A RELEVÂNCIA DA INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202505311210


Linda Ester Pimentel Ramos Mendes
Luciana Pires da Silva
Fabiola Burock Venturi de Abreu
Patricia da Rosa Guimarães
Luciano da Silva


RESUMO-  O presente artigo tem por objetivo apresentar a reflexão sobre o transtorno espectro autista em crianças nas escolas de Educação Infantil, enfatizando a relevância da inclusão de crianças autistas no ambiente escolar e a capacitação do professor para lidar com essa síndrome. Neste estudo bibliográfico, percebeu-se a necessidade de a escola, os pais e os professores estarem preparados para receberem essas crianças em um ambiente acolhedor, de aprendizagem e sociabilidade. Portanto, quando a questão é desenvolver uma criança com autismo, é propício para a escola que esteja aberta ao campo das ideias e as metodologias aplicadas devem ser adequadas, dinâmicas e bem planejadas para melhor favorecer o bom desenvolvimento da criança, considerando a necessidade e  a importância da independência na perspectiva da autonomia necessária desta criança autista que possui para o enfrentamento de suas dificuldades com socialismo e verbalização diante de todas as ações rotineiras de comunicação. Resultados obtidos ressaltam que para mudar os hábitos e comportamentos das pessoas que lidam com crianças autistas, tais como colaboradores da escola, professores, familiares e a própria sociedade, é necessário a formação permanente acerca, desses distúrbios, capaz de romper com os tabus e preconceitos existentes e uma boa orientação psicopedagógica com o intuito de que ofereçam a estas crianças qualidade de vida e bem estar, e que este pensamento e filosofia esteja sendo multiplicado para toda a família e sociedade.

Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Inclusão. Educação Infantil. Qualidade de Vida.

1. INTRODUÇÃO

A atuação docente no processo de ensino-aprendizagem assume papel determinante, especialmente diante das demandas cada vez mais complexas da educação inclusiva. A escolha por investigar esse campo parte da compreensão de que, para responder aos desafios e às diversas propostas que emergem em todo o país, é essencial investir na constante atualização dos educadores e na ampliação de saberes específicos. Este tema não apenas dialoga com o universo acadêmico, como também reverbera de forma significativa na sociedade, ao contribuir para uma prática educativa mais inclusiva, sensível e comprometida com o desenvolvimento integral de todas as crianças.

Esta pesquisa tem por finalidade compreender como se estabelecem e se ressignificam as interações entre professores e estudantes no contexto do Atendimento Educacional Especializado (AEE), com foco no potencial de tais interações para favorecer a aprendizagem de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ressalta-se que essa potencialização depende, em grande medida, da formação docente, tanto inicial quanto continuada, voltada à inclusão. Ao refletir sobre a presença de crianças autistas na Educação Infantil, busca-se evidenciar a importância de práticas pedagógicas que não apenas promovam a socialização, mas também assegurem estratégias de ensino que contribuam para a autonomia e para o fortalecimento das habilidades psicossociais desses alunos.

A pesquisa propõe-se, ainda, a refletir sobre o impacto que a formação e qualificação dos profissionais da educação exercem sobre o cotidiano escolar de crianças autistas, abordando, nesse percurso, os fundamentos da psicopedagogia inclusiva e as metodologias que favorecem o reconhecimento e o desenvolvimento das potencialidades de cada criança. Reconhece-se que, no contexto da Educação Infantil, algumas crianças com TEA tendem a construir formas próprias de se relacionar com o ambiente e os colegas, o que pode levar ao isolamento ou até a comportamentos de resistência frente às propostas escolares, desafiando a mediação pedagógica.

Diante dessas particularidades, a questão norteadora do estudo emerge de forma contundente: de que maneira é possível promover uma inclusão significativa e respeitosa de crianças autistas nas escolas de Educação Infantil? Espera-se, com este trabalho, oferecer subsídios teóricos e metodológicos que contribuam com pais, educadores, psicólogos e demais profissionais envolvidos, a fim de fortalecer práticas que assegurem às crianças com autismo uma educação sensível às suas necessidades, promotora de desenvolvimento, inclusão social e maior autonomia futura.

