um aumento alarmante nos registros de estupro e estupro de vulnerável, indicando a urgência de ampliar o debate jurídico sobre o tema. O artigo propõe uma análise qualitativa, combinando revisão de literatura com elementos da jurisprudência brasileira para alcançar seus objetivos. Os questionamentos norteadores incluem a abordagem jurídica sobre o aborto, a responsabilidade dos adolescentes envolvidos, e a influência dos responsáveis na decisão de abortar. Na primeira seção, são analisadas as questões legais e sociais relacionadas à proteção de indivíduos menores de 14 anos, incluindo o enquadramento jurídico do estupro bilateral de vulneráveis e considerações sobre a idade de consentimento. Os subcapítulos subsequentes exploram detalhadamente o enquadramento jurídico do estupro bilateral de vulneráveis, a vulnerabilidade desses indivíduos sob a ótica do ordenamento jurídico e considerações sobre a idade de consentimento. Na segunda seção, o foco se volta para a gravidez na adolescência, fornecendo breves notas sobre direitos fundamentais da menor grávida, casos concretos, panoramas da gravidez e do aborto de mães vulneráveis no Brasil, e perspectivas de soluções e conciliações. Por fim, o estudo visa responder às questões propostas e atingir seus objetivos, contribuindo para um debate mais amplo e informado sobre o tema.

Palavras-chave: estupro bilateral de vulneáveis; aborto; gravidez na adolescência; celeuma.

ABSTRACT

The debate on cases of bilateral vulnerable rape sparks legal, ethical, and moral discussions in several countries, especially when resulting in pregnancy, complicating the scenario. In Brazil, this debate gains prominence, considering the Penal Code and its provisions on vulnerable rape. In this context, the present study aims to understand the legal approach to abortion in cases of bilateral vulnerable rape, evaluating possible conflicts and solutions. Data from the Brazilian Public Security Yearbook of 2023 reveal a alarming increase in reports of rape and vulnerable rape, indicating the urgency to broaden the legal debate on the topic. The article proposes a qualitative analysis, combining literature review with elements of Brazilian jurisprudence to achieve its objectives. Guiding questions include the legal approach to abortion, the responsibility of the involved adolescents, and the influence of guardians in the decision to abort. In the first section, legal and social issues related to the protection of individuals under 14 years old are analyzed, including the legal framework of bilateral vulnerable rape and considerations on the age of consent. Subsequent subsections thoroughly explore the legal framework of bilateral vulnerable rape, the vulnerability of these individuals from the perspective of legal order, and considerations on the age of consent. In the second section, the focus shifts to teenage pregnancy, providing brief notes on fundamental rights of the pregnant minor, specific cases, panoramas of pregnancy and abortion of vulnerable mothers in Brazil, and perspectives on solutions and reconciliations. Finally, the study aims to answer the proposed questions and achieve its objectives, contributing to a broader and more informed debate on the topic.

Keywords: bilateral vulnerable rape; abortion; teenage pregnancy; controversy.

1 INTRODUÇÃO

O debate em torno dos casos de estupro bilateral de vulneráveis tem gerado intensas discussões de cunho jurídico, ético e moral em diversos países ao redor do globo. Sobretudo quando o ato resulta em uma gestação, tornando o caso deveras mais complexo, especialmente considerando que o Código Penal aborda o delito de estupro de vulnerável no artigo 217-A. Logo, suscitando questionamentos complexos acerca dos direitos reprodutivos da mulher, da preservação da vida do feto, da justiça para as vítimas de violência sexual e da interpretação das leis vigentes no cenário brasileiro.

No Brasil, o estupro bilateral de vulneráveis trata-se da ocorrência de relações sexuais ou outros atos de natureza sexual entre adolescentes menores de 14 anos, de forma consensual (Costa; Campelo; Alves, 2023). Este debate parece oscilar entre considerações jurídicas e sociais, provocando reflexões sobre a proteção integral, a dignidade e a liberdade (sexual) de crianças e adolescentes, bem como sobre a necessidade de uma solução jurídica apropriada.

Dito isso, cabe destacar que no panorama recente do Brasil, de acordo com dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (Bueno et al., 2023), há um cenário alarmante no país: o maior número de registros de estupro e estupro de vulnerável da história, totalizando 74.930 vítimas. Esses números correspondem aos casos reportados às autoridades policiais e representam apenas uma parcela da violência sexual enfrentada por mulheres, homens, meninas e meninos de todas as idades. Em comparação com o ano de 2021, a taxa de estupro e estupro de vulnerável aumentou em 8,2%, atingindo 36,9 casos para cada grupo de 100 mil habitantes.

Os números apresentados abrangem os casos de estupro, totalizando 18.110 vítimas em 2022, um aumento de 7% em relação ao ano anterior, e os casos de estupro de vulnerável, com um total de 56.820 vítimas, representando um aumento de 8,6% (Ibid.). Isso indica que 24,2% das vítimas eram homens e mulheres com mais de 14 anos, enquanto 75,8% eram incapazes de consentir, seja devido à idade (menores de 14 anos) ou por qualquer outra razão (deficiência, enfermidade, etc.). Tais índices justificam a importância de ampliar cada vez mais no campo jurídico o debate sobre o estupro de vulnerável e as condições para a realização do aborto.

Neste contexto, considerando que os atos criminais e as contravenções podem ser imputados aos adolescentes através de um processo especial, o objetivo deste artigo é compreender a abordagem jurídica sobre o aborto nos casos de estupro bilateral de vulneráveis, avaliando possíveis conflitos de vontade e soluções jurídicas.

Os objetivos específicos, por sua vez, estão elencados a seguir: a) compreender as questões jurídicas envolvendo adolescentes menores de quatorze anos que praticam atos libidinosos resultando em gravidez; b) discutir a autonomia das crianças e/ou adolescentes em contraposição às responsabilidades dos seus responsáveis; c) propor perspectivas para solucionar esse conflito.

Para tanto, adotamos uma metodologia qualitativa, aplicando uma revisão de literatura cruzada com elementos da jurisprudência brasileira em torno da temática, a fim de cumprir o objetivo proposto. Faz-se de suma importância destacar também nossa questão norteadora da pesquisa: qual é a abordagem jurídica sobre o aborto nos casos de estupro bilateral de vulneráveis? Além desta, outras questões também emergem: cometem as crianças e/ou adolescentes crime um crime contra o outro nos casos de estupro bilateral de vulneráveis? E quanto à decisão de abortar, cabe apenas à adolescente ou também aos seus responsáveis – diante dessa problemática, surge a hipótese de que a menor deseje prosseguir com a gravidez, enquanto seus responsáveis se opõem; entretanto, devido à sua condição de menor de idade, ela ainda não possui plena autonomia para decidir por si mesma.

Sendo assim, na primeira seção após a introdução, focaremos na análise da vulnerabilidade das pessoas menores de 14 anos, abordando questões legais e sociais relacionadas à proteção desses indivíduos. Serão discutidos aspectos como o enquadramento jurídico do estupro bilateral de vulneráveis e considerações sobre a idade de consentimento.

No subcapítulo 2.1, por sua vez, nos concentraremos na análise detalhada do enquadramento jurídico do estupro bilateral de vulneráveis. Serão exploradas as definições legais, os dispositivos legais pertinentes e as implicações legais associadas a essa forma específica de crime.

Em seguida, será discutida a vulnerabilidade das pessoas menores de 14 anos sob a ótica do ordenamento jurídico. Serão analisadas as leis, regulamentações e políticas que visam proteger os menores e garantir seus direitos fundamentais.

Já no último subcapítulo da seção, serão abordadas considerações importantes sobre a idade de consentimento, incluindo discussões sobre a definição legal dessa idade e suas implicações nas relações interpessoais e na proteção dos indivíduos menores de 14 anos.

No capítulo 3, inicia uma nova seção do trabalho, concentrando-se na gravidez na adolescência. Serão fornecidas breves notas sobre o tema, delineando questões importantes relacionadas aos direitos fundamentais da menor grávida, casos concretos, panoramas da gravidez e do aborto de mães vulneráveis no Brasil, e perspectivas de soluções e conciliações.

Em seguida, serão discutidos os direitos fundamentais das menores grávidas, incluindo questões relacionadas à saúde, educação, dignidade e proteção legal.

Finalmente, no item 3.2, serão apresentados casos concretos de gravidez na adolescência, analisando-se suas circunstâncias, desafios e desfechos.

Por seu turno, o subcapítulo 3.3 fornecerá um panorama sucinto da situação da gravidez e do aborto entre as mães vulneráveis no Brasil, destacando questões relevantes e estatísticas pertinentes.

Subsequentemente, serão discutidas possíveis perspectivas de soluções e conciliações para lidar com os desafios e dilemas associados à gravidez na adolescência, com o objetivo de promover o bem-estar e os direitos das menores grávidas.

