A RELAÇÃO ENTRE ESTRESSE CRÔNICO SOBRE O EIXO DA VIA DOPAMINÉRGICA E SEUS POSSÍVEIS TRANSTORNOS PSICOSSOMÁTICOS: UMA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA 

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202411161552


Isabelle Eutalia Rodrigues Da Silva1
Professora Me. Chimene Kuhn Nobre2


RESUMO 

Introdução: O estresse crônico é uma condição prolongada de ativação do sistema de resposta ao estresse, que pode ter impactos profundos na saúde mental e física. A dopamina, um neurotransmissor fundamental no cérebro, está intimamente envolvida nos processos de recompensa e motivação. Este trabalho busca examinar a relação entre o estresse crônico e o eixo da via dopaminérgica, bem como os transtornos psicossomáticos que podem surgir dessa interação. Objetivos: Este estudo tem como objetivo sintetizar as atuais descobertas e perspectivas sobre como o estresse crônico afeta a via dopaminérgica e os transtornos psicossomáticos resultantes. Material e Métodos: Esta revisão bibliográfica foi realizada utilizando bases de dados científicas como Scientific Electronic Library Online (Scielo), PubMed e Library Genesis. Os termos de busca utilizados foram “Estresse Crônico”, “Dopamina” e “Transtornos Psicossomáticos”. Resultados: A análise da literatura revela que o estresse crônico altera significativamente a via dopaminérgica, resultando em diversas mudanças neuroquímicas e comportamentais, incluindo a redução da sensibilidade dos receptores de dopamina e a alteração na liberação de dopamina: disfunção dopaminérgica está associada ao desenvolvimento de depressão, alterações na via dopaminérgica estão correlacionadas com transtornos de ansiedade e estresse crônico afeta a regulação do sono-vigília devido a interferências no ciclo dopaminérgico. Conclusão: O estresse crônico exerce um impacto substancial sobre o eixo da via dopaminérgica, contribuindo para o desenvolvimento de diversos transtornos psicossomáticos. O tratamento eficaz desses transtornos requer uma abordagem multifacetada, combinando intervenções farmacológicas, terapias comportamentais e abordagens integrativas. 

Palavras chaves: Estresse Crônico, Dopamina, Via Dopaminérgica, Transtornos Psicossomáticos, Intervenções farmacológicas, Terapias Comportamentais, Abordagens Integrativas.

ABSTRACT 

Introduction: Chronic stress is a prolonged condition of activation of the stress response system, which can have profound impacts on mental and physical health. Dopamine, a key neurotransmitter in the brain, is closely involved in reward and motivation processes. This work aims to examine the relationship between chronic stress and the dopaminergic pathway axis, as well as the psychosomatic disorders that may arise from this interaction. Objectives: This study aims to synthesize the current findings and perspectives on how chronic stress affects the dopaminergic pathway and the resulting psychosomatic disorders. Material and Methods: This bibliographic review was carried out using scientific databases such as Scientific Electronic Library Online (Scielo), PubMed and Library Genesis. The search terms used were “Chronic Stress”, “Dopamine” and “Psychosomatic Disorders”. Results: The analysis of the literature reveals that chronic stress significantly alters the dopaminergic pathway, resulting in several neurochemical and behavioral changes, including a reduction in the sensitivity of dopamine receptors and an alteration in dopamine release: dopaminergic dysfunction is associated with the development of depression, changes in the dopaminergic pathway are correlated with anxiety disorders and chronic stress affects sleep-wake regulation due to interferences in the dopaminergic cycle. Conclusion: Chronic stress has a substantial impact on the dopaminergic pathway, contributing to the development of several psychosomatic disorders. Effective treatment of these disorders requires a multifaceted approach, combining pharmacological interventions, behavioral therapies and integrative approaches. 

Keywords: Chronic Stress, Dopamine, Dopaminergic Pathway, Psychosomatic Disorders, Pharmacological Interventions, Behavioral Therapies, Integrative Approache

1. INTRODUÇÃO 

A relação entre estresse crônico e o eixo da via dopaminérgica é um tema de crescente interesse na literatura científica, especialmente devido à sua potencial implicação nos transtornos psicossomáticos. Ao longo das últimas décadas, pesquisadores têm investigado os complexos mecanismos pelos quais o estresse crônico pode afetar a regulação da dopamina no cérebro, e como isso pode estar associado a uma série de condições psicossomáticas, incluindo distúrbios de humor, ansiedade e manifestações físicas de doença sem uma causa orgânica clara (Lemos; Carvalho, 2023). 