2. INCLUSÃO ESCOLAR

É fundamental que os professores tenham acesso a informações sobre o diagnóstico e o prognóstico dos estudantes com necessidades educacionais especiais. Nesse sentido, conforme destaca Maciel (2000), é recomendável que a escola estabeleça um diálogo direto com os pais ou responsáveis, de modo a compreender a trajetória de vida da criança e construir, em conjunto, estratégias pedagógicas que favoreçam o desenvolvimento integral. A articulação entre escola e família, aliada à orientação de profissionais como fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos e médicos que acompanham o estudante, contribui para o planejamento de práticas mais adequadas e eficazes.

A relação entre o docente e o aluno constitui um dos pilares da inclusão escolar. Quando pautada na empatia e livre de preconceitos, essa relação possibilita que o aluno com deficiência se desenvolva plenamente. Entretanto, como observa Maciel (2000), o convívio entre os próprios estudantes pode evidenciar resistências, preconceitos e dificuldades de aceitação. Assim, torna-se essencial que todos os alunos recebam orientações sobre a convivência com a diversidade e sobre como respeitar as diferenças.

Para Budel e Meier (2012), o conceito de inclusão ultrapassa a simples inserção da criança com deficiência na sala regular. Trata-se de assegurar que ela se perceba como parte integrante daquele espaço, sentindo-se pertencente e acolhida. A inclusão, portanto, exige um planejamento escolar que atenda a todos, visando não apenas o acesso, mas o sucesso educacional. Segundo os mesmos autores, é necessário refletir sobre os conceitos de integração e aceitação. Integrar significa estar envolvido em um todo, participando ativamente dele. Dessa forma, a inclusão só é efetiva quando promove pertencimento e reconhecimento das singularidades dos alunos.

Ainda segundo Budel e Meier (2012), a educação deve ser compreendida em seu sentido mais amplo, indo além da simples transmissão de conteúdos. Ela deve fomentar o pensamento crítico, a construção de novas formas de ver o mundo e o desenvolvimento de mentalidades que favoreçam a autonomia e o respeito mútuo. A formação escolar precisa estimular a descoberta de capacidades, o exercício da cidadania e a convivência democrática.

No Brasil, o direito ao ensino fundamental foi reconhecido em 1934, durante as reformas da Era Vargas, o que impulsionou a criação de novas legislações e resultou em melhorias significativas na qualidade de vida da população. Como afirma Gina Pompeu (2007), a educação deve ser entendida como um direito subjetivo fundamental. A autora argumenta que a ignorância pode ser comparada à escravidão moderna, sendo a educação o único caminho legítimo para a conquista da liberdade.

A valorização de uma educação de qualidade beneficia não apenas o indivíduo, mas também toda a sociedade. Ao ampliar as possibilidades de desenvolvimento econômico, social e cultural, o acesso ao conhecimento permite o despertar de percepções antes adormecidas por falta de estímulo, revelando que o bem coletivo deve prevalecer sobre interesses individuais.

Compreende-se, ainda, que os estudantes devem ser preparados para utilizar a linguagem de forma autônoma e consciente, combinando saberes formais com experiências culturais que os conectem ao contexto social em que vivem. Tal preparo amplia sua participação em grupos sociais e fortalece a atuação cidadã, mesmo diante do fato de que o processo de aprendizagem se estende ao longo de toda a vida.

O professor, por sua proximidade com os alunos e sua presença constante no cotidiano escolar, desempenha papel central na identificação de dificuldades, necessidades e potencialidades. Sua experiência e prática diária o habilitam a perceber nuances e propor intervenções que contribuam para a formação integral dos estudantes. Dessa forma, a maneira como o docente se comunica, a linguagem que adota e sua postura ética influenciam diretamente a dinâmica da sala de aula e a qualidade do relacionamento com os alunos.

