THE RELEVANCE OF THE SOCIAL WORKER IN THE ANALYSIS OF THE CONTINUED PROVISION BENEFIT (BPC/LOAS) TO PERSONS WITH DISABILITIES WITH THE NATIONAL INSTITUTE OF SOCIAL INSURANCE
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202409291311
Valdivan Conceição da Silva2
Dorielton Pereira Xavier3
RESUMO:
Esta pesquisa consiste em discutir a real importância do profissional assistente social quando da análise da concessão do benefício de prestação continuada realizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social. Para tanto, aborda-se inicialmente a temática do benefício em questão, seus conceitos, requisitos e procedimento de avalição da deficiência, feito pela avaliação social e perícia médica. O entendimento do instrumental de avaliação da deficiência, demonstra o avanço que a inclusão do serviço social trouxe para o processo de concessão. Porém, deixa claro que melhorias precisam ser buscadas para uma justa garantias de direitos da população em vulnerabilidade. O estudo foi realizado por intermédio de levantamento bibliográfico e documental, acerca de livros, dissertações e artigos científicos com abordagem em torno do tema analisado, com o intuito de construir um arcabouço teórico bem fundamentado. Em suma, foi concluído que a presença do assistente social nas etapas de avaliação para a concessão do amparo social é fundamental, embora necessite de reformas no instrumental de avaliação utilizado pela autarquia previdenciária, para consecução do direito de seguridade social estampado no ordenamento brasileiro.
Palavras–Chave: Benefício de prestação continuada. Avaliação da deficiência. Assistente social. Avaliação social.
ABSTRACT:
This research consists of discussing the real importance of professional social workers when analyzing the granting of continuous provision benefits carried out by the National Social Security Institute. To this end, the theme of the benefit in question is initially addressed, its concepts, requirements and disability assessment procedure, carried out by social assessment and medical expertise. Understanding the disability assessment tool demonstrates the progress that the inclusion of social services has brought to the concession process. However, it makes it clear that improvements need to be sought to fairly guarantee the rights of the vulnerable population. The study was carried out through a bibliographic and documentary survey, about books, dissertations and scientific articles with an approach around the analyzed topic, with the aim of building a well- founded theoretical framework. In short, it was concluded that the presence of the social worker in the evaluation stages for granting social support is fundamental, although it requires reforms in the evaluation tools used by the social security authority, to achieve the right to social security established in the Brazilian system.
Keywords: Continuous provision benefit. Disability assessment. Social worker. Social assessment.
1 INTRODUÇÃO
A defesa das políticas de Proteção Social, sobretudo no campo da Seguridade Social, tem norteado a atuação do profissional do Serviço Social, especialmente a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, que dentre tantos acertos, instituiu politicamente a assistência social. Neste sentido, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) foi criada para organizar este direito da seguridade social e instituiu o pagamento de benefícios assistenciais. No conjunto de amparos estabelecidos tem-se o Benefício de Prestação Continuada (BPC), objeto do presente estudo.
O BPC é um benefício assistencial, de cunho individual e não vitalício, que se caracteriza pela disponibilidade de um salário mínimo, garantido às pessoas com deficiência e aos idosos com 65 anos ou mais, que cumprirem os requisitos: renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo e inscrição no Cadastro Único (CadÚnico). No que diz respeito ao BPC destinado à pessoa com deficiência, precisa ainda comprovar a deficiência por meio de avaliação social e perícia médica no INSS.
Desta forma, a inserção da avaliação social na análise da deficiência para a concessão/indeferimento do BPC é recente e representa uma conquista para o Serviço Social, assim como para o requerente ao benefício assistencial, que passou a ter seu pedido baseado na Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF, que traz uma abordagem mais completa e justa, pois é biopsicossocial, para além da análise meramente biológica, como era realizada anteriormente, com viés apenas na CID.
Com isso, a pesquisa realizada busca respostas para a problemática da importância do profissional assistente social na concessão do BPC destinada a pessoa com deficiência, tendo em vista que uma das etapas do processo é a avaliação social, que visa analisar aspectos ambientais, sociais e pessoais do autor. Para isso, objetiva-se assimilar com mais detalhes o benefício em si, compreender as transformações na avaliação da deficiência a partir do novo modelo adotado e verificar a relevância para o Serviço Social.
