A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NO COMÉRCIO ELETRÔNICO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6629260


Autora:
Mariana Mendes Rodrigues
Orientador:
Ricardo Luciano de Lima.

RESUMO

O presente trabalho de pesquisa tem como objetivo o estudo do comércio eletrônico e as regras estatuídas no Decreto-lei n° 7.962/2013. Em havendo uma relação de consumo configurada, de acordo com os artigos 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor, qualquer falha na prestação de serviços por parte do fornecedor de serviços caberá indenização ao consumidor, no campo da responsabilidade civil. Esta é dividida pelo vício do produto, fato do produto ou defeito, vício do serviço e fato do serviço ou defeito. Com a sociedade tecnológica em que se vive atualmente, com acesso fácil ao telefone celular com rede de internet, fez com que crescesse o comércio eletrônico que veio a ser regulamentado em 2013, pelo Decreto-lei n° 7.962, tais como o Mercado Livre, Uber e ainda o Ifood, dentre outros. Havendo falha na prestação de serviços, mesmo usado via smartphone, haverá direito indenizatório. A pesquisa realizada é exploratória, qualitativa, e possui como principal doutrinador Flávio Tartuce, além de estudos legislativos e jurisprudenciais.

Palavras-chaves: Comércio Eletrônico. Falha. Responsabilidade. Jurisprudência.

ABSTRACT

This research work aims to study electronic commerce and the rules laid down in DecreeLaw No. 7,962 / 2013. In the event of a configured consumer relationship, in accordance with articles 2 and 3 of the Consumer Protection Code, any failure in the provision of services by the service provider will indemnify the consumer, in the field of civil liability. This is divided by product addiction, product fact or defect, service addiction and service or defect fact. With the technological society in which we currently live, with easy access to cell phones with an internet network, electronic commerce that grew to be regulated in 2013 by Decree-Law No. 7,962 has grown, such as the Free Market, Uber and Ifood, among others. If there is a failure to provide services, even if used via smartphone, there will be an indemnity right. The research carried out is exploratory, qualitative, and has Flávio Tartuce as its main doctrine, in addition to legislative and jurisprudential studies.

Key-words: E-commerce. Failure. Responsibility. Jurisprudence.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO………………………………………………………………………………………………………….

1 A RESPONSABILIDADE CONSUMERISTA………………………………………………………….

1.1.1 A Responsabilidade Civil pelo Vício do Produto

1.1.2 A Responsabilidade Civil pelo Fato do Produto ou Defeito

1.1.3 A Responsabilidade Civil pelo Vício do Serviço

1.1.4 A Responsabilidade Civil pelo Fato do Serviço ou Defeito

2 AS COMPRAS REALIZADAS VIA INTERNET

3 OS CASOS CONCRETOS

3.1 O Mercado Livre

3.2 Uber

3.3 Ifood

3.4 PIX

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS

As Hipóteses de Responsabilidade Consumerista…………………………………………


INTRODUÇÃO

O presente trabalho de pesquisa possui como objetivo geral realizar o estudo do comércio eletrônico, diante da atual sociedade brasileira em que se vive, em que mais se consome produtos e serviços, mediante uso de aplicativos baixados diretamente nos telefones celulares.

Diante do crescimento do comércio eletrônico, se fez necessário a regulamentação legislativa, através do Decreto-lei n° 7.962/2013, em que e protegeu de forma específica os fornecimentos de produtos e serviços de forma eletrônica, além da necessidade do respeito às diretrizes legais previstas no Código de Defesa do Consumidor.

Primordialmente, será esclarecido sob as hipóteses de responsabilidade consumerista, eis que pode ser por vício do produto ou serviço ou pelo fato do produto ou serviço, esclarecendo suas diferenciações.

No segundo capítulo, consignará de forma pormenorizada, o Decreto-lei n° 7.962/2013, mostrando a previsão legislativa, com apoio do Código de Defesa do Consumidor.

No terceiro e derradeiro capítulo, será exortado casos práticos, no cotidiano vivenciado pelos brasileiros, tais como o uso comum dos aplicativos “Mercado Livre”,

“Uber”, e “Ifood”, em que há o mercado de consumo de fácil acesso pelos consumeristas.

Será demonstrado se havendo falha na prestação de serviços, em tais plataformas digitais, haverá ou não, direito indenizatório pelo consumidor lesado, mostrando o real entendimento majoritário da jurisprudência a respeito.

1 A RESPONSABILIDADE CONSUMERISTA

Primordialmente, antes de se adentrar sob o comércio eletrônico propriamente dito e o que vêm estabelecer o Decreto n° 7.962/2013, se faz necessário consignar sob a responsabilidade consumerista, mostrando as suas diversificações, para que haja uma aplicação na prática, a fim de se demonstrar se é possível haver uma responsabilização, caso haja um abuso por parte do fornecedor, na relação comercial eletrônica.

1.1 As Hipóteses de Responsabilidade Consumerista

Em havendo cometimento de um ato ilícito conforme a preceituação do artigo 186 do Código Civil, nasce à vítima do dano sofrido, o direito de ser indenizada com fulcro no artigo 927 do mesmo diploma cível, cabendo, portanto, ao causador do evento danoso, responsabilizar a parte lesada.

Tal fato funcionará da mesma forma nas relações que envolvam consumidores e fornecedores, havendo, portanto, uma relação de consumo. O consumidor, ao adquirir qualquer produto ou serviço de um fornecedor, poderá ser lesado em tal venda ou contratação, cabendo à vítima, ora na relação e pelas diretrizes legislativas, denominada “consumidor”, ser indenizada sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, podendo fazer a divisão da responsabilidade em várias hipóteses conforme se demonstrará a seguir.

O Código de Defesa do Consumidor concentra a abordagem da responsabilidade civil no produto e no serviço. Nesse contexto, surgem a responsabilidade pelo vício ou pelo fato, sendo o último também denominado de defeito. Desse modo, quatro são as situações básicas de responsabilidade civil tratadas pela Lei Consumerista:

  • Responsabilidade pelo vício do produto;
  • Responsabilidade pelo fato do produto (defeito);
  • Responsabilidade pelo vício do serviço;
  • Responsabilidade pelo fato do serviço (defeito).

Tal divisão é fundamental para compreender a responsabilidade civil dos fornecedores de produtos e prestadores de serviços, cumprindo revelar, de imediato, que existem diferenças bem claras a respeito dos seus efeitos e das atribuições de responsabilidades.

Antes de se demonstrar tais decorrências, é preciso diferenciar o vício do fato ou defeito. No vício, seja do produto ou de serviço, o problema fica adstrito aos limites do bem de consumo, sem outras repercussões (prejuízos intrínsecos).

Por outro lado, no fato ou defeito, seja também do produto ou serviço, há outras decorrências, como é o caso de danos materiais, morais e estéticos (prejuízos extrínsecos).

De outra forma, pode-se dizer que, quando o dano permanece nos limites do produto ou serviço, está presente o vício. Se o problema extrapola os seus limites, há fato ou defeito, presente, no último caso, o acidente de consumo propriamente dito.

A primeira diferença em relação ao vício e ao fato se refere às pessoas legitimadas a responder as situações correspondentes. Como já ficou claro, o Código de Defesa do Consumidor adota a regra geral da solidariedade presumida entre os envolvidos no fornecimento dos produtos e na prestação de serviços.

De início, lembre-se que essa solidariedade pode ser retirada do artigo 7º, parágrafo único da Lei nº 8.078/90.

A ideia de solidariedade é ainda abstraída do sentido dos artigos 14, 18, 19 e 20 da Lei Consumerista, eis que o Código do Consumidor Brasileiro representa uma das principais rupturas do modelo dual de responsabilidade – contratual e extracontratual.

Sendo assim, a solidariedade é a regra, no contrato ou fora dele, em caso de haver uma relação jurídica de consumo, conforme reconhecem várias decisões do Superior Tribunal de Justiça, tais como: STJ – Resp 547.794/PR – Quarta Turma – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 15.02.2011 – Dje 22.02.2011; STJ – AgRg no REsp 1.124.566/AL –

Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 23.11.2010 – Dje 06.12.2010; STJ – Resp 1.190.772/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.10.2010 – Dje 26.10.2010.

Pois bem, como visto, quatro são as hipóteses de responsabilidade civil prevista pelo Código de Defesa do Consumidor: a) responsabilidade pelo vício do produto; b) responsabilidade pelo fato do produto ou defeito; c) responsabilidade pelo vício do serviço; d) responsabilidade pelo fato do serviço ou defeito.

Em três delas, há a solução da solidariedade, respondendo todos os envolvidos com o fornecimento ou a prestação. Em uma delas, a solidariedade não se faz presente.

A diferenciação não é claramente difundida perante o público jurídico nacional. Tanto isso é verdade que muitos erros são cometidos na prática, sendo ouvidos com frequência nas salas de aula.

A exceção à solidariedade atinge o fato do produto ou defeito, pelo que consta dos artigos 12 e 13 da Lei nº 8.078/90. Isso porque ambos os comandos consagram a responsabilidade imediata do fabricante ou de quem o substitua nesse papel e a responsabilidade subsidiária do comerciante.

Preconiza o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

O comerciante tem responsabilidade mediata, somente respondendo nas hipóteses previstas no artigo 13 da Lei nº 8.078/90, in verbis:

Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

– o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
– o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
– não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

Cumpre destacar que o entendimento majoritário da doutrina é no sentido de sustentar a responsabilidade subsidiária do comerciante.

A jurisprudência nacional, do mesmo modo, tem aplicado esse sentido de forma constante, em julgados que reconhecem a ilegitimidade passiva do comerciante em ações contra ele propostas diretamente, em hipóteses de não enquadramento no artigo 13, supramencionado.

O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado no dia 17/04/2018, decidiu:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO. FATO DO PRODUTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTAMENTO DO DEVER DE REPARAÇÃO. ACÓRDÃO ESTADUAL EM CONFORMIDADE COM JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO COMERCIANTE NÃO CONFIGURADA. FABRICANTE IDENTIFICADO. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Esta eg. Corte Superior firmou entendimento de que, uma vez identificado o fabricante do produto impróprio para consumo, não há que se falar em responsabilização solidária do comerciante. Incidência da Súmula 83/STJ. Precedentes. 2. Agravo interno desprovido. (STJ – AgInt no REsp: 1298531 SP 2011/0298083-8, Relator: Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), Data de Julgamento: 17/04/2018, Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 25/04/2018).

Recentemente, em decisão publicada pelo Colendo STJ, em 01/04/2020, restou consignado, a tese de que a responsabilidade do comerciante é subsidiária e não solidária, senão vejamos:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N° 1.647.793 – GO (2020/0007053-9). (…) Neste viés, o artigo 13 da Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) entrega ao comerciante uma RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA (e não solidária) em relação ao resto da cadeia de fornecimento, ou seja, a responsabilidade sobre algum dano só caberia a Recorrente se não fosse identificado o fabricante do produto (…). (STJ – AREsp: 1647793 GO 2020/0007053-9, Relator: Ministro João Otávio de Noronha, Data de Publicação: 01/04/2020).

Vejamos, para melhor conhecimento, entendimento e elucidação, as situações em separado.

1.1.1 A Responsabilidade Civil pelo Vício do Produto

De início, há a responsabilidade por vício do produto (artigo 18 da Lei nº 8.078/90) quando existe um problema oculto ou aparente no bem de consumo, que o torna impróprio para uso ou diminui o seu valor, tido como um vício por inadequação.

Em tais casos, repise-se, não há repercussões fora do produto, não se podendo falar em responsabilização por outros danos materiais, além do valor da coisa, morais ou estéticos.

