REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11553538
Bruna Laiene da Silva Magno de Oliveira1;
Regiane Kelly Minosso Ribeiro2;
Dulcinéia Bacinello Ramalho3.
RESUMO
O presente artigo irá abordar um estudo relativo ao tema paternidade socioafetiva e seus efeitos jurídicos na sucessão hereditária. Serão pontuados a evolução do conceito de família, sobre as relações familiares e socioafetivas e os impactos jurídicos relativos à sucessão hereditária. Considerando-se as modificações causadas pela Constituição Federal de 1988 e Código Civil, e ponderando que essas relações vão muito além de laços biológicos e sanguíneos, que reconhecem a importância dos laços afetivos na formação da família, e o quanto os impactos emocionais são significativos para todas as partes envolvidas, especialmente para a crianças. O método de abordagem é de pensamento dedutivo para a elaboração do trabalho com abordagem qualitativa., sendo uma pesquisa bibliográfica e documental.
Palavras-chave: Paternidade socioafetiva; Sucessão hereditária; Família; Impactos emocionais; Multiparentalidade.
ABSTRACT
This article will address a study on the subject of socio-affective paternity and its legal effects on hereditary succession. The evolution of the concept of the family, family and socio-affective relationships and the legal impacts on inheritance will be discussed. Considering the changes caused by the 1988 Federal Constitution and Civil Code, and considering that these relationships go far beyond biological and blood ties, which recognize the importance of affective ties in the formation of the family, and how significant the emotional impacts are for all parties involved, especially for children. The method of approach is deductive thinking for the elaboration of the work with a qualitative approach, being a bibliographical and documentary research.
Keywords: Socio-affective paternity; Hereditary succession; Family; Emotional impacts; Multiparenthood.
1. INTRODUÇÃO
A família é um dos institutos mais antigos concebidos pela sociedade.
Durante o período colonial, as famílias eram estruturadas conforme o modelo patriarcal, e o pai era considerado a maior autoridade dentro de casa.
Conforme o Código Civil de 1916, o matrimônio era tido como a fundação da família, e, a Constituição de 1934 também abraçava esta ideia, assim como as demais constituições. A mudança sobre este entendimento, só foi ocorrer na Constituição Federal de 1988, onde houve, a regulamentação da união estável, conforme disposto nos parágrafos 3º e 4º do artigo 226.
Desta forma, este conceito de família, como muitos sabem, foi sendo reestruturado ao decorrer dos anos, devido inúmeros fatores como mudanças econômicas, sociais e também culturais. E, desde quando houve a colonização, até os dias atuais, que essa estrutura familiar sofre modificações, para que a sociedade se torne mais harmônica.
A Constituição Federal de 1988 e o Código Civil de 2002, trouxeram mudanças necessárias para o Direito de Família e uma dessas mudanças refere-se à filiação.
Antes, o único vínculo parental, era o biológico e o registral, o que mudou com o decorrer dos anos, principalmente pelas novas modalidades de família que surgiam, esse vínculo paternal se dá apenas pelo amor e afeto de pais e filhos não sendo necessária a ligação consanguínea.
De acordo com Diniz (2024), a filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; é a relação de parentesco consanguíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram a vida, podendo, ainda (CC, arts. 1.593 a 1.597 e 1.618 e s.), ser uma relação socioafetiva entre pai adotivo e institucional e filho adotado ou advindo de inseminação artificial heteróloga.
O artigo 1.593 do Código Civil determina que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”. Sendo assim, nota-se que o vínculo de parentesco não necessariamente precisa ter apenas como origem os laços biológicos, mas também as outras formas de relação familiar, como a socio afetividade.
No Código Civil brasileiro não se fala expressamente sobre a paternidade socioafetiva, porém, ela é reconhecida e amparada mesmo que não seja citada diretamente.
Conforme Madaleno (2023), a filiação consanguínea deve coexistir com o vínculo afetivo, pois com ele se completa a relação parental. Não há como aceitar uma relação de filiação apenas biológica sem ser afetiva, externada quando o filho é acolhido pelos pais que assumem plenamente suas funções inerentes ao poder familiar e reguladas pelos artigos 1.634 e 1.690 do Código Civil.
