REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7479855
Tárcia Thyele Araújo Malheiros
Eliane Alves de Souza
RESUMO
O hospital é uma entidade médica e social tendo como objetivo a prevenção e o tratamento da doença. Esta pesquisa teve como objetivo analisar a percepção da equipe de técnicos em enfermagem que participam das atividades do projeto Escuta promovido pela Faculdade Facite que realizam atividades de orientações e acolhimento no Hospital Municipal do Oeste Baiano. Diante da temática finitude e morte de pacientes em fase terminal. Trata-se de uma pesquisa qualitativa não experimental, com objetivos descritivos que foi realizada de forma online, através da plataforma Google Docs. Foram entrevistados 10 (dez) profissionais técnicos de enfermagem de um Hospital Municipal do Oeste Baiano. Como instrumento de coleta de dados dessa pesquisa foi utilizado um questionário composto por perguntas . Como resultado final, observou-se que os profissionais da área da saúde compreendem o que é a morte, tendo a mesma como algo inerente da vida, mas a maioria não está preparada para lidar com a finitude e morte do outro, observa-se que a morte de um paciente gera um grande desgaste emocional em todos os profissionais mesmo lidando diariamente com essa realidade. Diante disso, a pesquisa identificou a importância da presença de um psicólogo hospitalar que atue junto à equipe de saúde e aos pacientes em fase terminal.
Palavras-chave: Finitude. Morte. Hospital. Técnicos de Enfermagem. Psicólogo Hospitalar
ABSTRACT
The hospital is a medical and social entity with the prevention and treatment of disease. This research aimed to analyze the perception of the team of nursing technicians at the Hospital Municipal do Oeste Baiano on the subject of finitude and death of terminally ill patients. This is a non-experimental qualitative research, with descriptive objectives that was carried out online, it was carried out through the Google Docs platform. Ten (10) nursing technicians from a Municipal Hospital in Oeste Baiano were interviewed. As a data collection instrument for this research, a questionnaire composed of objective questions was used. As a final result, it was observed that health professionals understand what death is, having it as something inherent in life, but most are not prepared to deal with the finitude and death of the other, it is observed that the death of a patient generates great emotional exhaustion in all professionals, even dealing with this reality on a daily basis. Therefore, the research identified the importance of the presence of a hospital psychologist who works with the health team and terminally ill patients.
Keywords: Finitude. Death. Hospital. Nursing Technicians. Psychologist
INTRODUÇÃO
A morte é um dos mais antigos temas, que sempre despertou amplas variedades de emoções e atitudes que remetem geralmente ao medo, angústia ou rejeição. Sendo muitas vezes vinculada ao sobrenatural, terror, castigo, dor, e outros significados que são considerados negativos pela sociedade ocidental (AIRES, 2012). A ciência da vida e da saúde fisiológica, seja ela vista pelo viés religioso ou não, indicam que a própria experiência cotidiana com a morte e o fim são características particulares dos processos vivos, sendo este um processo irreversível que insere o nascer, o crescer, o declinar e o morrer (POLES; BOUSSO, 2004). O hospital é um local de nascimento, renascimento e morte. O ambiente hospitalar mostra para todo e qualquer ser humano que a vida é um sopro. O nascimento de uma pessoa é algo que gera felicidade na equipe de saúde, salvar a vida de alguém gera um sentimento profundo de “dever cumprido”, mas lidar com a finitude e morte de um paciente ainda não é algo tratado com naturalidade, mesmo a morte fazendo parte do cotidiano de um hospital, boa parte da equipe enfrenta essa situação com temor (POLES; BOUSSO, 2004). Lidar com a finitude e morte de um paciente leva os técnicos de enfermagem a pensar e ao mesmo tempo buscar compreender os seus sentimentos diante das emoções que são específicos nesse processo, tais como o luto, a , a dor, a perda e a revolta, tornando esses aspectos extremamente complexos e difíceis de serem analisados sob a perspectiva da racionalidade e da fé do ser humano, sendo que os mesmos podem causar algumas disfunções e desequilíbrio no repertório do indivíduo (NASIO, 1997).
