REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202410311036
Nathanael Crispin Dos Santos;
Kassio Jhafan Da Silva Evangelista;
Delner do Carmo Azevedo
RESUMO
A introdução desta pesquisa trata da regulamentação da inteligência artificial (IA) e seus impactos no sistema jurídico brasileiro, com ênfase nas áreas de direito civil, penal e trabalhista. O estudo analisa como a crescente presença da IA nas relações sociais e econômicas exige a criação de diretrizes legais que protejam direitos fundamentais, como a dignidade humana, privacidade e igualdade. No direito civil, são discutidas questões de responsabilidade por danos causados por IA, proteção de dados e contratos automatizados. No direito penal, o foco está no uso da IA tanto para a prevenção de crimes quanto para a prática de atos ilícitos, o que demanda a criação de regulamentações específicas para evitar abusos e garantir a responsabilidade penal. Em relação ao direito do trabalho, a pesquisa explora como a automação impulsionada pela IA pode transformar o mercado de trabalho, ameaçando postos e aumentando a necessidade de proteções legais para os trabalhadores. A pesquisa adota uma metodologia de revisão integrativa de literatura, buscando identificar os principais desafios e riscos associados ao uso da IA. Isso inclui questões éticas, como a discriminação algorítmica e a falta de transparência nas decisões automatizadas, além de debater a necessidade de um arcabouço regulatório que equilibre os avanços tecnológicos com a proteção dos direitos fundamentais. A IA, embora promissora, apresenta desafios que precisam ser enfrentados por meio de regulamentação eficaz para garantir que a inovação ocorra de forma segura e justa.
Palavras chaves: Regulamentação da Inteligência Artificial; Impactos Jurídicos da IA; Direito e Tecnologia; Legislação sobre Inteligência Artificial.
ABSTRACT
The introduction of this research deals with the regulation of artificial intelligence (AI) and its impacts on the Brazilian legal system, with an emphasis on the areas of civil, criminal and labor law. The study analyzes how the growing presence of AI in social and economic relations requires the creation of legal guidelines that protect fundamental rights, such as human dignity, privacy and equality. In civil law, issues of liability for damages caused by AI, protection of data and automated contracts. In criminal law, the focus is on the use of AI both to prevent crimes and to commit illegal acts, which requires the creation of specific regulations to prevent abuses and guarantee criminal liability. In relation to labor law, the research explores how automation driven by AI can transform the job market, threatening jobs and increasing the need for legal protections for workers. The research adopts an integrative literature review methodology, seeking to identify the main challenges and risks associated with the use of AI. This includes ethical issues, such as algorithmic discrimination and the lack of transparency in automated decisions, as well as debating the need for a regulatory framework that balances technological advances with the protection of fundamental rights. AI, while promising, presents challenges that need to be addressed through effective regulation to ensure innovation occurs safely and fairly.
Keywords: Regulation of Artificial Intelligence;Legal Impacts of AI;Law and Technology;Legislation on Artificial Intelligence.
1. INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem como foco a análise da regulamentação da inteligência artificial (IA) e seus impactos no sistema jurídico brasileiro, com especial atenção às áreas do direito civil, direito penal e direito do trabalho. O estudo visa explorar as disposições constitucionais, leis e regulamentos que norteiam o uso da IA em diversos setores da sociedade, além de abordar os princípios e valores fundamentais que devem guiar sua implementação. A regulamentação da IA tem gerado discussões em várias esferas do direito, dada a sua crescente presença no cotidiano e a capacidade de transformar profundamente o mercado de trabalho, as relações sociais e a justiça penal.
Serão analisadas as implicações jurídicas, tanto positivas quanto negativas, do uso de tecnologias de IA, principalmente no que se refere à proteção de direitos fundamentais como a dignidade humana, a privacidade e o direito à igualdade. No contexto do direito civil, questões sobre a responsabilidade por danos causados por sistemas de IA, a proteção de dados pessoais e os contratos automatizados serão considerados com base na legislação vigente e em decisões judiciais recentes. Já no direito penal, a pesquisa abordará como a IA pode ser usada tanto para a prevenção de crimes quanto para a execução de atos ilícitos, levantando a necessidade de regulamentações específicas para prevenir abusos e garantir a responsabilidade penal.
