THE TRANSFERENCE STUDENT-TEACHER AND THE DESIRE TO KNOW
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12191658
Andréa Pinheiro Bonfante1
Professora Dra. Maria da Glória Schwab Sadala2
RESUMO
O presente trabalho propõe pensar a transferência, nas relações estabelecidas entre aluno e professor, tendo a aprendizagem como objeto de estudo, onde e quando ela esteja em jogo. Partindo da transferência como um fenômeno que não se presentifica somente no contexto de uma análise, pretende-se mostrar como ela pode colaborar de forma significativa nos processos de aprendizagem, agindo como facilitador, despertando no aluno desejo de saber, enquanto que a transferência negativa ou mal manejada pode dificultar ou impossibilitar a aprendizagem, não despertando no aluno desejo de saber, tornando-a enfadonha e desinteressante.
Palavras-chave: transferência. desejo. saber. aprendizagem.
ABSTRACT
The present work proposes to think about transference, in the relations established between student and teacher, having learning as the object of study, where and when it is at stake. Starting from the transference as a phenomenon that is not presente only in the contexto of an analysis, it is intended to show how it can significantly collaborate in the learing processes, acting as a facilitator, arousing in the studente a desire to know, while the negative transference or mishandled can make learning difficult or impossible, not arousing the student´s desire to know, making it boring and uninteresting.
Keywords: transference. desire. knowledge. learning.
INTRODUÇÃO
O que motivou a escolha do tema desta pesquisa, “A transferência aluno-professor e o desejo de saber”, foram todas as implicações que atravessam aprática educacional em instituições ou em quaisquer outros lugares onde a aprendizagem esteja em questão, mas também, nos atendimentos psicopedagógicos, ao receber crianças, jovens e seus familiares, que trazem queixas de dificuldades e transtornos de aprendizagem das mais diversas ordens e demandas, vindas não apenas do núcleo familiar e dos espaços educacionais aos quais essas crianças pertencem como também de consultórios de equipes multidisciplinares que atendem esse público.
Diante disso que se apresenta de forma bastante recorrente, alguns questionamentos assomam-se aos incômodos surgidos a partir das observações na cartografia educacional: Quais seriam as razões da não aprendizagem e suas dificuldades? Quais as motivações dos professores e instituições para contribuir com a superação dessas dificuldades? E, o que pode auxiliar ou dificultar o processo de aprendizagem? Foram dúvidas e desconfortos que incitaram à busca por compreensão desse vazio, da não completude da aprendizagem e suas implicações nesse processo.
Na busca por respostas, ou algo que minimamente possa nos levar a uma relativa compreensão, deparamo-nos com o fenômeno da transferência, que é algo que acontece ao longo de nossas vidas e que pode ser observado em todas as relações dos sujeitos, desde sua mais tenra infância e em todos os espaços. É nesse sentido que esta pesquisa se insere como uma proposta interdisciplinar, buscando, na interseção psicanálise e educação, uma compreensão cuidadosa para os impasses inerentes ao processo de aprendizagem.
No presente artigo, propomos pensar a figura do professor que, assim como o analista, possa vir a ocupar o lugar de sujeito suposto saber e nos deparamos com alguns questionamentos: Que saberes são esses que tanto o analisante como o aluno acreditam que quem desempenha essas duas funções, a de analista e a de professor, possa ser detentor? Como cada um desses profissionais maneja essa relação, até mesmo tirando proveito dela, fazendo com que a análise e a aprendizagem aconteçam e evoluam?
Este é, antes de tudo, um convite a refletir sobre como a psicanálise pode contribuir com a educação e, mais especificamente, sobre como a transferência pode tornar possível a aprendizagem despertando desejo. Vale ressaltar que nosso objeto de estudo é, também, o desejo de saber, que provêm dessa pulsão que movimenta, que tira do lugar e que faz pensar, um desejo permeado pela inquietação e busca.
O Mal-Estar Na Educação
Quando já se viveu por muito tempo numa civilização específica e com frequência se tentou descobrir quais foram suas origens e ao longo de que caminho ela se desenvolveu, fica-se às vezes tentado a voltar o olhar para outra direção e indagar qual o destino que a espera e quais as transformações que está fadada a experimentar. (FREUD, 1927/1996, p.15)
Freud, em sua obra “O futuro de uma ilusão”, traduz de forma bastante clara o desamparo do sujeito frente às vicissitudes da vida nos alertando sobre a necessidade de regulamentos, instituições e ordens para que a distribuição da riqueza seja mantida e para que a civilização se proteja contra os impulsos hostis dos homens, levando-se em conta o fato dos homens apresentarem tendências não apenas destrutivas, mas, também, antissociais e anticulturais.