Segundo Franco (2010) o profissional de saúde vive um conflito sobre como se posicionar frente à morte de um paciente, afetados pela tristeza devido à idade do paciente, a causa da morte e principalmente quando se cria um vínculo com o mesmo. A morte é atualmente tida como um tabu perante a sociedade, mesmo ela sendo uma experiência natural assim como o nascer, mas é vista como algo relacionado a dor, sofrimento, descontentamento e desestabilização. Existe uma incapacidade de enfrentamento por parte das pessoas em relação a aceitar a morte com resignação e dignidade (KUBLER-ROSS, 1985).
A morte desencadeia diversos sentimentos. Ao vivenciar a terminalidade do ser humano, o profissional da área da saúde pode perceber o seu próprio processo de finitude diante do outro, a partir do momento que o paciente terminal finaliza sua vida toda equipe que acompanhou o caso acaba vivenciando o luto (MOTA et. al., 2011). Um estudo realizado por Mota e colaboradores (2011) mostrou que sentimentos como dor, tristeza, sofrimento, medo, impotência e insucesso são comuns nos profissionais de enfermagem que vivenciam a finitude e morte diariamente, mesmo sendo um assunto difícil de falar e sobretudo vivenciar, os profissionais relatam que a morte de um paciente terminal se torna um alívio tanto para o próprio paciente como para seus familiares e toda equipe de saúde que lidam com o caso. O estudo ainda ressalta que a preparação acadêmica desses profissionais destacam o processo de cura e possivelmente está aí o motivo de tanto despreparo desses profissionais frente à finitude e morte. Diante disso, essa pesquisa tem como problematização identificar a percepção dos técnicos de enfermagem acerca da sua atuação no atendimento de pacientes em fase terminal, verificando-se então sentimentos e crenças dos mesmos diante da finitude e morte. Esse estudo tem como objetivo analisar a percepção da equipe de técnicos em enfermagem do Hospital Municipal do Oeste Baiano diante da temática finitude e morte de pacientes em fase terminal.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa não experimental, com objetivos descritivos e de caráter qualitativo. A pesquisa qualitativa, segundo (Gil, 2017), é aquela que tem como objetivo proporcionar uma maior familiaridade com o problema, dando ao pesquisador maior conhecimento do assunto, a fim de torná-la mais compreensível. Participaram da pesquisa 10 técnicos de enfermagem que atuam em um hospital público em um município do Oeste da Bahia que são acolhidos pelo projeto Escuta promovido em parceria com a Faculdade Facite e a prefeitura municipal. O projeto Escuta presta atendimento a comunidade, em caráter preventivo, informativo e de orientação individual e/ou grupal dentro das especificações da demanda oferecendo o serviço de Psicologia através dos estagiários à população encaminhada pela Secretaria Municipal de Saúde nos campos do hospital e unidades de saúde e também acompanha, acolhe as equipes de saúde com a promoção de rodas de conversa de diversas temáticas voltadas a realidade dos profissionais que são divulgados mediante as atividades da Faculdade Facite e que podem ter conhecimento ao buscar informações da instituição. Por se tratar de um estudo que foi realizado de forma online, o mesmo foi realizado através da plataforma Google Docs e não teve um local fixo. A pesquisa foi desenvolvida através da disponibilização do TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – Anexo A) enviado por e-mail, solicitando-se a assinatura 21 do mesmo e reenvio do scanner para que os mesmo respondessem o questionário de forma online desenvolvido através do Google Docs composto por 10 questões (Apêndice A). Para a realização dessa pesquisa, o projeto foi encaminhado para o Comitê de Ética em Pesquisa – CEP da Faculdade São Francisco de Barreiras para aprovação. Após a aprovação (CAAE: 33839020.0.0000.5026) do CEP, a pesquisadora entrou em contato via WhatsApp com o público alvo da pesquisa através de um grupo, onde foi possível explicar o intuito da pesquisa e por ser uma pesquisa para voluntários deixou-se livre a manifestação dos interessados em realizá-la, ao fim, totalizou-se 10 manifestações. A coleta de dados ocorreu no período de setembro de 2020 e cada participante do estudo enviou por e-mail o scanner com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após isso, os mesmos receberam via WhatsApp o link do questionário que foi respondido de forma online e individual, sendo necessário somente 10-15 minutos para seu preenchimento. Por fim, os dados foram enviados ao pesquisador responsável de forma digital pelo Google docs. Os dados da questão objetiva lançadas, tabuladas e analisadas através do Microsoft Excel 2016, já as respostas das questões abertas foram lidas e lançadas no SPSS e analisadas estatisticamente a partir da frequência descritiva
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sexo e idade
Do total de técnicos de enfermagem entrevistados (n=10), a maioria (80%/n=8) são do sexo feminino e apenas (20%/n=2) são do sexo masculino, sendo que (80%/n=8) tem idade entre 30 a 59 anos e apenas (20%/n=2) tem de 20 a 29 anos (Tabela 1).