No campo do direito do trabalho, a automatização promovida pela IA levanta questões sobre a substituição da mão de obra humana, a redefinição de postos de trabalho e a necessidade de novas proteções legais para os trabalhadores, especialmente no que diz respeito ao desemprego tecnológico e à precarização das condições laborais. “A inteligência artificial tem o potencial de transformar radicalmente a dinâmica do trabalho, sendo imperativo que o direito acompanhe essas mudanças” (SILVA, 2020).
A pesquisa será conduzida por meio de um levantamento bibliográfico amplo, englobando obras doutrinárias e artigos científicos, além da análise de casos concretos que envolvem a aplicação de IA no Brasil. O estudo também buscará identificar os principais desafios e riscos associados à adoção dessas tecnologias, como a discriminação algorítmica, o viés nas decisões automatizadas e a dificuldade de responsabilizar juridicamente os agentes envolvidos em operações mediadas por IA.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Lacunas Legais da Regulamentação de IA no Mundo
Se a Inteligência Artificial (IA) fosse definida apenas como a capacidade de conferir consciência a objetos inanimados para que pensem por conta própria e realizem certas funções, então esse conceito pode remontar tão longe quanto o surgimento das primeiras sociedades humanas. Desde tempos antigos, tanto a magia quanto as religiões, incluindo as mais primitivas baseadas em figuras totêmicas (DURKHEIM, 1996), exploraram a possibilidade de conceder poderes mágicos ou divinos a objetos, transformando-os em entidades com capacidades cognitivas. No entanto, o conceito de Inteligência Artificial não se limita à magia ou a poderes divinos.
Um entendimento mais próximo do conceito de Inteligência Artificial pode ser encontrado em um período um pouco mais avançado na história. Na Grécia Antiga, por volta de 350 a.C., Aristóteles contemplava a ideia de que certos objetos, como uma vassoura, pudessem realizar tarefas comuns aos escravos da época, poupando-lhes o trabalho repetitivo diário (MARAR apud PRADO, 2016). Nesse pensamento, não está presente a noção de conferir magicamente uma habilidade, mas sim de projetar um utensílio, em termos tecnológicos, para que tenha consciência e possa, neste caso específico, varrer e limpar.
Observa-se que não existe uma definição exata que consiga abarcar o que é Inteligência Artificial. Conforme destacado por Rosa (2011), embora a palavra “artificial” seja compreensível por estar relacionada ao que é feito pelo ser humano (diferenciando-se assim da magia ou de certos ritos religiosos), a palavra “inteligência” é muito mais complexa. Pereira (s.d.) ressalta que, do ponto de vista teológico, o termo pode ser considerado um dom divino que torna o homem semelhante ao Criador; do ponto de vista filosófico, refere-se a um princípio abstrato que é a fonte da intelectualidade; e do ponto de vista psicológico, diz respeito à capacidade de resolver problemas novos com rapidez e êxito. Portanto, devido à falta de consenso sobre o significado de inteligência, torna-se desafiador delinear um significado preciso para “inteligência artificial”.
No entanto, tanto Rosa (2011) quanto Pereira (s.d.), Luger (2013) e Russell e Norvig (2013) concebem a Inteligência Artificial como uma área intrínseca à Ciência da Computação, relacionada à capacidade dos computadores de realizar tarefas que até então eram executadas exclusivamente por seres humanos. Mais especificamente, busca-se não apenas compreender, mas também construir entidades inteligentes por meio de algoritmos computacionais.
Russell e Norvig (2013, p. 25) categorizam diferentes definições de diversos autores ao longo das décadas em 4 seções principais: a primeira entende a Inteligência Artificial como uma simulação do pensamento humano; a segunda como a capacidade de uma máquina pensar racionalmente para tomar decisões e agir; a terceira como a capacidade de agir como um humano, inclusive desempenhando tarefas de forma superior; e a quarta como a capacidade de agir racionalmente, isto é, projetar agentes inteligentes que tomem decisões autonomamente.
2.2 Impactos da IA nas Relações Trabalhistas
A Inteligência Artificial (IA) é um dos principais pilares conceituais emergentes da modernidade, e apesar de seus avanços se alastrarem de forma significativa, sua abrangência ainda é limitada tanto no universo acadêmico quanto no social. Como Cozman e Neri (2021, p. 21) definem, a IA refere-se a “sistemas que pensam como humanos; que agem como humanos; que pensam racionalmente; que agem racionalmente”. No entanto, apesar dessa definição, a IA continua sendo um campo em constante desenvolvimento, ainda não totalmente explorado e compreendido em sua totalidade. A amplitude dos impactos sociais, econômicos e éticos da IA leva a discussões importantes que devem ser analisadas sob diferentes perspectivas e abordagens teóricas.