Garcia obtempera:

O artigo trata da responsabilidade por vício de qualidade do produto, na qual se encontram como sujeitos passivos todos os fornecedores que respondem pelo ressarcimento dos vícios, coobrigados e solidariamente. Aqui, ao contrário da responsabilidade pelo fato do produto (arts. 12 e 13), não há responsabilidade diferenciada para o comerciante.
Da mesma forma que na responsabilidade pelo fato, a responsabilidade por vícios será aferida de forma objetiva, ou seja, não se indaga se o vício decorre de conduta culposa ou dolosa do fornecedor. Também pouco importa se o fornecedor tinha ou não conhecimento do vício para que seja aferida sua responsabilidade. Nos moldes do art. 23, “a ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime de responsabilidade.” (GARCIA, 2017, p. 199).

Em suma, lembre-se que no vício, o problema permanece no produto, não rompendo os seus limites. A título de ilustração, o §6º do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor lista algumas situações em que o vício do produto está presente, em rol exemplificativo, pois os bens são considerados impróprios para uso e consumo, senão vejamos:

Art. 18. (…) (…)
§6º. São impróprios ao uso e consumo:
I – os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;
II – os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;
III – os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam.

Deve ficar claro que o vício do produto não se confunde com as deteriorações normais decorrentes do uso da coisa. Sendo assim, para a caracterização ou não do vício deve ser considerada a vida útil do produto que está sendo adquirido.

Conforme se extrai de trecho de publicação constante do Informativo nº 506 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

O fornecedor responde por vício oculto de produto durável decorrente da própria fabricação e não do desgaste natural gerado pela fruição ordinária, desde que haja reclamação dentro do prazo decadencial de noventa dias após evidenciado o defeito, ainda que o vício se manifeste somente após o término do prazo de garantia contratual, devendo ser observado como limite temporal para o surgimento do defeito o critério de via útil do bem. O fornecedor não é, ad aeternum, responsável pelos produtos colocados em circulação, mas sua responsabilidade não se limita, pura e simplesmente, ao prazo contratual de garantia, o qual é estipulado unilateralmente por ele próprio. (STJ – Resp 984.106/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 04.10.2012).

Não se pode esquecer, ademais, que, no vício do produto, há solidariedade entre todos os envolvidos com o fornecimento, caso do fabricante, do produtor e do comerciante.

Vista tais concretizações, ressalte-se que a lei estabelece duas exceções internas bem específicas a respeito da solidariedade no vício do produto.

A primeira exceção tem relação com os produtos fornecidos in natura, respondendo perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor, conforme §5º do artigo 18 do CDC.

Para concretizar a norma, se alguém adquire uma maçã estragada em uma feira livre, a responsabilidade, em regra, será do feirante. Porém, se na maçã constar o selo do produtor, o que é bem comum, o último responderá pelo vício.

Como segunda exceção, determina o §2º do artigo 19 que o fornecedor imediato, no caso, o comerciante, será responsável pelo vício da quantidade quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais.

O desrespeito à lealdade negocial, à boa-fé objetiva, acaba por gerar a sua responsabilidade pessoal, afastando o dever de reparar o fabricante. A título de exemplo, se há um problema na balança do mercado, que está adulterada, a responsabilidade será do comerciante e não do produtor ou fabricante.

Deve ficar clara a intenção da norma, ao preceituar que a ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos não o exime de responsabilidade conforme artigo 23 do Código de Defesa do Consumidor.

Dessa forma, há um dever legal do fornecedor em evitar o vício, sendo irrelevante o fator culposo ou subjetivo para que surja a correspondente responsabilidade, uma vez que o Código Consumerista adota um sistema objetivo de deveres negociais.

Em outras palavras, pensar o contrário seria a volta ao um modelo classista e superado de Direito Privado, fundado em boas ou más intenções. Fazendo incidir tal ideia, vejamos exemplar julgado do Tribunal Paranaense:

Apelação cível. Ação declaratória de nulidade de título de crédito e cautelar de sustação de protesto. Locação de automóvel. Relação de consumo. Dano no motor. Bem que teria sido entregue em perfeitas condições de uso. Argumento afastado.
Vício oculto que não exime a responsabilidade do fornecedor. Art. 23 do CDC. Nível de óleo e água no radiador. Verificação que é ônus da apelante. Descumprimento de dever inerente à sua função. Locatário que notificou a ocorrência. Inexistência de violação contratual pelo apelado. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJPR – Apelação Cível 0558126-6, Curitiba – Décima Primeira Câmara Cível – Rel. Des. Augusto Lopes Cortes – DJPR 06.04.2009, p. 193).

1.1.2 A Responsabilidade Civil pelo Fato do Produto ou Defeito

No fato do produto ou defeito estão presentes outras consequências além do próprio produto, outros danos suportados pelo consumidor, a gerar a responsabilidade objetiva direta e imediata do fabricante conforme artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor. Além disso, há a responsabilidade subsidiária ou mediata do comerciante ou de quem o substitua conforme artigo 13 da Lei nº 8.078/90.

Garcia exalta:

A doutrina diferencia os termos “vício” e “defeito”. Assim, para parte da doutrina, vício pertence ao produto ou serviço, tornando-o inadequado, mas que não atinge o consumidor ou outras pessoas. Ex: a televisão adquirida que funciona mal. Já o defeito é o vício acrescido de um problema extra. O defeito não só gera uma inadequação do produto ou serviço, mas um dano ao consumidor ou a outras pessoas. Ex: televisão que explode causando danos às pessoas. Nesse sentido, há vício sem defeito, mas não defeto sem vício. (GARCIA, 2017, p. 155).

Presente o fato do produto, a Lei Consumerista assegura o direito de regresso daquele que ressarciu o dano contra o culpado, ou de acordo com as participações para o evento danoso, conforme parágrafo único do artigo 13 do CDC.

Entretanto, nas ações propostas pelo consumidor envolvendo os artigos 12 e 13 da Lei nº 8.078/90, é vedada a denunciação da lide para exercício desse direito de regresso conforme 88 do Código de Defesa do Consumidor.

Nos termos da norma, o direito de regresso pode ser exercido em processo autônomo, sendo facultada ainda a possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos da ação proposta pelo próprio consumidor.

Isso, em momento posterior ao recebimento pelo consumidor do que lhe é devido, em prol da economia processual.

A respeito da vedação da denunciação da lide, anotam com precisão Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, citados por Flávio Tartuce (NERY JÚNIOR; NERY apud TARTUCE), estendendo a conclusão para o chamamento ao processo, nas hipóteses de solidariedade:

O sistema do CDC veda a utilização da denunciação da lide e do chamamento ao processo, ambas condenatórias, porque o direito de indenização do consumidor é fundado na responsabilidade objetiva. Embora esteja mencionada como vedada a denunciação da lide na hipótese do CDC 13, parágrafo único, na verdade o sistema do CDC não admite a denunciação da lide nas ações versando lides de consumo. Seria injusto discutir-se, por denunciação da lide ou chamamento ao processo, a conduta do fornecedor ou de terceiro (dolo ou culpa), que é elemento da responsabilidade subjetiva, em detrimento do consumidor que tem o direito de ser ressarcido em face da responsabilidade objetiva do fornecedor, isto é, sem que se discuta dolo ou culpa.

Apesar de ser esse o entendimento mais justo e correto, em prol da proteção dos consumidores, a jurisprudência superior tem entendido que a vedação da denunciação da lide somente atinge as hipóteses dos artigos 12 e 13 do Código de Defesa do Consumidor, e não outras situações, como naquelas relativas a problemas no serviço.
Nessa linha de pensamento, cito dois julgados, senão vejamos:

Civil e processual. Ação de indenização. Danos morais. Inscrição em cadastros de devedores. Cheques roubados da empresa responsável pela entrega dos talonários. Denunciação da lide. Rejeição com base no art. 88 do CDC. Vedação restrita à responsabilidade do comerciante (CDC, art. 13). Fato do serviço. Ausência de restrição com base na relação consumerista. Descabimento. Aberta de contencioso paralelo. I. A vedação à denunciação à lide disposta no art. 88 da Lei 8.078/90 restringe-se à responsabilidade do comerciante por fato do produto (art. 13), não alcançando o defeito na prestação de serviços (art. 14). II. Precedentes do STJ. III. Impossibilidade, contudo, da denunciação, por pretender o réu inserir discussão jurídica alheia ao direito da autora, cuja relação contratual é direta e exclusiva com a instituição financeira, contratante da transportadora terceirizada, ressalvado o direito de regresso. IV. Recurso especial não conhecido. (STJ – Resp 1.024.791/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 05.02.2009 – Dje 09.03.2009).

Civil e processual. Ação de indenização. Danos morais. Travamento de porta de agência bancária. Denunciação à lide da empresa de segurança. Rejeição com base no art. 88 do CDC. Vedação restrita à responsabilidade do comerciante (art. 13, CDC). Fato do serviço. Ausência de restrição com base na relação consumerista.

Hipótese, todavia, que deve ser apreciada à luz da lei processual civil (art. 70, III). Anulação do acórdão. Multa. Afastamento. Súmula 98-STJ. I. A vedação à denunciação à lide disposta no art. 88 da Lei 8.078/90 restringe-se à responsabilidade do comerciante por fato do produto (art. 13), não alcançando o defeito na prestação de serviços (art. 14), situação, todavia, que não exclui o exame do caso concreto à luz da norma processual gera de cabimento da denunciação, prevista no art. 70, III, da lei adjetiva civil. II. Anulação do acórdão estadual, para que a Corte a quo se manifeste sobre o pedido de denunciação à lide, nos termos acima. III. Precedentes do STJ. IV. ‘Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório’ (Súmula 98 do STJ). V. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (STJ – Resp 439.233/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 04.10.2007 – DJ 22.10.2007, p. 277).

Com o devido respeito, as modalidades de intervenção de terceiros, em regra, tumultuam o processo, dificultando o caminho judicial dos consumidores, já tormentosos.

Assim, o melhor caminho, sem dúvidas, é o seu afastamento, dando primazia ao recebimento dos direitos devidos pelo consumidor e assegurando-se o direito de regresso em posterior momento.

1.1.3 A Responsabilidade Civil pelo Vício do Serviço

Frise-se que, nas hipóteses envolvendo o serviço, tem-se o mesmo tratamento legal, presente a mesma diferenciação concreta entre o chamado vício do serviço e o fato do serviço, sendo o último o defeito a gerar o acidente de consumo.

Iniciando-se pelo vício do serviço, aplica-se a regra de solidariedade entre todos os envolvidos com a prestação. Em outras palavras, se um serviço contratado tiver sido mal prestado, responderão todos os envolvidos.

Nos termos do §2º do artigo 20 do CDC, são considerados como impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.

Em casos tais, enuncia o caput do mesmo preceito legal que o prestador de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária.

Frise-se a premissa da solidariedade passiva, no vício do serviço, respondendo todos os envolvidos com a prestação.

Mais uma vez, também no vício do serviço, a ignorância do fornecedor quanto a tais problemas não o exime de responsabilidade, pelos mesmos fundamentos antes expostos conforme artigo 23 do Código de Defesa do Consumidor.

Ato contínuo, a garantia legal de adequação do serviço independe de termo expresso, sendo vedada a exoneração contratual do fornecedor ou a cláusula que afaste a citada solidariedade conforme artigos 24 e 25 do Código de Defesa do Consumidor.

1.1.4 A Responsabilidade Civil pelo Fato do Serviço ou Defeito

O fato do serviço ou defeito está tratado pelo artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, gerando a responsabilidade civil objetiva e solidária entre todos os envolvidos com a prestação, pela presença de outros danos, além do próprio serviço como bem de consumo.

Deve ficar claro que, no fato do serviço, a responsabilidade civil dos profissionais liberais somente existe se houver culpa de sua parte (responsabilidade subjetiva), conforme preconiza o §4º do artigo 14 da Lei nº 8.078/90.

Assim como ocorre com o produto, o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais o modo de seu fornecimento.