Segundo Freud “todo indivíduo é virtualmente inimigo da civilização, embora se suponha que esta constitui um objeto de interesse humano universal” (FREUD, 1927/1996, p.15) e por esta razão “A civilização, portanto, tem de ser defendida contra o indivíduo, e seus regulamentos, instituições e ordens dirigem-se a essa tarefa.” (1927/1996, p.15)
Contudo, fica evidente que essas dificuldades não são inerentes, de forma alguma, à natureza da própria civilização, mas são determinadas pelas imperfeições de nossa cultura. Essas imperfeições não são difíceis de serem detectadas, fazendo com que muitas pessoas se perguntem se realmente valeria a pena defender essa civilização já estabelecida.
Freud levanta um questionamento quanto a ser possível um reordenamento das relações humanas e se pergunta sobre até que ponto seria possível diminuir o ônus dos sacrifícios que são impostos aos homens e se seria essa uma grande empreitada. Birman (2016), em Mal-estar na atualidade, deixa claro queestá implícita nessa questão a problemática da subjetividade, pois não há como abordarmos o mal-estar sem trazermos à cena o sujeito, pois o mal-estar reside onde reside o sujeito e sua subjetividade. O mal-estar é tema recorrente quando o assunto é o sofrimento dos sujeitos em suas especificidades.
A dificuldade dessa tarefa e o mal-estar recorrente deve-se ao fato de que vivemos num mundo perturbado e conturbado, onde a precariedade de nossas ferramentas interpretativas não dá conta de acompanhar a velocidade e agudeza dos acontecimentos que nos imergem numa condição de autogerenciamento constante que nos adoece (BIRMAN, 2016). Ao nos vermos imersos nessa configuração, urge-se a necessidade de refletirmos sobre a angústia que resulta dessas novas formas de subjetivação, circunscritas no mal-estar na atualidade.
Falar do mal-estar na atualidade é reportar-se à obra freudiana “O mal-estar na cultura”, só que numa nova configuração, numa nova dinâmica, que pensa o estatuto do sujeito no mundo moderno, um sujeito que se encontra desencantado do mundo, desamparado em si mesmo, esvaziado de si, que não sabe o que e nem como fazer com isso que a modernidade lhe sinaliza, lhe aponta e lhe exige. Freud diz que não há como pularmos para fora deste mundo. Isso equivale a dizer que há aí um vínculo indissolúvel, isto é, “de ser uno com o mundo externo como um todo” (FREUD, 1927/1996, p. 74).
É curioso pensar que Birman (2016) venha fazer fronteira com as colocações de Freud, dialogando sobre questões que já eram consideradas pelo pai da psicanálise desde o final dos anos 1920. E o que estava em questão para Freud que pode ser agora observado por um autor do século XXI?
Desde aquela época, Freud já se esforçava para circunscrever o sujeito na modernidade e, passado um século, essa continua sendo a questão, e claro, com agravantes consideráveis, visto a complexidade do desamparo que, desde sempre, foi estrutural e que hoje se acentua por essa nova cartografia social. Uma cartografia que fala de uma fragmentação do sujeito, de sua subjetivação e, também, da matéria-prima da qual essa subjetivação é formada, onde o “eu” se encontra numa posição privilegiada, assumindo formas inéditas, que não sabemos ainda como lidar, tampouco os resultados que essas experiências irão nos sinalizar.
Essa exaltação desmedida da individualidade no mundo espetacular, como se a vida fosse um grande palco, com holofotes sempre voltados para esse “eu” extremamente narcísico, pronto a atuar a todo tempo como se não houvesse sequer um intervalo entre um ato e outro, aponta para o que Birman (2016) nomeia “Ethos da violência”, que é justamente isso que impossibilita a capacidade de admirar o outro em sua diferença, já que a descentralização em si pode ser tão difícil aos sujeitos dos tempos modernos.
A positivação do mundo aponta para novas formas de violência, numa sociedade aparentemente pacificada, porém permissiva, cega a uma violência viral, uma violência subjetiva, velada, que cala, adoece e acaba por disciplinar os supostos indisciplinados que mal se dão conta da escravidão a qual se permitem estando presos a esses discursos.
Se o sujeito da educação é o sujeito que também transita em outros espaços, seja ele professor, aluno, família ou instituição, fica claro que esse mal-estar na atualidade já chegou na cartografia escolar. Aliás, pode-se verificar com bastante clareza que esse mal-estar do qual temos falado até então tem contribuído imensamente para identificarmos vários sujeitos em sofrimento psíquico na educação, em absolutamente todas as esferas que desenham esses cenários, seja ele aluno, professor ou a família, que quase nunca sabe o que fazer e como fazer com as intercorrências que circundam a aprendizagem de seus filhos.
Não consideramos aqui apenas a posição do professor em relação ao aluno, mas, também – e, principalmente – dele com ele mesmo. Novos tempos exigem novas configurações, novos posicionamentos, e esse suposto esquecimento ao não se considerar tais questões não passou despercebido por ninguém, trata-se de um ver e não querer se haver com isso, que pode tirar o educador de uma suposta zona de conforto.
