A VULNERABILIDADE DA CLASSE IDOSA DIANTE DOS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202411291240


Caio Henrique Costa Januario;
Pablo Basilio Mascarenhas de Freitas;
Orientadora: Danielle Freitas de Lima Oliveira.


RESUMO: Este trabalho tem como foco a análise da vulnerabilidade da pessoa idosa frente ao empréstimo consignado, com base nas experiências vivenciadas durante o estágio acadêmico de um dos autores. A pesquisa parte da constatação de que o idoso, enquanto consumidor, se encontra em uma situação de hiper vulnerabilidade, especialmente em relações com instituições financeiras, o que frequentemente resulta em superendividamento nessa faixa etária. O objetivo é examinar, à luz da Constituição Federal, do Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto do Idoso, as questões jurídicas envolvendo a concessão de empréstimos consignados a essa população. A pesquisa é de caráter exploratório e utiliza o método dedutivo, evidenciando práticas abusivas na oferta de crédito, particularmente para idosos em situação de maior fragilidade financeira e social.

Palavras-Chave: Idosos. Vulnerabilidade. Endividamento.

ABSTRACT: This work focuses on analyzing the vulnerability of elderly people when faced with payroll loans, based on experiences during the academic internship of one of the authors. The research is based on the observation that the elderly, as consumers, find themselves in a situation of hypervulnerability, especially in relationships with financial institutions, which often results in over-indebtedness in this age group. The objective is to examine, in light of the Federal Constitution, the Consumer Protection Code and the Statute of the Elderly, the legal issues involved in granting loans granted to this population. The research is exploratory in nature and uses the deductive method, highlighting abusive practices in the provision of credit, particularly for elderly people in situations of greater financial and social fragility.

Keywords: Elderly. Vulnerability. Debt.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa mostrar as fraudes sofridas pelos idosos diante dos empréstimos consignados bem como, as dificuldades que esta classe enfrenta ao tentar se sustentar com menos da metade do salário que recebe.  Percebe-se que, eles são considerados os principais contratantes dentre os diversos indivíduos que utilizam este serviço, em razão das características do serviço social da previdência.

Consequentemente a isso, por ser uma classe totalmente carente de conhecimentos tecnológicos, acabam tornando-se alvos fáceis dos fraudadores que agem de maneira rápida, fazendo com que os idosos não perceba o golpe. Sabemos que, com o grande número das fraudes nos empréstimos, consequentemente aumenta o endividamento dos consumidores, com ênfase no consumidor idoso, pois existem alguns motivos que ocasiona tudo isso: pelo fato do indivíduo não possuir uma educação básica e financeira, o processo do envelhecimento e o discernimento físicos e mentais.

A vulnerabilidade dos idosos diante dos empréstimos consignados aponta diversos problemas para serem questionados. O que poderá ser feito para evitar essa prática tão lesiva aos idosos?

A pesquisa foi desenvolvida no intuito de expor o impacto que uma fraude de um empréstimo pode causar na vida do idoso. Apesar da classe idosa está resguardada perante a legislação, percebe-se que o número de processos dessa natureza cresce cada vez mais, tomando grandes proporções. Assim, o estudo foi desenvolvido também para alcançar os aspectos que mostram a vulnerabilidade da classe idosa, em razão da idade avançada, e da falta de conhecimentos tecnológicos. Foi exposto também as normas de proteção aos direitos dos idosos, como o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor atuando nas relações de consumo e contratuais.

O trabalho foi bastante útil ao trazer as possíveis soluções para as fraudes nos empréstimos consignados, o qual foi apresentado a importância desse tema ser debatido tanto pela sociedade, quanto no âmbito jurídico. É por fim, destacar as principais formas de resolução e proteção do idoso pelo ordenamento jurídico brasileiro, pois é importante a busca da devida proteção dos direitos dos idosos.

Este trabalho será divido em quatro etapas: o início da fraude, o superendividamento da população idosa, a abusividade dos contratos, e por fim, a intervenção do Poder Judiciário.