Nesse sentido, a função do professor vai além da simples transmissão de conhecimento: ele deve mediar saberes, facilitar o aprendizado e promover a inserção ativa dos alunos na sociedade. Para tanto, é necessário que o professor assuma uma postura proativa, disposta a sair da zona de conforto e transformar o conhecimento em sabedoria aplicada à realidade.

Como aponta Veiga (2011), a metodologia de ensino consiste em um conjunto de normas e orientações que organizam o processo educativo. A autora salienta que esse conjunto visa tanto a orientação do ensino quanto do estudo, garantindo intencionalidade e sistematização às práticas pedagógicas. Nesse contexto, a metodologia atua como instrumento que direciona o processo formativo, estimulando aprendizagens significativas e duradouras.

A gestão democrática exige a compreensão em profundidade dos problemas postos pelas práticas pedagógicas. Ela visa romper com a separação entre concepção e execução, entre o pensar e o fazer, entre teoria e prática. Busca resgatar o controle do processo e do produto do trabalho pelos educadores (Veiga, p. 18, 2011).

O professor planeja um caminho a seguir para que seus objetivos sejam traçados, e para isso é fundamental elaborar algumas diretrizes, que na verdade é uma ciência a qual investiga algo, incluindo a linguagem a ser utilizada. É na ação refletida e na proporção da sua prática que o professor pode ser agente de transformações na escola e na sociedade implementando sua função social. 

Nesse sentido, como bem acentua Libâneo (2004) O ensino pode impulsionar o desenvolvimento de competências cognitivas através da construção de conceitos e do desenvolvimento do pensamento, e por que meios os alunos podem melhorar e ampliar a sua aprendizagem”. Portanto o papel do professor é extremamente importante nesse processo.  

(Pimenta, 2005) discorre que nos países mais desenvolvidos notadamente há uma preocupação latente com a formação e o desenvolvimento profissional de professores e com as inovações no campo da didática, já que estas questões podem ser debatidas com a finalidade de propor políticas públicas que favoreçam a democratização escolar e social, nas quais os professores e as escolas em suas novas lógicas de organização curricular e novas formas de gestão, garantindo melhores condições de trabalho e possibilidades de mais recursos a serem aplicados em sala de aula.

No contexto da educação brasileira, ainda se observam diversas limitações que impactam diretamente a estruturação do sistema educacional. Pimenta (2002) ressalta que a formação docente apresenta uma dissociação entre teoria e prática, o que compromete a construção de uma atuação mais crítica e fundamentada. Para a autora, a reorganização curricular exige mudanças significativas nas condições de trabalho dos professores, como a garantia de tempo e estabilidade, fatores indispensáveis para que possam desenvolver processos de reflexão e investigação sobre sua prática pedagógica.

Ademais, as formações dos professores não são suficientemente adequadas do que de condicionam a saberes práticos que “formam um conjunto de representações a partir das quais os professores interpretam, compreendem e orientam sua profissão e sua prática cotidiana em todas as suas dimensões” (Tardif, 2002, p. 4).

3. O AUTISMO NAS ESCOLAS DO BRASIL E SUA MUDANÇA DE ACORDO COM AS LEIS DA POLÍTICA NACIONAL DA EDUCAÇÃO

Ainda não há um consenso definitivo sobre a definição exata do autismo, tampouco sobre suas causas. No entanto, diversas pesquisas apontam que se trata de uma condição que compromete significativamente a capacidade de interação social, muitas vezes associada à ausência ou dificuldade de comunicação verbal. 

De acordo com Gilberg (1990, p. 112), o autismo é compreendido como “uma síndrome comportamental com etiologias múltiplas e curso de distúrbio de desenvolvimento”. Reconhece-se, portanto, que não se trata de uma doença, mas de uma síndrome, geralmente identificada por padrões de comportamento repetitivos e características específicas no desenvolvimento infantil.