Então, ao final da pesquisa, poderemos responder às questões desenvolvidas e aos objetivos definidos.

2 ANÁLISE DA VULNERABILIDADE DAS PESSOAS MENORES DE 14 ANOS

Concernente à vulnerabilidade dos menores de 14 anos, como veremos adiante, houve uma dificuldade em se definir quando se tratava ou não de um vulnerável, ao ocorrer um crime de violação sexual. Atualmente, encontra-se pacificado tanto pelos tribunais quanto pelo legislador. Entretanto há julgados atuais que mitigam essa vulnerabilidade, a depender do caso concreto.

Antes da Lei 12.015/2009, o ato sexual com pessoa vulnerável configurava, a depender do caso, estupro (art. 213) ou atentado violento ao pudor (art. 214), mesmo que praticado sem violência física ou moral, pois presumida (de forma absoluta de acordo com a maioria) no art. 224 do CP. Este dispositivo (art. 224) agora está expressamente revogado, subsumindo-se a conduta ao disposto no art. 217 -A do CP. (Cunha, 2016, p. 467).

Ou seja, em se tratando de vulnerável, não carece mais falar em violência, pois está agora pacificado que o fato de se realizar a conduta descrita no tipo contra vulnerável já caracteriza o ato violento de forma absoluta, sendo desnecessário discutir o grau de violência envolvida, pois agora tem um tipo específico para cuidar do menor de 14 anos, o artigo 217-A do Código Penal.

Todavia, faz-se de suma importância compreender o contexto da Lei 12.015/2009: a introdução dessa legislação traz consigo uma mudança fundamental na nomenclatura do Título VI do Código Penal brasileiro. O título anteriormente intitulado “Dos crimes contra os costumes” foi substituído por “Dos crimes contra a dignidade sexual”.

Essa alteração vai além de uma simples mudança de terminologia, pois reflete a preocupação do legislador com a dignidade sexual, que é vista como uma extensão da própria dignidade da pessoa humana, estabelecida como o cerne de todo o sistema jurídico (Cavichioli, 2008).

Ao mencionar explicitamente um aspecto da dignidade humana – a dignidade sexual – no início do Título VI do Código Penal brasileiro, busca-se condicionar a interpretação das alterações introduzidas pela nova lei à consideração da dignidade humana como um valor ético inalienável, merecedor de proteção efetiva pelo Estado. A valorização da dignidade da pessoa humana emerge como princípio essencial e orientador de todo o ordenamento jurídico, especialmente quando se trata da liberdade sexual (a capacidade de escolher livremente o parceiro sexual), servindo como critério fundamental para a interpretação e compreensão das leis penais (Ibid.).

Como observado por Flávia Piovesan (2008), a dignidade humana representa o ponto de partida e o ponto de chegada da interpretação normativa, tornando-se o verdadeiro princípio norteador do Direito Internacional e Interno. Assim, o princípio da dignidade da pessoa humana condiciona a interpretação de todas as normas que compõem o ordenamento jurídico, incluindo aquelas de natureza penal.

Neste sentido, a revogação do artigo 214 do Código Penal brasileiro pela Lei nº 12.015/2009 levanta a questão da abolitio criminis. Este fenômeno ocorre quando uma conduta, anteriormente considerada crime, deixa de sê-lo. No entanto, a revogação do referido artigo não resultou em abolitio criminis, pois a conduta descrita continua sendo considerada crime sob o artigo 213 do Código Penal, agora denominado estupro. Assim, não houve uma eliminação completa da previsão da conduta como crime, apenas uma alteração na sua disposição dentro do mesmo diploma legal (Cavichioli, 2008).

Por sua vez, Ary Queiroz Vieira Júnior (2023), discorrendo sobre o assunto, explica o motivo da revogação do artigo em comento, sendo este porque na previsão legal insculpida no artigo 224 da Lei Repressiva, segundo a qual a violência era presumida (havendo controvérsia se se tratava de presunção relativa ou absoluta) se a vítima: “a) não é maior de catorze anos; b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia essa circunstância; c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência”.

Em resumo, com a mudança feita pelo legislador no Código Penal, não carece mais se falar em violência, quando se fala em ato de violência sexual contra os vulneráveis, pois só o fato de ser contra essas pessoas, já há a caracterização de violência. Em outros termos, a Lei nº 12.015/2009, ao fundir os comportamentos de estupro e atentado violento ao pudor em um único tipo penal e, portanto, permitir a aplicação do princípio da continuidade delitiva quando preenchidos os requisitos do artigo 71, caput, do Código Penal, é considerada uma norma penal mais favorável (Cavichioli, 2008). Consequentemente, deve retroagir em benefício do réu, conforme estabelecido no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal de 1988.

Entretanto, vencido o assunto violência, surgiu a questão da vulnerabilidade do menor de 14 anos, se seria absoluta ou relativa. Ressalta-se que, caso seja absoluta, não há admissão de prova em contrário. Em outro giro, se relativa, admite-se prova em contrário.

Nucci (2020) cuidou de analisar o grau de vulnerabilidade dos menores de 14 anos e chegou à conclusão de tratar-se de absoluta: No entanto, ele cita uma exceção dizendo que mesmo a lei tendo optado pela vulnerabilidade absoluta, há uma exceção à regra, visto que o Brasil é um país de natureza continental, com costumes e valores diferenciados em suas regiões. Alega ainda que há casais, em união estável, com filhos, possuindo a mãe seus 12 ou 13 anos (por vezes, até menos). Abaixo, a citação:

Formou-se uma família, cuja proteção advém da Constituição Federal, não podendo prevalecer a lei ordinária. Preceitua o art. 226, caput, da CF: “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Para efeito de proteção estatal, reconhece-se a união estável. (Nucci, 2020, p. 189).

Ou seja, para ele, a vulnerabilidade não deve ser reconhecida apenas sob a ótica da letra da lei, pois é preciso analisar cada caso à parte, considerando as particularidades de um país de tamanho continental como o Brasil. Cabe destacar aqui que, apesar do pensamento do autor, a doutrina está dividida – o que será demonstrado posteriormente.

Dito isso, antes de se falar de estupro bilateral de vulneráveis, começaremos falando sobre o art. 217-a do código penal, o qual diz o seguinte:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009).

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009).

§ 1 o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. (Brasil, 1940).

Esclarecendo, ao ocorrer um crime de estupro, deve-se analisar certas peculiaridades da vítima: caso ela não seja vulnerável ou tenha o necessário discernimento, estaremos diante do crime de estupro tipificado no artigo 213 do Código Penal brasileiro.

Em outro giro, quando se trata de uma vítima vulnerável ou quem não tenha o necessário discernimento, o legislador optou por criar um tipo específico para cuidar desses tipos de pessoas: foi criado pela lei 12.015-2009 a figura do estupro de vulnerável, através do artigo 217-A do Código Penal. Esse artigo protege as pessoas vulneráveis e seu texto veda a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos de idade, bem como com indivíduos que possuem as seguintes condições de vulnerabilidade (Bitencourt, 2018): a) real (do menor de 14 anos); b) equiparada (do enfermo ou deficiente mental); c) por interpretação analógica (quem, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência), que, repetindo, foi prevista somente neste art. 217-A.

Já Rogério Greco (2014) salienta que a lei, portanto, tutela o direito de liberdade que qualquer pessoa tem de dispor sobre o próprio corpo no que diz respeito aos atos sexuais. Segundo ele, estupro de vulnerável agride, simultaneamente, a dignidade do ser humano, presumivelmente incapaz de consentir para o ato, como também seu desenvolvimento sexual.

Indo mais a fundo, precisamos considerar essa temática quando dois vulneráveis tem um envolvimento de forma voluntária, pois essa é uma questão tão complexa a ponto de a própria legislação penal não ter um tipo específico para tal situação. Iremos explorar mais esse tópico na seção seguinte.

2.1 ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO ESTUPRO BILATERAL DE VULNERÁVEIS

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Brasil, 1990) estabeleceu que a fase da criança vai até os 12 anos incompletos e a do adolescente até os 18 anos incompletos. O ECA se aplica principalmente a crianças e adolescentes, mas também excepcionalmente a jovens com idade entre 18 e 21 anos.

Segundo Ishida (2022), a definição da idade de transição da criança para o adolescente pelo ECA foi uma decisão política legislativa, com o objetivo de distinguir aqueles que podem ser submetidos a medidas socioeducativas devido à prática de atos infracionais. No entanto, o critério biológico não é absolutamente preciso, pois algumas crianças podem apresentar características de adolescentes, como mudanças físicas ou psicológicas. Acredita-se que a intenção da lei foi diferenciar, para fins de proteção, crianças e adolescentes dos adultos, especialmente devido à fragilidade e vulnerabilidade em aspectos físicos, cognitivos, emocionais e sociais.

