REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202504301850
Yuri Campelo Lima Da Cruz
Orientador: Prof. Dr. Bento Herculano Duarte Neto
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo analisar a responsabilidade civil do empregador por danos morais decorrentes de acidentes de trabalho, com ênfase nas decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT-RN). A pesquisa adota uma abordagem qualitativa, fundamentada em revisão bibliográfica e análise jurisprudencial, com foco em dois acórdãos paradigmáticos — um de cada Turma do TRT-RN — sobre acidentes típicos e doenças ocupacionais. Parte-se da distinção entre responsabilidade subjetiva e objetiva no direito brasileiro, destacando-se a aplicação da teoria do risco social em contextos específicos. A análise revelou que o TRT-RN tende a adotar postura cautelosa, exigindo prova robusta do nexo causal para fins de indenização. Conclui-se que a responsabilização do empregador por danos morais no ambiente de trabalho depende, majoritariamente, da comprovação de culpa ou da existência de atividade de risco que justifique a aplicação da responsabilidade objetiva.
Palavras-chave: responsabilidade civil; acidente de trabalho; dano moral; jurisprudência; TRT-RN.
ABSTRACT
This article aims to analyze the employer’s civil liability for moral damages arising from work-related accidents, with an emphasis on the decisions of the Regional Labor Court of the 21st Region (TRT-RN). The research adopts a qualitative approach, based on bibliographic review and jurisprudential analysis, focusing on two leading decisions — one from each Chamber of TRT-RN — concerning typical accidents and occupational diseases. The study discusses the distinction between subjective and objective liability in Brazilian law, highlighting the application of the social risk theory in specific contexts. The analysis revealed that TRT-RN tends to adopt a cautious stance, requiring robust evidence of causation to justify compensation. It is concluded that the employer’s liability for moral damages in the workplace mostly depends on the proof of fault or the existence of a risky activity that justifies the application of strict liability.
Keywords: civil liability; work accident; moral damage; case law; TRT-RN.
1. Introdução
A relação que nasce entre duas pessoas ligadas pelo vínculo laboral é regida por diversos princípios que buscam, em sua essência, a proteção do empregado, por este ser a parte hipossuficiente, como o princípio da proteção, da norma mais favorável, o da condição mais benéfica, entre outros. Como destaca Delgado (2024, p. 239), esses princípios compõem o núcleo basilar do Direito do Trabalho, sendo aplicáveis de forma ampla sem gerar conflitos com outros princípios jurídicos. Ademais, esses princípios têm o escopo de garantir um ambiente de trabalho seguro e livre de abusos. Entretanto, situações como: acidentes de trabalho, negligência no fornecimento de equipamentos de proteção individuais (EPIs) podem gerar danos passíveis de indenização. O respeito e a manutenção da integridade pessoal do trabalhador estão necessariamente atrelados ao princípio da dignidade da pessoa humana, que pelo seu posicionamento na Carta Magna de 1988 é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III)1.
Nesse cenário, a responsabilidade do empregador precisa ser analisada atentamente, em especial quando se trata de danos sofridos pelo trabalhador, que muitas vezes tem que recorrer à previdência social para tratar das enfermidades adquiridas no ambiente laboral, o que reforça a necessidade de responsabilização do empregador nos casos em que sua conduta contribuiu para o dano. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, incisos XXII e XXVIII, estabelece o direito dos trabalhadores a um ambiente seguro e a um seguro contra acidentes de trabalho, determinando que o empregador deve arcar com as indenizações devidas sempre que houver dolo ou culpa. Segundo dados levantados pelo Observatório da Segurança e Saúde do Trabalho2, apenas no ano de 2022 foram registrados mais 600 mil casos de acidente de trabalho, dos quais 2500 resultaram em óbito do empregado. No Estado do Rio Grande do Norte, para o mesmo, foram apurados cerca de 4195 notificações, dos quais 20 foram com óbito.
Assim, o presente trabalho objetiva analisar e compreender o posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 21 ª Região (TRT21) no que tange o tratamento dado aos casos de acidente do trabalho e os critérios adotados na ponderação da responsabilização do empregador por danos morais no ambiente laboral decorrentes do acidente. Foi definido o período pós-reforma trabalhista de 2017, visto que esta foi responsável pela inclusão do título “do dano extrapatrimonial” na CLT. Tal título acrescentou diversos artigos na lei trabalhista, dentre eles o mais importante para o objeto deste estudo é o art. 223-G, pois é aquele que trata dos critérios a serem utilizados pelos magistrados no momento de avaliar o dano sofrido e, em seu § 1o, trata do valor para fixação da indenização a depender do nível da ofensa: leve, média, grave ou gravíssima.
Além disso, quanto aos objetivos específicos, busca-se examinar a distinção entre responsabilidade subjetiva e objetiva nas decisões do TRT21, identificar os principais tipos de danos indenizáveis no contexto trabalhista conforme bem como apresentar uma análise de precedentes relevantes do regional sobre o tema.
