ABANDONO AFETIVO E SUAS IMPLICAÇÕES NA RETIFICAÇÃO DE NOME NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7761122


Anatiele Eufrásio da Silva1
Pedro Henrique Dutra2


RESUMO

O presente artigo propõe investigar a possibilidade de exclusão de sobrenomes parentais motivadas pelo abandono afetivo e o impacto na vida das crianças que foram abandonadas, deixadas à mercê da ajuda emocional dos pais e além disso quais são as características desse abandono. A pesquisa tem como objetivo geral descrever sobre o abandono afetivo e a retificação de nome, bem como trazer a associação dos dois temas. E conexos deste, os objetivos específicos são analisar e descrever sobre a natureza jurídica do nome e do direito de personalidade; descrever sobre as hipóteses de retificação de nome, visando constatar opiniões sobre o delineamento da pesquisa, o abandono afetivo; e por fim, identificar como o abandono afetivo influência nas demandas de retificação de nome, bem como, quais têm sido os posicionamentos majoritários acerca do tema no ordenamento jurídico brasileiro. A presente pesquisa se utilizou de métodos científicos para que possa ser compreendido de forma clara todos os elementos que a compõe, sendo sempre observados os objetivos que foram propostos para chegar à resposta do problema apresentado. Para realizar a pesquisa foi empregado o método dedutivo, uma vez que vamos analisar a perspectiva numa ótica geral, partindo para os ideais específicos, dentro do delineamento da pesquisa. A pesquisa é bibliográfica, e conta com um estudo feito a partir da perspectiva social, doutrinária, jurisprudência, histórica e culturais. Resta claro que a pesquisa bibliográfica é de extrema importância, visto que, concede um estudo teórico, embasado na lei e na jurisprudência, ademais, foi utilizada a abordagem qualitativa, inserida em uma pesquisa básica, onde os objetivos são descritivos.

Palavras-chave: abandono afetivo; alteração do nome; direito da personalidade.

AFFECTIVE ABANDONMENT AND ITS IMPLICATIONS IN THE RECTIFICATION OF NAME IN THE BRAZILIAN LEGAL ORDER

ABSTRACT

This article proposes to investigate the possibility of excluding parental surnames motivated by affective abandonment and the impact on the lives of children who were abandoned, left at the mercy of emotional help from parents and, in addition, what are the characteristics of this abandonment. The research has the general objective of describing affective abandonment and name rectification, as well as bringing the association of the two themes. And related to this, the specific objectives are to analyze and describe the legal nature of the name and the personality right; describe about the hypotheses of name rectification, aiming to verify opinions about the design of the research, the affective abandonment; and finally, to identify how affective abandonment influences demands for name rectification, as well as what have been the majority positions on the subject in the Brazilian legal system. This research used scientific methods so that all the elements that compose it can be clearly understood, always observing the objectives that were proposed to arrive at the answer to the presented problem. To carry out the research, the deductive method was used, since we are going to analyze the perspective in a general perspective, starting with the specific ideals, within the research outline. The research is bibliographic, and has a study made from the social, doctrinal, jurisprudence, historical and cultural perspective. It remains clear that bibliographic research is extremely important, since it provides a theoretical study, based on law and jurisprudence, in addition, a qualitative approach was used, inserted in a basic research, where the objectives are descriptive.

Keywords: affective abandonment; name change; personality right.

INTRODUÇÃO

Está consagrado no código civil, em seu artigo 16, o direito ao nome, e incluso a ele, o sobrenome. A Lei de Registros Públicos exige que toda pessoa física seja nomeada no nascimento e em todos os atos solenes da vida cívica há a necessidade de identificar o indivíduo, sempre pelo nome.

O nome é a identidade principal de uma pessoa diante da sociedade. Não se origina de escolha pessoal, mas acompanhará o indivíduo ao longo de sua vida. Essa identidade continua tanto na vida pública quanto na privada, mesmo após a morte do indivíduo.