O principal objetivo da IA é reproduzir características humanas, agindo com racionalidade e discricionariedade para realizar tarefas que aceleram atividades essenciais e tornam processos mais eficientes, especialmente no contexto da 4ª Revolução Industrial. Com o uso dessas tecnologias, o ambiente em que vivemos, incluindo moradia, trabalho, transportes e lazer, tem sido moldado cada vez mais pela IA alterando a dinâmica das interações sociais e a produção criativa. O impacto dessas inovações tecnológicas é tão profundo que a dependência da IA nas atividades cotidianas torna-se cada vez mais evidente e desafiadora de mensurar, dada a rápida renovação de suas capacidades e o surgimento constante de novas soluções tecnológicas.
Embora estejam integrados nas atividades cotidianas, como na simples tarefa de encontrar a rota mais eficiente para um destino, os algoritmos são frequentemente percebidos como abstratos pela maioria das pessoas. Apesar de experimentarem os efeitos dos algoritmos no dia a dia, muitos desconhecem ou não compreendem tecnicamente seu funcionamento. Essa falta de entendimento contribui para uma desconexão entre o uso massivo da tecnologia e o conhecimento de suas implicações, sobretudo em termos éticos e jurídicos.
Os algoritmos não apenas influenciam tarefas triviais, mas também estão no cerne do desenvolvimento de mercados e novas tecnologias. O avanço nesse campo é irreversível, tornando crucial que se compreenda seu funcionamento, especialmente para os profissionais do Direito e legisladores. Para esses profissionais, dominar o conhecimento sobre algoritmos e inteligência artificial (IA) é fundamental para prever e regular adequadamente seu impacto, evitando consequências indesejadas quando essas tecnologias interagem diretamente com seres humanos.
Como aponta Reis (2020), “o mundo seria completamente diferente sem os algoritmos; sem eles, os computadores, a internet e a realidade virtual não existiriam”. De fato, os algoritmos são uma das maiores invenções científicas do Ocidente, uma vez que possibilitaram o desenvolvimento dos computadores, impulsionados por softwares que popularizaram os dispositivos pessoais. A partir disso, é essencial entender que os algoritmos são conjuntos de instruções lógico-matemáticas, estruturadas de forma finita e eficaz, para resolver problemas específicos de maneira sistemática.
A maioria dos países ainda está em fase inicial de elaboração de legislações específicas para IA, com algumas exceções, como o Regulamento de IA da União Europeia (AI Act), que busca estabelecer normas de segurança e transparência no uso de IA. A ausência de diretrizes claras e consistentes globalmente pode criar descompassos entre a evolução da tecnologia e sua aplicação prática com responsabilidade ética. No Brasil, por exemplo, o Projeto de Lei 21/2020 é uma tentativa de regular o uso da IA, propondo uma série de medidas para garantir que o desenvolvimento e a aplicação de IA sejam seguros, transparentes e respeitem os direitos humanos, mas ainda há desafios para sua implementação.
2.3 Impactos Penais da IA
Os algoritmos e a IA estão em um nível de sofisticação que não pode ser ignorado. Essas tecnologias têm a capacidade de tomar decisões de forma autônoma, o que levanta questões éticas e legais complexas. Embora facilitem a vida cotidiana, o fato de que podem agir independentemente exige a criação de um protocolo ético-jurídico robusto. Esse protocolo deve garantir que a IA opere de forma alinhada com os princípios das relações humanas, sem causar danos ou degradar a convivência social.
Neste contexto, é relevante mencionar as Leis da Robótica, idealizadas por Isaac Asimov, que propõem regras básicas para a interação harmoniosa entre robôs e seres humanos. Conforme Asimov (1969, p. 3), a Primeira Lei estabelece que “um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal.” A Segunda Lei determina que “um robô deve obedecer às ordens dadas por seres humanos, exceto quando essas ordens entrarem em conflito com a Primeira Lei.” A Terceira Lei afirma que “um robô deve proteger sua própria existência, desde que essa proteção não conflite com as duas primeiras leis.” Posteriormente, foi criada a Lei Zero, que estabelece que “um robô não pode causar dano à humanidade ou, por inação, permitir que a humanidade sofra algum mal.”