Não obstante a isso, de acordo com o ECA, ato infracional é a conduta que corresponde a um crime ou contravenção penal cometido por um adolescente ou criança. Se o ato infracional for praticado por uma criança, serão aplicadas medidas de proteção previstas no próprio ECA; já se for cometido por um adolescente, será submetido ao procedimento legal para a aplicação de medidas socioeducativas.

A distinção entre crime ou contravenção penal e ato infracional está relacionada ao sujeito ativo da conduta e não à conduta em si (Costa; Campelo; Alves, 2023). Se a conduta for realizada por uma criança ou adolescente, é corretamente denominada como ato infracional; se for realizada por uma pessoa maior de 18 anos, é considerada crime ou contravenção penal. Mesmo que a conduta seja a mesma, quando praticada por crianças ou adolescentes menores de 14 anos, como a conjunção carnal ou outro ato libidinoso consentido entre eles, eles incidem no tipo descrito no artigo 217-A do Código Penal, sendo coautores do ato infracional semelhante ao crime de estupro de vulnerável.

Em suma, o estupro bilateral de vulneráveis trata-se da ocorrência de relações sexuais ou outros atos de natureza sexual entre adolescentes menores de 14 anos, de forma consensual (Costa; Campelo; Alves, 2023).

Tendo isso em vista, a doutrina cuidou de nomear o ato de envolvimento de dois vulneráveis de estupro bilateral de vulneráveis.

Quando dois adolescentes, menores de 14 (catorze) anos de idade, mantêm entre si, de forma consensual, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, incidem no tipo descrito no art. 217-A do Código Penal, como coautores do ato infracional análogo ao crime de estupro de vulnerável. (Costa, Campelo e Alves, 2023, p. 66).

Todavia, faz-se imprescindível destacar que embora a doutrina tenha concedido essa nomenclatura a esses casos, essa lacuna é ainda persistente no Código Penal. Essas questões ainda não foram abordadas pelo ordenamento jurídico, especialmente pela jurisprudência nacional, seja por meio de leis, comparações ou interpretações.

Neste contexto, Sales (2017) levanta a discussão sobre a atipicidade da conduta, argumentando que não há lesão a um bem jurídico protegido, o que torna absurda a ideia de punir dois menores de 14 anos que, consentindo, decidiram praticar atos libidinosos ou ter relações sexuais. Isso considerando as mudanças sociais e culturais e o comportamento sexual atual dos adolescentes entre 12 e 13 anos de idade, bem como o princípio da lesividade e da adequação social, que devem ser considerados ao interpretar a lei (Ibid.).

Além disso, o autor (Ibid.) considera importante destacar que a intervenção penal nesse tipo de situação seria desproporcional, pois as autoridades competentes devem buscar meios educativos e pedagógicos para conscientizar os menores de 14 anos sobre os riscos do sexo precoce. Isso é uma questão de saúde pública e não deve ser tratada pelo Direito Penal como última medida.

Sobre o tema, Filó (2012) indaga sobre o que ocorreria, porém, se dois menores de catorze anos realizassem entre si atos libidinosos consentidos por ambos:

Ambos praticariam o crime de estupro bilateral? Se ambos fossem maiores de doze anos e menores de catorze anos cometeriam ato infracional?

Para aqueles que entendem que não cabe exceção ao art. 217-A, a resposta é positiva! Sim, os dois teriam cometido estupro de vulnerável e ambos responderiam por ato infracional e seriam ao mesmo tempo vítimas (Filó, 2012, p. 87).

Já Vanessa de Souza Farias (2014) esclarece como surgiu a possibilidade da ocorrência na prática do estupro bilateral de vulnerável a partir da Lei n. 12.015/2009:

É importante destacar que a partir da Lei n. 12.015/2009, vislumbra-se possível a caracterização, em tese, da figura do estupro bilateral. Destarte, se dois indivíduos menores de 14 (quatorze) anos relacionarem-se sexualmente, ainda que sem violência, estariam praticando ato infracional correspondente a estupro de vulnerável, um contra o outro. Essa possibilidade é criticada por parte da doutrina, pois afasta por completo a autodeterminação sexual dos jovens. (Farias, 2014).

Um dos expoentes da doutrina que critica a possibilidade exposta acima por Farias (2014) é Salvador Netto (2009). Este autor afirma que quando a legislação alterou a redação e a sistemática dos crimes sexuais, cometeu um grande equívoco aos indivíduos menores de idade. Ainda, a aplicação do dispositivo, da forma como está, prejudica a análise jurídica.

Se dois adolescentes de 13 anos se envolvem sexualmente, o legislador, consciente ou não, estaria estabelecendo a figura enigmática do “estupro bilateral”. Isso porque, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 103) e seu sistema penal, ambos os adolescentes cometeriam atos infracionais um contra o outro, sem considerar a questão da violência ou da autodeterminação, que são relativizadas nessa idade (Ibid).

Ao criar o crime de “estupro de vulnerável” e impedir a absolvição de quem realiza ato sexual com um menor, independentemente do contexto, o legislador não busca proteger a dignidade sexual do menor, mas sim impor uma ideia moral sobre uma idade fictícia considerada razoável para práticas libidinosas (Ibid.). A aplicação inflexível do artigo 217-A não protege os vulneráveis, mas sim restringe a vida sexual dos menores de catorze anos até atingirem essa idade, violando o direito desses menores ao desenvolvimento sexual normal e transformando o início de sua vida sexual em um dogma legislativo arbitrário (Ibid.).

No entanto, a sexualidade é um aspecto vital da vida, sendo o ingrediente mais valioso para alguns. Não obstante a isso, no processo biológico das espécies superiores, a perpetuação dos genes parece ser o único objetivo, relegando o indivíduo a um mero material descartável e invariavelmente descartado (Ibid.).

Corroborando com este pensamento, Bittar (2006) afirma que:

A concepção que se propõe para a importância da expressão dignidade da pessoa humana, sobretudo na pós-modernidade, passa por uma compreensão não-unilateral das culturas, e muito menos centrista-ocidental das culturas. Mas passa pela visão de que a afirmação da dignidade da pessoa humana, em territórios com amplas distinções culturais regionais, como é o caso do Brasil, ou mesmo, projetando-se para fora do território do Estado, para se alcançar o plano das relações entre os povos, passa por um profundo respeito da diferença, bem como pela afirmação da multiculturalidade e da relatividade das concepções de dignidade, como forma mesmo de se realizarem valores com preocupações isomórficas. (Bittar, 2006, p. 56)

Neste sentido, o art. 217-A transforma as pessoas menores de catorze anos em meros objetos da vontade do legislador. Consequentemente, a aplicação de forma irrestrita desta legislação é capaz até mesmo de violar a dignidade sexual destes indivíduos, ao passo que lhes retira a possibilidade de construir um desenvolvimento sexual normal.

No entanto, quando do ato resulta em uma gestação, surgem várias problemáticas. A maior delas reside no caso de conflito de vontades quanto à opção de se manter ou não a gravidez. Já que se trata de menores de 14 anos, os quais não respondem por si, em nenhuma das esferas e seja qual for suas vontades, acabará, na prática, tendo que coincidir com a de seus responsáveis.

2.2 A VULNERABILIDADE SOB A ÓTICA SOCIOJURÍDICA E DO ORDENAMENTO JURÍDICO

O Superior Tribunal de Justiça vem considerando a presunção da vulnerabilidade do menor de 14 anos de forma absoluta. Este tribunal, instituído pela Carta Magna de 19881, é o órgão encarregado de harmonizar a interpretação da legislação federal em âmbito nacional. Compete a ele proferir decisões finais sobre litígios civis e criminais que não se relacionem com questões constitucionais ou da justiça especializada. Uma prova de seu posicionamento é a edição da Súmula 593, na qual se conceitua o crime de estupro de vulnerável e deixa claro ser irrelevante o consentimento da vítima:

DIREITO PENAL – ESTUPRO

O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente. (TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/10/2017, DJe 06/11/2017).

O Congresso Nacional também segue esse mesmo entendimento quanto ao tema vulnerabilidade. Prova disso é que incorporou ao Código Penal, por meio da Lei 13.718/2018, acrescentando o parágrafo 5º ao artigo 217-A, o qual cuida do estupro de vulnerável, com o seguinte teor: “as penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime” (Brasil, 2018).

Logo, de acordo com o Poder Legislativo, ao se praticar um crime de estupro contra vítima vulnerável, pouco importa o seu consentimento. Esse entendimento demonstra a posição do legislador quanto à vulnerabilidade do menor de 14 anos, ao que esse parágrafo indica, parece que se considera em sua forma absoluta.