Birman (2016) faz uma linda associação daquilo que se evita falar, se revelar, como o segredo de Polichinelo, isto é, aquilo que todo mundo pode enxergar ou ter acesso se assim desejar, mas que, entretanto, é evitado, justamente para que não se abra a caixa de Pandora, caixa essa repleta de surpresas, talvez infortúnios e, quem sabe, até mesmo dor, o que pressupõe trabalho. Mas não há como considerar as novas dinâmicas e configurações sem que se abra a caixa, abri-la é inevitável. Se tratando da psicanálise, abrir a caixa é examinar o que Birman (2016) chama de “circo dos horrores” presente no obscurantismo do fundamentalismo da psicanálise.
Mas a proposta de nosso trabalho é refletir sobre o quanto isso pode estar associado ao mal-estar na educação, visando uma nova compreensão sobre esse incômodo que observamos nos espaços educacionais, seja ele na perspectiva do aluno ou de sua família, do professor, coordenação, direção ou de quaisquer outros sujeitos inseridos de forma direta ou indireta no contexto educacional. Esse mal-estar tem se feito tão presente que passamos a desconsiderar algo de extrema relevância na educação e seus processos de aprendizagem: o prazer. Não há aprendizagem sem prazer, não há desejo de saber que se sustente sem ele.
Rubem Alves (2018), em seu livro A educação dos sentidos, utiliza-se de uma frase relativamente comum, “É brincando que se aprende”, para falar algo bastante reflexivo: “brinquedo, para ser brinquedo, tem de ser um desafio. Brinquedo é um objeto que, olhando para mim, me diz: veja se você pode comigo!”. O brinquedo me põe à prova. Testa minhas habilidades.” (ALVES, 2018, p. 67).
Não existe nada mais enfadonho do que um brinquedo que dá certo sempre, um jogo que se vence sempre, um quebra-cabeças que pode ser completamente montado na primeira tentativa. Precisamos de desafios, precisamos ser estimulados. Alguns brinquedos desafiam o corpo, já outros desafiam a habilidade, a paciência, a interpretação e, até mesmo, a capacidade de antecipar estratégias, porque a inteligência gosta de brincar e, brincando, ela se aguça ainda mais, ela salta, progride, evolui e se vê desejosa de mais saberes.
Atentos a proposta de reflexão deste trabalho, consideramos que o brincar, visto sob a ótica aqui proposta, pode facilitar o estabelecimento da transferência, criar vínculos, validar o processo e, em contrapartida, a transferência possibilita esse brincar na educação, que circunda o desejo de saber.
E por que o mal-estar? Talvez pela ausência do prazer, do desejo de se ensinar e de aprender. E por que a ausência destes? Podemos pensar no desamparo, na desvalia, no desencanto de quem ensina e, também, daquele que não aprende: professores e alunos que não foram atravessados pelo desejo de saber.
Talvez seja “um tiro que saiu pela culatra”, expressão que Birman (2016) usou ao comentar que o analista como agenciador do processo que ele mesmo provoca assume a função de coautoria dos destinos de uma existência por conta dos desdobramentos que são desencadeados por um processo de análise, implicando no percurso da subjetividade de seu analisante.
O professor também assume de alguma forma papel bastante semelhante, um papel de coautoria junto ao aluno nos desdobramentos que são desencadeados num processo de aprendizagem, pois, assim como o ato analítico implica em colocar em evidência o registro ético presente na cena analítica, o ato docente também implica em se colocar um certo registro ético presente nas cenas escolares onde a aprendizagem está em trânsito. E é essa uma das questões relevantes: será que o professor assume esse lugar de coautoria junto ao aluno ou tem se ausentado dessa responsabilidade por não querer se haver com isso ou por nem ao menos saber o que fazer com isso, com esse mal-estar?
Levantamos aqui o debate, trazendo reflexões e perguntas, entretanto há uma pontuação bastante importante de Carlos Brandão, no prefácio do livro Paulo Freire: vida e obra que talvez possa nos sinalizar o ponto central dessa problemática: “Uma educação onde o diálogo não é apenas uma estratégia de ensino ou um método didático, mas o fundamento e a razão de ser do próprio trabalho de ensinar-e-aprender” (BRANDÃO, 2010, p. 8).
As Práticas e Seus Apontamentos Sobre a Transferência
Considerando a proposta interdisciplinar deste artigo, de buscar na interseção psicanálise e educação uma compreensão cuidadosa para os impasses inerentes ao processo de aprendizagem, propomos mostrar que a transferência entre professor e aluno pode se inserir como forma de facilitar a aprendizagem, uma excelente saída para tornar a aprendizagem possível, compreendendo que seja de extrema relevância compreender quais são as possíveis intercorrências que a prejudica, para que as evitemos e não incorramos nos equívocos que nos impediram de viabilizá-la a princípio.
Quem transita pelo universo escolar, com bastante frequência se depara com uma questão, como por exemplo; o que poderia dificultar ou facilitar essa aprendizagem. Frente a esse questionamento, pode-se pensar que um caso de sucesso ou insucesso nessas relações, possa se localizar justamente na transferência.