O autismo é uma síndrome comportamental que engloba comprometimento nas áreas relacionadas à comunicação, quer seja verbal ou não verbal, na interpessoalidade em ações simbólicas, no comportamento geral e no distúrbio do desenvolvimento neuropsicológico (Orrú, 2011, p.30).

Uma das características marcantes do Transtorno do Espectro Autista é a dificuldade de interação social. Quando essa condição não é devidamente acolhida e trabalhada no ambiente escolar, especialmente pelos professores, podem surgir prejuízos significativos no processo de aprendizagem. Da mesma forma, caso a família não promova a participação da criança autista nas interações do cotidiano familiar, também poderão ocorrer comprometimentos nas relações sociais e interpessoais, dificultando ainda mais seu desenvolvimento integral. 

Como explica (Orrú, 2011, p. 34) sobre o autismo:

Muitas das alterações apresentadas por crianças autistas ocorrem em razão da falta de reciprocidade e compreensão na comunicação, afetando, além da parte verbal, as condutas simbólicas que dão significado às interpretações das circunstâncias socialmente vividas, dos sinais sociais e das emoções nas relações interpessoais.

O Transtorno do Espectro Autista ocorre com maior frequência em crianças do sexo masculino, sendo menos comum entre meninas. Nos casos femininos, os sinais tendem a se manifestar de maneira mais sutil e complexa, o que torna o diagnóstico mais difícil e, muitas vezes, tardio. Diferentemente da Síndrome de Down, cujas características físicas são mais evidentes e facilitam a identificação, o autismo pode não ser prontamente reconhecido, especialmente por pessoas que não possuem conhecimento sobre a condição. Pois:

Já a aparência das crianças que apresentam autismo é em geral normal. A síndrome do autismo não se manifesta por traços na aparência da pessoa e, também, não é identificada pela maioria dos exames laboratoriais. Desta forma, o diagnóstico do autismo se torna mais difícil e complexo (Orrú, 2011, 2011, p. 28). 

O processo de diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista exige o envolvimento de uma equipe multidisciplinar composta por profissionais como médicos, psicólogos educacionais, psiquiatras e neuropsiquiatras. Essa articulação é essencial para garantir uma avaliação mais precisa e abrangente. 

O autismo é identificado por uma tríade de alterações comportamentais: comprometimento na comunicação verbal, dificuldades significativas nas interações sociais e presença de comportamentos repetitivos, estereotipados e rigidamente estruturados. Os primeiros sinais costumam manifestar-se antes dos três anos de idade e tendem a persistir ao longo da vida. Estima-se que a condição afete cerca de cinco a cada mil crianças, sendo mais prevalente no sexo masculino, numa proporção de quatro meninos para cada menina diagnosticada. Vale ressaltar que:

Os sintomas e o grau de comprometimento variam amplamente, por isso é comum referir-se ao autismo como um espectro de transtornos, denominados genericamente de transtornos invasivos do desenvolvimento, foram estabelecidos critérios de classificação dos transtornos invasivos do desenvolvimento que estão formalizados no Manual de Diagnóstico e Estatístico (DSM-IV) da Associação Americana de Psiquiatria e na Classificação Internacional de Doenças (CID-10) publicada pela Organização Mundial de Saúde. A origem do autismo ainda é desconhecida, embora os estudos realizados apontem para um forte componente genético (Coll, 1995, p. 50).

Observa-se que indivíduos com Transtorno do Espectro Autista apresentam comprometimentos significativos na interação social, evidenciados pela dificuldade em utilizar comportamentos não verbais como contato visual, expressões faciais, postura corporal e gestos. Tais limitações também se refletem na dificuldade em estabelecer vínculos com os pares, bem como na reduzida participação em interações sociais e na ausência de reciprocidade. No campo da comunicação, observa-se atraso ou ausência total na aquisição da linguagem oral uma vez que mesmo nos casos em que a fala se desenvolve, é comum a presença de dificuldades acentuadas para iniciar ou sustentar uma conversação.