Almeida afirma:

A responsabilidade pelo fato do serviço está previsto no art. 14 do CDC nos seguintes termos: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
Vale lembrar que em razão de um serviço defeituoso ocorre um acidente de consumo e o consequente dever de reparar os danos independentemente da comprovação de dolo ou de culpa. Trata-se mais uma vez de responsabilidade objetiva. (ALMEIDA, 2017, p. 461).

Por outra via, estabelece o §2º do artigo 14 do CDC que o serviço, assim como ocorre com o produto, não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. Dessa forma, se uma empresa passa a utilizar uma nova técnica para desentupimento, isto não quer dizer que há o reconhecimento de que as medidas anteriores eram ruins ou defeituosas.

Deve-se atentar que, no fato do serviço ou defeito, há evidente solidariedade entre todos os envolvidos na prestação, não havendo a mesma diferenciação prevista para o fato do produto, na esteira do que consta dos artigos 12 e 13 do CDC.

Isso porque é difícil diferenciar quem é o prestador direto e o indireto na cadeia de prestação, dificuldade que não existe no fato do produto, em que a figura do fabricante é bem clara.

Almeida complementa:

(…) na definição de serviço defeituoso o CDC levou em consideração a forma como o serviço fora prestado e os eventuais riscos sobre os quais, se inerentes, normais, previsíveis e dentro de uma razoabilidade esperada pelo consumidor, não há falar em defeito em sua prestação.
Ademais, à época em que foi fornecido o serviço no mercado de consumo tem relação com os chamados “riscos de desenvolvimento”, que também não é causa excludente de responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço. (ALMEIDA, 2017, p. 463).

Vejamos decisão do Superior Tribunal de Justiça, que responsabiliza uma instituição bancária pelo serviço mal prestado por empresa terceirizada, o que acabou por acarretar a inscrição do nome do correntista em cadastro de inadimplentes. Pela presença dos danos morais, o caso é o exemplo típico de fato do serviço:

Recurso especial. Extravio de talões de cheque. Empresa terceirizada. Uso indevido dos títulos por terceiros. Inscrição indevida em cadastro de proteção de crédito. Responsabilidade do banco. Dano moral. Presunção. Valor da indenização excessivo – Redução. Recurso especial parcialmente provido. I. Em casos de inscrição devida em órgãos de proteção ao crédito, não se faz necessária a prova do prejuízo. 2. Restou caracterizada a legitimidade passiva do Banco recorrente, o qual é responsável pela entrega dos talões de cheque ao cliente, de forma segura, de modo que, optando por terceirizar esse serviço, assume eventual defeito na sua prestação, mediante culpa in eligendo, por defeito do serviço, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que disciplina a responsabilidade objetiva pela reparação dos danos (REsp 640.196, Terceira Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ 01.08.2005). 3. Firmou-se entendimento nesta Corte Superior que, sempre que desarrazoado o valor imposto na condenação, impõe-se sua adequação, evitando-se assim o injustificado locupletamento da parte vencedora. 4. Recurso especial conhecido em parte e nela parcialmente provido. (STJ – Resp – 782.898/MT – Quarta Turma – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – j. 21.11.2006 – DJ 04.12.2006, p. 328).

Uma vez realizando as hipóteses de responsabilidade civil consumerista, se faz necessário ao próximo capítulo consignar sob o comércio eletrônico, mostrando a possibilidade jurídica de se realizar uma transação comercial consumerista na égide do Decreto n° 7.962/2013.

2 AS COMPRAS REALIZADAS VIA INTERNET

Após realizado o estudo sob a responsabilidade civil advinda de uma relação de consumo, seja pelo defeito do produto ou serviço, ou fato do produto ou serviço, se faz necessário adentar sob as compras realizadas via internet, por meio eletrônico. Atualmente, o comércio eletrônico encontra-se disciplinado pelo Decreto-lei n° 7.962/2013.

Antes de se realizar um detalhamento do decreto supramencionado, importante realizar uma breve menção sob os aspectos subjetivos de uma relação de consumo, sendo o consumidor e o fornecedor.

Preceitua o artigo 2° do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 2°. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Salienta-se que para que uma pessoa possa ser considerada consumidora, ela tem que adquirir um produto ou serviço, como destinatária final, isto é, ela própria tem de usar para si o produto ou serviço que está adquirindo, não podendo adquirir e após revender, pois então seria considerada uma nova fornecedora do produto, na cadeia consumerista.

De acordo com Flávio Tartuce, a teoria adotada para o conceito de consumidor é a teoria finalista, senão vejamos:

Na essência, a teoria finalista ou subjetiva foi a adotada expressamente pelo art. 2° do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor para a qualificação do consumidor, pela presença do elemento da destinação final do produto ou do serviço. Tem prevalecido no brasil a ideia de que o consumidor deve ser destinatário final fático e econômico. (TARTUCE, 2017, p. 58).

Apesar de o entendimento doutrinário ser sob a aplicação da teoria finalista, em compasso com a literalidade do artigo 2° do Código de Defesa do Consumidor, se faz necessário realizar um breve esclarecimento sob as demais teorias existentes: maximalista, minimalista e finalista aprofundada ou mitigada.

A teoria maximalista possui como escopo fazer com que o conceito de consumidor não seja tratado somente aqueles indivíduos que adquirem produto ou serviço como destinatário final, fazendo com que amplie o conceito de consumidor, atingindo o maior número de pessoas possível.

Tartuce obtempera:

A teoria maximalista ou objetiva procura ampliar sobremaneira o conceito de consumidor e daí a construção da relação jurídica de consumo. (…). A definição do art. 2° deve ser interpretada o mais extensivamente possível, segundo esta corrente, para que as normas do CDC possam ser aplicadas a um número cada vez maior de relações de consumo. (TARTUCE, 2017, p. 59-60).

Tal teoria tem como fim fundamentar de que o próprio Código de Defesa do Consumidor amplia o conceito de consumidor, colocando alguns indivíduos como consumidores por equiparação, mesmo não participando diretamente da relação de consumo, que são chamados também de bystander.

Em contrapartida, há a teoria minimalista que, segundo Flávio Tartuce (2017), determina que não há a existência de relação de consumo naqueles casos em que se percebe claramente a relação consumerista, tal como a relação entre o banco e o correntista. Isto porque o §2° do artigo 3° do CDC, determina que as relações bancárias estão abrangidas de proteção do diploma consumerista. Tal teoria encontra totalmente em descompasso com o ordenamento jurídico legal, eis que a própria Súmula n° 297 do Superior Tribunal de Justiça consagra que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Por derradeiro, há a existência de uma quarta teoria, chamada de finalista aprofundada ou mitigada, que para Tartuce (2017) é uma conjugação das teorias finalistas com a maximalista, fazendo com que abranja a proteção do consumidor a um maior número de pessoas, havendo uma limitação da proteção, dentro da destinação final do produto ou serviço adquirido.

Diante de tantas teorias consagradas na doutrina, se faz necessário consignar o entendimento jurisprudencial a respeito, fazendo com que se entenda qual a aplicação na prática dos jurisdicionados brasileiros.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do REsp n° 1195642/RJ, entendeu que:

CONSUMIDOR. DEFINIÇÃO. ALCANCE. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇÃO. FINALISMO APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. VULNERABILIDADE. 1. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica. 2. Pela teoria finalista, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pela Lei nº 8.078/90, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo. 3. A jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando finalismo aprofundado, consistente em se admitir que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço pode ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor. 4. A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra). 5. A despeito da identificação in abstracto dessas espécies de vulnerabilidade, a casuística poderá apresentar novas formas de vulnerabilidade aptas a atrair a incidência do CDC à relação de consumo. Numa relação interempresarial, para além das hipóteses de vulnerabilidade já consagradas pela doutrina e pela jurisprudência, a relação de dependência de uma das partes frente à outra pode, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilidade legitimadora da aplicação da Lei nº 8.078/90, mitigando os rigores da teoria finalista e autorizando a equiparação da pessoa jurídica compradora à condição de consumidora. 6. Hipótese em que revendedora de veículos reclama indenização por danos materiais derivados de defeito em suas linhas telefônicas, tornando inócuo o investimento em anúncios publicitários, dada a impossibilidade de atender ligações de potenciais clientes. A contratação do serviço de telefonia não caracteriza relação de consumo tutelável pelo CDC, pois o referido serviço compõe a cadeia produtiva da empresa, sendo essencial à consecução do seu negócio. Também não se verifica nenhuma vulnerabilidade apta a equipar a empresa à condição de consumidora frente à prestadora do serviço de telefonia. Ainda assim, mediante aplicação do direito à espécie, nos termos do art. 257 do RISTJ, fica mantida a condenação imposta a título de danos materiais, à luz dos arts. 186 e 927 do CC/02 e tendo em vista a conclusão das instâncias ordinárias quanto à existência de culpa da fornecedora pelo defeito apresentado nas linhas telefônicas e a relação direta deste defeito com os prejuízos suportados pela revendedora de veículos. 7. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1195642/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 21/11/2012).

Outrossim, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do REsp n° 1321083-PR, decidiu um caso concreto com base na teoria finalista mitigada, por entender ser essa a adotada pelo Código de Defesa do Consumidor. Tal decisão consta do Informativo n° 548 do Colendo STJ, senão vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPRA DE AERONAVE POR EMPRESA ADMINISTRADORA DE IMÓVEIS. AQUISIÇÃO COMO DESTINATÁRIA FINAL. EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. 1. Controvérsia acerca da existência de relação de consumo na aquisição de aeronave por empresa administradora de imóveis. 2. Produto adquirido para atender a uma necessidade própria da pessoa jurídica, não se incorporando ao serviço prestado aos clientes. 3.
Existência de relação de consumo, à luz da teoria finalista mitigada. Precedentes. 4. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (AgRg no REsp 1321083/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/09/2014, DJe 25/09/2014).

Denota-se que nas relações de consumo, não somente o fornecedor e o consumidor direto que são protegidos, e sim há outros indivíduos que podem ser afetados, também chamando de consumidores por equiparação, conforme determina o parágrafo único do artigo 2° do Código de Defesa do Consumidor. Uma vez uma relação consumerista defeituosa vier a afetar qualquer indivíduo, mesmo indiretamente, deverá o fornecedor responder civilmente por todos os prejuízos causados.

No que concerne ao fornecedor, o artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor preceitua:

Art. 3°. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§1°. Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§2°. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Para que haja um consumidor que adquira um produto ou serviço como destinatário final, se faz necessário que haja, do outro lado da cadeia de consumo, o fornecedor, em que é aquela pessoa, física ou jurídica, brasileira ou estrangeira, que realiza o fornecimento de serviço ou venda de produtos.

Havendo a relação de consumo, o contrato firmado entre o fornecedor e o consumidor regem-se pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor – Lei n° 8.078/90, tendo o consumidor, por ser hipossuficiente, na grande maioria das vezes, direitos resguardados pela lei mencionada, que se encontram disciplinados em um rol exemplificativo, em seu artigo 6°, in verbis:

Art. 6°. São direitos básicos do consumidor:
I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
IX – Vetado;
X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput e deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento.

Sabendo que em uma relação de consumo, para se restar aplicado o Código de Defesa do Consumidor, se faz necessário ter de um lado, o fornecedor de produtos e serviços, e de outro, o consumidor, que adquira como destinatário final, de acordo com a teoria finalista.

As relações de consumo podem advir de diversas formas, podendo ser através de uma compra feita pelo consumidor, diretamente no estabelecimento empresarial do fornecedor, do revendedor ou através do comércio eletrônico. Este, está cada vez mais comum na sociedade consumista brasileira, tendo em vista que a população encontra-se sempre em posse de um aparelho celular e com rede de dados móveis de internet, fazendo com que procurem o produto ou serviço desejado, sem sair de suas casas.