De acordo com Tartuce (2023) nota-se claramente que o julgamento do Supremo Tribunal Federal não estabeleceu a hierarquia entre a paternidade socioafetiva ou a biológica, devendo-se reconhecer a multiparentalidade como regra, o que não cabe um modelo fechado, uma monossolução, para resolver os conflitos familiares.
Já para Nader (2015), as relações de parentesco configuram uma grande parte do objeto do Direito de Família. Tais relações independem das entidades familiares. As discriminações contra a prole advinda fora do casamento só foram cessar a partir das últimas décadas do século XX.
Diniz (2024) salienta, grande é a importância dessas relações de parentesco, em razão de seus efeitos jurídicos de ordem pessoal ou econômica, que estabelecem direitos e deveres recíprocos entre os parentes, como a obrigação alimentar, o direito de promover interdição e de receber herança, com exceção do parentesco por afinidade etc.
Desse modo, o que se nota é que atualmente, muito mais importa o caráter afetivo das relações familiares do que a forma como as famílias foram constituídas, reconhecendo-se o princípio da afetividade como um direito fundamental e valorizando o carinho existente nas relações em detrimento de formalidades legais.
Levando-se em consideração que, a paternidade socioafetiva pode gerar inúmeros conflitos familiares e jurídicos na sucessão hereditária, quando ocorre a disputa entre filhos biológicos e os filhos socioafetivos em relação a divisão de bens deixados pelo falecido.
Desta forma, foram estabelecidos os seguintes objetivos a serem alcançados na elaboração deste artigo: Apontar quais são os problemas que podem surgir junto com a paternidade socioafetiva quando se trata de sucessão hereditária; Analisar o que a lei dispõe a respeito da paternidade socioafetiva quando se fala em direito a sucessão hereditária e a sua importância para a proteção dos direitos dos adolescentes e das crianças; e demonstrar qual a melhor forma de resguardar a criança e ao adolescente que passa por esse processo de paternidade socioafetiva, para que não seja prejudicado, priorizando sempre seu bem-estar.
2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo teve sua abordagem na pesquisa realizada de forma qualitativa, para a elaboração do trabalho. Foram realizadas inúmeras pesquisas e coletas de dados para a formulação do artigo. Sendo utilizada também a pesquisa bibliográfica e documental.
O método dedutivo foi o escolhido para criação do artigo.
Os sites utilizados para embasamento da elaboração do presente trabalho, foram o google acadêmico e a minha biblioteca, que é disponibilizado pela instituição de ensino Unisapiens.
3. RESULTADOS
Diante do estudo realizado para elaboração deste artigo, percebe-se que, a filiação socioafetiva tornou-se cada vez mais rotineira e comum nas famílias brasileiras. A prática do abandono afetivo por parte de genitores se tornou algo comum nos dias de hoje, e isso, consequentemente afeta diretamente aos filhos oriundos da relação. O fato de haver pagamento da pensão por si só, sem o acompanhamento e atenção que deveriam ser direcionados aos filhos, não se caracteriza como o efetivo exercício da paternidade ou maternidade.
Estabelecer vínculos e reconhecê-los é fundamental para aqueles que já passaram por um processo de abandono e desamparo. Lembrando que, ao assumir e oficializar a responsabilidade de ser pai ou mãe socioafetivo, este vínculo será para o resto da vida, não sendo desfeito, caso haja divórcio ou dissolução de união estável.
Através da legalização da paternidade socioafetiva, permite-se a inclusão do sobrenome do pai ou da mãe socioafetivos ao nome dos filhos, sem que haja exclusão sobrenome dos pais biológicos, amparando ainda direitos relativos à sucessão e alimentos.
4. DISCUSSÃO
4.1 Evolução familiar
Ao longo dos tempos o conceito de família vem evoluindo, e fundamental para essa evolução é o contexto cultural, social entre outros de cada sociedade. A família vem desempenhando diferentes funções ao longo da história pois tem sido uma instituição fundamental para a organização e sobrevivência das comunidades humanas.
No início as famílias eram geralmente extensas e incluíam não apenas os pais e os filhos, mas também outros parentes próximos, logo após houve uma tendência para as famílias nucleares, compostas apenas pelos pais e filhos. Foi no século XX que ocorreram mudanças significativas no conceito de família.