2. Metodologia
A pesquisa foi conduzida por meio de uma abordagem qualitativa, baseada na revisão bibliográfica e na análise do sítio “Sistema de Jurisprudência” do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT-21). Foram utilizados livros de referência no Direito do Trabalho, artigos científicos e legislações aplicáveis para fundamentar a análise. Além disso, foram consideradas decisões do TRT-21 para ilustrar como esse tribunal tem interpretado a responsabilidade civil do empregador em casos de dano moral e material, permitindo a identificação de padrões jurisprudenciais específicos desta corte. Atente-se para o recorte temporal definido acima, a fim de dar atenção especial à aplicação (ou não) das regras criadas pela Lei nº 13.467, de 2017.
A escolha pelo TRT da 21ª Região, com sede em Natal/RN, justifica-se pela sua relevância jurisdicional. Instituído pela Lei nº 8.215/91, o tribunal é responsável pelo julgamento de processos oriundos de todo o Estado do Rio Grande do Norte, integrando a estrutura da Justiça do Trabalho de segundo grau. O TRT-21 é composto por diversos órgãos, sendo os principais julgadores o Tribunal Pleno e as suas duas Turmas, formadas por desembargadores que apreciam recursos ordinários, agravos de petição e embargos de declaração. As decisões são formalizadas em acórdãos, que reúnem o voto do relator e, se houver, votos divergentes ou complementares. A consulta a esses acórdãos foi realizada por meio do “Sistema de Jurisprudência” disponível no site institucional, permitindo acesso direto ao conteúdo e favorecendo o controle social e a pesquisa acadêmica.
Compreender a estrutura e funcionamento do TRT-21 é essencial para a análise empreendida neste trabalho, pois permite situar as decisões no seu contexto institucional, oferecendo uma leitura mais precisa sobre a interpretação local da responsabilidade civil do empregador, especialmente nos casos de acidente de trabalho com repercussão moral.
Para fins de delimitação e viabilidade da pesquisa, optou-se por realizar uma análise qualitativa de acórdãos selecionados como representativos das decisões proferidas pela 1ª e 2ª Turmas do TRT da 21ª Região, no que se refere à responsabilidade civil do empregador por acidentes típicos e doenças ocupacionais. Em vez de realizar um levantamento estatístico de toda a jurisprudência disponível, priorizou-se o estudo aprofundado de dois acórdãos — um de cada turma — que expressam, com clareza, fundamentos jurídicos relevantes e distintas abordagens na aplicação da responsabilidade subjetiva e objetiva. Tal critério visa possibilitar uma compreensão comparativa e crítica sobre a aplicação dos princípios trabalhistas em decisões paradigmáticas, respeitando os limites temporais e metodológicos próprios de uma investigação acadêmica de graduação
3. Desenvolvimento
3.1. Acidente do trabalho e sua caracterização
O conceito de acidente do trabalho é definido no art. 19 da Lei 8.213/91 como sendo aquele evento ocorrido no exercício de seu labor a serviço de empresa ou de empregador doméstico e que causa no trabalhador lesão corporal ou “perturbação funcional que causa a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho” (BRASIL, 1991).
Mauad (2024) destaca que a definição não se aplica apenas ao que o referido autor denominou de acidente típico, cuja definição consiste em um evento único, repentino e inesperado, que acontece no ambiente e no horário do trabalho, visto que também devem ser incluídas naquele rol as doenças profissionais e do trabalho.
Na linha do raciocínio desenvolvido no parágrafo anterior, Martins (2024), por sua vez, amparado no que diz o art. 20 da lei previdenciária, define que a doença profissional, também conhecida como tecnopatia, é aquela que se desenvolve a partir da atividade habitual exercida pelo trabalhador. Trata-se de uma enfermidade diretamente ligada à função desempenhada, sendo considerada típica daquela ocupação específica. Essas doenças constam em listas oficiais elaboradas pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social, a exemplo do anexo II do decreto nº 3048/993, e são reconhecidas como inerentes a determinadas categorias profissionais, dada a exposição constante a determinados agentes nocivos no exercício da função.
Por outro lado, a doença do trabalho, ou mesopatia, não está vinculada diretamente à natureza da atividade, mas sim às condições em que ela é executada. São enfermidades causadas ou agravadas por fatores ambientais, como insalubridade, ergonomia inadequada, jornada excessiva ou falta de medidas de proteção. Inclusive, Mauad (2024) destaca que essas enfermidades podem acometer qualquer pessoa, mas seu risco ao empregado é potencializado pelo simples exercício da sua profissão, como é o caso da contaminação pelo vírus da COVID-19 por profissionais que atuaram no ambiente hospitalar durante a pandemia nos anos de 2020 a 20234. Embora não sejam específicas da função, essas doenças surgem como consequência das adversidades do meio laboral e também são reconhecidas como acidentes do trabalho para fins de reparação e proteção do trabalhador.
Ademais, a lei previdenciária, em seu art. 21, ainda acrescenta situações que são equiparadas ao acidente de trabalho, mesmo que não se configurem como acidente típico. São exemplos: quando o acidente, ainda que não exclusivo, contribui diretamente para a morte, redução ou perda da capacidade laborativa do segurado, ou cause lesões que demandem tratamento médico; os eventos ocorridos no local e durante o expediente, como agressões físicas (inclusive de terceiros), atos de sabotagem, terrorismo, imprudência, negligência ou imperícia de colegas, ações de pessoas com distúrbios mentais ou ainda desastres naturais, como desabamentos e incêndios.