Tabela 1 –
Sexo | F % |
Feminino Masculino Total | 80% 20% 100% |
Idade | F% |
25 anos 26 anos 31 anos 37 anos 39 anos 41 anos 42 anos 45 anos 49 anos 59 anos Total | 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 100% |
Um estudo realizado por Lopes e Leal (2005) mostrou que há uma predominância do sexo feminino na prática da enfermagem em todos os níveis (auxiliar, técnico, graduação).
1.1 Conceito de morte
Falar sobre morte, seja de forma abstrata ou específica, remete há vários pensamentos, é algo que gera uma reflexão por vezes muito angustiante, pois através de uma visão sobre a morte é possível refletir sobre tudo na vida, o que já aconteceu, o que está acontecendo e sobretudo, sobre o que vai acontecer. Pensar em morte é pensar em incertezas, é não saber o dia do amanhã, mas mesmo assim continuar sonhando e planejando tudo que dá sentido à vida. Pensar e falar sobre morte é saber que cada dia que passa é menos um dia de vida (SOUZA et. al., 2013).
Quanto ao conceito, a maioria destacou que a mesma representa o fim da vida, significa uma passagem, a única certeza que temos e que tanto tememos, para tanto, alguns dos entrevistados responderam da seguinte forma:
Única certeza da vida:
P3: Algo de difícil aceitação, mas a certeza que é o caminho de todos nós, e que fica é uma memória, lembranças boas ou ruins.
P4: Para mim a morte é a única certeza que o ser humano possui na vida. (APÊNDICE B).
Uma passagem:
P6: É uma passagem, onde encerramos um ciclo e iniciaremos outro o qual ainda desconhecemos (APÊNDICE B).
As falas dos entrevistados mostram que a morte é vista como algo natural e inerente da vida, mas que é difícil de se aceitar e/ou pensar.
5.2 Assistência da equipe de saúde ao paciente em fase terminal
O trabalho realizado com pacientes terminais é conhecido como “cuidado paliativo”, nesse processo a equipe de enfermagem trabalha com técnicas que visam uma melhora na qualidade de vida do paciente mesmo em fase terminal, onde o foco é prevenir e aliviar o sofrimento vivido pelo mesmo, tratando das suas dores e sintomas físicos, psicossociais e espirituais, fazendo com que o paciente tenha uma concepção da reafirmação aceitando a morte como um processo natural, e isso se dá através do vínculo entre o profissional e paciente, através de conversas e trocas de atitude, especialmente de profissional para paciente (SADALA; SILVA, 2009).
Ressalta-se que o cuidado de enfermagem vai muito além do cuidado técnico, perpassa sobretudo, em especial, em cuidar de alguém, uma profissão que demonstra o que é se importar e envolver com uma pessoa. É desenvolver um trabalho terapêutico cuidando de todas as dificuldades de qualquer paciente que necessita dos seus serviços (SADALA; SILVA, 2009).
Diante dos 10 entrevistados somente (n=9) responderam essa questão, destacando que:
P2: Em se tratando de paciente terminal, o indicado é proporcionar conforto físico, psicológico e espiritual, com vistas a minimizar seu sofrimento e de sua família frente a iminente partida.
P4: A assistência é feita com todo os recursos oferecido pela a unidade, e nesse contexto nos técnicos, prestamos mais essa assistência, pois sempre ouvimos os seus chamados.
P5: Procuramos dar todo conforto possível, realizar seus desejos e diminuir a sua dor.(APÊNDICE B).