Podemos refletir a respeito do lugar que a figura do professor possa ocupar como sujeito suposto saber. O professor é movido pelo desejo, numa função de tamanha relevância na qual gira o processo de aprendizagem que, em contrapartida, pode vir a despertar no aluno um desejo de aprender, fundamental para que a aprendizagem ocorra.
O que nos foi ensinado e o quanto disso conseguimos aprender, passa a ser mais claramente sentido na aplicabilidade desses saberes em nossa vida adulta e profissional. Conseguimos perceber com razoável clareza a influência positiva que alguns mestres nos legaram, motivando-nos, e porque não dizer influenciando-nos com determinadas tendências, posicionamentos e pontos de vista, enquanto outros, ao contrário, nos bloquearam, nos impediram de seguir adiante em determinadas percepções devido aos seus comportamentos e formas de agir para conosco, comportamentos esses que deslizam desde suas posturas até os conhecimentos dos quais eram detentores, fatos que ficam muito claros numa das elucidações de Freud:
[…] devo admitir uma coisa: é difícil dizer se o que exerceu mais influência sobre nós e teve importância maior foi a nossa preocupação pelas ciências que nos eram ensinadas, ou pela personalidade de nossos mestres. É verdade no mínimo, que esta segunda preocupação constituía uma corrente oculta e constante em todos nós e, para muitos, os caminhos das ciências passavam apenas através de nossos professores. Alguns detiveram-se a meio caminho dessa estrada e para uns poucos – por que não admitir outros tantos? – ela foi por causa disso definitivamente bloqueada. (FREUD, 1914/1996, p. 286)
Freud (1914/1996), em “Algumas reflexões sobre a psicologia escolar”, nos alerta sobre isso e faz questionamentos consideráveis sobre o que seria esse sentimento tão contraditório. Que movimento é esse que nos leva, ao mesmo tempo, a cortejar nossos mestres ou lhe virarmos as costas, imaginar neles simpatias ou antipatias? O que pode levar um aluno a amar ou odiar, criticar e admirar? A psicanálise nomeia como ambivalência essa posição alternante, que é justamente essa facilidade de se deslocar entre sentimentos contraditórios. A transferência segue esse movimento.
Para ensinar, é importante dar-se conta de que algo escapa nessa relação de aprendizagem, pois ela é incompleta e falha, assim como são as relações estabelecidas entre os sujeitos. E é bom que seja assim, pois isso é motor necessário para que haja movimento de ambas as partes, articulando o desejo.
Mas o professor, numa posição equivocada ou talvez ilusória, pode fantasiar que sabe tudo e que pode dar conta de ensinar tudo, que pode amar e ser amado por todos na mesma medida. Quando o professor percebe que as coisas não caminham necessariamente nessa direção, frustra-se e se culpa e, muitas vezes, também culpa o aprendente, responsabilizando-o por isso, nomeando esses movimentos como desatenção, falta de interesse, inaptidão e/ou qualquer outra coisa que tire o professor da posição de sujeito faltoso, incompleto e castrado, pois é muito mais fácil apontar para o outro do que responsabilizar-se, pois dar-se conta da falta é ferir as raízes mais profundas de seu narcisismo.
O professor precisa considerar esse conceito fundamental da psicanálise, a transferência, que deve ser bem estabelecida e manejada adequadamente, assim como o analista a maneja com o analisante, embora no contexto educacional deva ser manejada de forma diferente, atendendo às demandas específicas dessa situação – e, por essa razão, deve ser conduzida de forma muito particular.
Se na relação entre analista e analisante é o desejo do analista que viabiliza e permite manejar a transferência, no contexto educacional, o professor, no lugar de agente, desejoso de ensinar, acaba por despertar desejo no aluno, viabilizando, assim, a aprendizagem. O manejo dessa transferência estabelecida na relação aluno-professor acontece de modo particular e pontual.
Vimos que o que possibilita uma análise é a transferência, mas, também, é importante a intervenção do analista. E o pivô da transferência é o sujeito suposto saber (S-s-S), lugar onde o analista é colocado por seu analisante, onde se espera do analista uma resposta, uma direção, supondo-se que ele, o analista, saiba desvendar um enigma. O analisante deposita no analista um saber sobre o seu inconsciente. A intervenção do analista dirige-se a uma finalidade muito específica, que é fazer a análise funcionar, ir adiante, pautando-se sempre na ética do desejo.
assim como há na relação analista-analisante uma intervenção do analista com o objetivo de fazer caminhar a análise, pode haver na relação professor-aluno uma intervenção do professor, movida por seu desejo, desejo de ensinar, com objetivo de usar a transferência do aluno para com ele, que foi colocado no lugar de sujeito suposto saber para tornar possível a aprendizagem, isto é, despertar no aluno o desejo de saber.