Dentro desse contexto, esta revisão de literatura se propõe a delimitar o tema da relação entre estresse crônico e o eixo dopaminérgico, explorando suas implicações nos transtornos psicossomáticos. A necessidade de compreender melhor essa interação surge a partir do reconhecimento da complexidade dos processos neuroquímicos envolvidos no estresse crônico e de seu potencial impacto na saúde mental e física. 

A problemática que guia esta revisão está relacionada à compreensão dos mecanismos pelos quais o estresse crônico influencia o funcionamento do sistema dopaminérgico e como essa influência pode desencadear ou potencializar transtornos psicossomáticos. O problema que orienta este trabalho é: Como o estresse crônico modula a atividade dopaminérgica e quais são as consequências disso para a saúde psicossomática? 

As hipóteses que emergem dessa problemática sugerem que o estresse crônico pode alterar a regulação da dopamina no cérebro, levando a desequilíbrios que contribuem para a manifestação de transtornos psicossomáticos. Além disso, acredita-se que diferentes tipos de estresse possam ter efeitos variados sobre o eixo dopaminérgico, resultando em sintomas distintos de transtornos psicossomáticos. 

O objetivo geral desta revisão é analisar criticamente a literatura existente sobre a relação entre estresse crônico, eixo dopaminérgico e transtornos psicossomáticos, buscando identificar padrões e lacunas no conhecimento atual. Como objetivos específicos, pretende-se: revisar os principais estudos que investigam o impacto do estresse crônico na regulação dopaminérgica, examinar os mecanismos neurobiológicos subjacentes à relação entre estresse e transtornos psicossomáticos e discutir possíveis implicações clínicas e terapêuticas dessas descobertas. 

A relevância deste trabalho acadêmico reside na sua contribuição para o entendimento dos mecanismos biológicos e psicológicos envolvidos na interação entre estresse crônico e transtornos psicossomáticos, fornecendo insights valiosos para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e intervenção mais eficazes. Além disso, esta revisão pode informar futuras pesquisas e práticas clínicas voltadas para o manejo desses transtornos complexos (Camina, 2020). 

2. MATERIAL E MÉTODOS 

Para delinear a pesquisa sobre a relação entre estresse crônico, o eixo dopaminérgico e transtornos psicossomáticos, foi adotada uma abordagem de revisão de literatura. Segundo Lima e Mioto (2007), a pesquisa bibliográfica requer uma abordagem metódica para pesquisar soluções.

A natureza da pesquisa foi teórica e descritiva, com ênfase na síntese e análise de informações provenientes de estudos prévios. O método utilizado consistiu em uma pesquisa bibliográfica realizada em bases de dados eletrônicas, como PubMed, PsycInfo e Scopus publicados nos últimos cinco anos. Os termos utilizados na busca por estudos na área da pesquisa publicados em periódicos científicos foram: “estresse crônico”, “eixo dopaminérgico” e “transtornos psicossomáticos” e seus correspondentes em inglês “chronic stress”, “dopaminergic axis” and “psychosomatic disorders”. Os critérios de inclusão dos estudos foram: abordagem da relação entre estresse crônico e atividade dopaminérgica, investigação dos efeitos do estresse sobre transtornos psicossomáticos, publicação em idioma inglês ou português e disponibilidade do texto completo. Excluíram-se estudos que não atendiam a esses critérios ou que não apresentavam relevância direta para os objetivos da revisão. A seleção das publicações foi conduzida de forma sistemática. Entre os trabalhos listados, encontram-se artigos, teses e revisões de literatura abordando uma variedade de temas, desde transtornos mentais, como o transtorno afetivo bipolar e a esquizofrenia, até aspectos relacionados ao estresse, sistema imunológico e saúde integral. 

3. RESULTADOS 

A pesquisa sobre os mecanismos de interação entre estresse crônico, dopamina e transtornos psicossomáticos revela a complexidade das relações entre fatores biológicos e psicológicos na manifestação desses distúrbios. Evidências substanciais destacam a influência significativa do estresse crônico na regulação dopaminérgica, demonstrando como alterações neuroquímicas e neurobiológicas podem contribuir para sintomas físicos e emocionais sem uma causa orgânica clara. 