A fim de construir um conjunto teórico para responder as indagações que permeiam o presente estudo, foi utilizado o método de pesquisa dedutivo, partindo do fenômeno geral para atingir o mais específico. Para tal propósito, contou-se com pesquisa bibliográfica e documental, realizado levantamento em livros, dissertações, artigos científicos, legislações e portarias vigentes.
Assim, apesar de algumas incongruências que ainda rondam a presença do assistente social na avaliação da deficiência para a concessão do BPC, a pesquisa demonstra a imprescindibilidade desse profissional para a análise, pois o Serviço Social tem atribuição necessária para lutar pela defesa das políticas de Proteção Social neste campo da Seguridade Social, sobretudo, na garantia de direitos das pessoas com deficiência. Pois as barreias enfrentadas por esta população não é apenas física, mas é, também, atitudinal como preconceitos e discriminações.
2 O BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA: CONCEITO E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) caracteriza-se como um benefício individual, intransferível e não vitalício, que garante uma renda básica (um salário mínimo), destinadas às pessoas com deficiência e aos idosos com 65 anos ou mais, que cumprirem critérios de renda com previsão em Lei. O BPC também integra a Proteção Social Básica trazido pelo Sistema Único de Assistência (SUAS). O presente trabalho tem foco no âmbito da pessoa com deficiência.
O benefício em questão foi estabelecido pela Constituição Federal de 1988, no artigo 203, que traz disposição quanto ao direito social da assistência social, que será prestada a quem necessitar, independente de contribuição e, especificamente, sobre o BPC, o inciso V do referido artigo tem como objetivo: “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei” (BRASIL, 1988). Isto é, o BPC tem base constitucional.
A regulamentação legal veio com a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei nº 8.742/1993), dispondo de todos os requisitos para o enquadramento da pessoa que necessita do benefício. Neste sentido, vários dispositivos legais e administrativos foram editados para a melhor implementação do BPC. É o caso do Plano Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), que prevê no item Proteção Social Básica o desenvolvimento de diversos serviços, programas e projetos que beneficiam a pessoa que está em situação de vulnerabilidade social, com inclusão das pessoas com deficiência nas ações ofertadas.
O seguinte trecho do PNAS (2004, p. 34) traduz de forma clara a importância dessa política para a própria assistência social no país:
Tal direito à renda se constituiu como efetiva provisão que traduziu o princípio da certeza na assistência social, como política não contributiva de responsabilidade do Estado. Trata-se de prestação direta de competência do Governo Federal, presente em todos os Municípios.
Na lição de Simões (2014), o órgão responsável pelo pagamento do benefício é a União Federal, por meio do Ministério da Cidadania e o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS). Por outro lado, a operacionalização é realizada pelo INSS, isto é, o requerimento, a concessão, a manutenção e a revisão, bem como a avaliação da deficiência – objeto do presente estudo -, conforme consta no Guia para Técnicos e Gestores da Assistência Social / Ministério da Cidadania de 2022.
Assim, os requisitos para a concessão do BPC, com base no Portal Gov.br do Governo Federal e Decreto nº 6.214/2007 (que regulamenta o benefício) são: pessoa idosa, com idade de 65 (sessenta e cinco) anos ou mais; ou pessoa com deficiência, de qualquer idade; renda por pessoa do grupo familiar igual ou menor que ¼ do salário mínimo; não cumulação com outro benefício da seguridade social (exemplo: seguro desemprego, aposentadoria ou pensão); e, inscrição no Cadastro Único (CadÚnico), geralmente, realizado no Centro de Referência da Assistência Social (CRAS).
É neste cenário que a pessoa com deficiência, que se enquadra nos requisitos fixados pela LOAS e demais instrumentos legislativos, vai buscar o auxílio do Estado, para ter resguardado o seu direito social, ou seja, a assistência social.
Ademais, o Estatuto da pessoa com deficiência (Lei 13.146/2015) consagra como objetivos dos serviços e programas da política pública da assistência social à pessoa com deficiência a garantia da segurança de renda, a acolhida, o desenvolvimento da autonomia, entre outros, para a promoção do acesso a direitos e a participação social plena. Pode-se firmar o entendimento de que o acesso ao BPC proporciona a consecução desses objetivos (BRASIL, 2015).