Assim como o analista é colocado no lugar daquele que supostamente sabe, isto é, de quem se espera uma direção, de que ele possa decifrar um enigma sobre as questões do analisante, o aluno projeta no professor um saber daquilo que ele deseja conhecer. Não sobre suas próprias questões, mas sobre os vários saberes, sobre o conhecimento das coisas que giram ao redor do mundo, como se o professor fosse uma grande enciclopédia. Assim, o professor, utilizando-se da transferência estabelecida e desse lugar que lhe foi dado, a manobra em prol de tornar possível a aprendizagem – não só possível, mas, também, prazerosa e efetiva.
O que mais se escuta em atendimentos nos consultórios psicopedagógicos em consultas preliminares, ressalta Lajonquière (2013), são as queixas dos pais inconformados com as dificuldades de suas crianças. Todas as colocações feitas pelos pais se interpõem de fato entre aquilo que é ensinado e aquilo que se obtém como resultado. Essas poucas expressões, produto de todo um saber cotidiano, indicam que “isso” que se interpõe entre o “ensinado” (o mostrado) e o “resultado” é uma espécie de “substância” capaz de oferecer resistência à aprendizagem, de fazer com que o sujeito repita insistentemente um mesmo erro, de que esqueça ou não consiga fazer aquilo que quer. Emergência de “alguma coisa” que, em si mesma, deteria tanto a chave que possibilita quanto a que impossibilita as aprendizagens (LAJONQUIÈRE, 2013, p. 63).
Weiss (2012) acredita que são inúmeras as questões pelas quais as dificuldades de aprendizagem se apresentam, dentre elas pode-se mencionar a falta de oportunidades, condições socioeconômicas e culturais, questões familiares, problemas intrauterinos, complicações no parto etc. Porém, a possibilidade de absorver os conhecimentos dependerá de como essas informações estão chegando até o aluno, como lhe foram transmitidos os conhecimentos e, também, das condições sociais que determinam a qualidade de ensino.
Voltolini (2011) em seu livro Educação e psicanálise introduz sua obra levantando questões muito importantes já inauguradas por Freud como: que relação a psicanálise pode manter com a educação? A história da educação traz consigo um ideal moralizante no que se refere aos impasses dos pais quanto ao esclarecimento sexual das crianças e essa abordagem faz com que a psicanálise caminhe à margem das reflexões pedagógicas por ser tomada pelo avesso dela.
Ainda, Voltolini (2011, p. 10) refere-se a isso como “pelo outro lado do mesmo pano”, tomando, assim, uma posição de que o que está em jogo não é necessariamente a boa relação pedagógica entre professor e aluno, mas a ignorância de todo adulto sobre a criança e seu campo amoroso, isso que se instala entre o professor e seu aluno, em outras palavras, a transferência, referindo-se a ela como uma “atmosfera particular” decisiva no destino que a aprendizagem pode vir a tomar.
O que a prática cotidiana aponta, embasada em experiências diversas acerca das questões da aprendizagem é que a transferência pode ser mola mestre para a superação da problemática escolar. E sejam quais forem as questões que discentes e/ou docentes se deparem e enfrentem, é o amor de transferência no contexto escolar que pode, de alguma forma, ser um caminho para lidar com essas realidades:
Todo principiante em psicanálise provavelmente se sente alarmado, de início, pelas dificuldades que lhe estão reservadas quando vier a interpretar as associações do paciente e lidar com a reprodução do reprimido. Quando chega a ocasião, contudo, logo aprende a encarar estas dificuldades como insignificantes e, ao invés, fica convencido de que as únicas dificuldades realmente sérias que tem de enfrentar residem no manejo da transferência. (FREUD, 1915[1914]/1996, p.177)
Partindo desta citação de Freud, que inaugura seu texto “Observações sobre o amor transferencial”, podemos pensar que todo professor, seja ele principiante ou não, a cada nova turma, ou novo início de ano letivo, provavelmente também se sente alarmado com as dificuldades que supõe estarem por vir na convivência diária com seus alunos, na sua preocupação em atender ou não as expectativas dos mesmos, ou se ele, professor, dará conta ou não de devolver a esse outro aquilo que se espera dele.
Entretanto, o professor, logo de início, deveria compreender que, para que esses trâmites deslizem com fluidez é essencial que um fenômeno se estabeleça, a transferência. É ela que basicamente será responsável pelo interesse despertado no aluno e seu desempenho na disciplina. Sendo assim, o manejo dessa relação é primordial.
Outra conjuntura não menos valorosa, é que o professor se dê conta de que não há aprendizagem completa, que algo falta, escapa, e que nem por isso ele deixará de cumprir seu papel daquele que ensina ao seu aprendente. Muito pelo contrário, o furo pode ser motor para despertar no aluno o desejo de novas descobertas e novas aprendizagens.
O aluno, enamorado pelo seu mestre, pode vir a ter como objeto causa de desejo o aprender. E movido por essa transferência, o aluno segue interessado, instigado, e o professor, em contrapartida, ficará ainda mais motivado a exercer seu ofício de despertar mais curiosidade, de fazer novas perguntas que resultarão em outras novas perguntas, pois apenas dar respostas aos alunos é atender demanda, corresponde de certa forma ao que se chama em psicanálise calar o sintoma, tudo o que na cena analítica um psicanalista não deve fazer.