Também se incluem como acidentes de trabalho as doenças causadas por contaminação acidental no exercício da atividade, bem como os infortúnios ocorridos fora do local e horário do trabalho, desde que estejam relacionados a ordens ou serviços prestados à empresa, mesmo que de forma espontânea, e também durante viagens a serviço, inclusive aquelas voltadas à capacitação profissional, ainda que utilizando veículo próprio.
Importante destacar, ainda, que os deslocamentos entre a residência e o local de trabalho — e vice-versa —, o que foi chamado por Martins (2024) de acidente de percurso, ou acidente in itinere, são igualmente considerados para fins de equiparação legal, independentemente do meio de transporte utilizado. Por fim, a norma esclarece que, nos momentos de refeição, descanso ou de atendimento a necessidades fisiológicas durante a jornada ou nas dependências da empresa, o empregado continua sendo considerado em exercício do trabalho.
Em arremate, Castro e Lazzari (2020) entendem que um evento será caracterizado como acidente de trabalho, desde que ele tenha relação direta com o exercício da atividade profissional. Dessa forma, não se enquadram nessa definição os acidentes que ocorrem fora do contexto das obrigações e responsabilidades vinculadas à função desempenhada. Importa destacar que o local da ocorrência não é determinante — o acidente não precisa acontecer no ambiente físico da empresa, mas sim decorrer do desempenho da atividade laboral. Dessa forma, compreende-se que os acidentes de trajeto, assim como aqueles ocorridos durante a realização de tarefas externas, também se inserem no conceito de acidente de trabalho.
Diante da amplitude conceitual, que engloba diferentes formas de eventos danosos vinculados à atividade laboral, nasce a necessidade de analisar as consequências jurídicas resultantes dessas ocorrências. Entre elas, a que nos interessa é a responsabilidade do empregador, em especial quando relacionada à falha no cumprimento de seus deveres legais e contratuais. O tópico a seguir se propõe a abordar os principais aspectos relacionados a essa responsabilização, tais como a distinção entre as formas de responsabilidade subjetiva e objetiva, o dano causado ao trabalhador e os critérios utilizados para fixação da respectiva indenização.
3.2. Responsabilidade civil do empregador
A responsabilidade civil do empregador, no contexto das relações de trabalho, constitui relevante instrumento de reparação dos danos causados ao empregado, especialmente nos casos de acidente de trabalho. Conforme dispõe o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, é assegurado ao trabalhador o direito à indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho, quando constatada a culpa ou dolo do empregador. Gagliano e Filho (2025) destacam que a responsabilidade civil é um fenômeno jurídico que exsurge nas interações não pacíficas do ser humano com a sociedade.
Nessa perspectiva, faz-se necessária a distinção das formas de responsabilidade civil que a doutrina apresenta: a subjetiva e a objetiva. Assim, a responsabilidade civil de natureza subjetiva surge quando o dano é provocado por uma ação intencional ou por falta de diligência do agente. Essa culpa, no âmbito civil, configura-se quando há descumprimento de um dever jurídico — geralmente relacionado à atenção ou cautela devida — como ocorre nos casos de imprudência ou negligência, conforme pode-se observar no Código Civil brasileiro, artigo 186: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Da leitura do artigo acima, é de fácil conclusão que, a norma segue “o princípio segundo o qual cada um responde pela própria culpa — unuscuique sua culpa nocet. Por se caracterizar em fato constitutivo do direito à pretensão reparatória, caberá ao autor, sempre, o ônus da prova de tal culpa do réu”. (Gagliano e Filho, 2025, p. 756)
No entanto, existem casos em que a legislação impõe a responsabilidade civil a uma pessoa mesmo que ela não tenha causado diretamente o dano, em razão de algum vínculo jurídico que mantém com o verdadeiro causador do prejuízo, destaca Gagliano e Filho (2025). Nessas situações estaremos diante da responsabilidade civil objetiva, cuja conceituação é apresentada no parágrafo único do art. 927, transcrito abaixo:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Hruschka (2018), por sua vez, destaca que é perceptível que o art. 186 vincula a obrigação de indenizar à presença do elemento culpa do agente. A outro giro, o parágrafo único do art. 927 fundamenta o dever indenizar na constatação do risco. O referido autor ainda acrescenta que a utilização de cláusulas gerais, conceitos abertos e redação ampla foram propositais, pois o legislador o fez no intuito de permitir que o instituto da responsabilidade civil se adapte a situações futuras e contextos não previstos na legislação.
No âmbito das relações de trabalho, esses dispositivos servem de base para a responsabilização do empregador quando o empregado sofre dano em razão da atividade profissional. A responsabilização subjetiva será aplicada quando houver demonstração de culpa, como nos casos de negligência no fornecimento de equipamentos de proteção.