É imperiosa a advertência de Freire (2015) de que o processo de concessão do BPC para à pessoa com deficiência é mais complexo, uma vez que, é necessário comprovar a deficiência, bem como a forma em que essa condição traz consequências para o convívio social. Por conseguinte, o requerente PCD passará por mais fases que o idoso para garantir o direito à renda.
2.1 O BPC para a pessoa com deficiência e a avaliação da deficiência
Uma singularidade do BPC a pessoa com deficiência em relação ao PBC idoso, é que além do critério de renda, deve ser realizada a avaliação da deficiência e do grau de impedimento por meio da avaliação social e avaliação médica, para posterior concessão ou indeferimento do pedido assistencial.
No que tange a deficiência, a LOAS dispõe no art. 20, §2º, que para fins de concessão do BPC é considerado como pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo. O impedimento, segundo o parágrafo 10°, art. 20 da LOAS, para caracterizar como deficiência, precisa produzir efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos. Veja-se o parágrafo 2° do mencionado artigo, que traz lições valiosas para a temática:
§2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Portanto, quando se trata de requerimento de benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência, o requerente será submetido a duas avaliações para conferir o enquadramento como deficiente. Aqui tem-se a soma da avaliação médica (realizada por médico perito federal), mais a avaliação social (realizada por assistente social do INSS). Para a concessão do benefício, os indicadores de ambas as avaliações devem sinalizar pela deficiência, caso contrário, o pedido será indeferido.
Atualmente vigora esse modelo de avaliação, social e médica, mas até pouco tempo atrás a concessão do benefício era pautada apenas pela perícia médica. Freire (2015) sinaliza que as perícias médicas examinavam somente se a pessoa tinha incapacidade para o trabalho, sem observar a efetiva participação do avaliado na sociedade.
Desta forma, o novo e atual modelo de avaliação da deficiência para a concessão do direito assistencial a renda foi configurado com a edição do Decreto nº 6.214/2007 – 14 anos após a LOAS dispor sobre o BPC. Este decreto trouxe uma mudança substancial, pois estabeleceu em seu art. 16 que a avaliação da deficiência e do grau de impedimento tomará como base a Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF (BRASIL, 2007).
2.2 Novo modelo de avaliação da deficiência
É de suma importância para a pesquisa em questão que seja feita uma abordagem sobre o novo modelo de avaliação da deficiência e a consequente análise do benefício. Segundo Freire (2015), foi a partir do Decreto nº 6.214/2007 que a avaliação da deficiência passou a contar com a avaliação social, além da perícia médica, já consolidada. Foi, precisamente, a partir de junho de 2009 que o requerente do BPC passou a ser avaliado por um assistente social do INSS e pelo perito médico, nesta ordem.
Neste sentido, anteriormente, a avaliação da deficiência era feita apenas pela avaliação médica, com uma abordagem focada no impedimento laboral e nos aspectos puramente biológicos. Para isso, era utilizado apenas o Código Internacional de Doenças (CID), que serve para decodificar doenças, como a própria nomenclatura deixa claro. Com o novo modelo adotado, a avaliação passou a ser baseada na CIF, em uma abordagem sob a perspectiva médica e social, mais abrangente, pois se ampara em aspectos biopsicossocial (FREIRE, 2015).
Com o intuito de trazer um conceito mais preciso, o próprio texto da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde cumpre de forma escorreita tal proposito:
A CIF pertence à “família” das classificações internacionais desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para aplicação em vários aspectos da saúde. A família de classificações internacionais da OMS proporciona um sistema para a codificação de uma ampla gama de informações sobre saúde (e.g. diagnóstico, funcionalidade e incapacidade, motivos de contacto com os serviços de saúde) e utiliza uma linguagem comum padronizada que permite a comunicação sobre saúde e cuidados de saúde em todo o mundo, entre várias disciplinas e ciências (CIF, 2004).
Sobre a aplicação da CIF, o texto da classificação expõe a ampla utilização em diferentes aplicações, como em segurança social, na avaliação da gestão dos cuidados de saúde, em inquéritos à população a nível local, nacional e internacional. No presente estudo, interessa a relevância da classificação de funcionalidades para a avaliação da deficiência no benefício assistencial.
