A TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE PERJÚRIO NO SISTEMA ACUSATÓRIO  BRASILEIRO: A BUSCA DA VERDADE FÁTICA EM FACE AOS DIREITOS DO  ACUSADO

THE TYPIFICATION OF PERJURY IN THE BRAZILIAN ACCUSATORIAL SYSTEM:  THE QUEST FOR FACTUAL TRUTH IN LIGHT OF THE RIGHTS OF THE ACCUSED. 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10207262


Lucas Otávio Rodrigues Ferreira1;
 Luccas Barcelos Gonçalves2


Resumo

O estudo aborda o crime de perjúrio no contexto do sistema acusatório  brasileiro, perjúrio é definido como a afirmação falsa ou omissão da verdade em um  contexto jurídico perante autoridade judiciária ou administrativa, com a intenção de  enganar o juiz ou funcionário público. O presente artigo destaca os desafios associados  à tipificação do crime de perjúrio no sistema acusatório brasileiro, incluindo a potencial  colisão com o princípio da não autoincriminação, que garante ao acusado o direito de não  produzir provas contra si mesmo que possam incriminá-lo, e a dificuldade de  comprovação, uma vez que é necessário demonstrar que o acusado sabia que estava  mentindo e tinha a intenção de induzir o juiz em erro. 

Palavras-chave: Perjúrio. Sistema Acusatório Brasileiro. Crime. Testemunha. Princípio  da Não Autoincriminação. Revisão da Tipificação. Integridade do Processo Judicial.  Direitos Fundamentais.  

Abstract

The study addresses the crime of perjury in the context of the Brazilian  accusatory system, perjury is defined as the false statement or omission of the truth in a  legal context before a judicial or administrative authority, with the intention to deceive the  judge or public official. This article highlights the challenges associated with the  classification of the crime of perjury in the Brazilian accusatory system, including the  potential collision with the principle of non-self-incrimination, which ensures the accused  the right not to produce evidence against themselves that could incriminate them.  Additionally, it addresses the difficulty of proof, as it is necessary to demonstrate that the  accused knew they were lying and intended to mislead the judge. 

Keywords: Perjury. Brazilian Accusatory System. Crime. Witness. Principle of Non-Self Incrimination. Revision of Classification. Integrity of Judicial Process. Fundamental  Rights. 

1 INTRODUÇÃO 

Este artigo tem como seu principal objetivo analisar a dificuldade da tipificação do  crime de perjúrio no sistema acusatório brasileiro em frente ao direito de não produzir  prova contra si mesmo do acusado, bem como os possíveis impactos da implementação  do perjúrio tanto nos direitos e garantias constitucionais do acusado, bem como nas  repercussões da aplicabilidade da lei penal e da preservação da dignidade da Justiça. 

O crime de perjúrio compõe-se da derivação do crime de falso testemunho  tipificado em nosso código penal, imputando ao acusado que assuma responsabilidade  por suas palavras durante o interrogatório judicial, prestando compromisso, assim como  a testemunha, de dizer a verdade sob penas legais. 

O perjúrio propriamente dito, ainda não está tipificado em nosso ordenamento  pátrio, porém o Projeto de Lei 3148/2021 visa tipificá-lo, para que o acusado não saia  impune ao mentir para o juízo como parte de um processo criminal. 

O deputado Hélio Costa, autor do referido projeto de lei, afirma que “o perjúrio do  acusado representa um abuso de defesa”, afinal o acusado durante todo o processo  criminal desde a fase investigatória pode mentir da forma e da quantidade que quiser sem medo de sanções legais, sendo desta forma já há muitos anos, afinal o Código Penal  está vigente desde 1940 e nunca fora tipificado em seu vasto texto o crime de perjúrio. 

Buscou-se abordar o tema de forma gradativa, começando pela base do direito  constitucional, as garantias individuais, que garante ao acusado o principal empecilho em  relação a tipificação do perjúrio, sendo este o direito de não se incriminar, também  garantido pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos. 

Em seguida, abordou-se o direito de mentira do acusado em comparação com o  compromisso de dizer a verdade firmado pelas testemunhas, bem como o conceito de  tipificação do perjúrio. 

Após, há comparação com legislações estrangeiras, as quais contam em seu texto  o perjúrio como crime, no intuito de apontar as principais diferenças entre o perjúrio e o  falso testemunho em âmbito internacional. 