2 O INÍCIO DA FRAUDE

O ato ilícito começa a partir do momento em que ocorre uma simples ligação, na qual é apresentada uma oferta de crédito ao idoso. Pelo fato das propostas apresentadas serem bastante vantajosas e bem elaboradas, o idoso acaba sendo atraído por essas “instituições financeiras”.  

A fraude também acontece quando, o idoso não realiza a contratação do empréstimo e tem o dinheiro descontado do seu salário, sem a sua devida autorização. No entanto, na maioria das vezes, são pequenos valores que estão sendo descontados, fazendo com que o idoso não perceba de forma rápida, uma vez que essa classe não possui um certo controle em verificar as movimentações de suas contas através de aplicativos digitais.   

A aposentadoria e vista como um descanso, por tudo que o idoso fez ao trabalhar por vários e vários anos. Quando esse direito é concedido, logo pensamos que a partir daquele momento, o idoso terá uma vida tranquila. Todavia, com as ofertas de créditos tentadoras que são oferecidas de maneira irregular, verifica-se que dia a pós dia inúmeros idosos acaba tendo seus direitos maculados por fraudes bancárias.

Os contratos de empréstimos devem considerar a declaração de vontade expressada por parte do idoso, pois, se for constatado a não autorização para a contratação de determinado empréstimo, deverá ser considerado nulo o negócio jurídico.

A maneira como as instituições financeiras encontraram para realizarem as fraudes relacionados aos empréstimos consignados, demonstram a ineficácia das normas que regulam a proteção ao idoso, em razão das normas não impedirem a continuação dessas práticas lesivas aos idosos.

Destaca-se ainda, que a fraude não acontece apenas por meio de falsas instituições financeiras. Em determinados casos, e o próprio ente familiar que age de má-fé. Isso acontece quando algum parente, ao ter acesso às contas bancárias do idoso, utiliza esses dados bancários para realizar a contratação de empréstimos. Nessas situações, se torna mais complicado, pois geralmente o idoso não desconfia que tenha sido lesado por algum parente.

É comum que um familiar tenha conhecimento sobre os dados pessoais e bancários do idoso, em virtude de ser o responsável por auxiliar na gestão de suas finanças. Ou seja, a utilização indevida de informações bancárias por familiares, pode ocasionar na contratação de empréstimo sem o consentimento ou conhecimento do idoso.

2.1 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO CONSUMIDOR DETURPADO PELO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO

O art. 4°, I, da lei 8.078/90, fala que o princípio da vulnerabilidade é uma condição de extrema importância para determinar um cidadão como consumidor, se tornando um ente frágil frente ao fornecedor em uma relação de consumo.

No entanto, é preciso entender que a vulnerabilidade e a hipossuficiência são situações distintas. Já que a hipossuficiência está ligada a questão financeira, uma pessoa com poucos recursos financeiros. Ou seja, será avaliada a situação socioeconômica do consumidor frente ao fornecedor. 

De acordo com Flavio Tartuce, todo consumidor deve ser considerado vulnerável, porém, nem sempre vai ser hipossuficiente, tendo em vista que, processualmente, o consumidor tenha ou não acesso a provas que comprovam os danos causados por produtos ou serviços com defeitos, justamente, por se tratar de pessoa carente de informações e conhecimentos técnicos.

O art. 1° da Lei 8.079/90 trata do princípio ao consumidor e diz:

Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5o inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias (BRASIL, 1990).

O artigo justifica a existência da lei é a intervenção do Estado no campo econômico, uma vez que surge a necessidade de proteger os consumidores na compra de produtos e serviços.    

A proteção do consumidor refere-se à proteção básica de direitos e interesses legítimos, que estão elencados no art. 6° do CDC: segurança pessoal (direito à vida, direito à saúde do consumidor, em relação aos produtos e serviços oferecidos, e o risco/dano que podem representar para os consumidores); segurança psicológica (liberdade de escolha), igualdade no emprego; segurança econômica (relacionada ao risco de lesão política econômica contra comportamentos abusivos de fornecedores de produtos ou serviços) (BRASIL, 1990).