Sedimentando o valor da nova classificação adotada dentro da estrutura da política pública de assistência social, Nogueira (2011, p. 41) discorre que com a CIF a deficiência deixa de ser tratada como consequência da doença e passa a ser vista como questão de saúde, em uma abordagem integrativa dos modelos médicos e sociais. Por conseguinte, os critérios de definição da pessoa com deficiência foram alterados quando da análise do BPC.
Com a CIF, os profissionais assistentes sociais puderam contar com um instrumento próprio para a avaliação social, que contempla informações como: condições de moradia; acesso a serviços e políticas públicas; apoio e proteção da família; possibilidade de participação na vida comunitária, social e cívica; entre tantas outras, que contribui para a garantia da justiça social exigida pelo Proteção Social Básica em que o BPC está inserido (NOGUEIRA, 2011, p. 14).
Deste modo, a avaliação social realizada pelo profissional do serviço social do INSS leva em consideração três fatores: ambientais, sociais e pessoais do requerente do BPC, com base no Guia para Técnicos e Gestores da Assistência Social / Ministério da Cidadania de 2022 e leis relativas ao auxílio assistencial.
2.3 A relevância do assistente social na análise do BPC à pessoa com deficiência
Para adentrar no cerne do estudo aqui proposto, é salutar que antes seja explorado o instrumental da avaliação da deficiência para a concessão ou indeferimento do amparo social. Desse modo, desde antes da edição do Decreto nº 6.214/2007, que marcou este novo modelo de avaliação da deficiência, conforme já mencionado, é discutido o caminho mais apropriado para uma justa análise do BPC. Logo, a Portaria Conjunta MDS/INSS n° 01 de 2009 foi o responsável por instituir a primeira versão dos instrumentos de avaliação social e perícia médica da deficiência e incapacidade para acesso ao BPC/LOAS (FREIRE, 2015).
No entanto, com a evolução do modelo de avaliação, a fim de aprimorar a análise, foi editada a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 01, de 2011 e, subsequente, a Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015, que substituíram a antiga portaria de 2009, implementando os critérios de concessão trazendo um novo instrumento de avaliação em seus anexos I e II.
Nessa continuidade, de acordo com Nogueira (2011, p. 42), o instrumento de avaliação social tem como fim guiar o profissional assistente social na emissão da sua opinião sobre as barreiras que existem e que geram dificuldades para a atividade e participação da pessoa avaliada na sociedade. Para isso, é realizada uma entrevista com o requerente de forma individualizada, garantindo subsídios para o estudo social do profissional por intermédio da análise dos fatores pessoais, ambientais e sociais, que causam impacto na funcionalidade e incapacidade, como preconiza o §2º, do art. 16 do Decreto 6.214/2007.
Para entender a relevância do profissional da assistência social na concessão do BPC, é mister compreender como é constituída a avaliação da pessoa com deficiência pelo INSS. O art. 2° da Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015, versa que é baseada na CIF, composta pelos componentes: fatores ambientais; funções e estruturas do corpo; e, atividades e participação.
Interessa ainda o art. 3° da referida portaria, pois traz a utilização e a finalidade dos instrumentos para a avaliação da pessoa com deficiência, veja-se:
Art. 3º Os instrumentos para avaliação da pessoa com deficiência destinam-se à utilização pelo Assistente Social e pelo Perito Médico, do quadro do INSS, com a finalidade de qualificar as barreiras enfrentadas, as alterações de funções e/ou Estruturas do Corpo, as limitações de atividades e restrições à participação social, em igualdade de condições com as demais pessoas.
Com isso, cabe ao assistente social do INSS a competência de avaliar e qualificar os componentes e domínios: fatores ambientais e atividades e participação. Ao perito médico previdenciário, fica a competência: funções do corpo e, também, atividades e participação, com domínios diversos daqueles da avaliação social, conforme art. 5° da portaria referida.
O presente estudo tem uma perspectiva voltada para a parte da avaliação social. No entanto, reitera que a avaliação da deficiência é realizada por meio das duas avaliações mencionadas.
Assim, cada componente da Avalição Social (fatores ambientais e atividades e participação) abarca alguns domínios distribuídos em níveis que levam em consideração o indivíduo ou a sua relação com a sociedade. E o instrumental vai além, pois cada domínio é subdividido em qualificadores que recebem nota em uma escala de 0 a 4, representando os indicadores: nenhum, leve, moderada, grave e completa (NOGUEIRA, 2011, p. 43).