Nesse contexto, observa-se que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho vem reconhecendo, de forma cuidadosa, a possibilidade de responsabilização do empregador em acidentes de trajeto, desde que demonstrados os elementos clássicos da responsabilidade subjetiva, com destaque para a culpa ou omissão quanto aos deveres legais de segurança.
Em decisão paradigmática, o TST esclareceu que:
RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS PROVENIENTES DE INFORTÚNIOS DO TRABALHO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO EMPREGADOR DE QUE TRATA O ARTIGO 7º, INCISO XXVII DA CONSTITUIÇÃO EM DETRIMENTO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA CONSAGRADA NO § ÚNICO DO ARTIGO 927 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. SUPREMACIA DA NORMA CONSTITUCIONAL . INAPLICABILIDADE DA REGRA DE DIREITO INTERTEMPORAL DO § 1º DO ARTIGO 2º DA LICC. I – É sabido que o acidente de trabalho e a moléstia profissional são infortúnios intimamente relacionados ao contrato de emprego, e por isso só os empregados é que têm direito aos benefícios acidentários, daí ser impondo a conclusão de a indenização prevista no artigo 7º, inciso XXVIII da Constituição se caracterizar como direito genuinamente trabalhista. II – Essa conclusão não é infirmável pela versão de a indenização prevista na norma constitucional achar-se vinculada à responsabilidade civil do empregador. Isso nem tanto pela evidência de ela reportar-se, na realidade, ao artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, mas sobretudo pela constatação de a pretensão indenizatória provir não da culpa aquiliana, mas da culpa contratual do empregador, extraída da não-observância dos deveres contidos no artigo 157 da CLT . III – Sendo assim, havendo previsão na Constituição da República sobre o direito à indenização por danos material e moral, provenientes de infortúnios do trabalho, na qual se adotou a teoria da responsabilidade subjetiva do empregador, não cabe trazer à colação a responsabilidade objetiva de que trata o § único do artigo 927 do Código Civil de 2002. IV – Isso em razão da supremacia da norma constitucional, ainda que oriunda do Poder Constituinte Derivado, sobre a norma infraconstitucional, segundo se constata do artigo 59 da Constituição, pelo que não se pode absolutamente cogitar da revogação do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, a partir da superveniência da norma do § único do artigo 927 do Código Civil de 2002, não se aplicando, evidentemente, a regra de Direito Intertemporal do § 1º do artigo 2º da LICC. Recurso conhecido e desprovido.
(TST – RR: 0183200-64 .2006.5.12.0026, Relator.: Antonio Jose De Barros Levenhagen, Data de Julgamento: 15/10/2008, 4ª Turma, Data de Publicação: 24/10/2008)
No que tange a responsabilidade objetiva poderá incidir quando a atividade desenvolvida for considerada de risco, independentemente da comprovação de culpa. Sobre essa matéria o TST já se manifestou da seguinte forma:
AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA DA CAUSA RECONHECIDA . Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso do empregado/parte autora, o valor fixado no artigo 852-A da CLT e, na hipótese dos autos, há elementos a respaldar a conclusão de que os pedidos rejeitados e devolvidos à apreciação desta Corte ultrapassam o valor de 40 salários mínimos. ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO. MOTORISTA DE CAMINHÃO. TRABALHO EM ALTURA . ATIVIDADE DE RISCO. QUEDA AO DESAMARRAR A LONA DO VEÍCULO PARA FAZER A DESCARGA DA MERCADORIA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA NÃO COMPROVADO . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA DA CAUSA RECONHECIDA. Constatado equívoco na decisão agravada, dá-se provimento ao agravo interno para determinar o processamento do agravo de instrumento. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR . LEI Nº 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO. MOTORISTA DE CAMINHÃO . TRABALHO EM ALTURA. ATIVIDADE DE RISCO. QUEDA AO DESAMARRAR A LONA DO VEÍCULO PARA FAZER A DESCARGA DA MERCADORIA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR . FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA NÃO COMPROVADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA DA CAUSA RECONHECIDA. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível violação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil . RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO . MOTORISTA DE CAMINHÃO. TRABALHO EM ALTURA. ATIVIDADE DE RISCO. QUEDA AO DESAMARRAR A LONA DO VEÍCULO PARA FAZER A DESCARGA DA MERCADORIA . RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA NÃO COMPROVADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA DA CAUSA RECONHECIDA . Perante o Direito do Trabalho, a responsabilidade do empregador pela reparação de dano, no seu sentido mais abrangente, derivante do acidente do trabalho ou de doença profissional a ele equiparada, sofrido pelo empregado, é subjetiva, conforme prescreve o artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988. No entanto, podem-se considerar algumas situações em que é recomendável a aplicação da responsabilidade objetiva, especialmente quando a atividade desenvolvida pelo empregador causar ao trabalhador um risco muito mais acentuado do que aquele imposto aos demais cidadãos, conforme previsto no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil Brasileiro. No aspecto, é de salientar que no julgamento do RE nº 828040 o Supremo Tribunal Federal firmou tese de repercussão geral no Tema 932 no seguinte sentido: “O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade”. No presente caso , o quadro fático delineado na decisão regional revela que “O reclamante sofreu acidente típico do trabalho no pátio da empresa quando estava desamarrando a lona do caminhão e tirando o arco de ferro para fazer a descarga, quando caiu de cima do caminhão no chão .” De outra parte, não há nos autos qualquer informação que possa imputar ao recorrente o fato exclusivo pela ocorrência do infortúnio. Nesse contexto, é possível concluir que o empregado, em razão de suas funções, foi exposto à situação de risco apta a atrair a responsabilidade objetiva do empregador. Logo, devidas as reparações por danos morais e materiais. Precedentes . Recurso de revista conhecido e provido.(TST – RR: 10008277320195020025, Relator.: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 23/04/2024, 7ª Turma, Data de Publicação: 30/08/2024)
3.2.1. A responsabilidade civil do empregador nos acidentes típicos
O acidente, como já exposto acima, é um evento que remete a um “acontecimento negativo inesperado, que provoca danos, prejuízos, feridos ou mortos (ex.: acidente de carro; acidente de trabalho; acidente desportivo)”5. Nesse sentido, investigar a quem cabe o ônus de ressarcir o empregador acometido por esse infortúnio é de extrema importância. Assim, neste primeiro momento buscaremos analisar como a jurisprudência do TRT-21 se posiciona diante de casos de acidente típico.