Parafraseando Rubem Alves, a criança, jovem ou adulto deve estar envolvido na curiosidade da busca para se sentir desejoso. Nesse sentido, podemos considerar que incitar o debate, devolver perguntas, questionar, fazer pensar, problematizar, ensinar sem atender demandas, talvez seja um caminho interessante para administrar essa transferência entre professor e aluno.
É na escola que crianças e jovens aprendem a compartilhar objetos e ideias, que entendem que o mundo não gira à sua volta; que aprendem a aceitar as diferenças, que há tempo de falar e tempo de ser ouvido, enfim, que estar no laço social demanda crescimento e comprometimento. O que muitas das famílias nunca disseram aos seus filhos, será a escola que dirá pela primeira vez. E estabelecer a lei fica, muitas das vezes, a cargo dela.
Para falar disto, Corso & Corso (2006), fazem uma interessante referência à obra de J. K. Rowling, As aventuras de Harry Potter, no capítulo intitulado “Uma escola mágica”, onde a grande maioria das cenas acontece na escola, numa ambivalência de sentidos entre o que acontece no mundo de fora e dentro dos muros da escola. A aprendizagem escolar transcende as salas de aula e os pátios, desliza para a vida dos sujeitos. Lições de amizade, hábitos, modas, leituras, músicas, comportamentos e tendências são aprendidos ali.
Na história de J. K. Rowlling, Hogwarts é mais do que uma instituição escolar, é um lugar de iniciação, uma escola da vida, pode-se dizer que até mesmo um ritual de passagem, que ensina para a vida, que compreende que a escola deva ser um lugar onde crianças e jovens se disciplinem e transgridam, que, por ora, aceitem e, por vezes, contestem, que se inspirem em alguns professores enquanto criticam e desaprovam outros. Na vida, assim como em Hogwarts, os conflitos acontecem, as pessoas se reinventam – lá, através de magia; aqui, com muita capacidade resiliência.
O encontro com o real, com o qual nos defrontamos a todo momento em nossas vidas, aquilo que não damos conta e não conseguimos nomear, na história é chamado “Voldemort”, o grande bruxo do mal. Na escola do mundo real, essas questões, nem sempre fáceis de serem vivenciadas, são aprendidas a duras penas, mas são elas que farão com que o aluno se implique com a própria vida, se tornando agente ativo, se autorizando para a vida.
Corso & Corso (2006, p. 257) resumem que “a instituição dá os meios, propõe as regras, mas os fins dependem de cada um”. E, ainda, acrescentam que, tanto no mundo da fantasia, dos bruxos, no caso de Hogwarts, como no nosso “mundo normal”, a escola e a vida, por muitos anos, efetuam trocas.
Essas trocas, entre alunos, entre a família e a instituição, entre a instituição e os alunos, entre os professores e os alunos, num movimento contínuo de ir e vir, numa via de mão dupla, produzem relações, exigem manejo, e estabelecem, também, transferências de toda ordem. Entretanto, é dessa transferência entre aluno e professor que nos propomos falar, salientando sua importância e fazendo os educadores refletirem sobre o quanto ela é fundamental nos processos de aprendizagem – importância essa relatada nos casos clínicos e educacionais aqui apresentados e comentados.
No meio psicanalítico, costuma-sedizer que a clínica é soberana, que é necessária uma articulação entre a teoria e a prática, que elas caminham juntas. No meio educacional, podemos pensar de forma semelhante, conscientizando-nos de que todas as teorias vistas, lidas e aprendidas nos livros, por mais consistentes e atraentes que sejam, e por mais que alguns autores da área educacional tragam consigo teorias fantásticas, precisam estar aliadas à prática, ao manejo de sala, ao lidar no dia-a-dia com o aluno, dando a ele não apenas um lugar de escuta, mas, também, voz. Caso contrário, se esse trânsito não for estabelecido, se essas trocas não forem efetuadas, incorremos no grande risco de fadar a aprendizagem ao fracasso.
Da Transferência ao Desejo de saber
Freud, em 1912, apresentou um estudo bastante detalhado acerca da transferência em seu texto “A dinâmica da transferência”. Trata-se de um exame teórico sobre o fenômeno da transferência, explicitando o quanto e de que maneira ele opera no tratamento analítico.
Mas em que exatamente consiste essa palavra? Em alemão, Ubertragung pode ser compreendido como “atingir algo”, “superar”, “alcançar”, “transmitir”, “transportar”, “intermediar”, além de outros significados que trazem consigo conotações muito específicas que se referem a uma plasticidade, uma reversibilidade, um movimento de ir e vir, aquilo que transpõe, que conecta, que faz par, que une, que vai em busca de algo e que retorna, um arco.