Nesta subdivisão das competências do instrumental de avaliação, os fatores ambientais têm como qualificadores a presença de obstáculos enfrentados pelo avaliado e recebe a nomenclatura de “Barreira”. Por seu turno, os fatores atividade e participação, o qualificador é chamado de “Dificuldade”. Já o componente da avaliação médica, funções do corpo, recebe o nome de “Alteração”.
Diante dessa vasta análise realizada pelos profissionais (assistente social e médico pericial) preenchendo os campos correspondentes aos seus componentes dispostos no instrumental de avaliação, ao final da avaliação médica – que em regra deve ser realizada após a avaliação social -, o sistema da autarquia previdenciária conclui o laudo, através de uma Tabela de Combinações. Essa tabela faz a somatória dos resultados dos três componentes da avalição e culmina com o resultado e a decisão da avaliação que pode ser de deferimento ou indeferimento. A figura a seguir mostra como o modelo funciona no próprio instrumental:
Figura 1 – Parte da tabela de Conclusão da Avaliação Social e Médico-Pericial da pessoa com deficiência da Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015
Fonte: Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015
Esse é, portanto, o procedimento para a realização da avalição da deficiência e incapacidade dos requerentes do Benefício de Prestação Continuada – BPC. É relativamente esse modelo adotado, e como foi explanado, está continuamente passando por aprimoramento, um exemplo é a instituição do Grupo de Trabalho para Acompanhamento, Monitoramento e Aprimoramento da Avaliação da Deficiência e do Grau de Incapacidade – GMADI, composto por assistentes sociais, médicos-peritos, gestores e técnicos do MDS e INSS, que tem o objetivo de fazer um estudo aprofundado sobre a temática para desenvolver a melhor forma de avaliação da deficiência e incapacidade (NOGUEIRA, 2011, p. 43).
De tudo que já foi exposto, torna-se evidente que a inclusão do assistente social na análise do benefício em comento é de grande valia. Como imagem deste fato, têm-se o primeiro concurso federal do INSS, em 2009, para preenchimento das vagas para o profissional do serviço social, que contou com 900 vagas para lotação nas Agências da Previdência Social de todo o país, para fiel comprimento da norma legislativa que estabeleceu a presença deste profissional quando da análise dos requisitos para a sua concessão.
De acordo com o Portal Gov.br do Governo Federal, atualmente, o INSS conta com 1.400 assistentes sociais distribuídos pelo Brasil, prestando serviços diariamente e, a principal atribuição é o atendimento aos requerentes do BPC. É inegável que a inserção do assistente social no INSS expandiu o campo de atuação do profissional, em uma seara tão importante e necessária, quando se trata de um benefício assistencial. Sem sombra de dúvidas, o melhor especialista para figurar nesta função é o assistente social capacitado. Tal conquista é a soma de muitos esforços, como pode ser entendido pelo fragmento do artigo do Conjunto Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS) (2010):
A luta em defesa do Serviço Social na Previdência Social não é recente e se vincula à garantia de um espaço de trabalho profissional comprometido com a defesa dos direitos sociais, com a efetivação da seguridade social pública e de qualidade, consonante com a direção do projeto ético-político do Serviço Social brasileiro.
Imperiosas também as lições de Ademir Alves da Silva (2010), no mesmo sentido, afirmando que “a inserção do Serviço Social no campo da defesa das políticas de Proteção Social e particularmente no âmbito da Seguridade Social brasileira, tem sido uma característica do desempenho dessa profissão nos anos recentes, no Brasil.” (SILVA, 2010, p. 19).
A despeito de tal conquista do serviço social na análise da concessão do benefício assistencial, ainda há uma prevalência (maior força) na avaliação médica, no que representa os saberes biomédicos, em relação aos aspectos avaliados pelo serviço social. Essa característica reflete o formato antigo que vigorou antes da introdução do modelo social, que veio para se somar ao âmbito biológico prestando o serviço de melhorar as condições de vida da população de pessoas com deficiência.
Na visão de Karla Emanuelle Rocha Nogueira, assistente social do INSS, expressa em sua dissertação de mestrado, esse novo procedimento está adequado para que o benefício seja indeferido quando os impedimentos receberem classificação como de curto ou médio prazo. O que desconsidera o grau de incapacidade previamente observado na avaliação, inclusive na avaliação social (NOGUEIRA, 2011, p. 44).