Além do Código de Defesa do Consumidor, que protege o consumidor na relação de consumo, pela omissão que se fez o diploma normativo quanto ao comércio eletrônico, até mesmo pela realidade quando do advento da lei para os dias atuais, se fez necessário editar um diploma normativo específico, protegendo os consumidores que adquirem produtos ou serviços, através do comércio eletrônico.

Com isso, surgiu o Decreto-lei n° 7.962/2013 que, apesar de ser sucinto, pois conta com apenas nove artigos, normatiza o comércio eletrônico, o que merece ser observado detalhadamente.

Diniz menciona:

Para compreender o valor do comércio eletrônico, é preciso compará-lo com as formas de transações comerciais tradicionais e verificar como ele pode transformá-las. A compreensão das possibilidades e limitações do comércio eletrônico ajuda a encontrar meios de melhorar a qualidade de um serviço ou de se desenvolverem mercados de outra forma inacessíveis. O comércio eletrônico também abre novas possibilidades de negócios que seriam impensáveis anteriormente. (DINIZ, 1999).

Silva e Oliveira complementam:

O e-commerce, também conhecido como comércio eletrônico, é uma forma de comércio à distância, onde o fornecedor e o consumidor estão distantes fisicamente, não havendo, para tanto, limite territorial, contudo, estão interligados, em regra, através de uma rede de computadores que pode ser a internet. Deste modo, há circulação de bens e serviços requisitados por consumidores através de uma página virtual que acessam a internet a utilizam para compras on-line. Hoje, é possível efetuar a compra de quaisquer produtos em um ambiente virtual, seja ele um serviço ou produto, sem a necessidade de transporte até o estabelecimento comercial e tampouco “aperto de mão” entre vendedor e cliente. Em suma, o e-commerce trabalha com as mesmas entradas e saídas do que em uma negociação física, porém não há necessidade de um vendedor. (SILVA; OLIVEIRA, 2019, p. 4).

Estatui o artigo 1° do decreto 7.962/2013:

Art. 1°. Este Decreto regulamenta a Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:

I – informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;
II – atendimento facilitado ao consumidor; e
III – respeito ao direito de arrependimento.

Para que um consumidor queira adquirir um produto ou serviço, mesmo não tendo condições financeiras para fazê-lo, faz com que os fornecedores, desejando a venda, façam um comércio eletrônico, facilitando as condições de pagamento, através de instituições financeiras, como a aquisição através de cartões de crédito.

No comércio eletrônico, por haver uma disposição de produtos ou serviços diretamente em sites eletrônicos, faz com que haja uma proteção maior das publicidades que ali estão sendo veiculadas, eis que o consumidor não está fisicamente avaliando o objeto do contrato da relação de consumo, podendo vir a ser amplamente prejudicado.

O dispositivo legal supramencionado determina que o produto, serviço e o fornecedor, nos sites eletrônicos, devem estar claramente identificados, detalhados, não podendo haver dúvida, eis que poderia prejudicar o consumidor na compra. Outrossim, deverá ter um atendimento facilitado ao consumidor.

Se, porventura, uma pessoa venha a adquirir um produto ou serviço no comércio eletrônico, e venha defeituoso, deverá ter um atendimento facilitado ao consumidor, para que possa resolver o impasse, eis que da mesma forma que é facilitada a compra, também deve ser o atendimento do consumidor.

E, ainda, o inciso III do artigo 1° do Decreto-lei n° 7.962/2013 estabelece que deve haver o devido respeito ao direito de arrependimento. Isso porque assim determina o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 49, senão vejamos:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Tais dispositivos legais elucidam que quando há uma compra fora do estabelecimento empresarial, há a possibilidade de o consumidor desistir do produto ou serviço adquirido, no prazo de sete dias, devendo qualquer valor pago, ser restituído, devidamente corrigido.

Não se trata de uma faculdade de o fornecedor querer devolver o dinheiro e rescindir o contrato de venda, e sim de uma imposição legislativa, realizando uma análise pormenorizada do sentido da letra da lei, mostrando veemente que o direito de arrependimento é previsto e deve ser respeitado.

Destarte, dispõe o artigo 2° do Decreto-lei n° 7.962/2013:

Art. 2°. Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para oferta ou conclusão de contrato de consumo devem disponibilizar, em local de destaque e de fácil visualização, as seguintes informações:

I – nome empresarial e número de inscrição do fornecedor, quando houver, no Cadastro Nacional de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda;
II – endereço físico e eletrônico, e demais informações necessárias para sua localização e contato;
III – características essenciais do produto ou do serviço, incluídos os riscos à saúde e à segurança dos consumidores;
IV – discriminação no preço, de quaisquer despesas adicionais ou acessórias, tais como as de entrega ou seguros;
V – condições integrais da oferta, incluídas modalidades de pagamento, disponibilidade, forma e prazo da execução do serviço ou da entrega ou disponibilização do produto; e
VI – informações claras e ostensivas a respeito de quaisquer restrições à fruição da oferta.

Não basta que o fornecedor deseje realizar a venda de seus produtos ou serviços, via internet, sem respeitar quaisquer parâmetros para a venda. Isso porque, pelo dispositivo legal mencionado, deve haver uma série de requisitos que devem ser cumpridos para que possa haver uma alienação, via comércio eletrônico, com intuito de proteger o consumidor, de quaisquer problemas que possam vir a surgir no futuro.

Um dos requisitos trata exatamente de que, mesmo que haja a compra via internet, deve haver no site eletrônico o endereço físico do estabelecimento empresarial, para contato, caso necessite o consumidor.

Se, porventura, o adquirente seja prejudicado em uma compra de produto ou serviço, vindo, a título de exemplo, um produto defeituoso, deverá entrar em contato com a empresa para que possa haver a restituição do bem, por outro da mesma espécie, ou devolução da quantia paga, tudo devidamente corrigido monetariamente.

Insta salientar, mais uma vez, sob o instituto do arrependimento que é possível em tais relações de consumo, eis que a contratação se realizou fora do estabelecimento empresarial, podendo o consumidor realizar a desistência da compra em até sete dias, a partir do recebimento do produto, devendo ser restituído de todos os valores arcados até então.

Caso não haja a resolução dos problemas que podem vir a surgir, como o não desejo do fornecedor em reparar os danos que sofreu o consumidor, realizando a troca do produto por outro em perfeito estado, ou restituindo os valores pagos no ato da compra, poderá fazer com que o consumidor procure os órgãos de proteção aos consumidores, como os Procon’s, para que tente resolver o conflito amigavelmente, sem adentrar na esfera judicial.

Se, mesmo assim, não houver acordo amigável entre o consumidor lesado e o fornecedor, poderá aquele ajuizar demanda judicial, visando o recebimento de seus prejuízos, seja materialmente, ou até por danos morais, tudo à depender do caso em concreto.

Ainda, merece destaque os incisos IV e V do artigo 2° do Decreto-lei n° 7.962/2013, que determina que o fornecedor, em seu site eletrônico, no momento do ato da compra, deve informar ao consumidor, as modalidades de pagamento, seja através de cartões de crédito, débito, ou boleto bancário, consignando ainda, se há acréscimo de valor, para entrega do produto na residência do consumidor, visando sempre a transparência na contratação.

Por sua vez, preconiza o artigo 3° do Decreto-lei mencionado que:
Art. 3°. Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para ofertas de compras coletivas ou modalidades análogas de contratação deverão conter, além das informações previstas no art. 2°, as seguintes:
I – quantidade mínima de consumidores para a efetivação do contrato;
II – prazo para utilização da oferta pelo consumidor; e
III – identificação do fornecedor responsável pelo sítio eletrônico e do fornecedor do produto ou serviço ofertado, nos termos dos incisos I e II do art. 2°.

O dispositivo legal vêm consagrar sob a oferta coletiva, eis que quando há a oferta pela internet, através de seus sites, há demanda coletiva, apesar de haver compras de forma individual. Isso porque os sítios eletrônicos dos fornecedores estão expostos a um número indeterminado de pessoas.

Uma vez havendo uma oferta coletiva, devem os fornecedores cumprirem com os requisitos constantes no artigo 3°, sob pena de ofensa literal à legislação, protegendo os consumidores de qualquer oferta abusiva, enganosa, vexatória.

Além dos requisitos trazidos no artigo 2°, há outros que estão previstos no dispositivo legal supramencionado, que devem, obrigatoriamente, serem respeitados. No que tange à facilitação ao consumidor do comércio eletrônico, determina o artigo 4°, in verbis:

Art. 4°. Para garantir o atendimento facilitado ao consumidor no comércio eletrônico, o fornecedor deverá:

I – apresentar sumário do contrato antes da contratação, com as informações necessárias ao pleno exercício do direito de escolha do consumidor, enfatizadas as cláusulas que limitem direitos;
II – fornecer ferramentas eficazes ao consumidor para identificação e correção imediata de erros ocorridos nas etapas anteriores à finalização da contratação;
III – confirmar imediatamente o recebimento da aceitação da oferta;
IV – disponibilizar o contrato ao consumidor em meio que permita sua conservação e reprodução, imediatamente após a contratação;
V – manter serviço adequado e eficaz de atendimento em meio eletrônico, que possibilite ao consumidor a resolução de demandas referentes a informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento do contrato;
VI – confirmar imediatamente o recebimento das demandas do consumidor referidas no inciso, pelo mesmo meio empregado pelo consumidor; e
VII – utilizar mecanismos de segurança eficazes para pagamento e para tratamento de dados do consumidor.
Parágrafo único. A manifestação do fornecedor às demandas previstas no inciso V do caput será encaminhada em até cinco dias ao consumidor.

Observa-se pelo dispositivo legal que o fornecedor possui diversos afazeres quando deseja realizar a venda de produtos ou serviços, em comércio eletrônico. A imposição legislativa se dá ao fator de que o consumidor, por ser parte hipossuficiente, econômico e socialmente falando, deve ser protegido de qualquer publicidade enganosa ou abusiva, devendo o produto ou serviço adquirido, estar exatamente nos termos da contratação.

O fornecedor deve ter um meio eficaz de atendimento via eletrônico, quando o consumidor desejar entrar em contato com aquele, quando haja algum defeito no produto ou serviço, ou até mesmo dúvidas em relação ao objeto contratado, que deverá ser respondido os questionamentos, no prazo de cinco dias, conforme parágrafo único do artigo 4° do Decreto-lei n° 7.962/2013, tentando ao máximo amenizar o abarrotamento do Poder Judiciário, com demandas judiciais que poderiam ser evitadas, através de uma solução extrajudicial.

Determinam os artigos 5° ao 8° do Decreto-lei:

Art. 5°. O fornecedor deve informar, de forma clara e ostensiva, os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento pelo consumidor.
§1°. O consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento pela mesma ferramenta utilizada para a contratação, sem prejuízo de outros meios disponibilizados.
§2°. O exercício do direito de arrependimento implica a rescisão dos contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumidor.
§3°. O exercício do direito de arrependimento será comunicado imediatamente pelo fornecedor à instituição financeira ou à administradora do cartão de crédito ou similar, para que:
I – a transação não seja lançada na fatura do consumidor; ou
II – seja efetivado o estorno do valor, caso o lançamento na fatura já tenha sido realizado.
§4°. O fornecedor deve enviar ao consumidor confirmação imediata do recebimento da manifestação de arrependimento.
Art. 6°. As contratações no comércio eletrônico deverão observar o cumprimento das condições da oferta, com a entrega dos produtos e serviços contratados, observados prazos, quantidade, qualidade e adequação.
Art. 7°. A inobservância das condutas descritas neste Decreto ensejará aplicação das sanções previstas no artigo 56 da Lei n° 8.078, de 1990.

Uma regra importante a ser observada é no tocante às instituições financeiras de cartões de crédito do consumidor, que é utilizado no momento do ato da compra, via comércio eletrônico. Isso porque se houver o arrependimento, deverá o fornecedor enviar à instituição bancária, a informação de que não haja o lançamento na fatura do cartão de crédito do consumidor, o valor do produto ou serviço adquirido.