Atualmente, o conceito de família é muito mais amplo e inclusivo do que no passado. Além das famílias nucleares tradicionais, reconhecem-se também as famílias socioafetivas entre outras formas de organização familiar.
Essa diversidade reflete a compreensão de que o mais importante não é a estrutura ou composição da família, mas sim os laços de afeto, cuidado e responsabilidade que unem seus membros. Sendo assim, tornou-se inviável estabelecer um modelo familiar uniforme, havendo a necessidade de traduzi-la em conformidade com as transformações sociais no decorrer do tempo, como cita Farias e Reosenvald.
Para Venosa (2023) o organismo familiar passa por constantes mutações e é evidente que o legislador, e mormente o julgador, devem estar atentos às necessidades de alterações legislativas que devem ser feitas no curso deste século. Não pode também o Estado deixar de cumprir sua permanente função social de proteção à família, como sua célula principal, sob pena de o próprio Estado desaparecer, cedendo lugar ao caos. Daí porque a intervenção do Estado na família é fundamental, embora deva preservar os direitos básicos de autonomia, essa intervenção deve ser sempre protetora, nunca invasiva da vida privada.
4.2 Socio afetividade
A socio afetividade é um conceito jurídico que reconhece a existência de vínculos de filiação baseados em laços afetivos e emocionais, independentemente dos laços biológicos. Em outras palavras, refere-se à relação de paternidade ou maternidade que se estabelece não apenas pelo vínculo biológico entre pai e filho, mas também pelo afeto, convivência, cuidado e responsabilidade assumidos por uma pessoa em relação a uma criança. Não encontramos no Código Civil de 2002, mencionando acerca da filiação socioafetiva, mas permite em sua redação do artigo 1.593, que a doutrina e a jurisprudência reconheçam a dita, que diz: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.
Se tratando de família socioafetiva, discorre Assumpção (2004, p. 53):
Família sociológica é aquela em que existe a prevalência dos laços afetivos, em que se verifica a solidariedade entre os membros que a compõe. Nessa família, os responsáveis assumem integralmente a educação e a proteção das crianças que, independentemente de algum vínculo jurídico ou biológico entre eles, criam, amam e defendem, fazendo transparecer a todos que são seus pais.
Sendo assim o vínculo para a socio afetividade se baseia em afeto amor e cuidado não havendo necessidade de vínculo biológico.
No âmbito jurídico, a paternidade socioafetiva pode ser reconhecida e garantida através de diversos instrumentos legais, como a adoção, a guarda, o reconhecimento voluntário de paternidade ou maternidade, entre outros. Esse reconhecimento é fundamental para assegurar os direitos e deveres tanto da criança quanto da pessoa que exerce o papel parental, garantindo, por exemplo, o direito à herança, ao nome, à educação e a outros aspectos fundamentais da relação familiar.
É importante ressaltar que o reconhecimento da paternidade socioafetiva não exclui a importância da paternidade biológica, mas sim amplia o conceito de família, reconhecendo que os laços afetivos e emocionais também são fundamentais para o desenvolvimento e o bem-estar das crianças.
Por meio da Constituição Federal de 1988 e com o Código Civil de 2002, ocorreram diversas mudanças na lei que fizeram com que as relações familiares sofressem regulamentações que até então não eram tratadas da forma devida, onde o vínculo familiar passa a ir muito além dos laços sanguíneos, e os laços familiares e começa a receber o amparo jurídico. Sabe-se que sociedade vive em constante mudança, e com a família não seria diferente, já que elas foram se moldando ao decorrer dos anos.
As relações de afeto passam a ter espaço no âmbito jurídico. E o presente trabalho visa analisar as relações socioafetivas, pontuando o que e quais direitos àqueles que possuem reconhecimento de paternidade têm sobre as sucessões hereditárias e o que a lei dispõe sobre esse assunto. Levando em consideração que vivemos em uma sociedade que frequentemente está mudando, há necessidade de se esclarecer tais pontos, e trazer ao conhecimento de todos o que a lei determina nos casos relativos a socio afetividade.
De acordo com Calderón (2017), o que se ressalta na análise da família é a percepção de que ela está em movimento constante, amoldando-se de acordo com o contínuo caminhar social. Muito mais do que instituto jurídico, família é realidade em movimento. Exemplo disso se dá com a presença da afetividade nos relacionamentos familiares, que, de anteriormente irrelevante, cada vez mais se evidencia, e com intensidade de tal ordem que não permite mais que seja ignorada pelo Direito.