Observando a Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015, no Anexo III, que traz os conceitos e critérios das avaliações social e médico-pericial, têm-se o conceito de impedimentos que são problemas nas funções ou nas estruturas do corpo, tais como, um desvio significativo ou uma perda e são tratados no instrumento de avaliação como “alterações de funções e/ou estrutura do corpo”, isto é, aspectos da avaliação feita pela perícia médica, o que corrobora o entendimento de Nogueira, acima exposto.
Em um estudo realizado pela Evidência Express (EvEx), uma iniciativa da Diretoria de Altos Estudos da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), tendo como base as diretrizes da Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015 (BRASIL, 2015) e os dados do Sistema Integrado de Benefícios – SIBE BPC/LOAS, foi analisado o impacto teórico e empírico de cada um dos qualificadores de deficiência, definidos como “Fatores Ambientais”, “Atividades e Participação” e “Funções do Corpo”. Neste estudo detalhado, foi possível verificar uma preponderância da avalição médico-pericial, evidenciando que existe espaço para divergências relativas à importância das duas avaliações para a concessão do BPC.
O referido estudo buscou explicar justamente o quanto da decisão de concessão ou indeferimento depende das informações coletadas na avaliação social e médica, para responder se o perito médico tem mais força na aprovação do benefício. E o resultado da pesquisa aponta o seguinte:
Nossos resultados indicam que, segundo a Tabela Conclusiva de Qualificadores (TCQ), as regras que definem a concessão do benefício atribuem, a priori, uma importância praticamente nula aos “Fatores Ambientais” e uma importância idêntica a “Atividades e Participação” e “Funções do Corpo”. Nossos resultados mostram que, apesar de o instrumento de avaliação do BPC ser multidisciplinar, a regra de concessão é potencialmente mais dependente dos produtos da avaliação médica do que da avaliação social. Um aumento completo na pontuação definida pela avaliador médico (18.7 p.p.) levaria a uma probabilidade de concessão do benefício quase três vezes maior do que um aumento nas pontuações definidas na avaliador social (6.1 p.p.). (EvEx/ENAP, 2021, p.6)
Neste sentido, essa “prevalência” da avaliação médica em relação a social, resulta da aplicação do atual instrumento de avaliação da deficiência, que, embora tenha avançado quando passou a ser baseado na CIF, privilegiando aspectos biopsicossociais, ainda há uma tendência a dar maior valor a perspectiva médica.
Para além desta incongruência em níveis médico e assistência social, o instrumental utilizado para o acesso a esta política social de proteção básica, apresenta outras limitações. Como é o caso de requerentes com impedimentos classificados como “leves” ou “moderados” pela perícia médica, mas que enfrentam enormes barreiras de inclusão no mercado de trabalho decorrentes de domínios que somente podem ser avaliados pelo assistente social, tais como o domínio atitudes, que classifica situações de preconceito, estigma, estereótipos e discriminação. Essas barreiras são obstruções que o impedem de participar de forma plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, o que caracteriza a deficiência nos termos do art. 2º da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Portanto, é inegável a relevância do assistente social na análise do BPC à pessoa com deficiência. A partir do novo modelo adotado para a avaliação da deficiência, é imprescindível a presença do profissional do serviço social para examinar barreiras e dificuldades da pessoa com deficiência. Há que se frisar que o objetivo da CIF, bem referido neste estudo, é entender a funcionalidade do ser humano e as suas restrições e aplicar tais informações em políticas sociais.
3 METODOLOGIA
A metodologia é o conjunto de procedimentos utilizados para o desenvolvimento da pesquisa, visando aperfeiçoar o conhecimento acerca de determinado tema. A ciência opera com métodos científicos. O método de abordagem utilizado neste trabalho foi o dedutivo, que parte de teorias gerais para fenômenos específicos.
Neste sentido, realizou-se pesquisa bibliográfica e documental, que segundo Gil (2002, p. 44) é aquela que já foi desenvolvida e está presente em materiais elaborados. É, portanto, uma investigação do tema abordado no estudo, por meio de livros, monografias, dissertações, artigos científicos, legislação e portarias vigentes.