Tal situação se deve pelo fato de que quando há o arrependimento da compra feita, há a rescisão contratual consumerista, não podendo o consumidor arcar com qualquer valor, mesmo que tenha sido feita o lançamento na fatura do cartão de crédito. Caso a instituição financeira já tenha feito, deverá ser feito o estorno do valor, eis que o parágrafo único do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor preconiza, expressamente, que o arrependimento ofertado pelo consumidor fará com que seja devolvido todos os valores até então pagos, tudo devidamente corrigidos monetariamente.

O artigo 7° do Decreto-lei n° 7.962/2013 ainda determina que, se porventura, não houver o cumprimento das disposições contidas no diploma normativo, deverá o fornecedor responder pelas sanções administrativas contidas no artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor, que reza:

Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:
I – multa;
II – apreensão do produto;
III – inutilização do produto;
IV – cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V – proibição de fabricação do produto;
VI – suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
VII – suspensão temporária de atividade;
VIII – revogação de concessão ou permissão de uso;
IX – cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X – interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade; XI – intervenção administrativa; XII – imposição de contrapropaganda.

Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo.

Impende salientar, portanto, que toda relação de consumo é protegida pelo Código de Defesa do Consumidor – Lei n° 8.078/90. Quando há a relação de consumo advinda do comércio eletrônico, há ainda a previsão normativa do Decreto-lei n° 7.962/2013, cujas disposições restaram consignadas expressamente em linhas pretéritas, que devem ser observadas, de forma obrigatória, por parte do fornecedor, sob pena de sofrerem sanções administrativas.

Realizadas as disposições normativas do comércio eletrônico, se faz necessário realizar a menção de algumas compras que são comuns de serem feitas pelos consumidores na realidade atual brasileira.

3 OS CASOS CONCRETOS

Uma vez realizado o estudo da responsabilidade consumerista, mostrando as suas especificações, tais como fato do produto/serviço e vício do produto/serviço, bem como a análise pormenorizada do Decreto n° 7.962/2013, é imprescindível adentrar sob os casos concretos, isto é, analisar o comércio eletrônico existentes na sociedade brasileira atual, com a modernização dos aparelhos celulares, bem como maior acesso dos consumidores à rede de internet.

3.1 O Mercado Livre

Com a modernidade da tecnologia, em que a maioria da população brasileira possui aparelhos celulares e respectivos dados móveis de internet, e ainda o aumento do consumismo e o imediatismo dos cidadãos, as compras em plataformas digitais cresceram assustadoramente.

Impende salientar que a forma tradicional que sempre existiu, seria a vez de que o consumidor iria pessoalmente na loja física do fornecedor, para a contratação do que desejava, negociando diretamente. Contudo, com a modernidade da tecnologia, fez com que surgisse uma grande leva de plataformas digitais, em que realizam vendas de produtos e serviços, diretamente em seus sites, não necessitando de que o consumidor saia de sua casa.

Ao mesmo tempo que trata-se de uma facilidade para o consumidor, eis que pode realizar a compra de um produto ou serviço diretamente de sua residência, não necessitando se dirigir ao estabelecimento empresarial, economizando tempo, faz com que o consumidor fique ainda mais a mercê dos fornecedores, podendo haver diversos abusos na publicidade e compra.

Uma das plataformas digitais, mais conhecida do público é o mercado livre, em que realizam a venda de produtos novos e usados, podendo qualquer pessoa física ou jurídica se cadastrar no site e colocar o produto que está vendendo, bem como o preço, qualidades do produto, características, forma de pagamento, dentre outros fatores.

Para que possa haver a venda do produto em tal plataforma digital, primeiramente a pessoa irá fazer um cadastro pessoal, colocando todos os seus dados pessoais, até mesmo para segurança do site. Posteriormente, irá preencher um formulário, colocando todas as características do produto que queira vendar, bem como anexar as fotos do objeto, para que possa ser postado logo em seguida.

Depois de realizado todos os passos, o produto será disponibilizado à venda na plataforma digital. Ocorre que após a postagem do produto, toda a parte de negociação do produto, recebimento de pagamento, será feito diretamente pela plataforma digital, e somente posteriormente, repassado ao dono do produto.

Pode-se questionar em qual momento em que o Mercado Livre vêm a se beneficiar e garantir seu lucro na negociação do produto de uma pessoa que venha a postar o objeto em seu site. Tal se dá na contratação no momento do cadastro do produto na plataforma digital, em que o cidadão irá escolher qual o valor que irá pagar ao Mercado Livre, de acordo com uma tabela de preços apresentada pelo mesmo.

Isso porque quanto maior a comissão da venda do produto, maior será a divulgação do objeto na plataforma digital, sendo levado ao conhecimento a um número maior de pessoas.

Denota-se que o proprietário real do produto não é o Mercado Livre e sim uma pessoa física ou jurídica que realiza o cadastramento no site e posta o objeto para venda. Por tal razão, se faz imprescindível que a plataforma digital recolha todos os dados pessoais do verdadeiro proprietário do bem, para que se possa resguardar juridicamente.

Trata-se o Mercado Livre, portanto, de uma plataforma eletrônica de intermediação, eis que não é a proprietária do produto, e sim recebe comissão para intermediar a venda entre o real proprietário do objeto e o futuro consumidor, que são clientes inscritos em seus cadastros.

Se, porventura, o consumidor vier a ser prejudicado, deve-se avaliar o caso em concreto, para se avaliar se houve a falha na prestação de serviços da plataforma digital, eis que se veio o adquirente a ser lesionado por sua falha, há sim o direito de o Mercado Livre ser responsabilizado solidariamente com o proprietário do produto, em compasso com os artigos 12 e 14, ambos do Código de Defesa do Consumidor.

Analisando sob a responsabilidade civil da plataforma digital intermediadora da compra, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, julgou um caso concreto recentemente, em 18 de Novembro de 2.019, decidindo:

RECURSO INOMINADO. PEDIDO DE BALCÃO. VENDA DE PRODUTO ATRAVÉS DA PLATAFORMA MERCADO LIVRE. VENDA NÃO REGISTRADA NO SITE. ENVIO DO BEM E NÃO RECEBIMENTO DE VALORES. FRAUDE. ENDEREÇO ELETRÔNICO NÃO OFICIAL. NEGOCIAÇÃO QUE OCORREU COM TERCEIRO. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO MERCADO LIVRE. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. Alegou a altura ter utilizado a plataforma online Mercado Livre para realizar a venda um macacão de motociclista. Disse que recebeu e-mail informando sobre a compra da roupa. Por isso, entrou em contato com a compradora por meio diverso, sendo que, após o envio do pedido, não recebeu o pagamento referente ao negócio, pelo que requereu a condenação da compradora e da plataforma ao pagamento do valor do produto e dos custos com o envio. Em contestação, o requerido Mercado Livre defendeu sua ilegitimidade passiva e, no mérito, sustentou a ausência de responsabilidade no caso, em razão da autora ter optado por fazer a negociação com terceiro fora do site da ré, e efetuando o envio do produto através de e-mail recebido de domínio diverso dos que lhe pertence. A corréu Silvana, citada, não compareceu às audiências, bem como deixou de contestar o feito, pelo que revel. Sobreveio sentença que reconheceu a ausência de responsabilidade da empresa Mercado Livre porque comprovado nos autos ter a autora recebido –mail com domínio diverso, fraudulento, e enviado o produto, não observando o dever de cautela que se impunha. Com efeito, tendo a autora optado por vender o produto fora da plataforma da empresa requerida, através de e-mail, cujo domínio não é aquele utilizado pela empresa demandada, não pode pretender seja o Mercado Livre responsabilizado pela ausência do pagamento, não se verificando qualquer falha na prestação do serviço de intermediação. Neste sentido: RECURSO INOMINADO. PEDIDO DE BALCÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. CONSUMIDOR. COMPRA E VENDA DE MACBOOK PRO PELA INTERNET. OFERTA DE VENDA NO SITE DA RÉ. MERCADO LIVRE. ENVIO DA MERCADORIA APÓS RECEBIMENTO DE EMAIL INFORMANDO O PAGAMENTO QUE NÃO OCORREU. CORREIO ELETRONICO FRAUDULENTO. AUSENCIA DE CAUTELA MÍNIMA DA AUTORA QUE DEIXOU DE OBSERVAR AS REGRAS DA PLATAFORMA DO RÉU, ENVIANDO PRECIPITADAMENTE O PRODUTO SEM ANTES VERIFICAR O CRÉDITO EM SUA CONTA GRÁFICA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA. RECURSO NÃO PROVIDO. (Recurso Cível, n° 71008092694, Quarta Turma Recursal Cível,

Turmas Recursais, Relator: Gisele Anne Vieira de Azambuja, Julgado em: 30-112018). Inocorrência de danos morais, diante da ausência de prova de lesão a direito de personalidade da autora. Prejuízo unicamente de cunho patrimonial, cuja reparação já foi contemplada na sentença. Decisum que merece ser mantido, por seus próprios fundamentos, a teor do artigo 46 da Lei n° 9.099/95. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível, n° 71008654758, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Roberto Behrensdorf Gomes da Silva, Julgado em: 1811-2019). (TJ-RS – Recurso Cível: 71008654758 RS, Relator: Roberto Behrensdorf Gomes da Silva, Data de Julgamento: 18/11/2019, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 20/11/2019).

Denota-se do julgado supramencionado, que o Mercado Livre possui sim responsabilidade consumerista, por ser uma plataforma intermediadora da relação de consumo, na aquisição dos produtos contidos em seu site. Entretanto, deve-se haver de fato uma falha na prestação de serviços por parte da empresa.

No caso julgado, apesar de a proprietária do produto ter colocado o mesmo no site para venda, resolveu por sua livre e espontânea vontade, vender o produto fora da plataforma, através de e-mail particular, não podendo haver responsabilização do Mercado Livre no presente caso, eis que não houve a falha na prestação de seus serviços.

Destarte, quando há a falha na prestação de serviços, como a não entrega do produto pelo Mercado Livre ao consumidor, há o dever de responsabilização da plataforma intermediadora. Assim decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, senão vejamos:

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – COMPRA E VENDA DE PRODUTO PELA INTERNET ATRAVÉS DO SITE MERCADO LIVRE – Ação de indenização por danos morais e materiais – Aparelho celular usado adquirido de terceiro na internet com intermediação do pagamento pelo site da ré Mercado livre – Mercadoria não entregue pelo vendedor – Preço descontado do comprador mesmo após o cancelamento do negócio – Necessidade de aforamento de ação judicial para a restituição do montante pago pelo consumidor – Cabimento da indenização por danos materiais – Indenização por danos morais descabida – Apesar de ser possível a ocorrência de abalo psíquico-físico decorrente dos transtornos causados ao autor, com o desconto indevido do valor mesmo sem a entrega do produto, este não é o caso dos autos, pela ausência de comprovação – Não configuração do dano moral, porquanto o caso concreto se apresenta como mero aborrecimento decorrente de inadimplemento contratual – Sentença mantida – Recurso não provido. (TJ-SP – APL: 10027263420158260347 SP 1002726-34.2015.8.26.0347, Relator: Carlos Nunes, Data de Julgamento: 09/08/2016, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 10/08/2016).

Pela não entrega do produto ao consumidor, a plataforma Mercado Livre foi condenada ao pagamento de indenização por danos materiais, eis que houve falha na prestação de serviços, causando prejuízos materiais ao adquirente do produto. Ao dano moral pleiteado, não houve deferimento, eis que não houve comprovação do abalo psíquico sofrido, tratando-se o caso, de mero aborrecimento.