Outrossim, é importante observar a ressalva feita de que esse entendimento persistirá mesmo no caso de a vítima ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime. Trata-se de um esclarecimento de extrema importância, visto que poderia ocorrer de essa experiência anterior ser usada pelo autor e sua defesa jurídica do crime para tentar sair sem punição. Por exemplo, sabe-se que existe a exploração sexual de crianças e, com esse parágrafo, não se pode alegar tal fato como tentativa de escusa da lei.

Do exposto, fica claro que o legislador considera os menores de 14 anos vulneráveis de forma absoluta. Entretanto, concernente aos Tribunais, há julgados considerando essa vulnerabilidade relativa, enquanto em outros a considera absoluta. Ao que parece os tribunais decidirão se os jovens menores de 14 anos serão absolutamente vulneráveis de acordo com o caso em concreto.

Como exemplo desta afirmação de relativização dos Tribunais, vale citar o Agravo em Recurso Especial nº 1.555.030 – GO (2019/0233236-0), do Superior Tribunal de Justiça, que teve como Relator o ministro Ribeiro Dantas. Este julgado referiu-se ao caso de uma menina de 13 anos de idade que manteve relação sexual com um homem de 19 anos e desse relacionamento tiveram um filho. Ocorre que o Tribunal acabou mitigando o alcance da Súmula 593/STJ, optando por analisar as particularidades do caso em concreto e afastando a condenação do réu por estupro de vulnerável.

Assim, o Tribunal entendeu que o namoro entre réu e vítima teve continuidade, já depois de a moça atingir a idade permitida pela legislação, culminando em seu casamento. Posteriormente, desta união foi gerado um segundo filho, de modo que existe uma unidade familiar constituída livremente pela ofendida, quando esta já tinha idade para consentir. Chegou-se então à conclusão de que impor a pena de reclusão ao recorrido constituiria, na prática, em nova vitimização da ofendida. Esta, uma jovem moça com atualmente 21 anos, seria deixada com a hercúlea tarefa de educar e sustentar, sozinha, dois filhos pequenos, sem o apoio de seu marido.

Afirmando configurar verdadeira contradição causar à vítima um sofrimento desta natureza, colocando sobre seus ombros tão pesada missão, quando o objetivo da norma penal é justamente protegê-la. Porém, o tribunal fez questão de deixar claro que essa decisão não se propõe à superação da Súmula 593/STJ, mas apenas se reconhece distinção entre a situação tratada pelo enunciado sumular e a excepcionalíssima hipótese dos autos, a reclamar tratamento jurídico diferenciado que preserve a liberdade de escolha da vítima e a família por ela constituída. Isso indica, mais uma vez, uma prevalência da Constituição Federal na perspectiva jurídica sobre a temática.

Esse julgado corrobora com o pensamento de Nucci (2020) exposto acima que centra-se no fato que, apesar da lei adotar a vulnerabilidade absoluta, existe uma exceção a essa regra, especialmente considerando a diversidade cultural e de costumes em todo o território brasileiro. É conhecida a existência de casais em união estável, com filhos, onde a mãe pode ter apenas 12 ou 13 anos, ou até menos. Essas famílias constituídas estão protegidas pela Constituição Federal, e a lei comum não pode prevalecer sobre ela.

Por fim, pelo que se nota, a tendência é que a vulnerabilidade do menor de 14 anos continue a ser considerada absoluta, mas contendo a ressalva da constituição da família que, nesse caso, os fatos indicam que será pela relativização em prol do núcleo familiar constituído. Outro fato a se esclarecer é que parece que cada caso será analisado de forma individual, considerando o caso concreto, dependendo do contexto do ocorrido.

2.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE A IDADE DO CONSENTIMENTO

É importante se analisar em que idade é admissível pela legislação a um adolescente iniciar uma vida sexual consentida. Sendo assim, discorre-se sobre em qual momento a legislação brasileira permite que os adolescentes possam ter autonomia para esse fim. Saraiva e Gondran definem esse consentimento como a vontade livre, não viciada, de permitir ou dar licença para que algum ato seja praticado. (Saraiva e Gondran, 2021, p. 178). Lowenkron também discorre sobre o consentimento e enfatiza que vai muito além do ato de consentir, pois necessita haver também a capacidade de decisão:

É importante notar que o ‘consentimento’, tal qual foi definido no pensamento liberal, pode ser entendido como um ato de vontade e, ao mesmo tempo, como uma capacidade para exercer livremente a própria vontade. Nesse sentido, a capacidade de ‘consentimento’ pressupõe a ideia de autonomia individual, que tem como pré-requisito o autodomínio, isto é, um ‘self’ livre de coações ou constrangimentos e capaz de governar racionalmente a si mesmo (Lowenkron, 2016, p.7).

Em continuidade, o autor ressalta o motivo de se ter uma idade do consentimento, dizendo que o jovem abaixo da idade permitida ainda não desenvolveu as competências para sua tomada de decisão, mas não nega que o jovem nessa faixa etária não tenha desejo:

O princípio que fundamenta a ‘menoridade sexual’ não é qualquer suposição de que o jovem abaixo da idade definida legalmente não tenha desejo ou prazer sexual, mas, sim, que este não desenvolveu, ainda, as competências consideradas relevantes para consentir uma relação sexual. Supõe-se que a competência para tomada de decisões vem com o tempo, através de um processo de socialização no qual o sujeito racional completo é (con)formado. (Lowenkron, 2016, p. 8).

Costa (2001), por sua vez, destaca que o início do comportamento sexual do ser humano começa já na infância, nas atitudes e curiosidades, decorrentes das necessidades de satisfações instintivas que exigem gratificações eróticas. De acordo com as etapas do desenvolvimento, o indivíduo localiza em determinadas regiões do corpo (zonas erógenas) o interesse libidinoso. Libido é a energia que alimenta a conduta sexual. Prosseguindo, ele divide o desenvolvimento do indivíduo por fases, enfatizando que na etapa precoce da adolescência (10 aos 14 anos) inicia-se a maturação física puberal:

Há extremo interesse e curiosidade sobre o próprio corpo e sobre o corpo de seus iguais. As fantasias sexuais são frequentes, podendo servir como motivo de culpa; a masturbação inicia-se nessa idade e pode ser acompanhada de sentimento de culpa; as relações costumam ser platônicas, sem contato físico, tais como “intermináveis” conversas ao telefone (Costa, 2001, p. 219).

Assim, vislumbra-se que a criança e adolescente passa a nutrir suas vontades e fantasias sexuais ainda no final da infância, porém carece analisar como a legislação brasileira trata essa vontade, a partir de qual idade permite que a criança ou adolescente tenha autonomia quanto às suas decisões referentes ao consentimento.

Segue-se então que, concernente ao Estatuto da Criança e do adolescente, Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, em seu segundo artigo são elencadas as idades em que se considera ser criança e adolescente, sendo, respectivamente, a primeira até doze anos de idade incompletos, e a segunda entre doze e dezoito anos de idade. Em direção similar, no Código Penal, Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, há um artigo voltado para os vulneráveis, no qual se proíbe a conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menores de 14 anos. O enunciado deste artigo diz o seguinte:

Estupro de vulnerável:

Art. 217-A.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1° Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência (Brasil, 1940).

Já o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem registrado a idade que considera marco do consentimento do adolescente, falando inclusive da irrelevância de eventual consentimento ou de sua experiência sexual anterior, através da Súmula 593-STJ que, como visto anteriormente, configura conjunção carnaval ou prática de atos libidonosos com menores de 14 anos como estupro de vulnerável. Também, como observado anteriormente, o Congresso Nacional considera 14 anos como a idade do consentimento.

Guilherme de Souza Nucci, também já deixou claro sua opinião sobre essa inovação do legislador, porém, para ele, essa idade do consentimento deveria ser padronizada para os 12 anos de idade:

A inclusão do § 5.º ao art. 217-A possui o nítido objetivo de tornar claro o caminho escolhido pelo Parlamento, buscando colocar um fim à divergência doutrinária e jurisprudencial, no tocante à vulnerabilidade da pessoa menor de 14 anos. (Nucci, 2020, p.1.188).

O renomado autor ainda afirma que o ordenamento jurídico perdeu uma oportunidade ímpar para equiparar os conceitos com o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, criança é a pessoa menor de 12 anos; adolescente, quem é maior de 12 anos. Logo, para ele a idade de 14 anos deveria ser eliminada desse cenário. A tutela do direito penal, no campo dos crimes sexuais, deve ser absoluta, quando se tratar de criança (menor de 12 anos), mas deveria ser relativa ao cuidar do adolescente (maior de 12 anos). É o que demanda a lógica do sistema legislativo, se analisado em conjunto (Nucci, 2020), indicando uma forma de suprir a lacuna legal.