As relações envolvendo consumidor e fornecedor devem acontecer com respeito, lealdade, solidariedade e cooperação no sucesso do negócio jurídico a ser formalizado entre ambas as partes, mantendo um bom equilíbrio na relação jurídica. O princípio da boa-fé está previsto no art. 4°, III, e 51, IV, do CDC:

Art. 4°. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção

de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.[…]

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.

[…]

A boa-fé subjetiva é um elemento ligado a pessoa de determinada relação contratual e está relacionado apenas às intenções das partes. A boa-fé contém previsão em alguns artigos do Código Civil, um exemplo é o art. 879, o qual se refere a bens recebidos de forma indevida de boa-fé pelo vendedor. 

2.2 O SUPERENDIVIDAMENTO DA POPULAÇÃO IDOSA

O superendividamento está ligado ao fato do consumidor idoso confiar em contratos de empréstimos consignados e acabar investindo o que não tem. Na maioria das vezes, existe a obscuridade por parte do fornecedor na formalização dos contratos de consumo, deixando de mostrar com clareza e objetividade o que de fato o consumidor está sujeito naquele negócio jurídico.

A concessão de um empréstimo para um idoso é bastante fácil, pois basta comparar as taxas em algum banco, verificar os termos do benefício do seguro da pessoa beneficiária, a apresentação da documentação necessária e realizar a assinatura do contrato. Não existe fiscalização por parte da instituição financeira para alertar se o idoso irá ter condições de arcar com os serviços contratados.

Desse modo, a instituição financeira demonstra está interessada apenas no lucro que vai ser gerado, e não a segurança financeira do seu cliente, deixando de proteger a aposentadoria do idoso.

O superendividamento é um problema nacional, pois de acordo com dados do Serasa, houve um aumento no número de idosos inadimplentes, subindo para 32,7% (trinta e dois vírgula sete por cento) em quatro anos, entre maio de 2019 a maio de 2023.

A pandemia do covid-19 também contribuiu para o superendividamento, tendo em vista que os idosos acabaram sustentando suas famílias através do crédito consignado. Um exemplo disso, era a contratação do empréstimo para prover as necessidades de um filho que se encontrava desempregado. A questão do desconhecimento dos idosos em relação aos juros que será pago durante a operação e outro fator que ocasiona o superendividamento.

Há casos também, em que a contratação do crédito é realizada para terceiros, sendo um familiar ou amigo, e que acabam não arcando com os pagamentos, deixando o idoso em situação complicada. Independentemente do tipo de situação que leve o idoso a contratar esse tipo de crédito, tem que ser observado o valor dos juros que consta no contrato, pois, muitos idosos visa somente o valor das prestações que serão pagas.

O empréstimo consignado deveria ser utilizado somente em emergências, como em caso de doença ou desemprego, mas, o idoso acaba ficando “pressionado” por algumas propostas de instituições bancárias inexistentes que são realizadas de maneira incorretas, e também, quando atendem as necessidades de terceiros.

Então, fica constatado que o idoso está sempre vulnerável nesses tipos de situações, tanto nas propostas apresentadas por empresas falsas, como também nos casos em que precisa sustentar sua família ou quando precisa ajudar algum amigo que está necessitando de recursos financeiros.

A questão do superendividamento pode abalar o psicológico e a saúde do consumidor, tendo em vista que o idoso fica completamente desesperado quando percebe que o seu salário está quase todo comprometido com as dívidas. A pressão psicológica causa insegurança no idoso, já que, em seu entendimento leigo, quanto mais crédito é concedido, melhores serão as condições para arcar com o pagamento, fazendo com que o consumidor se “afunde” cada vez mais em suas dívidas.

3 DOS CONTRATOS ABUSIVOS

O código de defesa do consumidor e o estatuto do idoso visa a proteção ao consumidor idoso, tendo em vista que ele é considerado uma parte vulnerável na relação de consumo.