A compreensão desses mecanismos é essencial para o desenvolvimento de estratégias preventivas e terapêuticas mais eficazes para transtornos psicossomáticos, visando tanto os aspectos neuroquímicos quanto os psicossociais envolvidos em sua etiologia e manifestação. Abordagens integrativas que considerem tanto os fatores biológicos quanto os psicossociais podem oferecer novas perspectivas para o tratamento e manejo desses distúrbios complexos. 

No entanto, é importante reconhecer que há muito a ser explorado nesse campo de pesquisa. São necessários estudos adicionais para elucidar os mecanismos específicos pelos quais o estresse crônico afeta a regulação dopaminérgica e como essas alterações contribuem para a manifestação de transtornos psicossomáticos. Além disso, abordagens terapêuticas personalizadas que levem em consideração a variabilidade individual na resposta ao estresse e na sensibilidade dopaminérgica podem representar uma nova fronteira na medicina personalizada e na psicoterapia. 

Investimentos contínuos em pesquisa nessa área são essenciais para avançar nosso conhecimento e desenvolver intervenções mais eficazes para transtornos psicossomáticos e psiquiátricos relacionados ao estresse crônico. A colaboração entre pesquisadores, clínicos e pacientes é fundamental para traduzir essas descobertas em práticas clínicas e políticas de saúde pública que melhorem a qualidade de vida das pessoas afetadas por esses distúrbios complexos. 

4. DISCUSSÃO 

A importância do tratamento do estresse crônico e das medidas que visam estabilizar o sistema dopaminérgico é um campo de pesquisa com relevância significativa tanto do ponto de vista científico quanto clínico. O estresse crônico é um fenômeno comum na sociedade moderna, resultante de uma série de fatores estressores persistentes, como demandas ocupacionais, problemas financeiros, conflitos interpessoais e pressões socioeconômicas (Lupien et al., 2009). Esta condição, caracterizada por uma ativação contínua do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) e níveis elevados de cortisol, pode levar a uma série de alterações fisiológicas e neurológicas, com destaque para a disfunção da via dopaminérgica (McEwen, 2007).

A dopamina é um neurotransmissor central na regulação do humor, motivação, recompensa e comportamento (Grace, 2016). As vias dopaminérgicas, incluindo a via mesolímbica, mesocortical e nigroestriatal, desempenham papeis críticos na mediação das respostas de prazer e motivação (Berridge & Robinson, 1998). O estresse crônico pode desregular essas vias de várias maneiras, resultando em disfunções significativas que contribuem para o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos e psicossomáticos (Pruessner et al., 2004). 

Estudos têm demonstrado que a exposição prolongada ao estresse pode alterar a liberação de dopamina, resultando em níveis anormalmente altos ou baixos desse neurotransmissor em diferentes regiões do cérebro (Koob & Volkow, 2010). Especificamente, a liberação de dopamina no núcleo accumbens pode ser reduzida, comprometendo o sistema de recompensa do cérebro e levando a sintomas como anedonia e falta de motivação (Nestler & Carlezon, 2006). Além disso, o estresse crônico pode diminuir a sensibilidade dos receptores de dopamina, resultando em uma resposta reduzida aos estímulos de recompensa, o que exacerba os sintomas de depressão e ansiedade (Pruessner et al., 2004). A plasticidade sináptica, ou a capacidade do cérebro de adaptar e reorganizar suas conexões neurais, também pode ser afetada, resultando em alterações duradouras na estrutura e função das vias dopaminérgicas (Grace, 2016). Estas alterações neurobiológicas subjacentes destacam a necessidade urgente de intervenções terapêuticas eficazes para mitigar os efeitos adversos do estresse crônico na saúde mental e física (McEwen, 2007). 

A prevalência do estresse crônico e suas consequências debilitantes para a saúde pública justificam a necessidade de pesquisas aprofundadas sobre os mecanismos subjacentes a essa condição. Transtornos psicossomáticos, que incluem condições como depressão, ansiedade, distúrbios do sono e outras doenças relacionadas ao estresse, representam um fardo significativo para a saúde pública (Kendler et al., 2011). Estes transtornos não apenas diminuem a qualidade de vida dos indivíduos afetados, mas também impõem uma carga econômica substancial devido a custos médicos elevados e perda de produtividade (Lazarus & Folkman, 1984). Além disso, os transtornos psicossomáticos estão frequentemente associados a comorbidades físicas, exacerbando os desafios de tratamento e manejo dessas condições (Kendler et al., 2011). Portanto, compreender os mecanismos neurobiológicos pelos quais o estresse crônico afeta a via dopaminérgica é crucial para desenvolver estratégias de intervenção que possam prevenir ou minimizar o impacto desses transtornos (McEwen, 2007). 