Preliminarmente, nota-se que há forte posicionamento no sentido de que o evento “acidente” sofrido pelo empregado e ocorrido no ambiente do não é automaticamente convertido em obrigação devida pelo empregador. Como pode-se observar no julgado do processo 0000171-93.2023.5.21.0016, em que o reclamante aduz que sofreu queda de escada e que deste episódio resultou em torção na perna e escoriações. Contudo, merece destaque o ponto de vista da Magistrada Maria Rita Manzarra De Moura Garcia, o autor não foi capaz de se desvencilhar do seu ônus de comprovar um dos elementos essenciais da responsabilidade, a culpa em sentido lato, conforme destaque
“Para que haja responsabilidade civil, é necessária a coexistência dos seguintes requisitos: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa (ato ilícito); b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c)nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade.
(…)Pergunto-me qual seria a culpa (dolo ou culpa strictu sensu) da empregadora no referido acidente. Qual medida poderia a reclamada ter adotado para evitar o acidente sofrido pelo obreiro? Qual dever de cautela teria sido por si inobservado? Seria razoável exigir da empresa que fosse retirado do ambiente todos os degraus? Seria razoável exigir que a empresa ministrasse curso sobre como evitar quedas ou tropeços ao subir 2 degraus? A resposta é desenganadamente negativa, o que me permite concluir ser descabida a tentativa de atribuição de culpa à reclamada no presente feito.
Não se trata, no presente caso, de situações em que a empresa ré, por descuido ou negligência, transforma o ambiente de trabalho em local suscetível de quedas, como, por exemplo, óleos ou substâncias análogas no chão, piso extremamente escorregadio por diversos fatores, ou ainda trabalho em certas altura sem que o risco de queda é previsível. Não há como sequer imaginar que foi justamente por negligência ou imprudência da parte ré que o autor se acidentou.
Portanto, diante do acima exposto, não há como se extrair dos autos que o acidente sofrido pelo reclamante decorreu de culpa da reclamada, uma vez que não demonstrada a sua imprudência, imperícia ou negligência no infortúnio ocorrido.”6
Tal posição foi acompanhada pela maioria dos desembargadores da Primeira Turma de Julgamento, cujo relator foi o Juíz convocado Décio Teixeira de Carvalho Júnior, em sede recursal, contudo não foi posição unânime, uma vez que foi registrado voto divergente da Desembargadora Maria Do Perpétuo Socorro Wanderley De Castro, embora vencido é muito relevante para entender o ponto central da discussão entre a responsabilidade subjetiva (regra) e a objetiva (exceção). Neste contexto, destaca-se o ponto fulcral de divergência no julgamento analisado, no qual a Desembargadora Maria do Perpétuo Socorro defende a aplicação da responsabilidade objetiva fundada na teoria do risco social7, em contraponto à posição vencedora, que mantém a aplicação tradicional da responsabilidade subjetiva, exigindo a comprovação de culpa do empregador. Esse embate jurisprudencial exemplifica a tensão doutrinária e prática no campo da responsabilidade civil trabalhista, em especial no que se trata de situação em que não houve culpa do empregador, nem a vítima concorreu para que o infortúnio lhe ocorresse.