Dias (2015) destaca que, a filiação socioafetiva decorre do ato de vontade, amor e respeito recíprocos e construídos com o passar do tempo, independentemente do vínculo sanguíneo. Neste sentido, é cabível salientar que a filiação socioafetiva é vista como uma forma de amor similar ao da filiação sanguínea, fazendo com que não seja gerada uma diferença entre filhos de sangue e de consideração.
4.3 Filhos Biológicos, adotivos e socioafetivos
A filiação biológica é aquela associada à verdade biológica, ou seja, determinada pela origem genética. (GAMA, 2008).
Adriana Lima explica que:
A paternidade biológica se relaciona com a consanguinidade, que pode ser provada cientificamente pelo exame de DNA, que revela a verdade técnica sobre a paternidade, buscada cada vez mais nos dias atuais. (Lima, 2011)
A filiação por adoção é regulamentada pelos artigos. 1.618 e 1.619 do Código Civil, e especialmente, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em seus artigos. 39 a 52D.
A filiação adotiva é precedente de um procedimento judicial. A adoção é o ato jurídico solene pelo qual uma pessoa recebe em sua família, na classe de filho, pessoa a ela estranha. (Gonçalves, 2008).
A adoção é modalidade artificial de filiação que busca imitar a filiação natural. Daí ser também conhecida como filiação civil, pois não resulta de uma relação biológica, mas de […] sentença judicial […]. A filiação natural ou biológica repousa sobre o vínculo de sangue, genético ou biológico; a adoção é uma filiação exclusivamente jurídica, que se sustenta sobre a pressuposição de uma relação não biológica, mas afetiva. A adoção contemporânea é, portanto, um ato ou negócio jurídico que cria relações de paternidade e filiação entre duas pessoas. O ato da adoção faz com que uma pessoa passe a gozar do estado de filho de outra pessoa, independentemente do vínculo biológico. (Venosa, 2011, p. 273).
A filiação socioafetiva é dita como a convivência, afeto e respeito entre pais e filhos que se enxergam e vivem como pais e filhos cumprindo os requisitos de uma família dita tradicional perante a sociedade. Sendo assim devem receber todo o amparo jurídico disponível.
Regina Beatriz Tavares da Silva destaca (2016):
A paternidade socioafetiva é o vínculo que se estabelece em virtude do reconhecimento social e afetivo de uma relação entre um homem e uma criança como se fossem pai e filho. Nessa espécie de paternidade não há vínculo de sangue ou adoção.
4.4 Sucessão hereditária
A sucessão hereditária é o conjunto de regras jurídicas que regulam a transferência do patrimônio (bens, direitos e obrigações) de uma pessoa falecida, chamada de “de cujus”, para seus herdeiros ou legatários. Esse processo ocorre por meio da abertura do inventário e do processo de partilha, nos quais são identificados e avaliados os bens deixados pelo falecido e distribuídos entre os herdeiros de acordo com as disposições legais ou testamentárias.
Magalhães conceitua sucessão sendo:
[…] a substituição de uma pessoa por outra na titularidade de um patrimônio em decorrência do evento morte. Assim, falecendo uma pessoa opera-se a transferência do domínio e da posse do seu patrimônio, considerado na sua universalidade, àquele que há de sucedê-lo saisine, ou por força de disposição de última vontade. (Magalhães, 2004, p. 17).
Levando em consideração o princípio da dignidade humana e da afetividade, princípios esses que não eram respeitados no Código de 1916, a Constituição Federal veio para garantir mais proteção, aos filhos que são frutos do casamento ou não lhes garantindo os mesmos direitos. Com a afiliação socioafetiva, as mesmas responsabilidades e obrigações são atribuídas seja filhos de sangue e ou adotivos incluindo o direito a herança.
Art. 227 § 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
A igualdade entre os filhos é absoluta, não pode admitir qualquer distinção, ou seja, os filhos devem receber igual tratamento, formal e material. (GiancoIi, 2009, p. 223)
De acordo com Gonçalves (2008, p.361), com relação ao filho socioafetivo no direito sucessório, eles concorrem, em igualdade de condições com os filhos de sangue, em razão da paridade estabelecida pelos arts. 227, §6º da Constituição e art. 1.628 do Código Civil.