Por fim, foi abordada as implicações jurídicas as quais reprimem a tipificação do  perjúrio, baseando-se principalmente no princípio da ampla defesa e do contraditório,  sem prejuízo do devido processo legal. 

Para abordar esses desafios, o estudo abordará diversos pontos de vista, partindo se de análises documentais, pesquisas bibliográficas, bem como de legislações  estrangeiras. 

2 A LEI PENAL E OS DIREITOS DO ACUSADO 

2.1 A GARANTIA CONSTITUCIONAL DE NÃO PRODUZIR PROVA CONTRA SI  MESMO 

A Constituição Federal nos traz em seu vasto texto, o art. 5°, que versa sobre os  direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos, podendo ser arguido que este  seria o artigo mais importante da Constituição Federal. É neste artigo que nos garante direitos que servem de fundamentos para importantes princípios norteadores do processo  penal, tais com o Princípio do Ampla Defesa e Contraditório e o foco deste tema, o  Princípio Nemo Tenetur Se Detegere, que é o princípio de não ser obrigado a produzir  prova contra si mesmo. 

O fundamento para o princípio de não se incriminar vem no art. 5, LXIII da  Constituição Federal, que garante ao acusado o direito de permanecer calado e tal  silêncio não pode ser considerado em seu desfavor, ressalta-se que esse direito de não  se incriminar não está somente em nossa constituição, mas também está presente na  Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, comumente conhecido como Pacto de  São José da Costa Rica, nos traz em seu art. 8, II, “g”, a seguinte garantia: “direito de não  ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada;”, a qual por sua vez,  possui força normativa de caráter supralegal. 

Este é um direito conferidos a todos aqueles que são imputados acusações  criminais, tanto em fase investigatória, durante o interrogatório pela autoridade policial,  que por sua vez, tem a obrigação legal de informar ao investigado os seus direitos, dentre  eles o de ficar calado, art. 5, LXIII da Constituição Federal. 

A expressão mais básica do princípio da não auto-incriminação, é o direito ao  silêncio, não sendo somente a forma mais básica, como também a mais utilizada,  estendendo-se por todo o trâmite do processo legal, desde a fase interrogatória até a  fase da ação penal e em casos de crime contra a vida, durante a sessão do plenário.  Porém o direito ao silêncio não é tão simples quanto parece, neste sentido leciona Aury  Lopes JR: 

O direito de silêncio é apenas uma manifestação de uma garantia muito  maior, insculpida no princípio nemo tenetur se detegere, segundo o qual o  sujeito passivo não pode sofrer nenhum prejuízo jurídico por omitir se de colaborar em uma atividade probatória da acusação ou por  exercer seu direito de silêncio quando do interrogatório. Sublinhe-se: do exercício do direito de silêncio não pode nascer  nenhuma presunção de culpabilidade ou qualquer tipo de prejuízo  jurídico para o imputado. (LOPES JÚNIOR, 2023, p.47). 

Tendo em vista a presença deste princípio em tratados internacionais que versam  sobre direitos humanos, é correto afirmar que o tão prezado direito de não se incriminar foi reconhecido como um direito inerente a condição de ser humano e, portanto, uma  violação deste direito poderia ser caracterizada como uma violação a dignidade da  pessoa humana pelo Estado. Nas palavras de Alexandre de Moraes: 

O importante é realçar que os direitos humanos fundamentais relacionam se diretamente com a garantia de não ingerência do Estado na esfera  individual e a consagração da dignidade humana, tendo um universal  reconhecimento por parte da maioria dos Estados, seja em nível  constitucional, infraconstitucional, seja em nível de direito consuetudinário  ou mesmo por tratados e convenções internacionais. (MORAES, 2021, p.21). 

2.2 A MENTIRA E O DIREITO DE DEFESA DO ACUSADO 

Mentir é algo comum na sociedade, sendo este, segundo o dicionário “Dizer  mentiras; falar como se fosse verdade algo que não é: enganar, iludir, ludibriar:”3, mas  como alguém pode mentir? Pessoas podem mentir de diversas formas, ao contar uma  mentira, pode mentir também por omissão, deixando de lado detalhes chaves para a  contextualização dos fatos, através de meias verdades. 

O acusado em um processo criminal tem não somente o direito de não se  incriminar, mas bem como o direito de produzir provas em seu favor, para a sua defesa,  sendo comum que o acusado minta em sua narrativa para melhor amoldar os fatos em  seu favor, exercendo como tal o seu direito de defesa, mas por que isso deveria significar  que o acusado pode mentir para o juízo e sair impune? 