Ao lidar com figuras públicas, a menção de um nome trará à mente as atividades em que se está envolvido, enquanto na vida privada, o indivíduo será lembrado pelo nome, na memória da família e das pessoas com quem convive.

O direito ao nome tem status de bem jurídico protegido e é tão vital que a Constituição Federal de 1988 fez questão de garantir em seu artigo 5°, inciso LXXVI, alínea a. Diante disso, fica claramente demonstrado que esta é uma questão de direito de personalidade, e o nome é um sinal único para cada pessoa.

Ademais, com o passar dos anos, e a evolução da legislação de maneira geral, as pessoas passaram a tomar conhecimento dos direitos que possuem, e a retificação do nome é um dos assuntos que vem sendo bastante discutido na atualidade, motivada por inúmeras questões.

  1. NOME CIVIL: CÓDIGO CIVIL DE 2002

Há alguns anos, mais precisamente quando vigorava o Código Civil de 1916, o direito ao nome não era considerado um direito que a pessoa possuía, como de igual modo não continha expressa relação com os direitos de personalidade. No entanto, com o advento do Código Civil de 2002 passou a ser garantido o direito ao nome em seu art. 16, como também, passou a dispor expressamente acerca dos direitos da personalidade nos artigos 11 a 21 (SILVA, 2019, p. 72).

O nome civil é uma forma de identificação de uma pessoa, assim como é um direito de personalidade previsto no Código Civil de 2002, art.16 (Brasil, 2002), que afirma o seguinte: “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

Ademais, com as relações jurídicas e outras relações como família, negócios, nasce a necessidade de individualizar as pessoas. De acordo com Gonçalves (2012, p. 563) os elementos essenciais e individuais de uma pessoa física são: distingui-lo dos demais e identificá-lo na sociedade.

Neste diapasão, com direito ao nome, passa a existir a proteção da individualidade com base no princípio da dignidade humana, desta forma, toda pessoa tem direito a um nome/prenome e sobrenome, e esse direito, além de conferir a proteção pessoal, também configura interesse do Estado e da sociedade em geral, assim comenta KÜMPLE (2017, p. 212):

De fato, interessa sobremaneira à coletividade e ao próprio Estado que seja possível distinguir as pessoas umas das outras. Assim, se por um lado o nome adquire especial relevância no âmbito privado, no contexto da proteção de um sistema isonômico, que garante a todos o direito à identidade, adquire, por outro, não menor importância na esfera pública, ao possibilitar a identificação de indivíduos no seio da sociedade para a correta imputação de direitos e obrigações.

O interesse legal do nome é exatamente a individualização da pessoa física para que ela possa utilizar de seus direitos e deveres, da vida civil, e essa personalização ajuda a diferenciar as pessoas. O nome é o reconhecimento das pessoas, a qual distinguem-se uma das outras, afirmando a sua própria personalidade. (SILVA, 2019, p. 68).

No que diz respeito a mudança de prenome ou sobrenome, vale ressaltar que, apesar de semelhantes os termos, retificar e alterar não se confundem. Enquanto a retificação consiste em corrigir algo que não está correto, tornando-o certo, a alteração não necessita de erros no registro. No entanto, as duas expressões são utilizadas como sinônimos em processos judiciais, uma vez que, a Lei de Registros Públicos o chamou de “Ação de Retificação de Registro Civil”, nesse processo, pode haver solicitações de correções e alterações de maneira conjunta ou individual.

Ademais, o nome civil é imutável, mas inclui exceções no direito e na jurisprudência baseados no princípio da dignidade da pessoa humana, sendo então essa regra relativa, pois alterações são permitidas, com amparo legal no Direito de Família e a Lei de Registro Público (FERRO JÚNIOR E SCHNEIDER, 2020, P. 154).