Entre as manifestações linguísticas mais recorrentes estão a repetição de palavras ou frases (ecolalia), o uso inadequado de pronomes pessoais (como a inversão de “eu” por “você”) e o emprego de expressões com significados próprios, conhecidos como usos idiossincráticos da linguagem. Além disso, os comportamentos e interesses dessas crianças tendem a ser restritos e repetitivos. Muitos demonstram forte resistência a mudanças, apegando-se a rotinas e rituais específicos. É frequente a repetição de movimentos estereotipados, como agitar as mãos ou girar sobre o próprio eixo. Também é comum que se fixem intensamente em determinados temas, como horários ou compromissos, demonstrando preocupação excessiva com essas questões.

Alguns autistas (cerca de 20%) apresentam um desenvolvimento relativamente normal durante os primeiros 12 a 24 meses de vida, depois entram em um período de regressão, caracterizado pela perda significativa de habilidades na linguagem. O retardo mental está presente em cerca de 75% dos autistas. Esses autistas com retardo mental são propensos a se automutilar, batendo com a cabeça ou mordendo as mãos, por exemplo. As convulsões aparecem em 15 a 30% dos casos, 20 a 50% apresentam alterações no eletroencefalograma. Além disso, em 15 a 37% dos casos de autismo ocorre associação com outras manifestações clínicas, incluindo os 5 a 14% que apresentam alterações cromossômicas ou alguma doença genética conhecida (Coll, 1995, p. 30).

Observa-se que o Transtorno do Espectro Autista ocorre em diferentes regiões do mundo e pode afetar indivíduos de qualquer origem racial, étnica ou condição social. Apesar dos avanços nas investigações científicas, ainda não há comprovação de que fatores psicológicos ou ambientais estejam diretamente relacionados com as causas do transtorno.

Os sintomas, causados por disfunções físicas do cérebro, podem ser verificados pela anamnese ou presentes no exame ou entrevista com o indivíduo, estas características são: Distúrbios no ritmo de aparecimento de habilidades físicas, sociais e lingüísticas; Reações anormais às sensações, ainda são observadas alterações na visão, audição, tato, dor, equilíbrio, olfato, gustação e maneira de manter o corpo; Fala e linguagem ausentes ou atrasados. Certas áreas específicas do pensar, presentes ou não (Coll, 1995, p. 36).

Entretanto nota-se que o ritmo imaturo da fala, restrita de compreensão de idéias. Uso de palavras sem associação com o significado; relacionamento anormal com os objetos, eventos e pessoas. Respostas não apropriadas a adultos ou crianças. Uso inadequado de objetos e brinquedos, estes são comportamentos geralmente executados por autistas. Portanto: 

Para um diagnóstico clínico preciso do Transtorno Autista, a criança deve ser bem examinada, tanto fisicamente quanto psico-neurologicamente. A avaliação deve incluir entrevistas com os pais e outros parentes interessados, observação e exame psico-mental e, algumas vezes, de exames complementares para doenças genéticas e ou hereditárias (Coll, 1995).

O diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista ainda representa um processo complexo e, muitas vezes, inacessível para grande parte da população. Famílias em situação de maior vulnerabilidade enfrentam maiores dificuldades para acessar recursos especializados, enquanto aquelas com melhores condições financeiras conseguem utilizar com mais frequência instrumentos e serviços nas áreas médica e psicopedagógica, o que evidencia desigualdades estruturais no acesso ao diagnóstico e ao acompanhamento especializado.

A temática da educação de pessoas com deficiência começou a ganhar visibilidade no início do século XX. No entanto, esse processo histórico ainda carrega marcas de estigmas e julgamentos sociais. Atualmente, entre os diversos desafios enfrentados pelas pessoas com necessidades educacionais especiais, a entrada e a permanência na escola permanecem entre os mais críticos. 