Deste modo os filhos socioafetivos terão direito a concorrerem na ordem sucessória como herdeiro necessário assim como os filhos biológicos ou adotivos.
4.5 O que diz a lei e as decisões judiciais
No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no artigo 20 dá forças aos 11 entendimentos inseridos pelo artigo 1.596 do Código Civil de que não há distinções entre os filhos de qualquer natureza, sendo proibida diferenciação entre eles. Direitos e deveres de forma igualitária entre os filhos é o primeiro efeito deste reconhecimento.
“Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.” (Estatuto da Criança de do Adolescente. Art. 20)
O Código Civil de 2012 em seu artigo 1596:
“Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.” (Código Civil/2012)
No Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 22 dispõe que os pais têm o dever de manter a guarda, o sustento e a moradia de seus filhos, ou seja, os filhos reconhecidos estarão submetidos ao poder familiar daquele que o reconheceu, nos termos do artigo 1.634 do Código Civil:
“Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta Lei.” (ECA)
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;
III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem.
IV – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
V – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro 12 dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII – representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos,
VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
Como preceitua Diniz (2007, p. 476), no direito sucessório, os filhos de qualquer natureza são equiparados.
Deste modo, o filho reconhecido concorre em igualdade com os irmãos, herdando quinhão igual ao que couber aos demais filhos.
Neste sentido os julgados concedem aos herdeiros socioafetivos igualdade no direito sucessório, conforme observamos:
“RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. FILIAÇÃO. IGUALDADE ENTRE FILHOS. ART. 227, § 6º, DA CF/1988. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. VÍNCULO BIOLÓGICO. COEXISTÊNCIA. DESCOBERTA POSTERIOR. EXAME DE DNA. ANCESTRALIDADE. DIREITOS SUCESSÓRIOS.
GARANTIA. REPERCUSSÃO GERAL. STF. 1. No que se refere ao Direito de Família, a Carta Constitucional de 1988 inovou ao permitir a igualdade de filiação, afastando a odiosa distinção até então existente entre filhos legítimos, legitimados e ilegítimos (art. 227, § 6º, da Constituição Federal). 2. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 898.060, com repercussão geral reconhecida, admitiu a coexistência entre as paternidades biológica e a socioafetiva, afastando qualquer interpretação apta a ensejar a hierarquização dos vínculos. 3. A existência de vínculo com o pai registral não é obstáculo ao exercício do direito de busca da origem genética ou de reconhecimento de paternidade biológica. Os direitos à ancestralidade, à origem genética e ao afeto são, portanto, compatíveis. 4. O reconhecimento do estado de filiação configura direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser exercitado, portanto, sem nenhuma restrição, contra os pais ou seus herdeiros. 5. Diversas responsabilidades, de ordem moral ou patrimonial, são inerentes à paternidade, devendo ser assegurados os direitos hereditários decorrentes da comprovação do estado de filiação. 6. Recurso especial provido.”
Após o reconhecimento da paternidade socioafetiva, seu registro fica irrevogável, ou seja, após a socio afetividade declarada não pode haver rompimento no vínculo paterno, a não ser por vícios de vontade perante o órgão judicial. A 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul dispôs no Recurso de Apelação Nº 70061285912:
APELAÇÃO. NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. PAI REGISTRAL QUE REGISTROU MESMO SABENDO NÃO SER PAI BIOLÓGICO. INEXISTÊNCIA DE ERRO. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA PROVADA. Caso de pai registral que efetuou o registrado sabendo não ser o pai biológico, uma vez que quando passou a se relacionar com a genitora ela já estava grávida. Na hipótese, não há falar e nem cogitar em erro ou em algum tipo de vício na manifestação de vontade. Por outro lado, foi realizado laudo de avaliação social que concluiu expressamente pela existência de paternidade socioafetiva entre o apelante e o filho registral que, hoje em dia, já é até maior de idade. NEGARAM PROVIMENTO. Desembargador: Rui Portanova (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 2014, online).