Entretanto, em outras hipóteses analisadas pela jurisprudência regional, verifica-se entendimento em sentido diverso. No processo nº 0000158-67.2022.5.21.0004, julgado pela 2ª Turma do TRT da 21ª Região, foi afastada a responsabilidade da empresa por acidente de trabalho sofrido por frentista durante a calibragem de pneu de carrinho de mão. A conduta do trabalhador foi considerada em desacordo com as normas internas da empresa, as quais vedam expressamente esse tipo de serviço, conforme orientação verbal e sinalização no ambiente de trabalho. De acordo com a prova testemunhal, o autor teria desobedecido às determinações patronais ao atender pedido de cliente e injetar pressão excessiva no pneu do carrinho, o que resultou em explosão e fratura no dedo da mão direita. A decisão de 1º grau, posteriormente confirmada em sede recursal, reconheceu a culpa exclusiva da vítima e julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais e estéticos. Para o relator do acórdão:
“É inviável atribuir ao reclamado qualquer responsabilidade sobre o infortúnio ocorrido, por culpa exclusiva da vítima, porque foi o reclamante que se colocou em situação de risco acentuado, optando deliberadamente por ‘atender solicitação de um cliente para encher pneu de carro de mão’.” (TRT21, RO 0000158-67.2022.5.21.0004, Rel. Des. Ronaldo Medeiros de Souza, julgado em 22/03/2023).
Com base no que foi exposto no presente tópico, é possível observar que, embora o ordenamento jurídico imponha ao empregador o dever de preservar a integridade física e moral de seus empregados, a responsabilização civil nos casos de acidente típico ainda está condicionada, via de regra, à demonstração de sua concorrência para o ocorrido. Os julgados analisados evidenciam que o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região adota majoritariamente a teoria da responsabilidade subjetiva como parâmetro para aferição do dever de indenizar, exigindo a comprovação do nexo causal e da conduta culposa do empregador. Ao mesmo tempo, nota-se a existência de posições divergentes relevantes, como a defesa da responsabilidade objetiva com base na teoria do risco social, o que demonstra que a jurisprudência ainda se encontra em movimento, especialmente diante de situações nas quais a culpa do empregador não é evidente, mas o trabalhador se vê acometido por um infortúnio laboral.
3.2.2. A responsabilidade civil do empregador nos casos de doenças profissionais e do trabalho
Além dos acidentes típicos, o Direito do Trabalho também tutela os casos de doenças profissionais e doenças do trabalho, que, conforme já foi introduzido anteriormente, são equiparados a acidentes para fins previdenciários. A análise da jurisprudência do TRT-21 mostra como tem sido a interpretação quanto ao dever de reparação nesses casos, que muitas vezes a relação entre o adoecimento do trabalhador e as condições de trabalho exige apuração técnica e probatória mais complexa, envolvendo peritos nomeados pelos magistrados no curso do processo. Busca-se, assim, compreender, neste tópico, em qual razão o empregador responde por danos sofridos pelo empregado decorrentes das patologias físicas e psicológicas vinculados tanto ao seu ambiente, quanto à dinâmica laboral.
Um caso relevante analisado, que ilustra bem o posicionamento do TRT21 no que se refere à responsabilidade civil do empregador nos casos de doença ocupacional é o analisado no processo 0000707-49.2023.5.21.0002. Nesse caso, o reclamante era motorista de ônibus e demonstrou que foi vítima de diversas formas de violência durante o exercício do seu mister, tais quais assaltos, depredação do ônibus que conduzia. Foi posteriormente diagnosticado com transtorno de ansiedade generalizada (CID F41.1) e transtorno de estresse pós-traumático (CID F43.1). A perícia médica reconheceu haver nexo concausal entre a atividade exercida e o adoecimento do trabalhador, destacando que “A depressão a ansiedade ocupacional é ocasionada de forma multifatorial, mas que importa o fator estressante”8, no caso, a função desempenhada pelo trabalhador “é de baixa ou autonomia dependente, sem variabilidade de tarefas, de alta demanda psicológica, portanto de elevado desgaste e baixo poder de decisão pontual diante das incertezas e imprevisibilidade relacionadas à violência urbana”9.
Tanto o juízo do primeiro grau, quanto o juízo ad quem (1ª turma), reconheceram a responsabilidade do empregador e determinaram a reintegração do reclamante, além do pagamento da indenização por danos morais. No acórdão, a Desembargadora Maria do Perpétuo Socorro Wanderley de Castro, ressaltou que, perante a ausência de medidas eficazes de proteção e da configuração do risco social inerente à profissão de motorista de transporte coletivo, isto é, transporte de valores e pessoas portadoras de bens de valor econômico, tais como: celulares, notebook etc. Assim, acrescentou a relatora:
“A natureza da responsabilidade da reclamada é objetiva, firmada no risco social, com perfeita configuração da hipótese prevista no artigo 927, parágrafo único do Código Civil, para a qual converge ainda o dever de proteção e cuidado que o empregador deve ter para com seus empregados, por efeito das normas da Constituição da República e do artigo 157 da CLT. Indubitável a agressão psicológica decorrente de um assalto a mão armada durante o exercício de atividade profissional.
(…)
Patente, pois, a lesão a um bem jurídico imaterial em razão do assalto sofrido no exercício do trabalho, está caracterizada a responsabilidade da reclamada e pois o dever de indenizar. Caracterizado o risco presente na atividade desenvolvida pelo autor na empresa, a concorrência do procedimento do empregador, ao não comprovar a adoção, na época do evento em comento, de medidas eficazes de segurança do trabalho protetivas, preventivas ou inibidoras de ato de violência urbana configura seu dever de indenizar o dano havido.” (TRT-21 – ROT: 0000707-49.2023.5.21 .0002, Relator.: MARIA DO PERPETUO SOCORRO WANDERLEY DE CASTRO, Primeira Turma de Julgamento, Gabinete da Desembargadora Maria do Perpétuo Socorro Wanderley de Castro)
Ademais, reforçou a Relatora, com suporte na doutrina de Maurício Godinho Delgado, que assaltos a ônibus, mesmo praticados por terceiros, enquadram-se nas hipóteses de responsabilidade objetiva do empregador, dada a natureza do risco inerente à atividade.