Sendo assim, fica claro que, um dos princípios inerentes ao direito ao nome, é o princípio da imutabilidade, mas é preciso analisar se tal princípio não se fere outros princípios essenciais, como a dignidade humana. Ademais, se o prenome ou sobrenome provoca constrangimento ou prejudica a criança, sua dignidade e seu emocional, a aplicação desse princípio deve ser relativizada, visto que, pode ofender a segurança jurídica do nome.

Todavia, estas questões vieram à tona com demandas de repressão ao sobrenome tendo como motivação o abandonado afetivo. Acerca do assunto existem opiniões diversas, a respeito disso escreve Carvalho (2019):

O abandono afetivo não constitui motivo suficiente para pautar a supressão de um sobrenome no registro civil, e algumas vezes é encarado como mero inconformismo do filho em relação ao mau relacionamento com o pai.

Portanto de acordo com a autora, o abandono afetivo não constitui justificativa plausível para motivar a supressão do sobrenome, deste modo, é pertinente fazer uma análise do que configuraria essa supressão, e dessa forma verificar posições jurisprudências majoritárias acerca do tema.

  1. A RELAÇÃO DO NOME E O DIREITO DE PERSONALIDADE

Por natureza, o homem é considerado um ser político e sua evolução humana necessita de interação com demais indivíduos, sendo assim, a natureza da convivência impõe a individuação da pessoa, para distinguir o sujeito, e sua parte constituinte na comunidade.

Esta identidade se manifesta, assim, como forma de satisfazer a diferenciação entre os seres humanos, e ela se dá através do nome. Segundo a tradição de origem hebraica, após a circuncisão, o recém-nascido recebe apenas um nome, e não necessariamente um sobrenome. Já na segunda fase da história Hebraica, reconhece-se, após o nome, aplicação do local de origem do indivíduo ou de sua residência (PEREIRA, 2006).

Ademais, no direito romano, prevalecia o princípio da variabilidade dos nomes, pois a lei não vedava a utilização de um nome que pertence a outra pessoa, o que era considerado proibido eram tomar para si o nome de outrem ou fazer alterações de forma fraudulentas (CUPIS, 2004).

O uso de três nomes atesta a prática comum entre os latinos de classes mais ricas, os plebeus adotaram a nomenclatura composta por dois elementos. Por sua vez, os escravos recebem apenas uma denominação, combinada como o sobrenome do seu dono (PERREIRA, 2006).

Na Idade Média, com a invasão bárbara e a imposição de germânicos, voltou a se usar apenas um nome. Sob notável influência da Igreja, tornou-se comum os habitantes dos feudos adotarem a nomenclatura de santos em seus filhos como forma de homenagear os católicos (CUPIS, 2004).

Portanto, os nomes concebidos na sociedade contemporânea, inclui diversos elementos, como padrão, como forma de enfatizar o nome, levantar uma bandeira, cujo escopo está localizado em designação pessoal, enquanto o nome paterno, descreve o sujeito, o objeto do acordo notarial, e evidencia a família a que pertence a pessoa.

Quanto aos elementos constitutivos da nomenclatura humana, o nome civil começa com o nome registrado, isso implementa a seguinte funcionalidade de distinguir membros de uma mesma família e de uma sociedade.

  1. DAS HIPÓTESES DE RETIFICAÇÃO DE NOME CIVIL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

De forma geral, os nomes civis não podem ser alterados ou emendados em vista que são considerados propriedades imutáveis e os indivíduos devem continuar a usá-lo durante toda a vida. No entanto, há exceções, que devem ser analisadas caso a caso, uma vez que, a lei e a jurisprudência já possuem entendimentos que flexibiliza a correção, mudança e retificação de nomes civis, sendo algumas dessas hipóteses: quando houver um claro erro gráfico; quando o nome da pessoa lhe cause constrangimento ou a exponha ao ridículo; com o advento do casamento, dentre outros fatores que serão expostos e detalhados durante toda essa pesquisa.