Pois bem, do exposto percebe-se que não há uma idade padrão para a idade do consentimento, mas o fato é que penalmente falando, a idade do consentimento é a partir dos 14 anos de idade e ainda há a possibilidade de mudança para acima dessa idade caso o mencionado projeto de lei seja aprovado nas casas legislativas.

3 BREVES NOTAS SOBRE A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA

A questão da gravidez na adolescência continua a ser um tema de grande importância no contexto da saúde reprodutiva no Brasil, devido à sua alta prevalência e ao fato de ser uma das principais causas de morbimortalidade entre as mulheres nessa faixa etária (Assis et al., 2021).

Neste contexto, é crucial que os profissionais da educação e da saúde estejam atentos às implicações da gravidez durante a adolescência, requerendo intervenção e reflexão. Diversos aspectos associados à gravidez precoce têm sido objeto de estudo, tais como: a compreensão da sexualidade dos adolescentes e a importância da educação sexual, o acesso e uso de métodos contraceptivos, as questões relacionadas às doenças sexualmente transmissíveis, incluindo a AIDS, os desafios do abandono escolar e a problemática da violência associada ao abuso sexual (Trindade; Freman; Pereira, 2003).

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (2019), o Brasil possui uma das maiores taxas de gravidez na adolescência da América Latina, com 68,4 nascidos vivos a cada mil meninas de 15 a 19 anos em 2016, apesar de uma diminuição nos últimos anos. Em 2010, quase 20% de todos os nascimentos no Brasil eram de mães adolescentes, enquanto em 2019 essa proporção caiu para 14,72% (Ibid.). A maior redução ocorreu entre as adolescentes de 15 a 19 anos. Já as adolescentes mais jovens, de 10 a 14 anos, apresentaram proporções abaixo de 1% e uma diminuição mais discreta (Ibid.).

As adolescentes grávidas geralmente têm acesso mais inadequado ao pré-natal, iniciando-o tardiamente e fazendo menos consultas em comparação com as adultas (Assis et al., 2021). No Brasil, assim como em outros países, há uma maior probabilidade de parto prematuro, baixo peso ao nascer, mortalidade materna e neonatal entre gestantes adolescentes (Ibid.). Além disso, há uma maior chance de complicações durante a gravidez, como infecções urinárias, aborto espontâneo, pré-eclâmpsia, doença hipertensiva relacionada à gravidez e ruptura prematura das membranas (Ibid.).

3.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS DA MENOR DE 14 ANOS GRÁVIDA

Em primeiro lugar, faz-se necessário conceituar os direitos fundamentais: segundo Gilmar Mendes, os direitos e garantias fundamentais, em sentido material, representam pretensões que, em cada contexto histórico, se revelam a partir da perspectiva do valor da dignidade humana (Mendes, 2012, p. 210). Já André Ramos Tavares (2020), ao abordar o tema, conceitua os tipos de direitos fundamentais, demonstrando que se trata de tema bem abrangente que abarca a todos, utilizando a expressão “direitos fundamentais” para englobar os direitos individuais, políticos, sociais, econômicos e de solidariedade, tanto em nível interno quanto internacional (Tavares, 2020, p. 442).

Nesse contexto, conforme demonstrado acima, esses direitos abarcam a todos, mas é essencial discorrer sobre eles no que concerne aos sujeitos de direitos (criança e adolescente) abordados no artigo. Tavares (2020, p. 567) destaca ainda que aos menores são garantidos todos os direitos conferidos aos adultos, mas com um tratamento diferenciado. Ao se referir ao Direito do menor, ele enfatiza a necessidade de considerar as peculiaridades da natureza do ser humano em desenvolvimento para atender à dignidade da pessoa.

Em síntese, crianças e adolescentes têm acesso a todos os direitos humanos concedidos aos adultos, mas alguns direitos específicos são direcionados às suas faixas etárias, conforme elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente. Essa diferenciação é crucial para respeitar a natureza peculiar em que crianças e adolescentes se encontram, além de atender aos ditames do princípio da dignidade da pessoa humana.

Ao trazer o enfoque do assunto direitos humanos para o contexto de possível gravidez em crianças e adolescentes, percebe-se que as normas jurídicas apresentadas, em sua maioria, garantem a oferta de direitos que os protegem para essa situação específica, no contexto de gravidez. No artigo 227, destaca-se o princípio da prioridade absoluta concedida a crianças e adolescentes em relação aos seus direitos fundamentais. Além disso, são elencados os responsáveis por garantir essa prioridade na efetivação desses direitos: família, sociedade e Estado. O texto detalha os direitos abrangidos, como vida, saúde, educação, entre outros, reforçando a necessidade de proteção contra negligência, discriminação, exploração, violência e opressão.

O artigo 229 estabelece os deveres dos pais em relação aos filhos menores, e vice-versa. A criança e o adolescente contam com a obrigação de seus responsáveis em fornecer amparo, independentemente de estarem em estado de gravidez ou não, mantém-se intacto o direito de serem protegidos.

Já ao se analisar a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990), observa-se que, assim como a Constituição de 1988, assegura os direitos fundamentais de forma prioritária a crianças e adolescentes, conforme estabelecido no artigo 4°. O artigo 5° do Estatuto prevê punição para quem atentar contra esses direitos, reforçando a proibição de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

A interpretação do Estatuto, conforme o artigo 6°, leva em conta os fins sociais a que se destina, as exigências do bem comum e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. Portanto, tanto a Constituição quanto o Estatuto da Criança e Adolescente asseguram direitos fundamentais, com especial proteção à criança e ao adolescente. Em situações em que uma menor vulnerável é vítima de um crime como estupro, resultando em uma gravidez indesejada, é crucial garantir prioritariamente seus direitos para proteger sua saúde física e mental.

Reiteramos mais uma vez que, do exposto sobre as legislações acima acostadas, é possível afirmar que o ser em desenvolvimento tem garantido pelo ordenamento jurídico brasileiro todos os seus direitos fundamentais. Não seria diferente na situação de uma gravidez, mesmo em uma idade tão juvenil, seria desumano mitigar essa proteção a essas mulheres em estado vulnerável.

Além da garantia desses direitos, vale dar ênfase para a prioridade que a menina gestante tem em todos os seus Direitos Fundamentais, desde a realização de um pré-natal ou até mesmo no acesso ao aborto, caso seja essa a opção desejada.

Cabe ressaltar que o aborto, no caso de estupro, segundo o dispositivo penal, não precisa de autorização judicial, mas caso o médico, para realizar o ato, exija essa autorização, como de fato vem ocorrendo, essa menor tem direito assegurado de acesso ao judiciário de forma prioritária.

3.2 CASOS CONCRETOS

Para início dessa discussão faz-se necessário explicitar que inúmeros casos de estupro de vulnerável que decorrem em gravidez ocorrem todos os dias. Recentemente, em Teresina – PI, uma menina de 11 anos engravidou pela segunda vez (G1, 2022). E pela segunda vez, sua família optou pelo prosseguimento da gestação.

Todavia, a fim de poder nos aprofundar na análise dos casos, discorreremos aqui somente sobre dois. O primeiro é o caso da menina de 11 anos que sofreu um estupro e acabou engravidando. Será retratado mais especificamente algumas falas da primeira juíza que cuidou desse caso, durante uma audiência com a presença da vítima e de sua mãe. Ressalta-se que essa entrevista foi publicada pelo Intercept Brasil no seu canal do Youtube. (Intercept Brasil, 2022).

Primeiramente, a juíza inicia perguntando como a infante está se sentindo em relação à gravidez, se sente dor, a menina responde somente que não. Ela continua indagando se ela sente dor no estômago, se o bebê já chuta, a menina fica calada. Então lhe pergunta sobre a gravidez, se a criança sabia como engravidava. A menina responde que não sabia. Dando continuidade, a juíza pergunta da expectativa em relação ao bebê, se ela queria esperar ele nascer, se queria vê-lo nascer. A menina balança negativamente a cabeça dizendo que não.

Em seguida, pergunta como que a menina e sua mãe chamam esse não querer ver o bebê nascer, a menina fica em silêncio. Pergunta se a menina aceitaria ficar com o bebê na barriga por mais tempo, até ele formar, para dar os medicamentos para ele para que seu pulmãozinho fique mais maduro e retirar o bebê para outra pessoa cuidar, caso ela não queira. A menina responde que não sabe.

A juíza diz que faria a pergunta ao médico, mas que se estivesse tudo bem, se ela aceitaria ficar mais umas duas semanas com o bebê e se depois de retirado ela aceitaria entregá-lo para outro casal, a menina respondeu que sim. Ela em continuidade, pergunta se ela não tem interesse em ficar com o bebê, a menina responde que não.