Conforme aponta Freire (2012, p. 70) ‘mesmo nos dias atuais, ainda se observa, embora de maneira mais sutil, práticas que resultam na exclusão de crianças com deficiência do espaço escolar’. Diante desse cenário, torna-se cada vez mais necessário preparar os professores para acolher e adaptar suas práticas pedagógicas, favorecendo a permanência desses estudantes na escola regular.

A Constituição Federal de 1988 estabelece, como um de seus fundamentos, a promoção do bem de todos, vedando qualquer forma de preconceito relacionado à origem, raça, sexo, cor, idade ou outras condições (art. 3º, inciso IV). No artigo 205, define-se a educação como um direito de todos, tendo como finalidade o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. Já o artigo 206, inciso I, garante como princípio da educação nacional a igualdade de acesso e de permanência na escola. No artigo 208, a mesma Carta assegura que o atendimento educacional especializado é dever do Estado, sendo preferencialmente oferecido no âmbito da rede regular de ensino (Brasil, 1988).

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), instituído pela Lei nº 8.069/90, complementa essas diretrizes ao afirmar, em seu artigo 55, que os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos na rede regular de ensino. No cenário internacional, importantes documentos como a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994) contribuíram de forma decisiva para a construção de políticas públicas voltadas à inclusão, influenciando diretamente a formulação de diretrizes educacionais mais justas, acessíveis e igualitárias (Brasil, 1990).

4. CONDIÇÕES E TRATAMENTOS ESPECÍFICOS NAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL PARA AS CRIANÇAS AUTISTAS

Ao tratar da educação inclusiva e especial, é imprescindível que haja um cuidado criterioso por parte da gestão no que se refere à contratação e capacitação dos profissionais que atuarão diretamente com os estudantes incluídos. Esses educadores estarão na linha de frente da implementação das políticas inclusivas e, por isso, devem estar devidamente preparados para lidar com as especificidades de cada criança. Independentemente de o aluno apresentar ou não uma condição como o Transtorno do Espectro Autista, para sua família ele sempre representará um valor inestimável. Para (Almeida, 2002, p. 40) deve-se manter a calma pois:

É importante que o educador saiba manter a calma durante as aulas. Momentos difíceis podem provocar estresse no educador, mas é importante que ele saiba entender a situação e manter a tranqüilidade, para deixar o aluno o mais confortável possível, pois o ambiente agradável e o controle emocional fará toda diferença na vida de um profissional que vai lidar com uma criança especial.

É possível observar, a partir da abordagem do autor, que o equilíbrio emocional do profissional da educação exerce uma função determinante no desempenho de suas atividades cotidianas. A paciência e a serenidade com que conduz suas ações refletem diretamente no clima do ambiente escolar, transmitindo tranquilidade e segurança. Essa postura beneficia especialmente os alunos com deficiência, que tendem a responder positivamente quando inseridos em contextos acolhedores e emocionalmente estáveis.

No cenário educacional contemporâneo, marcado por uma crescente competitividade entre instituições e profissionais, torna-se essencial que o educador não se restrinja a uma única função. Isso é ainda mais relevante no atendimento a crianças com necessidades educacionais especiais, como aquelas com Transtorno do Espectro Autista. 

Professores e psicopedagogos devem estar preparados para exercer múltiplos papéis, atuando não apenas como transmissores de conhecimento, mas também como cuidadores e mediadores do desenvolvimento integral desses estudantes, que requerem atenção individualizada e estratégias pedagógicas específicas. De acordo com (Almeida, 2002, p. 50) o profissional deve ter múltiplas funções. Pois:

[…] muitas vezes, será necessário assumir vários papeis além da função de educador. Em muitos momentos, será necessário conversar com os pais dos alunos assumindo mais um papel de orientador do que de professor. Você já deve entrar para a área sabendo que, provavelmente, enfrentará muitos desafios ao longo do ano letivo.