Acerca do erro de ortografia no nome civil, não há ainda previsão legal para essa possibilidade, no entanto o Artigo 58 da Lei de Registros Públicos fornece uma correção na redação do nome quando o erro gráfico do nome for óbvio, a depender da decisão do juiz e deve haver pedido da parte que for interessada (GAGLIANO, 2014).

Observou-se que a lei confere maior amplitude e não se limita a erros gráficos, a correção de erros também pode ser tratada no próprio cartório onde ocorreu o registro. Com base no erro gráfico, faz-se importante analisar o seguinte recurso:

APELAÇÃO. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. Pretendida modificação do prenome LEILA para LAILA ao argumento de que foi grafado erroneamente. Alegação de que é conhecida pelo prenome que seria correto. Sentença de improcedência. Inconformismo da autora. Acolhimento. Autora que demonstrou a utilização do nome que reputa ser o correto no seio familiar, social e profissional. Prenome Laila possui significado associado à cultura e tradição familiar, de origem árabe. Alteração do prenome que é possível consoante a exceção do artigo 58 da Lei nº 6.015/73. Inexistência de prejuízo à segurança jurídica de terceiros. Sentença reformada. Recurso provido. (v.19893). (TJ-SP, Relator: Viviani Nicolau, Data de Julgamento: 07/07/2015, 3ª Câmara de Direito Privado).

Ademais, outra hipótese bastante recorrente nas demandas de retificação e modificação do nome, é o caso do nome que exponha seu titular ao ridículo. Este caso cobre os casos que colocam titulares de nomes em determinadas situações que crie problemas sem motivo e traga constrangimento para ele e para os outros.

Para que esta regra seja efetiva, deve-se reconhecer que se neste caso, a mudança de nome pode ser solicitada a qualquer momento, desde que qualquer elemento do nome, incluindo o primeiro nome e o nome dos pais o prenome/ sobrenome cause grande constrangimento ao portador (GARCIA, 2014).

De acordo com o artigo 56 da Lei de Registros Públicos, os indivíduos maiores de 18 anos, pessoalmente ou através de advogado, poderá solicitar a mudança do nome civil, neste caso não requeira motivo, no entanto, o sobrenome registrado deverá ser preservado (BRASIL, 1973). Sobre esse assunto, Paulo Nader e Flávio Tartuce escrevem:

[…] o artigo 56 da Lei de Registros Público prevê o prazo de um ano, contando de quando o interessado atingir a maioridade civil, para que o nome seja alterado, desde que isso não prejudique os apelidos da família[…] (TARTUCE, 2011, p. 199). […]permite-se ao jovem, ao completar 18 anos, a alteração de seu nome, conservados os apelidos de família, consoante prevê o art. 56 da Lei de Registros Públicos. Esse direito poderá ser exercitado no prazo de um ano, diretamente pelo interessado ou por seu procurador[…] (NADER, 2011, p. 188).

O período referido no artigo 56 da Lei de Registros Públicos é considerado decadencial, ou seja, quando o limite de tempo expirar, apenas poderão ser realizadas as correções judicialmente forma razoável e fundamentada.

É considerada uma prática comum mudar ou adicionar sobrenomes após o casamento, observando o que prevê a lei. Antigamente, era a esposa que acrescentava o sobrenome do marido ao nome de solteira, isso porque o Código Civil de 1916 estabelece que as esposas são quem deve seguir o sobrenome do marido após o casamento. O artigo 1.565 do Código Civil de 2002 estabelece que qualquer um dos cônjuges, poderá acrescentar o sobrenome se preferir o do outro (BRASIL, 2002).

Observe que em novos dispositivos não há distinção de quem deve adicionar os sobrenomes um do outro, resultando em igualdade entre os cônjuges. Sobre o assunto, Sílvio de Salvo Venosa relata:

Essa faculdade não é somente da mulher, pois ambos os cônjuges possuem o mesmo direito no atual Código (art. 1.565, §1º): o marido também pode acrescer ao seu o sobrenome da esposa, embora esse não seja o nosso costume. (VENOSA, 2011, p.197).