Em dado momento, a promotora assume a palavra dizendo que o bebê já está completo, que tem bebê que nasce até antes e pede para ela manter por uma ou duas semanas para não deixar morrer, pois, segundo ela o bebê será retirado da barriga e deixarão ele morrer. Então lhe sugere entregar para a adoção. A menina permanece calada. Ela pergunta novamente e mais uma vez houve silêncio.

Em seguida, a juíza continua a tentar convencê-la, diz que quanto mais ele ficar na barriga, mais saudável vai ficar e pergunta se ela compreende, ela fica em silêncio. Ato contínuo, pergunta se ela consegue ficar até o final da gestação, caso o médico diga que ela tenha saúde para isso, a garota diz que não consegue. Então ela pergunta se o pai do bebê concordaria em entregá-lo para a adoção e a menina diz que não sabe.

Em outro momento a mãe da menina começa a ser indagada e a juíza lhe pergunta se tem consciência de que vão retirar e ter que esperar até o bebê morrer e que isso é uma crueldade. A mãe responde dizendo que mais crueldade do que a menina está vivendo e que não sabe mais o que fazer. A mãe diz que gostaria pelo menos que sua filha ficasse com ela (a menina estava em um abrigo para ser protegida de novos abusos). Diz que queria sua filha com ela porque ela não tem noção do que está passando.

Concernente a essa situação relatada, indiscutivelmente é algo bastante complexo por conta dos envolvidos. Tem-se uma criança de dez anos em estado de gravidez, isso por si só já é algo alarmante, pois, biologicamente e psicologicamente esta criança ainda não tem um preparo para gerar uma nova vida.

Uma outra perspectiva dessa complexidade é que essa menina foi abusada e desse ato resultou na gravidez. Posteriormente se divulgou que o autor se tratava de um outro menino de 13 anos de idade. Ou seja, trata-se de outro vulnerável envolvido na história, o que torna ainda mais sensível o caso.

O fato é que, na época do julgamento, ainda não se tinha divulgado na mídia quem seria o autor do fato.  E partindo do pressuposto de que a juíza também não sabia, é no mínimo assustador lhe ouvir perguntando se o pai do nascituro aceitaria que ela realizasse o aborto.

O segundo caso, a título de exemplo, ocorreu no ano de 2019, sendo o de uma garota de 10 anos, natural da cidade de Tarauacá no interior do Acre. Ela sofreu abuso e veio a engravidar e foi levada pelo seu pai para o hospital do município com o intuito de que realizassem um aborto. Ocorre que por se tratar de um quadro clínico de risco, pela sua idade e dado a gravidez já estar avançada, encaminharam-na para o município vizinho – Cruzeiro do Sul, no Acre.

Em um primeiro momento, seu pai autorizou o aborto, mas depois voltou atrás e desautorizou e a menina veio depois a dar à luz a criança. Ocorre que pela idade, é indiscutível que essa menina sofreu o estupro de vulnerável, porém, conforme veiculado no site G1, o conselheiro do município relatou se tratar de uma gravidez de risco, pois além da pouca idade, ela ainda tinha epilepsia.

Sobre essa temática, cabe ressaltar que o Código Penal no Artigo 128discorre dizendo o seguinte:

Art. 128 Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I – Se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II – Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. (Brasil, 1940).

Esses são os dois tipos de abortos permitidos no Código Penal. Concernente ao segundo, cuida do aborto se a gravidez resulta de estupro. No primeiro tipo de aborto, precisa de autorização, já nesse segundo caso, a lei diz que basta a autorização da gestante ou do seu responsável.

Sobre o segundo tipo permissivo de aborto, Cezar Roberto Bitencourt discorre que se trata do aborto humanitário, também denominado ético ou sentimental, o qual é autorizado quando a gravidez é consequência do crime de estupro e a gestante consente na sua realização. Pelo nosso Código Penal não há limitação temporal para a estuprada-grávida decidir-se pelo abortamento. (Bitencourt, 2020, p. 609). O autor confirma que a excludente de ilicitude se estende caso um médico pratique um aborto em uma gravidez resultante do crime de estupro de vulnerável:

A excludente em exame estende-se ao crime praticado com violência implícita (art. 217-A). A permissão legal limita-se a referir-se ao crime de estupro, sem adjetivá-lo. Como o legislador não desconhece a existência das duas formas de violência, elementares desse crime — real (art. 213) e implícita (art. 217-A) —, ao não limitar a excludente à presença de qualquer delas, não pode o intérprete restringir onde a lei não faz qualquer restrição, especialmente para criminalizar a conduta do médico. Com efeito, interpretação restritiva, no caso, implica criminalizar uma conduta autorizada, uma espécie de interpretação extensiva contra legem, ou seja, in malam partem. (Bitencourt, 2020, p. 611).

Sendo assim, analisando os dois casos das meninas já mencionados, caso o médico praticasse o aborto teria sua conduta amparada pela excludente de ilicitude. Porém, no primeiro caso, a Juíza e Promotora mostraram-se evidentemente interessadas em tentar convencê-la a continuar a gravidez. Mesmo a menina e sua responsável dizendo claramente que não queriam levar a gravidez adiante.

Um outro fato a se apontar é que conversavam com a menina como se ela já tivesse plena capacidade cognitiva e reflexiva para entender o que lhe estava sendo perguntado.  As perguntas pareciam ser formuladas para alguém que já tivesse um maior entendimento ou até mesmo para quem desejasse a maternidade.

Outro ponto a ser destacado – e que ajudou na motivação da escrita do presente artigo -, foi o fato de a juíza perguntar à criança se ela achava que o pai do bebê concordaria em entregá-lo para a adoção. Na audiência, em nenhum momento não é falado de quem seria o autor do estupro contra a menor. Algum tempo depois foi divulgado pela mídia que se tratava de um menino de 13 anos e que ambos moravam na mesma casa.

Ocorre que, considerando que não se falou do autor e considerando também se tratar de um crime de estupro de vulnerável, o código penal é bem claro ao autorizar o aborto no caso de estupro, não deixando brecha para que se indague se o suposto autor do crime concorda ou não em qualquer ato referente a uma gravidez resultante do estupro.

Sendo assim, as operadoras do direito não demonstraram em nenhum momento olhar especificamente para a menina como um ser vulnerável que também carecia de uma maior proteção, além de se pensar no seu cuidado mental ao longo do tempo, visto que é uma situação complexa que inevitavelmente deixará sequelas. Logo, em um caso sensível como este, qualquer decisão a ser tomada causará implicações.

Ao se optar pelo aborto, não há como garantir que em dado momento da vida dessa garota, esse ocorrido, por questões morais, poderá lhe ocasionar danos mentais. Ela como ser humano, pode optar em seguir determinada religião, por exemplo, e essa questão poderá se reavivar com pesar em sua consciência. Nesse caso, ela poderia escolher manter sua gestação, mas como muito jovem, poderia enfrentar risco de vida ou mesmo o bebê poderia não sobreviver, gerando também consequências emocionais.

Outra implicância de ela levar a gravidez adiante, mas por causa da pouca idade, sua vida profissional ainda não está definida. Nesta senda, a família deverá arcar com as responsabilidades de ambos, pois em vez de uma vulnerável, terão dois.

Mais do que isso, quais seriam as implicações psicossociais de uma criança passar nove meses gestando um ser indesejado, fruto de uma violência, em seu próprio corpo? Essa criança, definida como vulnerável pela legislação, possui condições de decidir se quer ser mãe? Evidentemente, tendo em vista a incapacidade da menor de analisar todos os impactos que a maternidade exerce sobre a vida das mulheres, mesmo as que já têm carreira consolidada, a resposta é negativa.

Já sobre a ótica social, também pode haver implicações, independente da decisão tomada. Essa menor e seus responsáveis poderão enfrentar críticas de pessoas moralistas, tanto por manter ou não a gestação. E caso morem em cidade pequena, é comum todos se conhecerem, essas críticas poderão ser faladas com maior recorrência e pode haver danos emocionais por motivo de vergonha, pois em muitos lugares ainda há essa preocupação das famílias em terem uma “filha solteira com filho” em casa, ainda mais com tão pouca idade. Frente a isso, os rumores em torno do caso, é um provável incômodo para esses envolvidos, pois ainda existe muito estigma em torno da mulher. Ainda existe muito preconceito quanto à questão de uma mulher engravidar sem estar em um matrimônio, quiçá em se tratando do caso de uma criança grávida.

Diante desse contexto, é relevante abordar a perspectiva de Flávia Biroli (2014), que analisa o debate sobre o aborto como uma extensão da crítica às relações entre o âmbito privado e o público, mediante a politização dos eventos no primeiro e a compreensão de que a organização de uma esfera está intrinsecamente ligada à organização da outra. Em outras palavras, as dinâmicas e a liberdade dos indivíduos na esfera privada influenciam diretamente suas vidas na esfera pública. A legalização do aborto, uma das principais demandas dos movimentos feministas brasileiros, confrontaria a idealização da maternidade, concebida pelo pensamento feminista como um papel imposto às mulheres, considerado natural e instintivo. Restringir o direito ao aborto, portanto, é visto como uma manifestação do controle estatal sobre os corpos das mulheres, interferindo até mesmo em suas escolhas reprodutivas – sobretudo no caso de pessoas vulneráveis, como as vítimas analisadas.