 Via de regra, os direitos não são absolutos, ou seja, podem ser mitigados, por exemplo  o encarceramento é uma mitigação do direito à liberdade, porém não há nada que impeça  ao acusado de mentir da forma que quiser em frente a um juiz, podendo contar várias  versões do mesmo fato durante as fases do processo, sem nenhum prejuízo. 

Deveria ser imposto ao réu o mesmo compromisso que as testemunhas prestam  ao testemunhar em um processo, não há como afirmar que é justo que as testemunhas  prestem compromisso sob pena de reclusão em caso de faltarem com a verdade, mas o  réu cujo interesse está diretamente ligado ao resultado da ação penal pode mentir  deliberadamente.

Segundo o deputado Hélio Costa, autor do Projeto de Lei 3148/2021 “O direito de  alguém de não ter que produzir prova contra si mesmo não significa que o Estado conferiu  um cheque em branco ao indivíduo para que este passe a lesar um dos mais relevantes  bens jurídicos tutelados pelo ordenamento pátrio, qual seja, a administração da justiça”. 

Noutro giro, a prospectiva de punição a uma pessoa sendo investigada apenas por  declarar-se inocente seria incompatível não somente com os princípios e garantias  constitucionais já mencionados, mas também outro dos principais princípios norteadores  do direito penal, o princípio do Favor Rei, mais comumente conhecido como in dubio pro  reu, pois apenas de ser investigado alguém já estaria sido de certa forma coagido para  confessar um crime, quer tenha o cometido ou não, por medo de uma condenação pior. 

2.3 O CONCEITO DE PERJÚRIO E SUA TIPIFICAÇÃO NO CÓDIGO PENAL  BRASILEIRO 

O perjúrio é um crime que consiste no acusado prestar falso testemunho em juízo,  com o fim de prejudicar o processo. No Código Penal brasileiro, o perjúrio ainda não está  tipificado, porém temos uma tipificação similar no art. 342 do Código Penal, o crime de  falso testemunho: 

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como  testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial,  ou em juízo arbitral, ou em qualquer outra forma de procedimento judicial, ou administrativo, em que for exigida a sua fé funcional: 
Pena – reclusão, de dois a quatro anos, e multa. (BRASIL,1940)

Para a configuração do crime de falso testemunho, é necessário que o sujeito ativo  da infração seja uma pessoa que tenha obrigação legal de prestar compromisso de dizer  a verdade, como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete. Além disso, é  necessário que o depoimento seja prestado em juízo, em juízo arbitral ou em qualquer  outra forma de procedimento judicial ou administrativo. 

O elemento subjetivo do crime é o dolo, ou seja, a vontade de prestar falso  testemunho com o intuito de induzir o juízo a erro. A pena do crime de falso testemunho  é de reclusão, de dois a quatro anos, e multa. Tal pena pode ser aumentada em metade  se o crime for praticado em processo que verse sobre crime punido com reclusão. Além  da pena criminal, o falso testemunho pode gerar também consequências civis, como a  perda de um cargo público ou a indenização por danos morais. 

Como mencionado por Nucci (2014, p.1223), há duas posições acerca do falso  testemunho, a de que não é necessário prestar compromisso para que lhe seja imputado  o crime de falso testemunho e a posição de que é essencial para que seja cometido o  crime de falso testemunho prestar o compromisso de dizer a verdade, atualmente é  adotado a segunda posição, sendo expressa no Código de Processo Penal em seu art.  203: 

Art. 203. A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa  de dizer a verdade do que souber e Ihe for perguntado, devendo  declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão,  lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma  das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e relatar o que  souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias  pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade. (grifei)(BRASIL, 1940) 

Mostrando de forma clara que o compromisso é o ato que imputa a testemunha o  dever legal de dizer a verdade, é o que a difere de um mero informante. 

Portanto o acusado, atualmente não pode cometer o crime de perjúrio, nem o de  falso testemunho pois não presta compromisso, ato essencial para que se enquadre na  tipificação. O Projeto de Lei 3148/2021 vem com a proposta de tipificar o perjúrio no que 

seria o “art. 342-A”, para que o acusado em um processo criminal também preste  compromisso de dizer a verdade. 