Outrossim, em recente decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em 10/12/2019, houve a condenação do Mercado Livre ao pagamento dos danos sofridos por consumidor, que adquiriu um aparelho celular, havendo a compra através de cartão de crédito, e o produto não fora entregue na residência do adquirente. Ao caso concreto, houve expressamente a condenação de acordo com a responsabilidade objetiva consagrada no Código de Defesa do Consumidor. Segue ementa do julgamento:

CIVIL. CONSUMIDOR. COMPRA DE CEULAR PELA INTERNET. MERCADO LIVRE/MERCADO PAGO. PRODUTO NÃO ENTREGUE. NÃO EVIDENCIADA A CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO OU DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA FORNECEDORA. TEORIA DO RISCO DO NEGÓCIO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

I. Recurso interposto pela requerida contra sentença de procedência parcial dos pedidos (condenação da requerida à devolução do valor pago pelo celular Iphone X – R$ 3.690,00 – produto não entregue). Alega a recorrente: (i) ser apenas intermediária entre vendedores e compradores, razão pela qual não pode ser responsabilizada por fato de terceiro; (ii) o recorrido efetuou a negociação e a compra fora da plataforma do Mercado Livre, a afastar a compra garantida do Mercado Pago. II. Rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva: o recorrente, por integrar a cadeira produtiva (gerenciamento de pagamento), responde objetiva e solidariamente pelos danos causados ao consumidor pela defeituosa prestação do serviço (CDC, artigos 7°, parágrafo único, 14, caput e 25, §1°). Precedentes: TJDFT, 6ª Turma Cível, Acórdão n. 950417; 1ª Turma Recursal, Acórdão n. 971692; 2ª Turma Recursal, Acórdão n. 907614. III. MÉRITO. A. A questão de direito material deve ser dirimida à luz das normas protetivas do CDC (arts. 6° e 14). B. Respeitante à moldura fática, destaca-se: (i) o requerente/recorrido comprovou o pagamento do produto (aparelho celular) pelo valor de R$ 3.690,00, por meio de cartão de crédito, em cuja fatura consta, inclusive, mercado pago como o responsável pelo débito (Id 12559653 – Pág. 1); (ii) o consumidor efetuou reclamação ao Mercado Pago em decorrência do produto não ter sido entregue, oportunidade em que foi informado que deveria reclamar com o vendedor, por ter negociado fora do Mercado Livre (Id 12559660 – Pág. 1). C. No caso concreto, a recorrente não comprovou minimamente que o consumidor tivesse mantido contato direto com o vendedor para efetivação da compra. Nesse quadro, configurada a defeituosa prestação do serviço (produto não entregue – CDC, Art. 14, §1°, I e II), responde a recorrente objetivamente pelos prejuízos (pagamento de R$ 3.690,00) experimentados (risco da atividade empresarial), especialmente porque ausente demonstração de qualquer circunstancia apta, em tese, a afastar a responsabilidade objetiva do recorrente (CDC – Art. 14, §3°, I e II). Precedentes TJDFT: 6ª Turma Cível, Acórdão n. 645568; 3ª Turma Recursal, Acórdão n. 728788. D. Por fim, não constatado dolo processual ou conduta temerária à condenação da parte recorrente por litigância de má-fé (pedido formulado em contrarrazões). IV. Recurso conhecido e improvido. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Condenada a recorrente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação (Lei n° 9.099/95, Arts. 46 e 55). (TJ-DF 07139335720198070003 DF 0713933-57.2019.8.07.0003, Relator: Fernando Antônio Tavernard Lima, Data de Julgamento: 10/12/2019, Terceira Turma Recursal, Data de Publicação: 18/12/2019).

No caso julgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, ficou determinado que houve a falha na prestação de serviços do Mercado Livre, em que o consumidor efetuou a compra de um aparelho celular, pagou por ele, através de seu cartão de crédito, e não recebeu o produto em sua residência.

A responsabilidade ao caso analisado é objetiva, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, embasando a condenação sob a teoria do risco do negócio. Tentou a plataforma intermediadora convencer o órgão julgador de que a responsabilidade foi de terceiro, e de que o Mercado Livre é apenas intermediar a compra do vendedor com o comprador, não podendo assim, ser responsabilizada.

Entretanto, a tese de defesa do Mercado Livre não fora aceita, eis que trata-se de uma fornecedora de serviços, apesar de ser intermediadora entre as compras realizadas em sua plataforma. Por ser fornecedora, submete-se às regras estatuídas no Código de Defesa do Consumidor, não podendo de forma alguma, lesionar qualquer consumidor. Ficando comprovada a falha na prestação de serviços, a plataforma intermediadora será responsabilizada ao pagamento de indenização, por danos materiais e/ou morais, à depender do caso em concreto.

Ainda, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, já analisou o caso de responsabilização da plataforma do Mercado Livre, em caso de ocorrência de culpa concorrente, senão vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. COMÉRCIO ELETRÔNICO. MERCADO LIVRE. CULPA CONCORRENTE. FRAUDDE. DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS. Situação dos autos em que o contexto probatório evidenciou a deficiência do sistema da plataforma de venda disponibilizada pelo demandado, possibilitando o acesso por terceiro fraudador ao endereço de e-mail do vendedor, fraudando a informação de confirmação de pagamento. Culpa concorrente da parte autora, embora a incidência do CDC que adota a teoria objetiva e prevê como eximente a culpa exclusiva da vítima, doutrina e jurisprudência passaram a admitir que a conduta da vítima também fosse sopesada por ocasião da fixação do dano, o que, no caso concreto, ocorreu na medida em que não atentou à conferência das instruções de segurança por meio do sistema para realização das vendas do produto ofertado. DANOS MATERIAIS. CONFIGURAÇÃO. Cabível o acolhimento dos danos materiais, consistente no ressarcimento de metade do valor do bem colocado à venda, repartida a culpa pelo reconhecimento da concorrência. APELAÇÕES DESPROVIDAS. (TJ-RS – AC: 70072734874 RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Data de Julgamento: 28/06/2017, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: 30/06/2017).

Portanto, pelos julgados mencionados, demonstra-se que a plataforma intermediadora do Mercado Livre, pode ser responsabilizada por danos materiais e/ou morais, em face de consumidores, havendo a falha na prestação de serviços.

3.2 Uber

Outra plataforma digital bastante utilizada atualmente é a “Uber”, que são motoristas particulares que usam de seus próprios veículos para fazerem viagens de passageiros, de clientes que são inscritos no aplicativo. Destaca-se que no presente caso, o aplicativo é utilizado pelos usuários em aparelho celular, em que realizam contrato breve de prestação de serviços, tendo o motorista a obrigatoriedade de levar o consumidor de um lugar a outro, nos termos contratados no aplicativo.

Para se analisar a situação dos “Uber” e a questão da responsabilidade civil, se faz necessário haver a separação entre a relação existente entre a empresa e o motorista que presta o serviço, e a entre o motorista e o cliente, este que contrata o serviço para realização de transporte terrestre.

Isso porque, quando se fala na relação entre a plataforma de viagens “Uber” e o motorista, não há aplicação do Código de Defesa do Consumidor, isto porque o motorista não pode ser enquadrado no conceito de consumidor insculpido no artigo 2° do CDC, tendo em vista que utiliza o aplicativo e presta serviços com objetivo de lucro.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em 16 de Julho de 2019, decidiu a respeito, senão vejamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. APLICATIVO DE TRANSPORTE. UBER. DESCREDENCIAMENTO DE MOTORISTA PARCEIRO. PEDIDO DE REATIVAÇÃO DE CONTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO COM BASE NO ART. 6°, VIII, DA LEI CONSUMERISTA. INAPLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REFORMA DA DECISÃO. O Código e Defesa do Consumidor não se aplica à relação jurídica mantida entre a Uber e o motorista cadastrado e que utiliza o aplicativo para o desenvolvimento de sua atividade econômica. Como o aplicativo é contratado pelo motorista parceiro a fim de incrementar sua atividade econômica, realizando a intermediação com o passageiro, o agravado não se adequa ao conceito de consumidor, definido pelo artigo 2° do CDC, em relação ao aplicativo. Por não se tratar de consumo, a relação contratual mantida entre as partes se submete ao regime jurídico comum tratado no Código Civil. Afastada a incidência da legislação consumerista, a controvérsia deve ser solucionada pelo meio da distribuição do ônus probatório preconizada pela lei processual no seu artigo 373, incisos I e II. Conhecimento e provimento do recurso. (TJ-RJ – AI: 00230586620198190000, Relator: Des(a). Rogério de Oliveira Souza, Data de Julgamento: 16/07/2019, Vigésima Segunda Câmara Cível).

Conforme já mencionado em linhas pretéritas, para que haja a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em um caso concreto, se faz necessário que haja o fornecedor de um lado, e, de outro, o consumidor, nos estritos termos dos conceitos preconizados nos artigos 2° e 3° da Lei n° 8.078/90.

Na relação contratual existente entre o aplicativo “Uber” e o motorista, trata-se de uma relação cível e não consumerista, eis que o motorista não pode ser enquadrado como consumidor, eis que utiliza da plataforma de viagens com o objetivo de lucro pessoal, repassando apenas uma comissão à empresa mencionada.

Por não poder ser enquadrado como consumidor, não se enquadra os requisitos subjetivos para aplicação do Código de Defesa do Consumidor, devendo toda a relação contratual existente entre o aplicativo e o motorista, ser regida pelo código civil, através dos dispositivos que tratam dos contratos.

Todavia, quando se olha ao ponto da relação existente entre o motorista e o cidadão, cliente, que recebe a prestação de serviços de transporte, se deslocando de um local para outro, aí sim haverá a aplicação da Lei n° 8.078/90. Isso porque, há um prestador de serviços, sendo o motorista, acompanhado do aplicativo “Uber”, bem como a pessoa contratante, recebedora da prestação de serviços oferecida, sendo o destinatário final do transporte.

Sob a aplicação do Código de Defesa do Consumidor sob tal relação mencionada, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em 27 de Junho de 2.019, definiu:

JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. APLICATIVO DE TRANSPORTE UBER. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO NÃO CARACTERIZADA. NEXO CAUSAL INEXISTENTE. 1. Embora o réu/recorrente alegue que atua somente conectando pessoas, a sua atividade possui fim lucrativo, pois recebe parcela dos valores relativos aos serviços prestados. Logo, integra a cadeia de fornecedores e, portanto, no âmbito do direito consumidor, é responsável solidariamente por eventuais danos causados aos consumidores. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. 2. A controvérsia deve ser solucionada sob o prisma do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor. A responsabilização civil nas relações de consumo assenta-se na teoria da qualidade do serviço ou do produto (art. 14 do CDC) e a exoneração total ou parcial da responsabilidade do prestador de serviços requer a presença de algum dos elementos obstativos do nexo causal, previstos no art. 14, §3°, do CDC. 3. No caso, o autor/recorrido solicitou serviço de transporte pelo aplicativo uber às 04:13h, com destino ao aeroporto, para embarque em voo às 05:55h. Occorre que o motorista selecionado cancelou a corrida às 05:00h, restando o autor/recorrido ter que se transportar ao aeroporto por outro meio, o que fez com que ele perdesse o voo. Nada obstante, não há como se atribuir a culpa pela do voo ao réu/recorrente, pois o serviço de transporte não está atrelado ao horário de voo contratado pelo autor/recorrido, que deve requerer o serviço a tempo suficiente para a sua chegada, com antecedência, no aeroporto, considerando, inclusive, a possibilidade da ocorrência de eventuais imprevistos ou transtornos. Com efeito, percebida a demora do uber e, considerando a hora do seu voo, deveria o recorrente ter providenciado, a tempo, outro meio de transporte, ou tê-lo solicitado com a devida antecedência, uma vez que, como se sabe, é permitido ao motorista do uber o cancelamento de corridas antes do embarque do passageiro, não restando configurada a falha na prestação do seu serviço, sobretudo porque não está na esfera de conhecimento do uber o horário de voo do recorrido, não se vinculando a ele, o que demonstra a inexistência do nexo de causalidade. 4. Desse modo, a perda do voo se deu por culpa exclusiva do autor/recorrido, de modo a elidir a responsabilidade do réu/recorrente, nos termos do art. 14, §3°, II, do CDC. 5. Preliminar rejeitada. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada, para julgar improcedentes os pedidos. Sem custas processuais e honorários advocatícios, a teor do art. 55 da Lei 9.099/95. 6. A ementa servirá de acórdão, conforme art. 46 da Lei n. 9.099/95. (TJ-DF 07001473720198070005 DF 0700147-37.2019.8.07.0005, Relator: Soníria Rocha Campos D’Assunção, ata de Julgamento: 37/06/2019, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: Publicada no DJE: 02/07/2019).