Essas leis ficcionais, embora criadas no âmbito da literatura de Asimov, levantam discussões relevantes para o mundo real, pois ilustram os desafios éticos e práticos de regular tecnologias que atuam de forma autônoma. Na prática, o desenvolvimento da IA requer um arcabouço regulatório que garanta a segurança e os direitos fundamentais dos indivíduos, ao mesmo tempo em que permite a inovação tecnológica. “A inteligência artificial precisa de normas jurídicas claras e eficazes para coexistir de maneira segura com a sociedade”, conforme Silva (2021). Assim, regulamentar o uso de algoritmos e IA é imprescindível para equilibrar os benefícios e riscos associados ao seu avanço.
2.4 Impactos Éticos da IA
Apesar de seus inúmeros benefícios, é fundamental reconhecer as desvantagens e os riscos que a IA pode trazer. A autonomia crescente dos sistemas de IA pode aumentar a imprevisibilidade de suas ações, criando potenciais situações de risco que precisam ser reguladas de maneira eficaz. Por isso, é imperativo que a regulamentação da IA seja fundamentada em princípios éticos claros, de forma a minimizar os impactos negativos e garantir que a tecnologia seja usada para o bem da sociedade. Como afirma Silva (2024), “a análise dos malefícios da IA é crucial para a sua devida regulamentação, visando minimizar qualquer infortúnio”.
A relação entre a IA e os direitos humanos é outro aspecto que merece atenção. Há uma crescente preocupação com os algoritmos utilizados, que muitas vezes refletem preconceitos e desigualdades sociais presentes na sociedade. Um exemplo disso é o estudo publicado pelo jornal El País (2016), que revelou como uma busca no Google por “three black teenagers” (três adolescentes negros) retornou imagens de fichas criminais, enquanto uma busca por “three white teenagers” (três adolescentes brancos) resultou em imagens de jovens felizes. Isso demonstra como a IA, quando mal utilizada ou enviesada, pode reforçar estereótipos negativos e perpetuar discriminações.
A aplicação da IA também tem se expandido em outras áreas, como no auxílio às pessoas com deficiência. Tecnologias como o TapTapSee, um aplicativo que ajuda deficientes visuais a ler rótulos de produtos, ou o Seeing AÍ, desenvolvido pela Microsoft, que identifica objetos e lê textos, são exemplos de como a IA pode promover maior autonomia e inclusão social. Essas inovações têm o potencial de transformar a vida das pessoas com deficiência, eliminando barreiras e proporcionando novas formas de interação e independência (SILVA, 2024).
No entanto, o uso crescente dessas tecnologias também levanta questões jurídicas importantes. A possibilidade de reduzir ou até mesmo eliminar a curatela de pessoas com deficiência, por exemplo, é um dos efeitos que a IA pode trazer à tona. Além disso, a tomada de decisão apoiada, um instrumento jurídico que visa garantir maior autonomia para essas pessoas, pode ganhar relevância em um cenário onde a tecnologia oferece mais possibilidades de comunicação e acessibilidade.
No campo da adoção, a IA também tem o potencial de ser utilizada para aprimorar os processos de compatibilidade entre adotantes e adotandos. Algoritmos semelhantes aos utilizados em aplicativos de relacionamento podem ser empregados para traçar perfis e prever a compatibilidade entre as partes, facilitando o processo de adoção e garantindo que o melhor interesse da criança e do adolescente seja atendido. Contudo, como ressalta Silva (2024), a sensibilidade humana ainda será necessária para analisar os resultados e tomar decisões, especialmente em questões tão delicadas quanto a formação de uma nova família.
As plataformas digitais, como as redes sociais e os aplicativos de relacionamento, também utilizam IA para conectar pessoas e facilitar interações. A pandemia da COVID-19, por exemplo, acelerou a adoção dessas ferramentas, mostrando que muitas atividades sociais podem ocorrer de forma virtual, sem a necessidade de presença física. Aplicativos de relacionamento, ou “dating apps”, se tornaram uma solução para pessoas que buscam novas conexões em um mundo cada vez mais digital. No entanto, é essencial discutir como os algoritmos que alimentam essas plataformas funcionam, especialmente quando seu design é mantido em segredo por questões de propriedade intelectual, o que gera preocupações sobre a transparência e equidade do processo (SILVA, 2024).
Em suma, a Inteligência Artificial oferece inúmeras vantagens para a sociedade, mas também apresenta desafios que precisam ser enfrentados de maneira responsável. A regulamentação da IA deve priorizar a proteção dos direitos humanos e garantir que os benefícios da tecnologia sejam distribuídos de forma justa e inclusiva, evitando discriminações e promovendo uma sociedade mais equitativa e justa.
3. METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão integrativa de literatura (RIL) de caráter descritivo e exploratório, conduzida por seis etapas distintas, conforme apresentado no quadro abaixo, com o objetivo de alcançar a finalidade do estudo por meio da seguinte pergunta norteadora: “Quais evidências científicas estão disponíveis na literatura nacional e internacional sobre os impactos da regulamentação da inteligência artificial no Direito?”
Quadro 2 – Etapas da RIL.
Etapa | Característica |
1ª etapa | Identificação do tema e seleção da hipótese ou questão de pesquisa. |
2º etapa | Estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos, amostragem ou busca na literatura. |
3ª etapa | Definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados ou categorizados dos estudos. |
4ª etapa | Avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa. |
5ª etapa | Interpretação dos resultados. |
6ª etapa | Apresentação da revisão e síntese do conhecimento. |
Fonte: Mendes; Silveira; Galvão, 2008.
Após a definição da questão de pesquisa, para a busca dos artigos científicos nas bases de dados jurídicas, como SciELO Jurídico, Periódicos CAPES e Biblioteca Digital Jurídica, foram utilizados os seguintes descritores relacionados à regulamentação da inteligência artificial e seus impactos no Direito: “Regulamentação da Inteligência Artificial”, “Impactos Jurídicos da IA”, “Direito e Tecnologia”, “Legislação sobre Inteligência Artificial”, seguido pela utilização do operador booleano de busca “and”.
Entretanto, para a obtenção da amostra final dos artigos, foram utilizados critérios de inclusão e exclusão para o desenvolvimento da revisão, análise e discussão do trabalho.
Os critérios de inclusão aplicados ao estudo foram: artigos publicados em bases de dados nacionais e internacionais, textos completos disponíveis, idioma de publicação em português, inglês ou espanhol, além de terem sido publicados entre os anos de 2000 a 2023, abordando diretamente a temática proposta.
Como critério de exclusão, aplicaram-se aos artigos que não estavam na íntegra, publicados em idiomas fora dos estipulados, fora do período requisitado, além de estudos duplicados e que não atendessem ao tema da regulamentação da inteligência artificial no Direito.
Figura 1. Fluxograma de busca e seleção dos artigos científicos.
Após os critérios de inclusão e exclusão conforme o fluxograma acima, foram utilizados neste trabalho 17 artigos que atendiam e respondiam à pergunta norteadora.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
A regulamentação da inteligência artificial (IA) vem ganhando cada vez mais destaque no campo jurídico, impactando áreas cruciais como o direito civil, penal e do trabalho. Estudos integrativos sobre o tema revelam implicações jurídicas de grande relevância e desafios urgentes que devem ser enfrentados para garantir que o uso dessas tecnologias ocorra de maneira ética, segura e em conformidade com os direitos fundamentais.
No âmbito do direito civil, um dos principais desafios diz respeito à responsabilidade por danos causados por sistemas de IA. Rosa (2011) observa que a ausência de uma definição clara e precisa de “inteligência artificial” dificulta a criação de normas que regulamentem de forma adequada a responsabilização em casos de falhas de algoritmos. O avanço das tecnologias, especialmente no que tange a contratos automatizados e decisões com base em algoritmos, demanda regulamentações mais robustas, que protejam a privacidade e os dados pessoais, em consonância com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A presença crescente da IA nas relações sociais exige uma reflexão mais aprofundada sobre a responsabilidade: seria ela do desenvolvedor, do operador ou do próprio sistema? Esse debate é essencial para a formulação de diretrizes legais que atribuam corretamente a responsabilidade em caso de danos.
No direito penal, a IA apresenta um papel ambíguo, como destaca Reis (2020). Por um lado, essas tecnologias são ferramentas poderosas na prevenção de crimes, sendo utilizadas em algoritmos preditivos capazes de identificar potenciais infratores. Por outro lado, há riscos evidentes de abuso, como o uso inadequado da IA para a prática de cibercrimes e violações de privacidade. Borges e Graminho (2021) chamam a atenção para o fenômeno da discriminação algorítmica, onde os sistemas de IA podem reproduzir e perpetuar preconceitos sociais existentes, levando a injustiças nas decisões automatizadas. A regulamentação penal precisa incluir mecanismos que previnam esses abusos e assegurem a responsabilização dos agentes envolvidos, garantindo que os direitos das minorias não sejam violados pelas decisões automatizadas.