Outro caso de igual relevância, desta vez julgado pela 2ª Turma do TRT21, foi nos autos do processo 0000759-33.2023.5.21.0006, que ilustra com precisão a tensão jurisprudencial existente entre a valorização da prova pericial e a análise principiológica do Direito do Trabalho no contexto de doenças ocupacionais. O caso concreto é de um ex-empregado que, originalmente, havia ajuizado originalmente o processo 0000421-21.2021.5.21.0009, pedindo danos morais e materiais decorrentes de doença profissional. Foram realizadas diversas perícias médicas, contudo, em razão do desaparecimento do autor no curso do processo 0000421-21.2021.5.21.0009, este foi extinto. Presumindo o seu falecimento, nova ação foi proposta por seu espólio com o número 0000759-33.2023.5.21.0006, reiterando os pedidos. Constata-se que o laudo médico-pericial realizado ainda no curso do primeiro processo reconheceu o nexo causal das enfermidades do reclamante, quais sejam, tendinite e bursite. Conforme argumenta a parte autora, as patologias descritas acima estão relacionadas ao labor contínuo e a constante demanda para superar as metas estipuladas pela empresa reclamada. Culminando assim no agravamento da sua doença e redução da sua capacidade laboral.
A sentença de primeiro grau acolheu a tese de nexo causal, utilizando-se de uma fundamentação principiológica centrada nos deveres de proteção da saúde e da integridade do trabalho, inclusive destaca que
“as atividades laborais atuaram como fator contributivo para o desencadeamento da doença que acometeu o empregado. Basta ver que em 2014 quando entrou na empresa o reclamante gozava de plena saúde como se encontra registrado no ASO admissional, e a partir de 2017 passou a ter dores e desconforto nos ombros, doença diagnosticada através de Ressonância Magnética, colacionada que comprovou tendinopatia e bursite.”10
Dessa forma, nota-se que, na visão da magistrada, a empresa tem uma responsabilidade em garantir o ambiente laboral salutar, contudo abre mão disso para instigar o empregado a cumprir e ultrapassar suas metas, ou seja, a busca por produtividade excessiva e acarretando no que foi chamado de esgotamento profissional.Daí nasceu a necessidade de responsabilização da empresa. Em sua avaliação, a magistrada entendeu que houve um alto grau de reprovabilidade na conduta da empresa, em especial porque o empregado foi demitido enquanto fragilizado pelas moléstias que o acometiam, e a condenou a pagar o valor de R$ 22.000,00 relativo a danos extrapatrimoniais. Ademais, foi deferido também indenização por danos materiais, relativa à diferença entre o valor do benefício previdenciário e a remuneração a que o obreiro teria direito.
Irresignada com o resultado da sentença, a reclamada interpôs recurso ordinário, que foi distribuído por sorteio para a 2ª turma e relatoria do Desembargador José Barbosa Filho. Acompanhando o relator, a Segunda Turma reformou integralmente a decisão do 1º grau. O colegiado entendeu que os documentos médicos e previdenciários juntados aos autos não eram suficientes para comprovar p nexo causal ou concausal entre as patologias e o trabalho desempenhado, ressaltando que o benefício previdenciário recebido (B91 – auxílio doença acidentário) se baseara em nexo técnico epidemiológico e não em avaliação individualizada, posto que aquele se trata de “um modelo estatístico genérico, com grande utilidade para a Previdência Social no exame dos pedidos de benefícios”11. Destacou-se também que a perícia anteriormente realizada afastou o nexo causal.
O relator enfatizou que o laudo pericial não deveria ter sido anulado por ausência de visita ao local de trabalho, face à facultatividade de seu realização pelo expert, conforme entendimento do TST.12 O acórdão também ressaltou que a empresa comprovou adotar medidas de ergonomia e proteção à saúde, nem se evidenciando culpa patronal e, consequentemente, sua responsabilização. Em razão do exposto, a condenação foi afastada e a ação foi julgada totalmente improcedente
As divergências vislumbradas ao se debruçar sobre os autos, nas decisões do 1º e 2º graus chamam a atenção, posto que na sentença tem-se que a magistrada entendeu tratar-se de uma responsabilidade objetiva da empresa, a outro giro, a 2ª Turma de julgamentos entendeu que, na verdade, tratava-se de caso de responsabilidade subjetiva, privilegiando a ausência de prova direta e categórica sobre o nexo causal.
4. Considerações finais
A presente pesquisa teve por objetivo investigar como o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região tem se posicionado em relação à responsabilidade civil do empregador por danos morais e materiais decorrentes de acidentes do trabalho, com foco específico nos acidentes típicos e nas doenças ocupacionais. A análise teórica foi sustentada pela doutrina especializada, e a parte empírica baseou-se no estudo de julgados representativos de cada uma das turmas do TRT-21.