Em complemento, considerando o conflito de vontades entre a menor grávida e seus responsáveis, cabe usar o segundo caso como exemplo: o pai da infante em um primeiro momento autorizou o aborto, mas depois mudou de ideia. Trata-se de uma decisão em que ele usa apenas o seu poder familiar, mas por se tratar de um homem, indaga-se se ele teria dimensão do significado de uma gravidez, de sua amplitude em várias áreas da vida de uma mulher. Ainda mais se tratando de uma criança de dez anos, é necessário questionar se seus direitos humanos estão sendo garantidos de forma efetiva. Parece que, na realidade, a menor vítima de um crime passa a ser revitimizada, sendo obrigada a dar continuação a uma gestação nessas condições.

Outrossim, nesse caso em tela, a vontade do pai da menina de não permitir o aborto prevaleceu, inclusive alguns meses depois ela deu à luz, em nenhuma das matérias se fala se essa menina queria ou não manter a gestação. Mas supondo que ela não quisesse, mas seu pai optando por manter, cabe a reflexão se essa menor não deveria ter sua opinião também levada em conta.

O site Intercept Brasil (2023) divulgou em seu portal que realizou um levantamento inédito e constatou-se que, entre 2015 e 2020, mais de 9 mil meninas estupradas engravidaram no Brasil, mas só 362 conseguiram o direito ao aborto. Ou seja, um total de menos de 4% dessas meninas conseguiu o direito ao aborto. Na reportagem do site, ainda há a tentativa de sondar por quais motivos muitas dessas meninas não têm acesso:

Se é por falta de informação ou por razões morais que o procedimento é negado por médicos a crianças estupradas, só podemos especular. Mas é obrigação do serviço realizar o aborto, bastando o consentimento. Se houver impedimentos técnicos, o estabelecimento deve encaminhar a paciente a um serviço capaz de fazer o abortamento. (Intercept Brasil, 2023)

Destaca-se neste excerto a questão moral que pode ser um motivo para que muitos responsáveis sejam contrários a essa decisão. Mas cabe lembrar que no caso de estupro de vulnerável, seja ele bilateral ou não, há a expectativa da vida de um nascituro, mas de outro lado já existe uma criança que merece acolhimento e proteção.

3.3 UM BREVE PANORAMA DA GRAVIDEZ E DO ABORTO DAS MÃES VULNERÁVEIS NO BRASIL

O Sistema Único de Saúde periodicamente divulga no portal DATASUS (NASCIDOS VIVOS – BRASIL) relatórios sobre a temática gravidez no Brasil. Esse relatório é divulgado por faixa etária, dentre elas existe a de 10 a 14 anos. O último relatório disponível no portal do ano de 2022 que tem como título “Nascim p/resid. mãe segundo Região”, o qual mostrou que nesse ano houve um total de 14.293 mulheres que se tornaram mãe nessa faixa de 10 a 14 anos no Brasil. Houve a divisão por regiões e consta que as Regiões Nordeste e Norte são as que mais têm incidência desses casos de nascimento. Em referência ao ano de 2023, de acordo com dados divulgados pela Revista Marie Claire, até o mês de junho, mais de 5 mil meninas de até 14 anos deram à luz no país. Ainda segundo a revista, nesse primeiro semestre de 2023, em média 29 meninas por dia deram à luz.

Considerando que há uma notável quantidade de meninas vulneráveis dando à luz, cabe analisar a questão do aborto, se há um quantitativo significativo que recorre a este serviço ou não.

De acordo com matéria do ano de 2022 veiculada no site O Globo, os casos de abortos legais de menores de 14 anos se multiplicaram por seis na última década. O site cita dados do Ministério da Saúde e diz que em 2011, 16 procedimentos de interrupção de gravidez de meninas abaixo de 14 anos foram registrados no país. Já no ano de 2021, o número chegou a 97, média de oito abortos por mês. O site ainda classifica esse quantitativo de abortos como de baixo número, em comparação com a quantidade de nascimentos nesta faixa etária e diz que isso se dá porque a realidade afasta essas meninas de exercerem seus direitos.

Além disso, o site UOL divulgou em seu portal, uma pesquisa intitulada de “Aborto no Brasil: o que dizem os dados oficiais?” Essa pesquisa foi realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, por meio de coleta e análise de registro público do sistema único de saúde. Assim, houve a divulgação de que as maiores vítimas do aborto no Brasil são as negras, as menores de 14 anos e as moradoras da periferia. Sendo essas as que mais morrem após interrupção de gravidez realizadas de forma insegura, devido a complicações de procedimentos clandestinos. Nessa pesquisa, dados foram cruzados e chegaram ao número de 770 óbitos maternos que foram registrados como tendo o aborto como causa oficial. Entretanto, se forem consideradas as fichas que mencionam o aborto, mas apresentam outras razões, o número salta para 993 vítimas.

3.4 PERSPECTIVAS DE SOLUÇÕES E CONCILIAÇÕES

Ao se falar de uma questão envolvendo uma criança ou adolescente, seja qual for a decisão é cabível esclarecer que há a garantia legal de um processo decisório célere. Essa celeridade é garantida pelo Código Civil em seu artigo 1.048, o garante que terão prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais envolvendo crianças e adolescentes.

Além disso, por ser uma celeuma complexa, é essencial adotar uma abordagem que leve em consideração não apenas os aspectos legais, mas também os psicológicos e sociais dos envolvidos. A escuta ativa e o respeito pelos direitos e desejos da menor são centrais nesse processo e os métodos extrajudiciais de solução de conflitos não podem ser descartados em detrimento dos métodos tradicionais.

Discorrendo sobre tais métodos, Fiorelli e Mangini (2018, p. 391-392) dizem que do ponto de vista de conteúdo intrapsíquicos (crenças, valores, princípios), o julgamento e a arbitragem são métodos que transferem essa questão para o coletivo. Ao indivíduo resta a possibilidade de submeter-se ao ritual, que constitui o grande foco do processo. Sob a ótica da psicologia, as partes se aproximam do coadjuvante; os agentes são as pessoas para as quais os poderes são delegados ou outorgados.

E quanto à responsabilidade dizem que passa a ser assumida pelas partes, que incubem de construir o que virá. E finalizam dizendo que essa transferência de responsabilidades significa também, compreender novas possibilidades de comportamento e internalizar novas crenças e visões de mundo. Esses métodos resgatam, para o indivíduo, as decisões a respeito das questões que eles mesmo trazem.

Cabe destacar também que nesse processo decisório, é preciso que todos tenham seu direito de expressão assegurado, inclusive a menor, pois de acordo com a Convenção sobre os Direitos da Criança (1990) lhe é assegurado expressar livremente suas opiniões, bem como ser ouvida em todos os processos que lhe afete.

Ocorre que no Código Penal, ao se tratar do aborto resultante de estupro, diz que a mulher irá decidir se deseja abortar, bem como seu responsável, no caso dos incapazes. Ao se tratar de um vulnerável, necessariamente quem decidirá será seus responsáveis e caso a menor tenha uma vontade diferente das dele surge o conflito de vontade.

No artigo 12 da já mencionada convenção é dito que os Estados Partes devem assegurar à criança que é capaz de formular seus próprios pontos de vista o direito de expressar suas opiniões livremente sobre todos os assuntos relacionados a ela, e tais opiniões devem ser consideradas, em função da idade e da maturidade da criança.

A mesma convenção assegura que a criança deve ter a oportunidade de ser ouvida em todos os processos judiciais ou administrativos que a afetem, seja diretamente, seja por intermédio de um representante ou de um órgão apropriado, em conformidade com as regras processuais da legislação nacional. Sendo assim, supondo que em um caso concreto envolvendo uma vulnerável grávida haja a divergência de vontades quanto a manter ou não essa gestação, deveriam haver dispositivos que garantissem a essa menor a expressão de sua opinião e vontade. Sobretudo em situações como a dos casos analisados, nos quais perdurou o conflito entre a vontade da menor com a de seus responsáveis legais, ou ainda com agentes legais que façam uso abusivo de seu poder.

Logo, ao surgir esses conflitos, uma equipe multidisciplinar poderia ser chamada para tentar soluções, com o intuito de mostrar as implicações de cada decisão e garantir maior imparcialidade ao caso. Também, essa equipe atuaria mediando os conflitos que surgissem durante as tratativas.