As falas dos entrevistados mostram que a morte é compreendida como uma etapa natural, que faz parte da vida humana e que tem conotações diferentes, devido a aspectos individuais e religiosos dos entrevistados. Percebeu-se ainda que existe um medo, um tabu ao falar sobre a morte para alguns profissionais. As falas também reforçam a compreensão dos profissionais sobre cuidados paliativos e a importância em minimizar o sofrimento dos pacientes.
E isso reforça os estudos de Sandala e Silva (2009) que irão destacar sobre o cuidado de enfermagem que vai muito além do cuidado dos profissionais de saúde e equipes multidisciplinares. Elas reforçam que cuidar é cuidar do seu semelhante, o que significa importar-se e envolver-se com o outro, e nisso destaca-se os cuidados paliativos os quais têm por objetivo melhorar a qualidade de vida dos pacientes que se encontram na fase terminal de uma doença, fazendo com que haja uma prevenção e alívio do sofrimento, os quais são tratados através de intervenções que minimizem dores físicas, psicológicas e espirituais. É através dos cuidados paliativos que o paciente pode ter uma reafirmação sobre a vida e uma visão sobre a morte entendendo a mesma como algo natural.
5.4. Sentimentos diante da morte de um paciente
Frequentemente os profissionais de saúde, mais especificamente os enfermeiros, técnicos e auxiliares, são expostos a enfrentar diariamente com a morte, e na maioria das vezes os paciente falece diante dos seus cuidados, dessa forma boa parte dos profissionais da área abordam o quanto é difícil lidar com essa situação, mesmo ela sendo rotineira no seu trabalho (SOUZA et. al., 2013).
As concepções culturais do processo saúde-doença-morte fazem com que os profissionais da área da enfermagem criem uma resistência diante das situações de perdas, afinal nenhum indivíduo é preparado para a morte, apenas para a vida e essas implicações afetam tanto a vida pessoal como a vida profissional, nesse quesito, quando a equipe perde um paciente inúmeras emoções e reações surgem, até mesmo de maneira involuntária, afinal, a morte de alguém é um espelho que reflete a finitude de si mesmo. É comum sentimentos de profundo desconforto, angústia, tristeza, incapacidade, entre outros surgirem diante dessa situação (SOUZA et. al., 2013).
Os entrevistados relataram:
P2- Angústia, sentimento de fracasso, insegurança, sabendo que estamos para salvar vida, e nesses momentos bate um certo medo, por não conseguir fazer o que foi jurado perante a todos no momento da formatura.
P8- Não é bom, sempre é doloroso ainda mais para nós profissionais da área, porque o que mais tentamos é lutar para salvar a vida, e é desanimador quando acontece o óbito.
P10- Quando o assunto é morte, eu prefiro evitar falar sobre, devido a palavra ser forte, pois se trata de um processo que acarreta profundas reações psicológicas, falta preparo emocional. (APÊNDICE B).
Observando as respostas obtidas, três chamaram atenção, pois mostram que mesmo tendo que lidar diariamente com a morte, percebe-se que nenhum profissional encontra-se preparado para lidar de forma “tranquila” com essa realidade, e por faltar despreparo e assistência psicológica alguns acabam se desanimando ou se sentindo fracassados por não ter tido a possibilidade de salvar a vida daquele paciente.
5.5 Enfrentando o óbito de um paciente
A vivência com o paciente terminal faz com que haja um encontro diário com a morte. É comum sentimentos de angústia, fracasso e culpa, diante do falecimento de um paciente, afinal, é uma situação que gera uma grande descarga emocional. Os comportamentos e emoções, que os profissionais vivenciam no cuidado com pacientes e principalmente no vínculo estabelecido entre os dois, pode gerar uma série de perturbações, estresse ocupacional e até mesmo, esses profissionais podem adquirir comportamentos autodestrutivos (MARGALHÃES; MELO, 2017).
O sofrimento dos técnicos de enfermagem é marcado pelo cumprimento das suas rotinas. A descarga emocional diante da perda de um paciente perpassa por todo um contexto de vínculo que estão ligados aos valores pessoais, à história de vida e à patologia do paciente (SOUZA et. al., 2013). Dessa maneira, conforme foi apresentado pelos entrevistados, a morte de uma paciente apesar de ser de grande tristeza e desconforto o mesmo assume um papel de descanso e alívio de todo sofrimento vivido até ali. Assim, neste questionamento os profissionais apresentaram as principais respostas:
P1. Não sei lidar com óbito, em silêncio diante o acontecimento.