Denota-se do julgamento proferido pelo TJDFT, que o cancelamento da viagem por parte do motorista, não pode ser considerada uma falha na prestação de serviços, para se haver uma responsabilização consumerista do motorista. Contudo, na relação existente entre o último e o cliente, é consumerista, aplicando-se todas as vertentes do Código de Defesa do Consumidor, inclusive sob a inversão do ônus probatório, insculpido no inciso VIII do artigo 6° do diploma normativo.

Havendo falha na prestação de serviço, há o dever da Empresa em pagar indenização em prol do consumidor, que utilizou o serviço de transporte. Segundo Brenno Grillo, em artigo publicado no site “Consultor Jurídico” (link: <https://www.conjur.com.br/2016-nov07/uber-condenada-pagar-12-mil-porque-motorista-errou-caminho>), a Uber foi condenada a pagar uma indenização de R$ 12.000,00 (doze mil reais) a uma consumidora que perdeu o vôo do Rio de Janeiro/RJ à São Luís do Maranhão/MA, pelo fato do motorista ter errado o percurso. A decisão foi proferida pelo juiz Manoel Aureliano Ferreira Neto, do 8° Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo de São Luís/MA.

A plataforma de prestação de serviços de transporte alegou, nos autos do processo, que houve culpa concorrente da consumidora, eis que não atendeu às instruções da Agência Nacional de Aviação, que determina que qualquer pessoa que for embarcar em algum vôo, necessita chegar com 120 minutos com antecedência ao aeroporto, para procedimentos de praxe, e evitar atrasos.

A consumidora solicitou o transporte da Uber, duas horas antes do horário de embarque, em que a empresa alega que tal tempo não foi suficiente para que o motorista chegasse a tempo ao aeroporto. Contudo, demonstrou a consumidora, no feito, de que somente veio a perder o vôo devido ao fato de que o motorista errou o caminho do hotel ao aeroporto, fazendo com que atrasasse, fazendo com que o Meritíssimo Juízo decidisse por condenar a Uber, em valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais), a título de indenização.

Outrossim, é do mesmo entendimento, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso. Isso porque uma consumidora perdeu o vôo tendo em vista o motorista do aplicativo ter errado o caminho, eis que o trajeto que era para durar 25 minutos, acabou sendo realizado no período de 60 minutos.

Em virtude de ter perdido o vôo, a usuária do aplicativo, consumidora da relação de transporte fornecida, ajuizou ação indenizatória perante o Segundo Juizado Especial de Rondonópolis/MT (autos n° 8015614-87.2018.8.11.0003), visando ser ressarcida de forma material e moral, por todos os prejuízos sofridos.

Em primeira instância, o entendimento do Meritíssimo Juízo foi pela condenação da Uber somente aos danos materiais, correspondente ao valor de R$ 549,00 (quinhentos e quarenta e nove reais), montante este referente ao valor da nossa passagem adquirida pela consumidora, que conseguiu embarcar no dia seguinte.

No que se refere ao dano moral, não houve condenação em sentença, ao argumento de que se tratou de mero aborrecimento da vida civil, não afetando o psicológico da consumidora, de forma que viesse a ter direito ao recebimento da indenização por danos morais.

Em virtude da sentença prolatada, que veio a ter sucumbência recíproca entre os polos da demanda, fez com que a consumidora, bem como a Empresa Uber, recorresse da decisão, interpondo Recurso Inominado, que foi julgado pela Turma Julgadora, composta pelos juízes Lucia Peruffo, Valdeci Morais Siqueira e Lamisse Roder Feguri Alves Correa.

Em unanimidade na decisão dos Recursos Inominados interpostos, a Turma Julgadora decidiu pela reforma da sentença no que se refere aos danos morais, mantendo a decisão proferida em primeira instância quanto aos danos materiais. Entendeu a Turma de que o caso concreto não tratou de mero aborrecimento e sim de que houve prejuízo moral à consumidora, usuária do aplicativo de transporte.

Diante disso, a Turma Julgadora, manteve a sentença no que toca aos danos materiais, condenando a Empresa Uber no valor de R$ 549,00 (quinhentos e quarenta e nove reais), referente ao valor arcado pela consumidora com uma nova passagem aérea comprada para um novo embarque, e, ainda, reformou a decisão de primeira instância, no tocante aos danos morais, condenando a fornecedora de serviços ao pagamento de indenização por danos psicológicos, no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Uma vez realizado o entendimento jurisprudencial no tocante à responsabilidade civil da Empresa Uber quando há falha na prestação de serviços, no erro de percurso usado pelo motorista, pode-se pensar sob a eventual responsabilidade da Empresa quando o motorista realiza condutas com os consumidores totalmente discrepantes, tal como no caso de que o motorista vir a cometer estupro com a passageira.

Neste caso mencionado, a título de exemplo, pode-se questionar de quem seria a responsabilidade civil: somente do motorista ou da Empresa Uber, de forma solidária, tal como determina o regramento básico do Código de Defesa do Consumidor.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos autos n° 008028120.2018.8.21.9000, já determinou que qualquer conduta que venha a ser praticado pelo motorista em desfavor do usuário, recebedor da prestação de serviços, a Empresa Uber é responsabilizada conjuntamente, na área cível.

A desembargadora Relatora dos autos mencionados, Dra. Mara Lúcia Coccaro Martins Facchini, assim declarou no acórdão:

(…)
É de ser afastada a preliminar de ilegitimidade. Ainda que a ré alegue não ter qualquer responsabilidade, por não ser empregadora do motorista, nem ser a proprietária do táxi, o motorista atua como preposto (colaborador) seu, de modo que pode ser chamada a responder pelos atos praticados por este, daí a necessidade de critérios rígidos na análise do cadastro.

Nas demandas judiciais, é de praxe a Empresa Uber requerer como preliminar em contestação, o afastamento de sua responsabilidade civil, alegando ilegitimidade passiva. Contudo, a jurisprudência está cada vez mais uníssona em demonstrar que o aplicativo de transportes, deve ser condenado, solidariamente com o motorista, por qualquer ato desonroso que venha a causar ao usuário/consumidor.

Isso porque, apesar de a Uber não estar contratando diretamente com o consumidor que venha a utilizar o transporte, e sim haver uma relação próxima somente entre usuário e motorista, este atua como colaborador, prestando um serviço em nome do estabelecimento empresarial.

Pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, havendo a falha na prestação de serviços, por fato do produto, como no caso da ocorrência de um estupro, furto, roubo, a responsabilidade consumerista é objetiva, solidária, fazendo com que o consumidor possa ajuizar uma demanda cível em desfavor do motorista bem como a Empresa Uber.

3.3 Ifood

O Ifood trata-se de outra plataforma digital comumente utilizada nos grandes centros urbanos, por usuários que não desejam sair de suas casas para se alimentarem. Isto porque, o aplicativo traz uma variedade de opções em que os usuários poderão solicitar, tais como comidas de restaurantes, padarias, lanchonetes, dentre outros.

Qualquer cidadão que deseje utilizar a plataforma digital, primeiramente realiza o download do aplicativo diretamente em seu aparelho celular, fazendo posteriormente o seu cadastro, colocando inclusive o seu endereço residencial. A localização da residência do consumidor talvez seja a principal informação constante no banco de dados do usuário no aplicativo, eis que fará com que o entregador, leve os produtos encomendados diretamente ao seu endereço, sem haver qualquer erro no percurso.

Apesar de um aplicativo que pode ser baixado por qualquer brasileiro, em seu aparelho telefônico, não possui serventia em cidades de pequeno porte, eis que não há a prestação de serviços, pela falta, escassez de uso, não havendo uma demanda suficiente que faça com que valha a pena manter nos interiores dos Estados.

Em virtude disso, faz com que o aplicativo seja utilizado principalmente nas capitais dos Estados, e cidades que possuam um grande número de habitantes. O usuário, desejando não sair de seu endereço residencial ou profissional, adentra no aplicativo, escolhe o produto e comida que deseja que seja entregue até seu endereço, já sendo demonstrado pela própria plataforma eletrônica, os modos de pagamento, bem como o valor a ser arcado pela entrega do produto.

Insta salientar, que a sociedade brasileira, no presente momento, encontra-se em pandemia, em virtude do vírus chamado “coronavírus”, ou pelo seu nome científico “covid19”, fazendo com que o comércio de comidas nos grandes centros urbanos sejam fechados, aglomerando ainda mais a utilização do aplicativo do Ifood.

Segundo o Decreto Estadual de Goiás, n° 9.637, determinou que os estabelecimentos de grande circulação de pessoas, como feiras, shoopings centers, dentre outros, deverá permanecer fechado, enquanto a situação da pandemia não venha a melhorar no estado goiano.

Sabe-se que nos grandes centros urbanos, principalmente nas capitais, há um grande fluxo de pessoas nos Shoppings Centers, eis que aglomera todos os estabelecimentos de que um indivíduo procura, tais como cinema, bares, lojas de vestuário, praça de alimentação, farmácias, dentre outros.

No que toca à alimentação, vêm afetar o “coronavírus” diretamente aos estabelecimentos empresariais que realiza a venda de produtos comestíveis, eis que não há a possibilidade de abertura ainda no presente momento. Com isso, fez crescer a utilização do aplicativo Ifood, haja vista que os serviços de delivery continuam funcionando e a todo vapor.

Segundo Pizarro (2017), o aplicativo que faz a intermediação da compra de um produto de comida, como o Ifood, é responsável solidário por qualquer prejuízo que venha a causar ao consumidor, na falha da prestação de serviço, aduzindo:

Utilizar um aplicativo para pedir comida ou transporte é prático e cada vez mais popular, porém, quando aparecem os problemas, o consumidor tem dificuldade em encontrar uma solução. Segundo os órgãos de defesa, nos casos em que o prestador de serviço não resolve a situação, o aplicativo deve responder solidariamente ao problema. “Há responsabilidade solidária, sim. Primeiro, o consumidor deve tentar resolver o problema com o prestador e serviço. Mas, se esse não resolver, o aplicativo tem que responder”, explica o coordenador do Procon da Assembleia Legislativa, Marcelo Barbosa, que baseia seu mento no Decreto Federal 7.962/2013, que regulamenta o comércio eletrônico. “O aplicativo e similar ao sítio eletrônico”, explica Barbosa.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em julgamento realizado em 26/10/2016, realizou o entendimento de que não houve dano moral configurado nos autos, pela falha na prestação de serviços, pela não entrega de delivery de comida, senão vejamos:

APELAÇÃO. CONSUMIDOR. MC DONALD’S. FALHA NA PRESTAÇAO DO SERVIÇO. ENTREGA DELIVERY DE LANCHE NÃO EFETUADA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. Cinge-se a controvérsia à configuração de danos morais em virtude da não entrega de lanche contratado via telefone. É incontroverso que não houve a entrega do lanche solicitado pela autora por meio do serviço de delivery do réu. Não obstante a falha na prestação de serviço dela não decorreu lesão extrapatrimonial passível de reparação. De tal fato não adveio dor, sofrimento, angústia, humilhação, vexame ou qualquer outro tipo e abalo aos direitos da personalidade. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-RJ – APL: 00111374420148190208, Relator: Maria Luiza de Freitas Carvalho, Data de Julgamento: 26/10/2016, Vigésima Sétima Câmara Cível Consumidor, Data de Publicação: 31/10/2016).