As abordagens terapêuticas para tratar os efeitos do estresse crônico sobre a via dopaminérgica são diversas e incluem intervenções farmacológicas, terapias comportamentais e psicossociais, bem como abordagens integrativas (Koob & Volkow, 2010). Intervenções farmacológicas que modulam a atividade dopaminérgica, como os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) e os estabilizadores de humor, têm mostrado eficácia no tratamento dos transtornos associados ao estresse crônico (Nestler & Carlezon, 2006). Estes medicamentos ajudam a normalizar os níveis de dopamina e a melhorar os sintomas de depressão e ansiedade. Em casos de disfunção dopaminérgica grave, os antipsicóticos podem ser usados para estabilizar a atividade dopaminérgica, especialmente em pacientes com transtornos psicóticos (Koob & Volkow, 2010). 

As terapias comportamentais e psicossociais, como a terapia cognitivo-comportamental (TCC), também desempenham um papel crucial na redução do estresse e estabilização da função dopaminérgica (Beck, 2011). A TCC é uma abordagem eficaz que ajuda os pacientes a identificar e modificar padrões de pensamento negativos e comportamentos disfuncionais que contribuem para o estresse (Beck, 2011). Além disso, práticas de mindfulness e meditação têm mostrado reduzir os níveis de cortisol e melhorar a regulação emocional, ajudando a estabilizar a função dopaminérgica e a reduzir os sintomas de estresse e ansiedade (Hölzel et al., 2011).

Abordagens integrativas, como exercícios físicos, alimentação balanceada e sono adequado, são igualmente importantes. A atividade física regular é conhecida por aumentar os níveis de dopamina e promover a neuroplasticidade (Ratey & Loehr, 2011). Exercícios aeróbicos, em particular, têm mostrado benefícios na redução do estresse e na melhora do humor (Ratey & Loehr, 2011). Uma dieta rica em nutrientes essenciais para a produção de dopamina, como tirosina e antioxidantes, pode ajudar a manter a saúde do sistema dopaminérgico e a reduzir os efeitos do estresse crônico (Gomez-Pinilla, 2008). A manutenção de um padrão de sono saudável é fundamental para a regulação da dopamina, pois o sono de qualidade pode ajudar a restaurar os níveis de dopamina e a melhorar a resposta ao estresse (Walker, 2017). 

Mediante a isso, a compreensão dos mecanismos pelos quais o estresse crônico afeta a via dopaminérgica é fundamental para desenvolver intervenções terapêuticas eficazes. Por conseguinte, os estudos necessários com uma abordagem interdisciplinar e a utilização de mecanismos que envolvam a neurobiologia do sistema dopaminérgico são de extrema importância para a difusão de conhecimento de qualidade e eficácia de tratamentos ou medidas de prevenção contra os malefícios causados pela exposição ao estresse de forma crônica (McEwen, 2007). 

4.1 Neurobiologia do estresse e do sistema dopaminérgico 

A neurobiologia do estresse e do sistema dopaminérgico constitui um campo de estudo fundamental para compreender as complexas interações entre processos neuroquímicos e eventos psicológicos. Segundo Rocha et al. (2023) afirmam que o estresse, uma resposta adaptativa do organismo a situações desafiadoras, desempenha um papel crucial na modulação da atividade dopaminérgica, um sistema neurotransmissor intimamente ligado a funções cognitivas, emocionais e motivacionais. Neste contexto, a compreensão dos mecanismos neurobiológicos subjacentes ao estresse e à regulação da dopamina é essencial para elucidar tanto os mecanismos de adaptação quanto às vulnerabilidades para transtornos psicossomáticos e psiquiátricos. 