Nosso Código Penal está vigente há 83 anos, desde 1940 e nunca houve  tipificação do crime de perjúrio em seu texto, mesmo que uma garantia mais “expressa”  do direito de não se incriminar só tenha vindo na CF/88 e no Pacto de São José da Costa  Rica em 1992, 48 e 52 anos após o Código Penal respectivamente, talvez queira dizer  que, apesar de bem estruturado, os valores e ideais que visava proteger no século  passado, estejam um pouco desatualizados. 

2.4 O CRIME DE PERJÚRIO EM OUTROS ESTADOS 

É evidente que cada Estado, em sua plena soberania possuem legislações  diferentes uns dos outros, em relação ao crime de perjúrio, há países que adotam uma  posição um tanto quanto similar ao do ordenamento brasileiro, países como a Alemanha,  possuem um conceito parecido com o adotado em nossa legislação, havendo em seu  código penal tanto o crime de falso testemunho como também o de perjúrio, sendo que  está é a principal diferença, pois desde a criação de nosso código penal nunca tivemos  em seu texto a tipificação do perjúrio, fato é, perjúrio e falso testemunho são basicamente  a mesma coisa, tendo como principal diferença a quem estaria sujeito ao crime. 

Na Alemanha temos a seguintes tipificações em relação aos crimes de perjúrio e falso  testemunho:

 Artigo 153 Testemunho Falso 
Aquele que, como testemunha ou especialista, prestar falso testemunho não sob juramento perante um tribunal ou outra autoridade competente para examinar testemunhas e especialistas sob juramento,  estará sujeito a uma pena de prisão de três meses a cinco anos. 
Artigo 154 Perjúrio
(1) Aquele que prestar falso juramento perante um tribunal ou outra  autoridade competente para administrar juramentos estará sujeito a uma  pena de prisão não inferior a um ano. (grifo nosso) 
(2) Em casos menos graves, a pena será de prisão de seis meses  a cinco anos.4 

Como pode-se notar em seu art. 154 do Código Penal da Alemanha, “aquele que  prestar…”, não específica quem, pode ser o acusado, pode ser a testemunha ou qualquer  outra pessoa, estaria sujeito ao crime de perjúrio. 

Os Estados Unidos têm certas similaridades com a legislação alemã no contexto  de não especificar que seja necessário ser testemunha, tradutor ou alguma outra coisa,  é qualquer um, sua legislação se difere muito da nossa, é um país famoso por cada  estado-membro ter suas próprias leis, não seria viável focar nas peculiaridades das  legislações de cada estado-membro, porém também possuem leis federais, são divididas  em “Títulos”, o “Título 18” seria o principal código penal federal do Estado, nele contém a  seguinte tipificação do perjúrio em sua seção. 1621: 

“Aquele: 
(1) tendo prestado juramento perante um tribunal competente,  oficial ou pessoa, em qualquer caso em que uma lei dos Estados Unidos  autorize a administração de juramento, afirme ou assine conscientemente  e em desacordo com tal juramento qualquer assunto material que ele não  acredite ser verdadeiro; ou 

(2) em qualquer declaração, certificado, verificação ou declaração sob  pena de perjúrio permitida nos termos da seção 1746 do título 28 do Código  dos Estados Unidos, assine conscientemente como verdadeiro qualquer  assunto material que ele não acredite ser verdadeiro;

 (3) comete perjúrio e será, exceto quando expressamente fornecido de outra forma pela lei, passível de multa de acordo com este título ou  prisão de até cinco anos, ou ambos. Esta seção é aplicável, quer a  afirmação ou assinatura seja feita dentro ou fora dos Estados Unidos.”5

2.5 IMPLICAÇÕES JURÍDICAS QUE REPRIMEM O PERJÚRIO 

Como visto anteriormente neste artigo, a adoção do crime de perjúrio no sistema  acusatório brasileiro seria amplamente prejudicial ao acusado, visto que violaria os  princípios constitucionais que garantem a presunção de inocência, o direito ao silêncio, o  contraditório e a ampla defesa. Tais princípios são pedras angulares do sistema judicial  brasileiro. É imperativo que qualquer proposta de adoção do perjúrio respeite e proteja  essas garantias fundamentais, assegurando que não haja conflito entre a busca pela  verdade e a preservação dos direitos individuais. Nesse sentido ensina Alexandre de  Moraes: 

O respeito aos direitos e garantias fundamentais deve ser real e efetivo,  jamais significando, porém, que a Constituição Federal estipulou  verdadeira cláusula de indenidade absoluta aos investigados, para afastar  a incidência dos poderes compulsórios do Estado na persecução penal,  licitamente fixados pela legislação. (MORAES, 2023, p.153). 