Ademais, outra hipótese bastante atual tem sido, aquelas justificadas pela mudança de sexo. A hipótese dessa mudança de nome é reconhecida pela jurisprudência, e está cada vez mais recorrente, e as partes interessadas demonstram a mudança de sexo por meio de intervenção cirúrgica.

A pessoa que se sujeita a realização desse método de cirurgia é chamada de transgênero. Assim provado judicialmente, a jurisprudência tem reconhecido mudanças de gênero e substituições de nomes no registro civil. Sobre tal tema, o TJ do Paraná julgou da seguinte forma:

APELAÇÃO CÍVEL. REGISTROS PÚBLICOS – ALTERAÇÃO DO ASSENTO DE NASCIMENTO – MUDANÇA DE PRENOME DE CONOTAÇÃO FEMININA, SENDO SEU PORTADOR DO SEXO MASCULINO – POSSIBILIDADE – ALEGADAS SITUAÇÕES VEXATÓRIAS E CONSTRANGEDORAS DURANTE TODA A VIDA- PREVISÃO LEGISLATIVA (LEI N.º 6.015/73, ART. 58) -PEDIDO PROCEDENTE. Apelo provido. 1. Uma vez evidenciado ser o prenome capaz de expor o seu titular a situações de vexame, confusões, troça ou constrangimentos, a alteração deve ser deferida. 2. A regra geral que determina a definitividade do prenome cede diante do caso concreto, mormente quando restam demonstrados nos autos, os diversos constrangimentos sofridos pelo requerente por se chamar nome de conotação evidentemente feminina, sendo seu portador do sexo masculino. 3. Não é função do magistrado ser mero aplicador da letra fria da lei. Antes deve usar de sensibilidade na análise das peculiaridades e das circunstâncias de cada caso, na busca da solução dos conflitos sociais e pessoais, considerando sempre que as realidades da vida devem sobrepujar o apego às exigências formais. (TJ-PR – AC: 3695125 PR 0369512-5, Relator: Ivan Bortoleto, Data de Julgamento: 25/04/2007, 12ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 7367).

Nesses casos, os magistrados devem considerar as razões e aprovar mudanças de nome, em razão da preservação psicológica e social, os tópicos discutidos aqui se relacionam amplamente com o princípio da dignidade da pessoa humana abrangidas pela Constituição Federal (VENOSA, 2011, p.200). Sob esta análise, podemos observar que, em função mudança de sexo, seria embaraçoso e constrangedor para o indivíduo ser forçado a continuar usando o nome de gênero oposto.

  1. O ABANDONO AFETIVO

Uma vida familiar digna é direito de toda criança e para que ela cresça e se desenvolva adequadamente, existe a necessidade de haver um vínculo entre filhos e pais, neste sentido, a escritora Maria Berenice Dias em um de seus livros manuais de família, destaca tal importância acerca dessa relação familiar:

O conceito atual de família é centrado no afeto como elemento agregador, e exige dos pais o dever de criar e educar os filhos sem lhes omitir o carinho necessário para a formação plena de sua personalidade. A grande evolução das ciências que estudam o psiquismo humano acabou por escancarar a decisiva influência do contexto familiar para o desenvolvimento sadio de pessoas em formação. Não se pode mais ignorar essa realidade, tanto que se passou a falar em paternidade responsável. Assim, a convivência dos filhos com os pais não é um direito, é um dever. Não há direito de visitá-lo, há obrigação de conviver com ele. O distanciamento entre pais e filhos produz sequelas de ordem emocional e pode comprometer o seu sadio desenvolvimento. O sentimento de dor e de abandono pode deixar reflexos permanentes em sua vida.” (DIAS, pág. 47, 2015).