P2. O sentimento é de impotência, pois o compromisso de salvar vida nem sempre é
P3. Muitas das vezes como um alívio, um descanso.
P8. Com respeito, seriedade, dedicação. (APÊNDICE B).
Observa-se que apesar de doloroso o falecimento de um paciente que se encontra em sofrimento é um alivio para o profissional, mas naquele momento é algo irreparável, que gera um grande sofrimento, fazendo com que o técnico se sinta um incapacitado, assim, o mesmo acaba se cobrando muito por se sentir obrigado a trabalhar para salvar vidas, dessa maneira, quando ocorre o óbito o sentimento de fracasso e impotência toma conta.
Um estudo realizado por Mota e colaboradores (2011) reafirmou que os resultados alcançados nesse estudo não são únicos, os autores apresentaram uma pesquisa sobre reações e sentimentos de profissionais da enfermagem frente à morte dos pacientes sob seus cuidados. Os profissionais entrevistados apresentaram dificuldades em falar sobre o assunto, a pesquisa ainda mostrou que mesmo a morte sendo algo comum no seu ambiente de trabalho os profissionais relataram que não é fácil acostumar com mesma, afinal a morte gera angústia e medo, seja em perder o outro ou pelo simples fato de ser a única certeza da vida. Os profissionais entrevistados apresentaram sentimentos de insucesso, angústia, medo, frustração e impotência frente à finitude e morte dos seus pacientes.
5.6 PENSAMENTOS E SENTIMENTOS NO MOMENTO DO ÓBITO
Desde a formação o técnico de enfermagem é direcionado como um profissional que deve trabalhar pela preservação da vida, baseando-se na cura, mas nem sempre é possível tratar do impossível, o ambiente hospitalar é um meio que a morte é algo comum, mas mesmo assim não é enfrentada de forma positiva no primeiro momento (SOUZA et. al., 2013).
Nesse quesito os entrevistados relataram:
Incapacidade
P2: Incapaz de confortar o próximo, recuo e me calo.
P7: Com muita tristeza, eu tomo a dor da família, sofro junto.
P9: Fracasso total, impotência, incapacidade. (APÊNDICE B).
Sensação de alívio
P2: Depende do estado do paciente, para alguns a morte é o alívio para suas dores, nesses casos, apesar de sentir pela a perda do paciente, a morte representa um descanso.
P6: Alívio quando é algo que se estende por muito tempo, e quando é repentino surge a dúvida se não houve algo que deixe de fazer para ajudar. (APÊNDICE B).
Dificuldade em aceitar:
P10: É difícil a aceitação quando circula uma notícia de morte, isso demonstra a emoção de anos de trabalho e de como é difícil lidar com isso, com esse sentimento de tristeza, você se vê derrotada, é como se tivesse perdido a luta, de uma forma irrevogável, e isso traz um desconforto psicológico. (APÊNDICE B).
Como mencionado no referencial, observa-se através da fala dos entrevistados uma grande cobrança diante do que eles foram preparados para fazer, salvar vidas, então mesmo sabendo que a morte é algo comum e inerente da vida humana ainda assim quando ocorre a morte de um paciente é sempre algo que gera uma surpresa extremamente desagradável e consequentemente muita cobrança por sentir que poderia ter feito mais para salvar a vida daquele paciente.
5.7 Pensamentos e sentimentos diante do desespero dos familiares no momento do óbito
Ver um membro da família morrer não é nada fácil, é um processo que gera um extremo esgotamento desenvolvendo uma série de sentimentos que geram desconforto. A relação entre equipe de enfermagem e familiares dos pacientes acamados acontece somente durante o processo de tratamento, com a morte do paciente esse vínculo é desfeito (MARQUES et. al., 2004).