Um outro ponto é que essa equipe sendo composta por profissionais de diferentes áreas, certamente será capaz de ouvir uma criança com uma linguagem apropriada e levando em conta o fato de se tratar de uma pessoa que ainda está em desenvolvimento tanto psiquicamente quanto emocionalmente e que, por isso, requer um tratamento considerando essa particularidade.

Em resumo, abordar esse tema, considerando que a menor esteja grávida, é uma situação complexa. Logo, a partir da análise empregada neste artigo, algumas estratégias resolutivas surgem:

1. Mediação Familiar e Aconselhamento: a perspectiva de conciliação pode envolver a busca por profissionais de mediação familiar ou conselheiros especializados. Esses profissionais podem facilitar conversas construtivas entre a menor grávida e seus responsáveis, promovendo o diálogo e ajudando a encontrar soluções que considerem o bem-estar de todos.

2. Avaliação Interdisciplinar: uma abordagem interdisciplinar pode incluir a participação de profissionais da saúde, assistentes sociais e psicólogos para avaliar o contexto físico, emocional e social envolvido. Essa avaliação pode oferecer relatórios sobre o real estado de saúde da menor. Esses relatórios podem servir de base para a decisão a ser tomada, por exemplo, em um caso de a gestação comprovadamente estiver oferecendo risco, talvez não caiba levar em conta a vontade desta menor. Esta estratégia deveria ser implementada pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS), ao passo que corre na mesma direção de seus trabalhos (CREAS, 2008). Haja vista que estes centros desempenham um papel crucial na inclusão e proteção social de pessoas e famílias que enfrentam violações de direitos e diversas formas de violência, como maus-tratos, negligência, abandono e discriminação. Nos CREAS, são oferecidos serviços de informação, orientação, apoio e integração social, com o objetivo de garantir e defender os direitos individuais. Logo, a presença dos CREAS em diferentes territórios e regiões fortalece a atuação do Estado no combate e enfrentamento das situações de violência enfrentadas por pessoas e famílias, tornando-se uma referência essencial na proteção da assistência social.

3. Intervenção do Estado e Órgãos Tutelares: em situações de conflito persistente, os órgãos tutelares podem desempenhar um papel importante. A intervenção do Estado pode garantir que os direitos da menor grávida sejam protegidos, enquanto busca equilibrar os interesses da família e a responsabilidade parental.

4. Advocacia para os Direitos da Menor Grávida: da perspectiva jurídica, advogados podem atuar em defesa dos direitos da menor grávida, assegurando que suas escolhas sejam respeitadas, desde que estejam em conformidade com a legislação vigente.

Finalmente, é muito importante destacar que cada situação é única e as soluções devem ser adaptadas às circunstâncias específicas. A perspectiva de conciliação busca encontrar um equilíbrio entre os desejos e direitos da menor grávida e as preocupações dos responsáveis, visando a uma solução que seja justa e respeitosa para todas as partes envolvidas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa tratou sobre “A abordagem jurídica do aborto em casos de estupro bilateral de vulneráveis: Conflitos de vontade e soluções jurídicas”. O estudo se mostrou relevante em razão de ser notório que muitos adolescentes iniciam cada vez mais cedo a vida sexual, bem como pelo número expressivo de meninas abaixo dos 14 anos que veem engravidando. Ocorre que quando dois vulneráveis se relacionam sexualmente de livre e espontânea vontade e desse relacionamento resulta uma gravidez, algumas questões em torno da concepção surgem e é preciso discuti-las.

Ao longo da pesquisa, pode-se elencar as seguintes limitações: com a lei 12.015 de 2009, criou-se o tipo específico para proteger os vulneráveis, mas ainda há controvérsias no tocante a questão da vulnerabilidade, pois os tribunais, em alguns casos vem relativizando e em outros continuam a considerar essa vulnerabilidade como absoluta.

Uma outra limitação encontrada foi que a lei 12.015 de 2009 buscou proteger a dignidade sexual dos vulneráveis, mas em se tratando das meninas, conforme pesquisado, mesmo após a lei entrar em vigor, ainda há um número considerável delas que estão engravidando. Este fato denota que a proteção desses menores ainda conta com algumas deficiências.

Já quando essas meninas sofrem o abuso e acabam grávidas, a decisão quanto ao futuro da gestação tem ficado na mão de outras pessoas e a menor poderá até arcar com uma gestação caso não a queira, a depender da vontade do judiciário ou de seus responsáveis.

Apesar disso, foi possível alcançar os seguintes objetivos almejados no início do trabalho: no que diz respeito ao objetivo geral de compreender as questões jurídicas envoltas no contexto de crianças e adolescentes menores de 14 anos que praticam entre si sexo ou outro ato libidinoso e dessa prática resulta em gravidez, constatou-se que não há um tipo penal específico para essa ação dos envolvidos, mas que a doutrina denomina de estupro bilateral de vulnerável. Há quem considere que ambos, por ainda serem adolescentes, comentem ato infracional análogo ao crime de estupro de vulnerável.

Já quanto à gravidez, sugeriu-se que, por ser uma questão delicada e não havendo consenso entre as partes, cabe ao judiciário colocar à disposição uma equipe para tentar solucionar o conflito, inclusive contando com os métodos não tradicionais de solução do conflito.

Sobre os objetivos específicos, em se tratando do enquadramento jurídico do estupro bilateral de vulnerável, verificou-se não haver um enquadramento específico no Código Penal, mas que a Doutrina utiliza essa denominação. Concernente à autonomia da menor em detrimento da responsabilidade dos pais, chegou-se à conclusão de que a menor, por ter seus direitos fundamentais garantidos, sua vontade deve ser observada e os pais têm prerrogativas e responsabilidades, mas que cabe o bom senso no caso de essa grávida apresentar risco a sua saúde, nesse caso a vontade dos responsáveis, caso seja diversa da deles, deverá prevalecer.

Diante disso, a hipótese levantada é de que a menor queira levar a gravidez adiante, mas que seus responsáveis não aceitem essa decisão – qual a vontade deveria prevalecer? Considerando o problema da seguinte pesquisa: conflito de vontades no caso de gravidez resultante de estupro bilateral de vulnerável, pode-se chegar, com a presente pesquisa, à seguinte resposta: Talvez a resposta mais sensata para essa problemática seria que depende de cada caso em concreto, pois como é uma situação complexa, não é possível padronizar uma resposta para esse caso, por exemplo, a saúde da menor deve ser avaliada, mas sua vontade também.

Ressalta-se que os tribunais estão seguindo esse caminho de analisar o caso em concreto, no que concerne a condenação de autores pelo crime de estupro de vulnerável, como se mostrou no corpo do artigo, através do julgado do STJ. Porém, em se tratando da problemática da gravidez resultante do estupro dessas vulneráveis, notou-se que o judiciário vem observando a vontade dos responsáveis apenas e dependendo do estágio da gravidez.

Quanto aos médicos, quando se deparam com uma vulnerável grávida, conforme noticiado no caso da menina de Santa Catarina, eles exigem uma autorização judicial mesmo quando os responsáveis demonstram interesse em interromper a gestação. Porém, é sabido que em caso de gestação resultante de estupro, essa autorização se faz desnecessária.

Como proposta para efetivar a solução do problema, sugere-se que educação sexual seja ofertada para as crianças e adolescentes. É preciso que eles saibam das consequências do ato sexual.

No caso da primeira criança retratada no artigo e que acabou engravidando, na audiência com a juíza, ao ser indagada se sabia como engravidava, a criança respondeu que não sabia. Diante disso, a educação sexual será importante para que as crianças e adolescentes possam saber distinguir se estão em potencial risco de serem abusados e, assim, podendo avisar a um adulto ou se protegerem de outra forma.

No entanto, ficou demonstrado no artigo que as crianças começam a ter interesse e fantasias sexuais em torno dos dez anos de idade. Assim, caso ocorra de iniciarem uma vida sexual mais cedo, a educação sexual lhe assegure ter conhecimento suficiente para evitar uma gravidez indesejada ou mesmo se protegerem contra doenças sexuais transmissíveis. Sendo assim, é indiscutível a importância de se ter acesso à educação sexual desde cedo e somando com uma maior atenção dos responsáveis em torno das crianças e adolescentes, essa problemática poderá ser, na maioria das vezes, evitada.

Por fim, quanto ao judiciário, ao se deparar com uma questão envolvendo uma menor, principalmente em se tratando de questões envolvendo sua dignidade sexual ou mesmo gravidez, cabe um tratamento humanizado e condizente com a faixa etária de pessoa em desenvolvimento.


1Ver mais em https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Institucional/Atribuicoes#:~:text=Criado%20pela%20Constitui%C3%A7%C3%A3o%20Federal%20de,constitucional%20nem%20a%20justi%C3%A7a%20especializada. Acesso em 14 de março de 2024.

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