Apesar dessas legislações estarem em favor deste grupo, percebe-se um grande aumento no número de reclamações aos órgãos de defesa ao consumidor, no caso o PROCON, como também do acionamento do poder judiciário, no intuito de cessar os descontos abusivos e indevidos. O trecho do Instituto Brasileiro do Sistema Judiciário robora essa informação:

São inúmeras as Ações Civis Públicas que tramitam em vários estados, questionando os contratos confusos do empréstimo compulsório; no Congresso Nacional tramita o PLS nº 345 limitando em 20% a soma dos descontos que podem ser debitados nos contracheques de trabalhadores, aposentados e pensionistas que tiverem mais de 60 anos e renda de até R$ 1.200,00. (CARDOSO, 2010, p.01).

As instituições financeiras estão constantemente se aproveitando da vulnerabilidade do consumidor idoso. Por esse motivo, são realizadas as propostas de ofertas de créditos para essas pessoas que possuem apenas um salário-mínimo para a sua subsistência, dependendo totalmente do benefício.

A maioria dos abusos financeiros praticados pelos credores, acaba prejudicando o consumidor mais velho. O código de defesa do consumidor, nos incisos do artigo 39, dispõe sobre as práticas abusivas que acontecem antes, no momento e após a relação contratual, conforme consta abaixo:

Art.39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: 

IV – prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

V – exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

VI – executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;

Outra prática considerada abusiva é o não fornecimento do contrato celebrado entre as partes, ou até mesmo a inexistência do contrato. Esta prática não está de acordo com o art. 46 do CDC que fala sobe a obrigação do fornecedor de prestar as informações de forma clara e objetiva sobre o negócio jurídico que será feito:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Ao analisar o dispositivo, nota-se que o consumidor somente poderá “fechar” o contrato, se obtiver a transparência das informações que ali constam. Caso ao contrário, o consumidor não poderá celebrar o contrato, visando a sua segurança. No entanto, as ofertas de créditos acontecem de forma persuasivas e enganosas, violando o direito à privacidade do consumidor.

4 A INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

No que concerne à proteção das pessoas idosas em situação de vulnerabilidade, o Estatuto do Idoso já prevê normas que visam garantir a efetiva proteção desse grupo na sociedade contemporânea. A legislação estabelece que a família, a comunidade e a sociedade em geral têm um papel fundamental na defesa dos direitos da pessoa idosa, com destaque para a participação do poder público. O Estado, como principal responsável pela implementação das políticas públicas, possui a estrutura necessária para assegurar que os direitos das pessoas idosas, previstos no arcabouço jurídico, sejam devidamente protegidos.

O artigo 43 do Estatuto do Idoso (Lei n.º 10.741/2003) aborda as medidas de proteção que devem ser aplicadas sempre que os direitos reconhecidos forem ameaçados ou violados, estabelecendo três hipóteses: I) por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II) por falta, omissão ou abuso da família, curador ou entidade de atendimento; e III) em razão de sua condição pessoal. O artigo 46 do Estatuto reforça o papel articulado entre ações governamentais e não governamentais de todas as esferas federativas para a efetivação da política de atendimento à pessoa idosa.

Os empréstimos consignados, embora convenientes em alguns aspectos, representam um risco especial para a população idosa, que muitas vezes se encontra em situação de vulnerabilidade social e econômica. Diante dessa realidade, o Poder Judiciário tem desempenhado um papel fundamental na proteção desse grupo.

Uma das principais intervenções do Judiciário é a análise cuidadosa das condições em que os empréstimos consignados são contratados por idosos. Os tribunais têm se posicionado de forma a coibir abusos, como a concessão de crédito a pessoas com capacidade civil reduzida ou a imposição de cláusulas leoninas nos contratos. Além disso, o Judiciário tem determinado a revisão de contratos já firmados, quando constatar a ocorrência de vícios de consentimento, desequilíbrio contratual ou outros fatores que evidenciem a vulnerabilidade do idoso.