No tocante aos acidentes típicos, observou-se que a jurisprudência tem majoritariamente aplicado a teoria da responsabilidade subjetiva, exigindo a comprovação de dolo ou culpa do empregador. A análise do processo 0000171-93.2023.5.21.0016, julgado pela 1ª Turma, evidenciou esse entendimento, com destaque para a rejeição da responsabilidade objetiva mesmo diante de divergência registrada em voto vencido.
Quanto às doenças ocupacionais, embora o processo 0000759-33.2023.5.21.0006 tenha inicialmente reconhecido o nexo causal e a responsabilidade da empresa em primeira instância, a 2ª Turma reformou a decisão, afastando o dever de indenizar diante da ausência de prova técnica conclusiva e atribuindo maior peso à perícia judicial anterior que negava o vínculo entre a enfermidade e o labor. Tal posicionamento reforça a exigência de prova robusta do nexo causal para o reconhecimento da responsabilidade civil no âmbito trabalhista.
Diante dos dados analisados, pode-se concluir que o TRT da 21ª Região adota uma postura cautelosa e técnica na análise da responsabilidade civil do empregador, respeitando os limites da legislação vigente e da prova dos autos, o que reforça a importância de instruções processuais bem estruturadas e amparadas por elementos técnicos consistentes.
5. Agradecimentos
Agradeço à minha família — Cláudio, Lourdes e Ysabelly — e à minha companheira, Klycia, por serem meus maiores incentivadores, sempre presentes e firmes no apoio à minha jornada acadêmica.
Aos antigos colegas da Guarda Legislativa, em especial Claudino, Nicole e Raphael, pela convivência e pelos aprendizados compartilhados.
Aos atuais colegas da 13ª Vara do Trabalho de Natal, pela oportunidade de conhecer de perto a atuação do Judiciário Federal, experiência que tanto contribuiu para minha formação.
Por fim, agradeço aos amigos Alisson, Dennis, Elion, Matheus, Thales, Rodrigo e Wallysson, pelo companheirismo ao longo do caminho.
1 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(…)
III – a dignidade da pessoa humana;
2 SMARTLAB (ed.). Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho. [S. l.], 2022. Disponível em: https://smartlabbr.org/sst/. Acesso em: 14 mar. 2025.
3 Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048compilado.htm. Acessado em 23/03/2025.
4 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). OMS declara fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à COVID-19. [S. l.], 5 maio 2023. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saude-publica-importancia-internacional-referente. Acesso em: 2 abr. 2025.
5 “acidente”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008-2025, https://dicionario.priberam.org/acidente. Acesso em: 2 abr. 2025.
6 BRASIL. Justiça do Trabalho (21ª Região). Sentença na Reclamatória Trabalhista nº 0000171-93.2023.5.21.0016. Reclamante: Hatson Fagner de Souza Araujo. Reclamadas: Prochnow Montagem e Manutenção Industrial LTDA e ICAVI Indústria de Caldeiras Vale do Itajaí S/A. Juíza: Maria Rita Manzarra de Moura Garcia. Assú, RN, 11 set. 2023. Disponível em: https://pje.trt21.jus.br/pjekz/validacao/23090809324384900000018325147?instancia=1. Acesso em: 2 abr. 2025.
7 “O foco da responsabilidade civil é a vítima (e não o autor do dano) e a reparação do dano estaria a cargo de toda a coletividade, dando ensejo a socialização dos riscos, com o intuito de que o lesado não deixe de merecer sua justa reparação.” Disponível em https://portal.stf.jus.br/jurisprudencia/tesauro/pesquisa.asp?pesquisaLivre=TEORIA%20DO%20RISCO. Acesso em 02 abr. 2025
8 BRASIL. Justiça do Trabalho (21. Região). 2ª Vara do Trabalho de Natal. Sentença no processo nº 0000707-49.2023.5.21.0002, de 20 de novembro de 2023. Juiz do Trabalho: Fábio Bezerra de Araújo. Disponível em: https://pje.trt21.jus.br/consultaprocessual/detalhe-processo/0000707-49.2023.5.21.0002/2#4d68ab3. Acesso em: 09/04/2025.
9 Ibidem.
10 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região. 9ª Vara do Trabalho de Natal. Sentença no processo 0000759-33.2023.5.21.0006. Reclamante: E. de M. C. R.. Reclamada: G. C. S/A. Sentença proferida pela Juíza do Trabalho Lygia Maria de Godoy Batista Cavalcanti em 26 mar. 2024. Disponível em: https://pje.trt21.jus.br/pjekz/validacao/26032615210600000000000000000?instancia=1. Acesso em: 16 abr. 2025.
11 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região. Segunda Turma. Acórdão no processo 0000759-33.2023.5.21.0006. Relator: Des. José Barbosa Filho. Natal, 12 jun. 2024.
12 TST-Ag-AIRR – 2236-41.2015.5.02.0058, 7a Turma, Relator: Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 09/02/2022
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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