Em relação a assistência para os familiares diante da perda é destacada como algo desconfortável na prática da enfermagem. Esses profissionais tentam dar assistência, mas é complicada a situação, porque a partida de um paciente afeta toda a equipe e assistenciar essa família torna o processo muito mais doloroso e angustiante, assim, é comum surgir a insegurança nesse momento, pois os profissionais da área são preparados para salvar vidas e não para perdê-las muito menos assistenciar de forma científica os familiares dos pacientes falecidos (FERNANDES; KOMESSU, 2013).
Diante da entrevista, nesse posicionamento os entrevistados relataram:
Empatia
P2: É momento de empatia de se colocar no lugar dos familiares, pois já perdi pessoas muito importantes e sei que essa dor da separação não se compara a nenhuma dor.
P9: Sempre me coloco no lugar dos familiares, porque sabemos que a morte causa uma dor intensa. (APÊNDICE B).
Desconforto e incapacidade:
P6: Incapaz até tentamos consolar, mas não creio que fizemos da maneira adequada.(APÊNDICE B).
Não sabe lidar com a situação:
P1: Desconfortável por não saber lidar com a situação.
P8: Não sei lidar, mas no momento sinto angústia, medo. (APÊNDICE B).
Observa-se o quanto há um despreparo desses profissionais diante dessa demanda, percebe-se que esse amparo é realizado pela via do senso comum, inclusive há um relato que diz que esse amparo feito por eles não é o adequado, não disponibiliza um suporte maior para a situação, pela fala dos entrevistados é possível perceber a necessidade de um profissional da psicologia no ambiente hospitalar, tanto para assistenciar os familiares, como para assistenciar a equipe hospitalar.
5.8 Óbitos marcantes
Ao serem questionados qual o óbito mais marcante vivenciado durante o tempo de trabalho somente 8 responderam de forma direcionada o que foi questionado as respostas obtidas foram:
P2: Paciente masculino 27 anos, com hipótese diagnóstica de hemorragia alta, e já havia uns dias internado, mesmo com todos o atendimento prestado, porém sem êxito, isso me abalou demais.
P3: Paciente com Covid-19.
P5: Um jovem ferido inconsequentemente pela esposa, onde permaneceu alguns dias internado, vindo a falecer no hospital.
P6: Sem dúvida a do meu pai, por ter sido no hospital onde trabalho.
P7: Uma gestante de 27 anos que estava uma semana internada, na hora do parto ela teve um quadro epilético, seguindo para uma eclampsia a mesma não resistiu, vindo a óbito ela e o bebê.
P8: De um paciente jovem com câncer de estômago.
P9: De um jovem que estava internado, e tinha sofrido um acidente acometendo um traumatismo de crânio, depois de semanas internado veio a óbito.
P10: De uma criança que tinha meses internada, devido a um problema cardíaco.(APÊNDICE B).
5.9 A importância do psicólogo hospitalar através da percepção dos técnicos de enfermagem O trabalho do psicólogo no ambiente hospitalar tem por objetivo auxiliar o paciente em seu processo de adoecimento, tendo como intuito a minimização do sofrimento provocado por conta da hospitalização, em relação ao paciente hospitalizado a família e toda equipe de saúde que mantém contato com esse paciente também são assistidos por esse profissional. O processo de atuação do psicólogo no hospital visa desenvolver atividades curativas e de prevenção, possibilitando a diminuição do sofrimento que a hospitalização e a doença causam no indivíduo e em todos que participam de forma ativa no processo de adoecimento dos pacientes em leito (MEIADO; FADINI, 2014).
Todos os entrevistados relataram que acham indispensável a participação do psicólogo no ambiente hospitalar, todos acreditam que é o único profissional capaz de auxiliar pacientes, familiares e equipe da maneira correta diante do adoecimento, dentre as respostas, destaca-se:
P2: A psicologia possibilita ao ser humano ver a morte como processo natural, sobretudo no ambiente hospitalar, dessa forma se mostra como importante instrumento de contribuição para o paciente e sua família bem como para profissionais de saúde.
P4: É de extrema importância, pois ajudaria a trabalhar às questões relacionadas às angústias tanto do paciente e seus familiares, quanto a equipe no ambiente hospitalar.
P6: Extrema importância, eles estão preparados para esse tipo de situação, sabe o que dizer e como dizer, entende o sofrimento e as melhores formas de amenizar tudo o que os familiares passam, naquele momento. (APÊNDICE B).