Pode-se confirmar que no mundo de hoje, o isolamento social, é um fato constante principalmente nos grandes centros, e o individualismo prevalece em quase todas as sociedades, desta forma os filhos precisam cada vez mais do apoio e presenças dos pais. O abandono afetivo tem como principal conceito o pai ou a mãe abandonando seu filho, ou até mesmo ambos. A nova visão do direito civil é que as famílias são construídas sobre bases emocionais, e não apenas biologia e de laços de sangue.

O afeto é um ato de preocupação, amor e bondade que uma pessoa demonstra a um alguém querido e aos outros que sejam próximos. Como é de grande conhecimento, é comum na maioria dos casos, o abandono ocorrer logo após o nascimento da criança ou quando o casal se divorcia, mas isso não é uma regra.

Muitas são as justificativas dadas quando ocorre o abandono, falta de tempo, distância geográfica, falta de condições financeiras. No entanto, não há razão nisto para provar que o pai ou as mães são incapazes de formar um vínculo afetivo com seus filhos. Os pais são responsáveis de cuidar das crianças de forma integral e oferecer educação de qualidade, estar com outros membros da família e, o mais importante, dar amor e carinho.

Nesse sentido, não são apenas as crianças e adolescentes, mas todos necessitam de atenção e amor, uma vez que sabemos que a criança de hoje será adultos de amanhã, sendo assim, se crescerem sabendo que são amados e possuem todos os cuidados e o suporte necessários terão um crescimento saudável, e consequentemente quando adultos possuirão boa capacidade de resolver problemas na carreira e na vida psicológica. Ademais, a falta de afeto familiar pode produzir consequências, muitas das quais irreversíveis (NADER, 2013).

O artigo 227 da Constituição estabelece: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absolta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. (CRFB, 1988).

A partir deste artigo pode-se ver que, a criança e adolescente têm direito a uma vida familiar digna, de modo a prover suas necessidades e desejos. Portanto, não se deve privar uma criança do afeto emocional familiar, estabelecida desde o nascimento.

  1. O ABANDONO AFETIVO E SUAS IMPLICAÇÕES NAS DEMANDAS DE RETIFICAÇÃO DE NOME

Com efeito, uma vez apontado pela jurisprudência, reconhece-se que a responsabilidade civil por abandono afetivo e outras consequências jurídicas são razões sob o sistema legal, com muitos outros efeitos que resultam nesta renúncia.

Como uma deixa para o abandono emocional, ofereci uma pesquisa cerca dessa possibilidade de retirar o sobrenome dos pais do nome civil do filho abandonado emocionalmente, valendo ainda ressaltar as respostas psicológicas e emocionais sofridas por aquele sobrenome por negligência e irresponsabilidade do pai, que abandona.

Por outro lado, para eliminar a discussão acima, pode-se observar que destacam o preconceito familiar, a invariância do sobrenome e normas legais envolvendo nomes, por exemplo, geralmente só são permitidas em correções, assunções de omissão, e em situações vexatórias (BARBOSA, 2014).

No entanto, como mencionado acima, foi decidido que no caso de motivos psicológicos, a invariância dos sobrenomes, presume-se que uma pessoa tenha aversão ao seu nome, o que neste caso a leva a ser torturada psicologicamente a sofrer de constrangimento (MATOS, 2014).

Na verdade, tal suposição é muito semelhante aos motivos que produzem a vontade a criança emocionalmente abandonada a tirar o sobrenome dos pais, um sobrenome que lhe causou constrangimento pessoal, que apesar de lhe dar uma identidade hereditária, sem identificação pessoal, pois se refere a dor e sofrimento criados pela marca psicológica do abandono emocional com tal experiência. A esse respeito, embora o assunto seja polêmico, é preciso destacar que houve decisão de revogar o nome patriarcal em favor das demandas motivadas pelo abandono afetivo. Vejamos a seguinte decisão:

REGISTRO CIVIL. SUPRESSÃO DO PATRONÍMICO PATERNO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL AMPARADA NO ART. 58 DA LEI DOS REGISTROS PÚBLICOS.
Uma vez que o patronímico paterno representa constrangimento para a apelante, pela rememoração da rejeição e do abandono afetivo e, considerando que a exclusão não interfere na sua identificação no meio social, onde é conhecida pelo sobrenome materno, na linha adotada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é de ser reconhecida, na hipótese dos autos, a situação excepcional prevista no art. 58 da LRP, que autoriza a alteração do sobrenome. Deram provimento. Unânime.