O estresse, enquanto fenômeno biopsicossocial, desencadeia uma série de respostas fisiológicas e comportamentais que visam restaurar o equilíbrio interno do organismo diante de ameaças percebidas. De acordo com Cavichioli (2022) essas respostas envolvem a ativação do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), resultando na liberação de hormônios do estresse, como o cortisol, que desempenha um papel central na mediação dos efeitos do estresse sobre o cérebro e o corpo. 

Por sua vez, o sistema dopaminérgico, que inclui vias neurais que projetam dopamina em diferentes áreas do cérebro, está intimamente envolvido na regulação do humor, motivação, recompensa e aprendizado (Toval, 2021). Estudos têm demonstrado que o estresse pode modular a atividade dopaminérgica, afetando a síntese, liberação, captação e metabolismo da dopamina em várias regiões cerebrais, como o córtex pré-frontal, o núcleo accumbens e o sistema límbico. 

As evidências sugerem que o estresse agudo pode aumentar a liberação de dopamina em certas áreas do cérebro, resultando em respostas comportamentais de alerta e vigilância. No entanto, Gomes, Rocha e Almeida (2023) apontam que o estresse crônico está associado a alterações na regulação da dopamina, incluindo redução da densidade de receptores de dopamina e disfunção na sinalização dopaminérgica. Essas mudanças podem contribuir para sintomas de depressão, ansiedade e outros transtornos psicossomáticos. 

Além disso, estudos em modelos animais e em humanos têm demonstrado que o estresse crônico pode levar a mudanças estruturais e funcionais no cérebro, afetando áreas importantes para a regulação emocional e do estresse, como o hipocampo e a amígdala. Essas alterações podem resultar em disfunções no processamento emocional e na resposta ao estresse, contribuindo para a vulnerabilidade a transtornos psiquiátricos (Rocha et al., 2023).

É importante ressaltar que a relação entre estresse, sistema dopaminérgico e transtornos psicossomáticos é bidirecional e complexa. Enquanto o estresse pode influenciar a atividade dopaminérgica, a dopamina também pode modular a resposta ao estresse e a sensibilidade ao estresse. Além disso, fatores genéticos, ambientais e individuais podem modular essa relação, contribuindo para a heterogeneidade dos sintomas observados em diferentes indivíduos (Toval, 2021). 

A compreensão da neurobiologia do estresse e do sistema dopaminérgico é essencial para o desenvolvimento de estratégias preventivas e terapêuticas mais eficazes para transtornos psicossomáticos e psiquiátricos. Abordagens farmacológicas e não farmacológicas que visam modular a atividade dopaminérgica, bem como intervenções psicossociais que visam reduzir o impacto do estresse crônico, podem representar caminhos promissores para o tratamento desses transtornos complexos. Assim, investimentos em pesquisa nessa área são essenciais para avançar nosso conhecimento e melhorar a qualidade de vida das pessoas afetadas por essas condições (Cavichioli, 2022). 

4.2 Evidências da influência do estresse crônico na regulação dopaminérgica 

Evidências substanciais têm emergido para destacar a influência significativa do estresse crônico na regulação dopaminérgica, um sistema neurotransmissor vital para várias funções cognitivas, emocionais e motivacionais no cérebro humano. Neste sentido, Petrilli (2024) destaca que o estresse, como resposta adaptativa do organismo a desafios ambientais, desencadeia uma série de eventos fisiológicos e neuroquímicos complexos, muitos dos quais afetam diretamente o funcionamento do sistema dopaminérgico. 

Estudos pré-clínicos e clínicos têm consistentemente demonstrado que o estresse crônico está associado a alterações na síntese, liberação, captação e metabolismo da dopamina em várias regiões cerebrais. Por exemplo, a exposição prolongada ao estresse tem sido associada a uma redução na densidade de receptores de dopamina em áreas como o córtex pré-frontal e o núcleo accumbens, o que pode influenciar negativamente a transmissão dopaminérgica e contribuir para sintomas de depressão e anedonia (Lemos; Carvalho, 2023). 

Além disso, estudos em modelos animais têm revelado que o estresse crônico pode alterar a atividade de neurônios dopaminérgicos em áreas cerebrais como o mesencéfalo ventral, resultando em mudanças na liberação de dopamina e na sensibilidade dos receptores dopaminérgicos. Segundo Camina (2020) essas alterações neurobiológicas podem afetar a percepção de recompensa, a motivação e o processamento emocional, contribuindo para a vulnerabilidade a transtornos psicossomáticos e psiquiátricos. 