Inicialmente, Freud considerou o fenômeno da transferência como algo que é da ordem do equívoco, algo que o analisante transcreve na figura do analista por um mal-entendido de suas conexões e associações inadequadas, mas, aos poucos, esse conceito passou a abarcar questões de grande complexidade e relevância, com alcances teóricos e clínicos cada vez mais consistentes. A Ubertragung, além de ser um conceito amplo, trata também de questões acerca do manejo e do diagnóstico, atualiza a cena edípica, traz notícias do mecanismo da resistência e da transferência negativa.
O que Freud nos aponta sobre a transferência é que cada um de nós tem um jeito muito particular de lidar com a própria história, que é constituída a partir das relações primordiais estabelecidas com aqueles que, desde sempre, nos cuidaram, tais como nossos pais, avós, babás etc. E transferimos para relacionamentos posteriores as imagos dessas relações, tal como uma inscrição, um clichê estereotípico, constantemente reimpresso e repetido, uma escrita do inconsciente que, através dos traços mnêmicos, estabelece, em cada sujeito, uma cadeia de significantes, onde um elemento se relaciona com outro.
Freud, de início, descobriu a transferência como um fenômeno. Entretanto, de acordo com o avanço da teoria psicanalítica, elucidada e revista por Lacan, a transferência passou a assumir um lugar de conceito, um dos quatro conceitos fundamentais da psicanálise, sendo os outros conceitos o inconsciente, a repetição e a pulsão. Lacan (1964/1979) propõe avanços na teoria da transferência elaborada por Freud, mas não a modifica. Como exemplo, temos suas formulações teórico-clínicas sobre o sujeito suposto saber, considerando-o como pivô da transferência.
Em seu Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise, Lacan (1964/1979, p. 120) afirma que “o conceito de transferência é determinado pela função que essa práxis ocupa” e que “nenhuma práxis mais do que a análise, é orientada para aquilo que, no coração da experiência, é o núcleo do real.” (LACAN,1964/1979, p. 55).
Essas duas afirmações de Lacan nos permitem pensar a direção que essa discussão pode tomar, nos sinalizando que ela é a mola mestre da análise e que o analista tem uma posição de extrema importância na condução da análise. Lacan diz ainda que a ênfase no real como um vetor que orienta a práxis psicanalítica nos sinaliza o desejo do analista como uma função essencial em torno do movimento da análise.
Considerando que o desejo é o pivô, a mola mestre que movimenta essas duas práxis, é fundamental pensar a articulação entre desejo e transferência. Quando falamos de desejo na práxis docente, podemos pensar num movimento que desliza entre o docente e o discente. E talvez seja esse o ponto comum à práxis psicanalítica. Um desejo, uma demanda, uma transferência que transita no campo analítico e no campo da educação e que, em ambas as práxis, ocupa um lugar de função essencial.
Dessa forma, o professor também pode se transformar nessa figura a quem os interesses de seus alunos serão endereçados, transferindo a esse professor experiências vividas com os pais ou outras pessoas com quem ele tenha vivido.
Sendo a proposta desse artigo pensar a transferência não apenas nos espaços analíticos, mas, também, em ambientes onde a aprendizagem se presentifica, dentro ou fora de instituições, onde haja o sujeito mestre e o sujeito aprendente, não podemos desconsiderar o quanto essas questões podem ser paradoxais, contraditórias, levando em conta o amor de transferência.
Freud nos alerta que todo principiante em psicanálise pode sentir muitas dificuldades em lidar com as questões relacionadas ao amor transferencial. Algumas situações são bastante curiosas e específicas e acontecem com razoável frequência.
Mas o que é complexo também é valioso, pois este amor transferencial pode sinalizar muitos aspectos da vida pulsional do paciente. Como uma formação do inconsciente, a transferência nos dá notícias desse amor. A articulação entre linguagem, pulsão, desejo e fantasia coloca a transferência como estratégia no tratamento psicanalítico. O que precisa estar claro para o analista desde sempre é que esse enamoramento nada tem a ver com o poder de sedução do analista, e sim com a função que foi dada por seu paciente a ele, tem a ver com esse lugar de analista a ser sustentado.
E que relações podemos estabelecer entre a transferência entre analista e analisante, a transferência entre professor e aluno, a resistência, seu manejo e os processos de aprendizagem? Quais elaborações podem surgir sobre o amor de transferência nos espaços educacionais? Será que estamos falando da mesma coisa em espaços distintos? Estabelece-se aqui um bom debate, pois, como dito em momento anterior, a transferência é um movimento que acontece em todas as relações e, também, na relação aluno-professor, mas esse movimento deve ser manejado de forma diferente.
Qual é o ponto comum desse duplo machado? Podemos pensar que seja o amor. Lacan (1964/1979, p. 123) diz que “A transferência, na opinião comum, é representada como um afeto”. Impõe-se, assim, um aprofundamento em relação a este amor transferencial.