Outra medida importante adotada pelo Poder Judiciário é a responsabilização das instituições financeiras que se valem da condição vulnerável dos idosos para obter vantagens indevidas. Tais instituições podem ser condenadas a indenizar os danos morais e patrimoniais causados, bem como a adotar mecanismos de prevenção e fiscalização mais efetivos.

A legislação prevê ainda uma série de instituições responsáveis pela proteção dos direitos da pessoa idosa, como tribunais especializados, promotorias específicas, conselhos executivos, serviços de justiça complementar e delegacias especializadas em crimes que envolvam pessoas idosas. O Ministério Público (MP) também desempenha papel fundamental na defesa desses direitos, podendo instaurar inquéritos civis e ações civis públicas, além de atuar como substituto processual, quando necessário.

A jurisprudência tem se alinhado com essa perspectiva de proteção aos idosos em casos de empréstimos consignados. Um exemplo relevante é o Agravo de Instrumento nº 12204-33.2019.8.17.9000, julgado pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Neste caso, o tribunal decidiu manter a suspensão dos descontos de um empréstimo consignado no benefício previdenciário de um idoso, destacando a necessidade de cautela na realização desses contratos para evitar fraudes.

A ementa do acórdão enfatiza que:

“Os empréstimos consignados firmados pelas instituições financeiras com beneficiários do INSS, notadamente os idosos, devem ser realizados com bastante cautela para evitar fraudes. […] A medida concedida, qual seja, suspensão dos descontos no benefício previdenciário, se reveste de caráter de urgência, tendo por escopo salvaguardar direito do idoso, visto que inúmeros contratos de empréstimo bancário veem sendo realizados sem o consentimento dos mesmos.”

Esta decisão reforça a importância da proteção dos princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, a função social do contrato e a proteção do consumidor, especialmente no que tange à segurança das relações jurídicas e à informação adequada e clara sobre os produtos e serviços oferecidos pelos fornecedores.

A jurisprudência entende também que descontos indevidos realizados na conta bancária do idoso, pode gerar indenização por danos morais, devendo o idoso receber a quantia em dobro. Outro exemplo é uma apelação cível n° 1.0000.21.032293-9/001, julgada pela 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

Os descontos realizados na conta bancária do autor, referentes aos empréstimos não autorizados devem ser restituídos, em dobro, abatidos os valores eventualmente depositados em conta de sua titularidade […]

O valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo cabível a majoração do quantum indenizatório quando o montante revelar-se irrisório. Afigura-se, portanto, razoável a fixação do quantum indenizatório em R$10.000,00 (dez mil reais).

A intervenção do Poder Judiciário na proteção de idosos em situações de vulnerabilidade, particularmente no contexto dos empréstimos consignados, demonstra-se crucial e alinhada com os princípios estabelecidos pelo Estatuto do Idoso e pela Constituição Federal. As decisões judiciais, como a apresentada nas jurisprudências acima, evidenciam uma tendência de priorizar a salvaguarda dos direitos dos idosos, reconhecendo sua condição de vulnerabilidade frente às instituições financeiras.

Esta postura do Judiciário, em conjunto com a atuação do Ministério Público e de outras instituições de proteção ao idoso, forma uma rede de amparo essencial para coibir práticas abusivas e fraudulentas no mercado de empréstimos consignados. Ao mesmo tempo, essas ações reforçam a necessidade de uma regulamentação mais rigorosa e de uma fiscalização mais efetiva nesse setor.

É fundamental que essa tendência de proteção se mantenha e se fortaleça, assegurando que os idosos possam usufruir de serviços financeiros com segurança e transparência, sem que isso comprometa sua dignidade ou seus meios de subsistência. A contínua vigilância e atuação do Poder Judiciário nessa área são, portanto, indispensáveis para garantir o respeito aos direitos e à dignidade da população idosa no Brasil.

REFERÊNCIAS

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