Assim sendo, hoje, todos, seja biológico, adotivos ou socioafetivos são filhos e são reconhecidos iguais perante a lei. Tendo direito ao reconhecimento de paternidade mesmo após a morte do pai socioafetivo para fins de direito de herança.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde tempos primórdios a família é uma instituição fundamental para a ordem da sociedade, porém, por muito tempo o conceito de família é algo que ficou muito engessado, e com o avanço da humanidade, os vários novos modelos de família surgindo esse conceito de família passou por um avanço visível e necessário, capaz de alcançar até mesmo aqueles que no passado perdiam seus direitos pelo simples fato de não fazerem parte da família dita tradicional, que são os filhos socioafetivos.
Percebe-se, que são inúmeras situações que esta paternidade socioafetiva pode trazer a vida daquele que a vive, e a regulamentação para tratar dos direitos de filhos socioafetivos após o divórcio ou direito de herança, é fundamental para resguardar e trazer segurança jurídica a todas as partes envolvidas.
Sendo assim, a paternidade socioafetiva representa uma evolução no direito de família, partindo para uma visão mais ampla e inclusiva quando se trata das relações familiares. E o reconhecimento da filiação socioafetiva torna o filho socioafetivo detentor dos mesmo direitos que um filho adotivo ou biológico, inclusive com relação ao direito à herança.
O Conselho Nacional de Justiça, por meio de seu provimento nº 63/2017, estabeleceu algumas regras quanto ao registro extrajudicial de filhos socioafetivos, este, tornou-se um marco de suma importância ao reconhecer e regulamentar o instituto das filiações socioafetivas.
O Tribunal Superior de Justiça e o Superior Tribunal de Justiça possuem decisões que equiparam os filhos biológicos, adotivos e socioafetivos para efeitos na sucessão hereditária. Sendo possível, a inclusão deste filho socioafetivo no testamento, visando garantir a distribuição justa da herança, o que reflete diretamente a importância do vínculo afetivo na estrutura familiar.
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação – referências – elaboração. Rio de Janeiro, nov. 2018.
ASSUMPÇÃO, Luiz Roberto de. Aspectos da paternidade no novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2004
Código Civil Brasileiro. Lei no 10.406, de 10/01/2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 05 abr. 2024.
Constituição da República Federativa do Brasil, do ano de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 05 abr. 2024.
DINIZ, Maria H. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. [Digite o Local da Editora]: SRV Editora LTDA, 2024. E-book. ISBN 9788553621453. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553621453/. Acesso em: 10 mai. 2024.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 426-427.
FARIAS, Cristiano Chaves. Direito Constitucional à Família. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre, IBDFAM/Síntese, n. 23, abril-Maio 2004.
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: família. São Paulo: Atlas, 2008.
GIANCOLI, Bruno Pandori. Direito civil. São Paulo: Saraiva, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Volume VI: direito de família. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
MADALENO, Rolf. Direito de Família. [Digite o Local da Editora]: Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559648511. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559648511/. Acesso em: 02 mai. 2024.
MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito das sucessões no novo código civil brasileiro. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004.
NADER, Paulo. Curso de Direito Civil – Vol. 5 – Direito de Família, 7ª edição. Digite o Local da Editora]: Grupo GEN, 2015. E-book. ISBN 9788530968687. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530968687/. Acesso em: 15 mai. 2024.
SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Paternidade socioafetiva X paternidade biológica. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/faustomacedo/paternidade-socioafetiva-xpaternidade-biologica/>. Acesso em: 13 mar.2024.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família. v.5. Disponível em: Minha Biblioteca, (18th edição). Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559646975. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559646975/. Acesso em: 20 abr. 2024.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
VENOSA, Sílvio de S. Direito Civil: Família e Sucessões. v.5. [Digite o Local da Editora]: Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559774715. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559774715/. Acesso em: 12 mai. 2024.
Apelação Cível, Nº 70061285912, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 25-09-2014, disponível em site tjrs.jus.br.
1Acadêmica de direito. E-mail: bruna-laiene@hotmail.com. Artigo apresentado a Faculdade Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Porto Velho/RO, 2024.
2Acadêmica de direito. E-mail: kellyminosso@gmail.com. Artigo apresentado a Faculdade Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024.
3Professora Orientadora. Professor do curso de Direito. E-mail: bacinelloramalho@gmail.com