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em julgamento realizado no dia 17/10/2019, nos autos n° 0713727-04.2019.8.07.0016, no tocante aos danos materiais e morais, decidiu:

JUIZADO ESPECIAL. CIVIL. CONSUMIDOR. COMPRA DE REFEIÇÃO PELO APLICATIVO IFOOD. PAGAMENTO POR CARTÃO DE CRÉDITO. REFEIÇÃO NÃO ENTREGUE. DANO MATERIAL COMPROVADO. RESTITUIÇÃO DEVIDA. ESTORNO REALIZADO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1. Trata-se de recurso interposto contra sentença que condenou os réus ao pagamento de indenizações por danos material (R$ 132,79) e moral (R$ 3.000,00). 2. O autor/recorrido encomendou, pelo aplicativo Ifood, refeição do estabelecimento do recorrido. A despeito do pagamento por meio de cartão e da informação de efetivação da entrega, a refeição não teria sido entregue ao recorrido, que se dirigiu ao estabelecimento do recorrente e não obteve solução satisfatória para o caso, diante do quê, já tarde, teve de se dirigir com sua família a um shopping, para alimentação. 3. Desse modo, uma vez que se trata de produto comprado e não entregue, é devida a indenização, por dano material, no valor pago pela refeição, que inclusive, já foi estornado pelo aplicativo Ifood (Id 10533059, p. 1). 4. Outrossim, não restou configurado o ano moral, tendo em vista que, apesar do transtorno vivenciado, trata-se de mero aborrecimento cotidiano, que revela a falha na prestação do serviço, mas não é ato a violar os direitos de personalidade do autor/recorrido. 5. Recurso Conhecido e Provido em parte. Sentença reformada, para excluir a indenização, por dano moral. Sem custas e sem honorários advocatícios, a teor do art. 55 da Lei 9.099/95. 6. A ementa servirá de acórdão, conforme art. 46 da Lei n. 9.099/95. (TJ-DF 07137270420198070016 DF 0713727-04.2019.8.07.0016, Relator: Soníria Rocha Campos D’Assunção, Data de Julgamento: 17/10/2019, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 06/11/2019).

Denota-se do julgamento supramencionado, que em primeira instância, houve condenação do Ifood por danos morais, pela falha na prestação de serviços, em que não efetuou a entrega da mercadoria solicitada pelo consumidor, além do pagamento de indenização pelos danos materiais. Entretanto, a plataforma intermediadora recorreu da sentença e conseguiu êxito na reforma da decisão, no tocante aos danos morais, entendeu a Turma Julgadora do TJDFT, que se tratou o caso analisado, de um mero aborrecimento cotidiano.

Apesar do entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no tocante aos danos morais, deve-se ressaltar que deve o órgão julgador analisar cada caso concreto, de forma pormenorizada, analisando as provas colhidas nos autos, para que possa decidir de forma justa, evitando o enriquecimento sem causa, totalmente proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro.

O Código de Defesa do Consumidor é claro em seus dispositivos, que quando há uma falha na prestação de serviços (vício do serviço ou fato do serviço), há o dever do estabelecimento empresarial arcar com todos os prejuízos de forma objetiva e solidária, tendo em vista a lesão causada em prol do consumidor.

Pela responsabilidade objetiva adotada pelo Código consumerista, deve o Poder Judiciário, analisar cada caso concreto, levado ao seu conhecimento para julgamento, tomando a decisão mais justa possível.

Em derradeiro, conforme já consignado alhures, o parágrafo único do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, prevê o direito de arrependimento ao consumidor que faz qualquer compra fora do estabelecimento empresarial, assim como ocorre nos casos do aplicativo “Ifood”.

Com a situação de pandemia pelo “Covid-19” que o Brasil se assola atualmente, por não conseguir os cidadãos irem diretamente aos restaurantes, shoppings centers, dentre outros locais de alimentação, faz com que consumidores peçam a todo o momento, alimentos via “Ifood”.

Cabe, portanto, destacar que aumenta, gradativamente, o número de consumidores que podem exercer seu direito de arrependimento conforme preconiza o parágrafo único do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, pela situação da pandemia, o senador Antônio Anastasia, integrante do partido “PSD/MG”, propôs um projeto de lei, sob o n° 1179/2020, que consta em seu artigo 8°: “Até 30 de outubro de 2020, fica suspensa a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de produto ou serviço adquirido por entrega domiciliar (delivery).”

Tal PL visa suspender o direito ao arrependimento dos consumidores, até dia 30 de outubro de 2020, haja vista que toda compra realizada atualmente, encontra-se sendo feito via delivery.

O projeto de lei veio a ser convertido em lei, no dia 10 de Junho de 2.020, sob o n° 14.010, determinando em seu artigo 8°: “Até 30 de outubro de 2020, fica suspensa a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de entrega domiciliar (delivery) de produtos perecíveis ou de consumo imediato e de medicamentos.”

Portanto, pela situação de pandemia por Covid-19 que viveu o Brasil, até o dia 30 de outubro de 2020, não poderia o consumidor, que fizer sua compra fora do estabelecimento empresarial, utilizar seu direito de arrependimento, por estar suspenso o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, cujo dispositivo trata sob tal instituto.

3.4 PIX

O PIX trata-se de outra forma de comércio eletrônico, em que fora criado recentemente, para que possa todos os usuários de bancos, realizar transferências bancárias, para bancos idênticos ou diversos, sem o pagamento de qualquer taxa. Ocorre que tal forma de transferência, até o dia atual, não fora regularizada em nenhuma norma jurídica, fazendo com que deixe o caráter preocupante de todos os usuários.

Isto porque para uso do PIX, basta que o consumidor bancário, vá até a agência de sua instituição financeira, e realize o cadastro de seu PIX, colocando uma chave para acesso, sendo CPF, e-mail e até o número de celular.

Apesar de tal revolução no cenário digital, já se inicia na jurisprudência brasileira, os primeiros problemas envolvendo tal forma de transferência, havendo a realização de golpes. Por não haver a participação do banco em si, na transação, os entendimentos jurisprudenciais estão sendo no sentido de ser culpa exclusiva do consumidor, na realização de fraudes.

Senão vejamos o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, de 23.03.2022, nos autos de nº 0732519-35.2021.8.07.0016:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO BANCÁRIO. TRANSAÇÃO MEDIANTE FRAUDE. TRANSFERÊNCIA POR PIX. CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. 1 – Na forma do art. 46 da Lei 9.099/1995, a ementa serve de acórdão. Recurso próprio, regular e tempestivo. 2 – Responsabilidade civil. Fraude em transferência bancária. PIX. Nexo de causalidade. Culpa do consumidor. Na inicial o autor afirma que a fraude se iniciou com um contato de um telefonema originário de linha desconhecida. Apesar da utilização de um número que coincide com o terminal de atendimento do banco réu, a concretização da fraude se deu com a transferência via PIX, para o que é necessário a participação ativa do correntista, com confirmação do número de conta e nome do beneficiário. No ambiente virtual em que tem se desenvolvido o comércio eletrônico, incluídas as operações bancárias, a conferência dos dados de pagamento e transferências, como valor e beneficiário, é o mínimo que se exige do consumidor como meio de evitar desvios. Sem isso, imputar a responsabilidade por fraudes sem relação com o fato do serviço, vale dizer, sem indícios da existência de defeito, é ir além da regra legal que submete a responsabilidade ao fato do serviço (art. 14 do CDC). (…) 4 – Recurso conhecido, mas não provido.

CONCLUSÃO

Segundo dispõe os artigos 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor, para que haja uma relação de consumo, é necessário com que haja de um lado, um fornecedor de produtos ou serviços, e de outro, uma pessoa física ou jurídica, que adquire o produto ou serviço como destinatário final.

Insta salientar que quando se fala que é necessário que haja o consumo do produto ou serviço como destinatário final, doutrinadores, como Flávio Tartuce, exortam que o Código de Defesa do Consumidor, veio a adotar a teoria finalista. Todavia, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, em seu Informativo n° 548, veio a enaltecer que a teoria aplicada, é a finalista mitigada.

Todo produto ou serviço ofertado no mercado de consumo, não poderá vir com qualquer defeito, falha, sob pena de o fornecedor responder por todos os prejuízos causados aos consumidores, segundo dispõe os artigos 12 e seguintes do Código de Defesa do Consumidor.

A responsabilidade civil consumerista é dividida em vício do produto ou serviço ou fato do produto ou serviço, à depender do caso em concreto, se o prejuízo do produto ou serviço é meramente financeiro, ou se veio a infringir a segurança e saúde do consumidor.

Tendo em vista que na sociedade atual brasileira em que se vive, com o fácil acesso ao telefone celular com internet, fez com que o mercado de consumo crescesse e desenvolvesse mecanismos para que os fornecedores pudessem ofertar seus produtos e serviços, de forma eletrônica, através de aplicativos baixados por usuários consumidores.

Diante do alto crescimento de compra via sistema eletrônico, fez com que o legislador criasse um ordenamento jurídico específico, protegendo o comércio eletrônico, através do Decreto-lei n° 7.962/2013.

Atualmente, principalmente com o isolamento social em que se é obrigatório fazer, diante da pandemia do “Covid-19”, muito conhecido como “coronavírus”, faz com que consumidores dos grandes e médios centros urbanos, utilizem de aplicativos para realizar compras virtuais, principalmente de alimentação como o “Ifood”, eis que não necessita o consumidor sair de sua residência, recebendo o produto diretamente no endereço informado no aplicativo, com toda a segurança que se espera.

Além do “Ifood”, há outras plataformas digitais bastante conhecidas e usadas, tais como o “Mercado Livre” e o “Uber”, dentre outros, cuja venda de produtos e fornecimento de serviços devem ser feitos com a mais estrita segurança ao consumidor, sob pena de serem responsabilizados civilmente, através de indenizações que poderão vir os consumidores lesados a ajuizarem no Poder Judiciário, cuja jurisprudência pacífica, realiza condenações, uma vez comprovada a falha na prestação de serviços e produtos.

Impende salientar, por oportuno, que o direito de arrependimento, previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, está suspenso de aplicação até o dia 30 de outubro de 2.020, por força do artigo 8° da Lei n° 14.010, publicada em 10 de Junho de 2.020, em virtude da pandemia de Covid-19 que assola a população brasileira, não podendo qualquer consumidor utilizar tal instituto em sua defesa em tal período.

REFERÊNCIAS

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente quero agradecer a Deus por não ter deixado que eu desistisse, por que houve momentos que fiquei tão desanimada com tudo que nem dá para explicar. Agradecer muito aos meus amigos Dâmella, Luane, Giulia e Luís, sempre me apoiando e não deixando que a tristeza me dominasse até essa etapa final.

Ao meu orientador Ricardo Luciano de Lima que teve muita paciência comigo, e sempre me respondeu com muita educação e respeito, e isso não tem preço, vou levar esses ensinamentos para minha vida.


Dedico tudo que eu possa ter feito no curso de Direito para meu amado e falecido avô, Ismael Rodrigues da Costa, o mesmo queria muito que eu me formasse, e agora nessa etapa final posso finalmente realizar o que ele sempre conversava comigo, não tem sentimento que explique o que é perder pessoas que amamos, é uma dor fora do comum! Também quero dedicar a minha mãe, Núbia Gomes Mendes, ao meu pai, Claúdio Rodrigues da Costa, ao meu irmão, Cristovão Mendes Rodrigues, minha irmã, Maria Clara Mendes Rodrigues, minha avó, Julieta Maria da Costa, que sempre me apoiaram e são tudo na minha vida.