Neste sentido, o Estado age como um coibidor do perjúrio, promovendo ações a  fim de beneficiar acusados que se comprometem a dizer a ampla verdade dos fatos, um  exemplo disso é a colaboração premiada, amplamente discutida no contexto do direito  processual penal brasileiro, especialmente devido à sua divulgação, publicidade e ao  poder midiático que o envolve, principalmente no contexto da Operação Lava Jato, que  revelou um grande esquema de corrupção. A Lei n. 12.683/2012, que trata do crime de  lavagem de dinheiro, estabelece que se o autor, coautor ou partícipe do crime colaborar  voluntariamente com as autoridades judiciais, sua pena pode ser reduzida em até dois  terços, e o regime inicial de cumprimento da pena pode ser aberto ou semiaberto,  conforme determinação do juiz. No entanto, essa redução está condicionada à clareza  dos esclarecimentos prestados, que devem contribuir de forma positiva para a  investigação ou processo penal. 

Da mesma forma, a Lei n. 12.850/2013 foi criada para tratar dos crimes de  organização criminosa. Ao analisar seus dispositivos, percebe-se que há uma série de  benefícios para o colaborador, incluindo o perdão judicial, que pode ser concedido pelo  juiz de acordo com o artigo 4º, § 2º: 

Art. 4º: 

O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão  judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de  liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha  colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o  processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou  mais dos seguintes resultados: 

§ 2º: 

Considerando a relevância da colaboração prestada, o  Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos  autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério  Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão  de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não  tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941  (BRASIL, 1941). 

Além disso, é fundamental enfatizar que qualquer colaboração por parte do  acusado deve ser feita de forma espontânea e voluntária. O acusado deve ter plena  consciência das implicações de suas palavras e ações, pois mentiras perante a  Autoridade Judiciária poderiam resultar em consequências adicionais prejudiciais. 

A adoção do Projeto de Lei n. 3148/2021 causaria grandes mudanças até mesmo  na Operação Lava Jato, ao passo que esta já teve enorme evolução desde a sua  deflagração, pois através da colaboração premiada, foi possível desmascarar diversos  agentes que deram rombo de bilhões aos cofres públicos brasileiros. 

Portanto, é necessário exercer extrema prudência ao aplicar esse instituto, uma  vez que a colaboração premiada, por si só, não pode ser a única base para uma  condenação penal. Ou seja, ela não deve ser o único elemento de prova para condenar  alguém. Esse entendimento está firmemente estabelecido pela Suprema Corte, como  demonstrado no caso do HC 94034, sob a relatoria da Ministra Carmen Lúcia. 

EMENTA: HABEAS CORPUS. INTERROGATÓRIOS DOS CO RÉUS, NOS QUAIS O PACIENTE TERIA SIDO DELATADO.  ATOS REALIZADOS SEM PRESENÇA DO DEFENSOR DO PACIENTE. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI N. 10.792/03:  IMPOSSIBILIDADE. VÍCIOS NÃO RECONHECIDOS. CONDENAÇÃO AMPARADA EXCLUSIVAMENTE NA DELAÇÃO  DOS CO-RÉUS: IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA.  

Em última análise, a busca pela verdade no processo penal não deve ser  alcançada às custas dos princípios constitucionais do acusado. É fundamental encontrar  um equilíbrio que permita a adoção do perjúrio no sistema acusatório brasileiro,  respeitando inteiramente as garantias individuais asseguradas pela Constituição. 

Através da análise cuidadosa das propostas alternativas discutidas neste ensaio,  é possível avançar na construção de um sistema judiciário brasileiro mais justo, eficaz e  compatível com os valores democráticos e constitucionais do país. 

3 CONCLUSÃO 

O estudo minucioso sobre a tipificação do crime de perjúrio no sistema acusatório  brasileiro revelou uma teia complexa de desafios e implicações jurídicas e  constitucionais. Enquanto a busca pela verdade processual é essencial para a justiça,  deve ser realizada com o devido respeito aos direitos fundamentais dos acusados. 

A Constituição Federal de 1988 consagra princípios como a presunção de  inocência, o direito ao silêncio, o contraditório e a ampla defesa, garantias fundamentais  que moldam o caráter democrático do sistema judicial brasileiro. A introdução do crime  de perjúrio no ordenamento jurídico nacional deve ser feita com extrema cautela, a fim  de não violar esses princípios essenciais. 