Além das mudanças neuroquímicas diretas, Milanesi et al. (2021) destacam que o estresse crônico também pode influenciar a plasticidade estrutural e funcional do cérebro, afetando áreas envolvidas na regulação do estresse e da emoção, como o hipocampo e a amígdala. Estudos têm demonstrado que o estresse crônico está associado a uma redução do volume do hipocampo e a alterações na morfologia dos neurônios, o que pode comprometer a função cognitiva e emocional e contribuir para sintomas de ansiedade e depressão. 

O estresse crônico pode induzir mudanças epigenéticas no cérebro, alterando a expressão de genes envolvidos na regulação do sistema dopaminérgico e da resposta ao estresse. Dentro deste contexto, Bueno et al. (2023) afirmam que essas mudanças epigenéticas podem ter efeitos de longo prazo na função cerebral e no comportamento, aumentando a vulnerabilidade a transtornos psicossomáticos e psiquiátricos ao longo da vida. 

É importante ressaltar que a influência do estresse crônico na regulação dopaminérgica não é uniforme e pode variar dependendo de fatores como duração, intensidade e natureza do estresse, bem como características individuais, como genética e história de vida. Além disso, o estresse crônico pode interagir com outros fatores de risco, como trauma infantil, abuso de substâncias e predisposição genética, aumentando ainda mais o risco de desenvolvimento de transtornos psicossomáticos e psiquiátricos (Camina, 2020). 

Diante dessas evidências, torna-se claro que a compreensão da influência do estresse crônico na regulação dopaminérgica é essencial para o desenvolvimento de estratégias preventivas e terapêuticas mais eficazes para transtornos psicossomáticos e psiquiátricos (Lemos; Carvalho, 2023). Abordagens farmacológicas e não farmacológicas que visam modular a atividade dopaminérgica, bem como intervenções psicossociais que visam reduzir o impacto do estresse crônico, podem representar caminhos promissores para o tratamento desses transtornos complexos. Assim, investimentos em pesquisa nessa área são essenciais para avançar nosso conhecimento e melhorar a qualidade de vida das pessoas afetadas por essas condições. 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A pesquisa sobre os mecanismos de interação entre estresse crônico, dopamina e transtornos psicossomáticos revela a complexidade das relações entre fatores biológicos e psicológicos na manifestação desses distúrbios. Evidências substanciais destacam a influência significativa do estresse crônico na regulação dopaminérgica, demonstrando como alterações neuroquímicas e neurobiológicas podem contribuir para sintomas físicos e emocionais sem uma causa orgânica clara. 

A compreensão desses mecanismos é essencial para o desenvolvimento de estratégias preventivas e terapêuticas mais eficazes para transtornos psicossomáticos, visando tanto os aspectos neuroquímicos quanto os psicossociais envolvidos em sua etiologia e manifestação. Abordagens integrativas que considerem tanto os fatores biológicos quanto os psicossociais podem oferecer novas perspectivas para o tratamento e manejo desses distúrbios complexos.

No entanto, é importante reconhecer que há muito a ser explorado nesse campo de pesquisa. São necessários estudos adicionais para elucidar os mecanismos específicos pelos quais o estresse crônico afeta a regulação dopaminérgica e como essas alterações contribuem para a manifestação de transtornos psicossomáticos. Além disso, abordagens terapêuticas personalizadas que levem em consideração a variabilidade individual na resposta ao estresse e na sensibilidade dopaminérgica podem representar uma nova fronteira na medicina personalizada e na psicoterapia. 

Investimentos contínuos em pesquisa nessa área são essenciais para avançar nosso conhecimento e desenvolver intervenções mais eficazes para transtornos psicossomáticos e psiquiátricos relacionados ao estresse crônico. A colaboração entre pesquisadores, clínicos e pacientes é fundamental para traduzir essas descobertas em práticas clínicas e políticas de saúde pública que melhorem a qualidade de vida das pessoas afetadas por esses distúrbios complexos. 

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1Isabelle Eutalia Rodrigues da Silva. E-mail: isabellerodrigues.ac@hotmail.com. Artigo apresentado à Faculdades Integradas Aparício de Carvalho, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Medicina, Porto Velho/RO, 2024.
2Professora Me. Chimene Kuhn Nobre. Professor do curso de Medicina. E-mail: prof.chimene@fimca.com.br