Já no direito do trabalho, a crescente automação e o uso de IA colocam em xeque o futuro das relações trabalhistas. Como salienta Silva (2020), a substituição da força de trabalho humana por sistemas inteligentes pode gerar desemprego tecnológico em larga escala e precarizar as condições laborais. A reestruturação dos postos de trabalho, bem como a criação de políticas públicas que assegurem proteção aos trabalhadores afetados, torna-se cada vez mais necessária. A regulamentação deve buscar um equilíbrio entre o uso da IA e a garantia de que os trabalhadores continuem a ter direitos básicos, como dignidade e igualdade de oportunidades no mercado.
Outro ponto crucial na regulamentação da IA é a definição de diretrizes éticas claras. As Leis da Robótica de Isaac Asimov (1969), apesar de oriundas da ficção científica, fornecem um marco conceitual que pode guiar a discussão ética sobre o uso de IA nas decisões automatizadas. Para Silva (2021), o desenvolvimento de protocolos ético-jurídicos robustos é imprescindível para garantir que a IA funcione de acordo com os princípios que regem as interações humanas, evitando danos e preservando a convivência social. A preocupação com a discriminação algorítmica é central, já que os sistemas de IA podem reforçar preconceitos históricos, tornando necessária uma regulamentação que promova a inclusão e impeça qualquer tipo de discriminação.
A revisão também enfatiza a urgência de um marco regulatório abrangente, que consiga equilibrar o avanço tecnológico com a proteção dos direitos humanos. Borges e Graminho (2021) destacam que, embora a IA traga inúmeros benefícios para a sociedade, ela também pode gerar impactos negativos se não for devidamente regulamentada. A relação entre IA e direitos humanos deve ser cuidadosamente observada, de forma que as inovações tecnológicas não amplifiquem desigualdades sociais ou comprometam a dignidade humana.
Portanto, a regulamentação da inteligência artificial é uma questão central para enfrentar os desafios éticos, legais e sociais decorrentes dessa tecnologia. A criação de um arcabouço jurídico que proteja os direitos fundamentais, responsabilize corretamente os agentes envolvidos e promova o uso ético da IA é não apenas desejável, mas imperativa. Profissionais do direito e legisladores devem agir proativamente para garantir que os benefícios da IA sejam amplamente distribuídos, ao passo que seus riscos sejam devidamente mitigados, assegurando um desenvolvimento tecnológico que respeite e valorize os direitos humanos.
5. CONCLUSÃO
Diante disto, conclui-se que a regulamentação da inteligência artificial (IA) deve ser encarada com seriedade e profundidade, evitando abordagens superficiais ou fragmentadas, o lastro da tecnologia trouxe benefícios e malefícios, e com IA não seria de forma diferente. A velocidade com que a IA avança e se integra em diversas áreas da sociedade e economia exige que o arcabouço jurídico acompanhe esse ritmo. É fundamental que a legislação seja dinâmica, assegurando que o desenvolvimento e o uso da IA ocorram de forma ética, responsável e inclusiva.
Um ponto crucial neste debate é o equilíbrio entre inovação e a proteção dos direitos fundamentais. As discussões legislativas devem priorizar o bem-estar social, sem que a dignidade humana, a justiça e a igualdade de oportunidades sejam comprometidas. O desenvolvimento de IA precisa ser feito com base em valores que promovam uma sociedade mais justa, onde a tecnologia sirva ao ser humano e não o subjugue.
Outro aspecto essencial é a responsabilidade compartilhada entre os envolvidos no ecossistema de IA, como desenvolvedores, operadores e os próprios sistemas inteligentes. A criação de políticas públicas fortes e orientadas para a proteção dos indivíduos é indispensável para garantir que a IA opere em conformidade com os princípios éticos da sociedade. Essas políticas devem incluir, por exemplo, diretrizes claras sobre a transparência dos algoritmos, a não discriminação e a segurança dos dados.
Além disso, uma regulamentação bem estruturada permitirá maximizar os benefícios que a IA pode trazer, ao mesmo tempo em que mitiga seus riscos, como o aumento do desemprego em setores automatizados ou a intensificação de desigualdades sociais. Isso significa que o progresso tecnológico deve ser direcionado de forma segura, garantindo o respeito aos direitos humanos e promovendo a justiça social em todas as suas esferas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Rosa, J. M. (2011). Inteligência artificial.
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