Cabe frisar também que a pesquisa foi exploratória e explicativa. A primeira tem “como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições”, conforme Gil (2002, p. 41). Já a segunda, cuida da identificação das causas que determinam ou contribuem para que os fenômenos ocorram (GIL, 2002, p. 42).
Quantos às fontes utilizadas, recorreu-se aos autores: Karla Emanuelle Rocha Nogueira, Carlos Simões, Ademir Alves da Silva e Samara Freire. O estudo foi permeado ainda por excelentes documentos governamentais do Ministério da Cidadania, CFESS, ENAP e ONU, além da necessária legislação pertinente ao benefício assistencial.
Com esta gama de material consultado, foi possível alcançar os objetivos pretendidos e formatar um trabalho consistente em face da contemporaneidade do assunto abordado, por meio de seleção, leitura, cotejamento de posições sobre as teorias e buscas na internet, com subsequente escrita e confecção do texto da pesquisa, demonstrando a relevância do assistente social inserido no processo de concessão do benefício de prestação continuada.
4 CONCLUSÃO
Tendo como objetivo o estudo da relevância do assistente social na análise da avaliação do benefício de prestação continuada destinada a pessoa com deficiência, o presente trabalho representa um importante instrumento de conhecimento acerca desse benefício da Política de Assistência Social, que integra a Proteção Social Básica no âmbito do SUAS, pautado na defesa de direitos das pessoas em vulnerabilidade social, como é o caso das pessoas com deficiência.
A partir da adoção do novo modelo de avaliação da deficiência, foi introduzido o profissional do Serviço Social na chamada avaliação social, somando-se a já tradicional perícia médica. Disso decorre a contemporaneidade do tema, pois a análise do benefício passou a ser baseada na Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde, isto é, fazendo uma abordagem mais ampla, sob a perspectiva médica e social, amparada no aspecto biopsicossocial.
Sendo assim, a inclusão por si só representa uma conquista para os assistentes sociais, que viram sua atuação profissional ganhar força em uma seara tão importante da Seguridade Social, de forma prática com a criação e preenchimento de cargos públicos nas Agencias da Previdência Social, cuja atuação é predominante no atendimento aos requerentes do BPC.
A discussão proposta foi salutar para compreender que o atual instrumento de avaliação da deficiência, instituído pela Portaria Conjunta MDS/INSS nº2, de 30 de março de 2015, foi construído de uma forma que privilegia a avalição médico-pericial, sendo potencialmente mais dependente dos produtos dessa avalição. Nesta senda, como proposta, tem-se a necessidade de reformular o instrumental para garantir que domínios como “atitudes” tenham maior relevância, uma vez que classifica situações de preconceito e discriminações, representando entraves para a plena participação da pessoa com deficiência na sociedade em igualdade de condições com os demais.
Desse modo, o estudo sobre a relevância do assistente social no benefício assistencial é, acima tudo, para mostrar o acerto dos envolvidos em incluir a avaliação social nessa análise. Embora exista um horizonte para se conquistar no que diz respeito ao ideal de avaliação da deficiência no Brasil, é notório que avanços foram alcançados, fruto de muitas lutas de uma classe trabalhista, que almeja incessantemente a defesa e promoção de direitos sociais. Depreende-se daí, os alcances dos objetivos proposto com esta pesquisa, mostrando que sim, é extremamente fundamental o profissional da assistência neste complexo processo.
Mais do que se questionar sobre o papel do assistente social na análise em comento, deve- se questionar o formato do instrumental utilizado e suas prevalências pela avaliação médica, isto é, o maior peso dado a abordagem médica. As duas avaliações são importantes e ambas refletem na vida da pessoa que busca o benefício de prestação continuada junto ao INSS. O que se requer é a igualdade de forças atribuídas a perspectiva médica e social, para uma justa garantia de direitos preconizados por grandes instrumentos jurídicos e sociais pátrios.
REFERÊNCIAS
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. Lei Nº 13.146, de 06 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Brasília, 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm Acesso em: 03 mai. 2024.
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1 Artigo apresentado ao Curso de Bacharelado em Serviço Social do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/Unisulma.
2 Acadêmico do curso de Bacharelado em Serviço Social do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/Unisulma. E-mail: silvavaldivan@gmail.com
3 Professor Orientador. Especialista em Docência do Ensino Superior. E-mail: dorielton.pereira@unisulma.edu.br