Assim, logo após elaborar seus argumentos acima mencionados, o ilustre Relator, citando decisão análoga ao caso dos autos, conheceu e deu provimento ao recurso, autorizando que fosse removido o nome paterno do nome civil do apelante.

CONCLUSÃO

Em resumo, após tudo que foi exposto, e diante dos argumentos a favor e contra a conclusão de afastar a possibilidade de sobrenomes paternos em casos de abandono afetivo, pode-se concluir que de fato existe sim a possibilidade, como vimos através de conclusões implícitas extraídas da análise jurídica ao longo do estudo.

O princípio da dignidade humana consagrado na constituição, o direito ao nome, como também o direito da personalidade, são inalienáveis, e devem ser seguidos juntos, pois os nomes civis além de estarem associados ao direito de um homem se afirmar na sociedade também deve trazer-lhe dignidade.

Ao revisar as considerações iniciais sobre nomes civis, e o capítulo 3 introduz o conceito de identidade, devendo também ser dada atenção aos títulos civis, os quais não serve apenas como um meio de identidade social, mas também capacita seus detentores a se auto identificarem como pessoa.

É concebível que essa autoidentificação não seja apenas a origem do indivíduo, mas também depende das influências que recebeu e das experiências vividas. De fato, é concebível que uma criança abandonada emocionalmente pelo pai não se sinta confortável diante de tal identidade pai-filho, ademais, é verdade que a imagem dos pais e o vínculo afetivo criado pela criação, influência bastante na formação da família e tem impacto na identidade e na vida das crianças.

Uma vez que é legalmente possível alterar o nome de um cidadão nos seguintes casos de exposição irracional, por que não é permitido suprimir os nomes dos pais? O nome paterno é um nome público da criança, onde isso lhe impõe restrições consideráveis, memórias tristes e uma completa falta de identidade.

Nesse sentido, conforme explicado, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e o Superior Tribunal de Justiça se manifestou, permitindo a exclusão de sobrenome de genitores nos casos de abandono afetivo.

Portanto, considera-se o interesse social observando-se que não há detrimento dos interesses de terceiros, dando prioridade à pessoa singular, garantindo-lhe a possibilidade de desfrutar de seus direitos da personalidade com dignidade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Presidência da República. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 10 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 16/09/2022.

FERRO JÚNIOR, Izaías Gomes; SCHNEIDER, Analice Morais. Introdução ao estudo do nome. In: FERRO JÚNIOR, Izaías Gomes; EL DEBS, Martha (coord.). Registro civil das pessoas naturais: reflexões sobre temas atuais. Salvador: Juspodivm, 2020.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1: parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

KÜMPEL, Vitor Frederico. Tratado Notarial e Registral vol. II. 1. ed. São Paulo: YK Editora, 2017.

SILVA, Carina Goulart da. Evolução, conceito e hipóteses de alteração do nome da pessoa natural. In: FERRO JÚNIOR, Izaías Gomes; SCHWARZER, Márcia Rosália; EL DEBS, Martha (coord.). Registro civil das pessoas naturais: temas aprofundados. Salvador: Juspodivm, 2019.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n. 70011921293. Sétima Câmara Cível. Relator Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos. Julgado em 05/10/2005.


1 Graduanda em Direito pela Faculdade Evangélica de Rubiataba. E-mail: tieleeufrasio@hotmail.com

2 Mestre em Ciências Ambientais pelo Centro Universitário de Anápolis