Nesse caso, o psicólogo pode contribuir com a equipe de saúde através da psicoeducação para a morte e consequentemente elaboração do luto. Cuidar do outro expõe o profissional da saúde a emoções e sentimentos que revelam os fantasmas de suas próprias realidades de perdas, a tristeza, insegurança, incapacidade, angústia, fracasso e culpa, por exemplo, são os principais sentimentos destacados por esses profissionais frente a essa temática, fazendo com que o mesmo se depare como sua própria imortalidade. Nesse contexto o psicólogo trabalha de uma forma humanizada com a equipe antes e após falecimento do paciente, sempre tratando a morte como algo vital do ser humano, tendo a empatia como algo primordial dentro do seu trabalho, afinal, cada pessoa tem sua singularidade em lidar com a finitude e sobretudo com a morte (MAGALHÃES; MELO, 2015).
CONCLUSÃO
Essa pesquisa teve como objetivo analisar a percepção da equipe de técnicos em enfermagem de um hospital municipal do oeste baiano diante da temática finitude e morte de pacientes em fase terminal. Com base nesse objetivo, obteve-se como resultados que diante da temática finitude e morte os técnicos de enfermagem encontram-se despreparados e fragilizados, pois mesmo o hospital sendo um ambiente que representa adoecimento, finitude e morte, se deparar e lidar com essa realidade gera uma série de descargas emocionais que remetem a impotência, angústia, sofrimento, tristeza e medo. Diante desses sentimentos percebe-se que esses profissionais acabam se cobrando de forma extrema pois acreditam que diante da morte de um paciente a sua missão jurada em formatura, salvar vidas, não está sendo desenvolvida da maneira correta. Observou-se, também, que mesmo diante das angústias vivenciadas a partir do falecimento de um paciente boa parte dos entrevistados compreendem que a morte é um processo inerente da vida humana, assim como definida por alguns, é a única certeza da vida, mas é uma certeza angustiante difícil de ser pensada e enfrentada, dessa maneira emoções e sentimento de frustração, incapacidade, insegurança, tristeza, medo, angústia e impotência são vivenciados com muita ênfase pelos profissionais entrevistados. Essa pesquisa mostra a importância da atuação do psicólogo no ambiente hospitalar, os próprios entrevistados relatam sobre a importância e a necessidade do psicólogo nesse ambiente, reconhecendo a importância do desenvolvimento técnico-científico com enfermos, familiares e equipe de saúde. O psicólogo possibilita a construção de alternativas que estimulam pacientes, família e equipe de saúde a pensar, discutir, compreender e enfrentar melhor a finitude e a morte. Os resultados obtidos através dessa pesquisa são de grande relevância para a sociedade. Através dessa pesquisa é possível observar o quão necessário é debater esse tema na formação dos técnicos de enfermagem, não apenas ressaltando que seu trabalho deve ser com foco no processo de cura dos pacientes, a finitude e morte é algo comum no contexto hospitalar, e infelizmente nem sempre será possível salvar vidas, e isso não é um problema, é algo comum e inerente do ser humano, especialmente ao que se refere a doença terminal, se essa visão sobre finitude e morte não for trabalhada com clareza na formação, infelizmente muitos profissionais continuam encarando a morte dos pacientes com fracasso, impotência e frustração. Outro resultado alcançado nesta pesquisa se dá através da desmistificação da sociedade em frente ao profissional de saúde ao definirem os mesmos como pessoas “frias” e “sem 32 sentimentos”, essa pesquisa quebra todo esse paradigma social, mostrando que por trás de um profissional há um ser humano que frente a finitude e morte sofre junto com o paciente e seus familiares. Por fim, essa pesquisa mostra a importância do psicólogo no ambiente hospitalar, há inúmeras condições que solicita o serviço do psicólogo nesse ambiente, para tanto, a atuação do psicólogo hospitalar só tem a beneficiar pacientes, familiares e toda equipe de saúde. Vale ressaltar ainda que a inserção do psicólogo em uma equipe de saúde dentro do hospital visa somar o saber e o fazer aos demais cuidados, promovendo um suporte biopsicossocial para o paciente.
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