É importante compreender que os alunos apresentam diferentes ritmos e estilos de aprendizagem. Por essa razão, adaptar as estratégias de ensino às necessidades individuais de cada estudante é essencial para promover uma educação inclusiva e eficaz. Criar um ambiente acolhedor, com atividades didáticas leves e dinâmicas, contribui significativamente para o engajamento e bem-estar da turma. As aulas devem ser conduzidas de forma agradável, respeitando os limites emocionais dos alunos e evitando qualquer tipo de pressão ou constrangimento. No caso de crianças com Transtorno do Espectro Autista, o cuidado com o aspecto emocional e o exercício contínuo da paciência por parte do educador são fundamentais para o sucesso do processo educativo.

A inclusão de crianças autistas no ambiente escolar demanda condições pedagógicas específicas e a presença de uma equipe multidisciplinar capacitada para acompanhar o processo de aprendizagem. Essas intervenções devem ser planejadas e aplicadas de forma coordenada, respeitando as particularidades de cada criança. Quando há um acompanhamento adequado, não há impedimentos para que esses alunos participem ativamente das atividades escolares e desenvolvam suas habilidades de forma satisfatória. Nesse contexto, cabe à escola o papel de buscar soluções pedagógicas eficazes que garantam o acesso, a permanência e o progresso desses estudantes no processo educacional.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Este artigo teve como propósito reunir e apresentar informações de natureza teórico-científica que contribuam para o aprimoramento do processo de ensino e aprendizagem de crianças com Transtorno do Espectro Autista na Educação Infantil. Buscou-se estimular a reflexão e a análise crítica, com o intuito de abrir caminhos para a construção de práticas pedagógicas mais sensíveis, inclusivas e eficazes no contexto escolar.

A análise realizada ao longo do estudo evidenciou a importância de o professor adotar uma abordagem psicopedagógica que reconheça e valorize o sujeito autista em sua totalidade. Isso inclui a incorporação de linguagens artísticas, o estímulo à criatividade, à expressão pessoal e à poética individual como elementos essenciais no processo de ensino, especialmente considerando que muitos desses alunos enfrentam dificuldades expressivas na comunicação verbal.

Verificou-se, também, que é papel do docente estruturar práticas que contemplem metodologias acessíveis e contínuas, capazes de promover o desenvolvimento cognitivo e emocional dos estudantes com autismo. A criação de um ambiente escolar acolhedor, o domínio dos conteúdos ministrados, a sensibilidade para lidar com o tempo e os ritmos de cada criança, e o comprometimento com um ensino contextualizado são aspectos fundamentais para assegurar uma trajetória escolar positiva e significativa.

Pode-se afirmar que, quando a criança autista recebe suporte adequado da família, da escola e da comunidade, há maiores chances de que ela se torne um adulto mais autônomo e com menos dificuldades de adaptação à vida em sociedade. No entanto, é necessário compreender que a síndrome acompanha o indivíduo ao longo de toda a vida, o que exige um olhar realista e respeitoso sobre suas possibilidades e limites.

Dessa forma, torna-se inadmissível que instituições de Educação Infantil adotem posturas passivas ou resignadas diante dos desafios impostos pelo autismo. Atitudes que se limitam à lamentação ou à manutenção de práticas ineficazes revelam um sistema estagnado e alheio às transformações sociais. É urgente promover ações que visem a mudança concreta, por meio do engajamento coletivo de todos os atores envolvidos na educação.

O foco deve permanecer na garantia de uma educação que promova o pleno desenvolvimento do aluno com autismo, reconhecendo-o como sujeito de direitos, capaz de sentir, criar, participar e transformar. Prepará-lo para viver em sociedade e construir sua própria história requer compromisso, investimento e, sobretudo, humanidade. Ainda que essa realidade inclusiva esteja distante em muitos contextos brasileiros, a persistência em ampliar o conhecimento e aplicar boas práticas pode tornar o cotidiano mais acessível, acolhedor e digno para esses indivíduos.

6. REFERÊNCIAS

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