O Projeto de Lei 3148/2021, que propõe a tipificação do perjúrio, trouxe à tona  debates cruciais sobre a linha tênue entre a busca pela verdade e a preservação dos  direitos do acusado. Ao analisar experiências internacionais, como as legislações alemã  e norte-americana, percebemos a diversidade de abordagens em diferentes contextos  jurídicos. Contudo, a experiência desses países também ressalta a necessidade de  equilibrar a justiça com a proteção dos direitos individuais. 

A colaboração premiada, uma ferramenta poderosa no combate à corrupção,  demonstra que é possível promover a verdade processual sem comprometer os direitos  constitucionais dos acusados. No entanto, sua aplicação deve ser cuidadosa e alinhada  com os princípios do devido processo legal. 

Diante desse panorama, é imperativo que o sistema jurídico brasileiro continue a  debater e aprimorar a abordagem ao perjúrio. Qualquer mudança legislativa deve ser  fundamentada em um entendimento profundo das implicações constitucionais e jurídicas  envolvidas. É somente por meio do respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos que podemos garantir a integridade do processo judicial e, ao mesmo tempo, a busca pela  verdade no âmbito da justiça brasileira. 

Em última análise, a construção de um sistema judiciário mais justo, eficaz e  democrático requer não apenas leis atualizadas e abrangentes, mas também uma  compreensão contínua e profunda dos princípios que sustentam a justiça em uma  sociedade democrática. O caminho a seguir deve ser trilhado com sensatez, equilibrando  a necessidade de punir a falsidade com a proteção dos direitos humanos, criando assim  um ambiente jurídico onde a verdade e a justiça possam coexistir em harmonia. 


3DICIO. Dicionário Online de Português

4 Perjury 
(1) Whoever falsely swears an oath before a court or another authority which is competent to administer oaths  incurs a penalty of imprisonment for a term of at least one year. 
(2) In less serious cases, the penalty is imprisonment for a term of between six months and five years.

5 Whoever— 
(1) having taken an oath before a competent tribunal, officer, or person, in any case in which a law of the  United States authorizes an oath to be administered, that he will testify, declare, depose, or certify truly, or  that any written testimony, declaration, deposition, or certificate by him subscribed, is true, willfully and  contrary to such oath states or subscribes any material matter which he does not believe to be true; or 
(2) in any declaration, certificate, verification, or statement under penalty of perjury as permitted under  section 1746 of title 28, United States Code, willfully subscribes as true any material matter which he does  not believe to be true; is guilty of perjury and shall, except as otherwise expressly provided by law, be fined under this title or  imprisoned not more than five years, or both. This section is applicable whether the statement or  subscription is made within or without the United States.

RERÊNCIAS: 

ALEMANHA. Strafgesetzbuch. Disponível em: https://www.gesetze-iminternet.de/englisch_stgb/englisch_stgb.html. Acesso em: 23 out 2023. 

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BRASIL. Decreto-Lei N 678, de 6 de novembro de 1992. Disponível em:  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso em: 23 out 2023. 

BRASIL. Lei n. 12.683, de 9 de julho de 2012. Altera a Lei n. 9.613, de 3 de março de  1998, para tipificar os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, direitos e  valores, e as infrações penais correlatas, e estabelece medidas de controle e preven ção.  Brasília, DF: Presidência da República, 2012. 

BRASIL. Lei N° 12850 de 2 agosto de 2013. Disponível em:  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 23 out  2023.

BRASIL. Projeto de Lei nº 3.148, de 2021. Altera o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de  outubro de 1941 – Código de Processo Penal, para incluir o juramento do acusado em  seu interrogatório, sob pena de falsidade ideológica. 

BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 94034. BRASIL. Disponível em:  https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=546065. Acesso  em: 23 out 2023. 

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1 Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário UNA – BOM DESPACHO. E-mail:  jake0lucao13@gmail.com. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de  Graduação em Direto do Centro Universitário UNA – BOM DESPACHO. 2023. Orientador: Prof. Gilberto  Andrade, Advogado e Prof. Universitário. 
2 Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário UNA – BOM DESPACHO. E-mail:  luccas.barcelos@hotmail.com. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de  Graduação em Direto do Centro Universitário UNA – BOM DESPACHO. 2023. Orientador: Me. Gilberto  de Andrade Pinto.