Freud (1915[1914]/1996) pontua que o amor de transferência não se deve aos encantos do próprio analista, mas pelo o que ele representa, e que esse amor é fundamental, mas pode colocar em risco o sucesso de um trabalho em análise. Nesse outro espaço do qual propomos falar, na cena da aprendizagem, o amor de transferência também pode contribuir para o processo de aprendizagem. Esse amor é constatado, justamente, quando o professor já despertou em seu aluno o desejo de saber, e ele, o amor, serviu então de ferramenta para sustentar a transferência estabelecida entre ambos. Podemos pensar que se há desejo de ensinar a priori, o que pode vir a posteriori é desejo de saber.
É importante pensarmos acerca do investimento libidinal na relação aluno-professor e o quanto isto marca o trilhamento na grande parte das relações estabelecidas entre docente e discente. Sem esse investimento, podemos pensar que o professor talvez não consiga despertar o desejo de saber do aluno. Essa transferência também não é única e igual para todos e com todos, ela é singular e subjetiva, mas, também, incompleta e falha, pois, se completa fosse, não sustentaria o desejo de saber. Amor de transferência é amor ao saber e este caminha na direção do desejo de saber.
Kupfer (1989), em sua obra Freud e a educação – O mestre do impossível, refere-se à transferência de forma bastante interessante, nos sinalizando sobre em que proporção esse amor de transferência nos traz notícias do quanto podemos aprender por amor a alguém.
O aluno transfere para o professor os sentimentos carinhosos ou agressivos da sua relação com os pais. Conscientemente ou não, o professor utiliza a ascendência que assim adquire sobre seu aluno, para transmitir ensinamentos, valores, inquietações. Pois não é verdade que os professores de que mais recordamos, com quem mais aprendemos, são aqueles que melhor nos seduziram? Na escola, como na vida, nós aprendemos por amor a alguém. (KUPFER,1989, p. 7)
Freud acreditava que um educador psicanaliticamente orientado poderia fazer com que a pulsão escópica de um aluno fosse transformada em curiosidade intelectual em ver o mundo e conhecer ideias, sendo que é justamente essa curiosidade que desempenha um papel extremamente relevante no desenvolvimento do desejo de saber. Trata-se da capacidade de sequestrar o olhar do outro na direção do desejo de saber, tão essencial na relação aluno-professor.
Freud também pensava que se o aluno se dirige à figura do professor atribuindo a ela sentido pautado no desejo. Assim como o analisante faz com seu analista, a figura do professor passa a fazer parte do que Freud nomeia cenário inconsciente e isto quer dizer que o que quer que diga o professor, ele será escutado, valendo-se justamente dessa posição que passou a ocupar no inconsciente do sujeito.
De certa forma, isso explicaria o fato de sermos perpassados por alguns professores ao longo de nossas vidas, mesmo que esses não pareçam ter nada de incomum, mas que deixem marcas tão significativas ou profundas que possamos até mesmo fazer nossas escolhas futuras, seja em que área de atuação for, movidos por esse gosto, por esse interesse que o professor nos despertou. Isso quer dizer que aquele professor foi investido pelo desejo de um determinado aluno e que devido a esse investimento foi possível que a palavra do professor fosse escutada, ganhando poder. “O desejo transfere sentido e poder à figura do professor, que funciona como um mero suporte esvaziado de seu sentido próprio enquanto pessoa.” (KUPFER,1989 p. 92).
Não podemos deixar de considerar que a aprendizagem está permeada de desejo de saber e que ela só acontece porque está circundada não apenas desse desejo do aluno, mas, também, de desejo de ensinar do professor, que ocupa um lugar de sujeito suposto saber. E o professor deve sustentar esse lugar, dado a ele pelo aluno, para que a aprendizagem possa se concretizar.
Na psicanálise, o desejo de saber se desdobra em desejo de falar, na medida em que o analisante endereça sua fala ao analista para saber de seu inconsciente, enquanto que o desejo do analista é desejo de saber acerca do inconsciente, de seu funcionamento e de seus mecanismos.
A transferência e o desejo de saber andam de mãos dadas. A transferência, enquanto fenômeno fundamental, está para o desejo de saber, enquanto que o desejo de saber está para a transferência. Sem esse vínculo estabelecido entre analisante-analista e aluno-professor, podemos pensar que, tanto o desejo de saber do analisante acerca de suas questões e de que o analista lhe diga sobre seu inconsciente quanto o desejo de saber do aluno despertado a partir da transferência estabelecida possam estar comprometidos. Sendo assim, a transferência é fator fundamental a ser considerado e manejado em ambos os contextos.
Ou seja, a transferênciaé primordial tanto para que a análise aconteça como para que a aprendizagem se efetive e, para tal, ela precisa estar circundada de desejo de saber. Desejo de saber do analisante sobre si e seu inconsciente e desejo de saber do analista sobre seu paciente; desejo de ensinar do professor, que desperta, pela via da transferência e manejo da mesma, o desejo de saber do aluno.
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1 Universidade Veiga de Almeida-UVA
2 (Orientadora)- Universidade Veiga de Almeida-UVA