A MEDIAÇÃO JUDICIAL COMO UM CAMINHO PARA A PACIFICAÇÃO SOCIAL, CELERIDADE PROCESSUAL E EFICÁCIA

JURÍDICA JUDICIAL MEDIATION AS A PATH TO SOCIAL PACIFICATION, PROCEDURAL SPEED, AND LEGAL EFFECTIVENESS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102410200053


José Antônio da Silva [1]


Resumo

Este artigo analisa a mediação judicial como um instrumento eficaz para a pacificação social, a celeridade processual e a eficácia jurídica no contexto brasileiro. Diante da sobrecarga do Poder Judiciário e da morosidade na prestação jurisdicional, a mediação emerge como alternativa ao modelo tradicional de resolução de conflitos, privilegiando o diálogo e a autonomia das partes. O estudo aborda os fundamentos teóricos e legais da mediação judicial, destacando a Lei nº 13.140/2015 e o Novo Código de Processo Civil de 2015. Explora-se como a mediação contribui para a promoção de uma cultura de paz, ao permitir soluções consensuais que atendem aos interesses mútuos e restauram relações sociais. Analisa-se o impacto da mediação na celeridade processual, evidenciando sua capacidade de descongestionar o Judiciário e proporcionar soluções mais rápidas e satisfatórias. Também se examina a eficácia jurídica dos acordos mediativos, ressaltando a segurança jurídica e o cumprimento voluntário das decisões. Por fim, discutem-se os desafios e perspectivas futuras da mediação judicial no Brasil, considerando aspectos culturais, institucionais e tecnológicos. Conclui-se que a mediação judicial representa um caminho promissor para a melhoria do sistema de justiça, contribuindo para um Judiciário mais eficiente e para a pacificação social.

Palavras-chave: Mediação Judicial. Pacificação Social. Celeridade Processual. Eficácia Jurídica.Resolução de Conflitos.

1  INTRODUÇÃO

A sociedade contemporânea enfrenta um cenário marcado por conflitos complexos e diversificados, refletindo a multiplicidade de relações sociais, econômicas e jurídicas. No Brasil, o Poder Judiciário tem sido sobrecarregado por um elevado número de processos, resultando em morosidade na prestação jurisdicional e, muitas vezes, na insatisfação das partes envolvidas. Diante desse contexto, torna-se imperativo buscar alternativas que promovam não apenas a resolução efetiva dos litígios, mas também a pacificação social e a eficiência do sistema jurídico.

A mediação judicial emerge como um instrumento significativo nesse panorama, representando uma abordagem inovadora para a resolução de conflitos. Diferentemente do modelo adjudicatório tradicional, a mediação privilegia o diálogo, a cooperação e a autonomia das partes, conduzidas por um mediador imparcial. Este método busca não somente solucionar o litígio específico, mas também restaurar ou preservar as relações entre as partes, contribuindo para a harmonia social.

O problema de pesquisa que norteia este estudo é: Em que medida a mediação judicial pode ser considerada um caminho eficaz para a pacificação social, celeridade processual e eficácia jurídica no contexto brasileiro? Para responder a essa questão, estabelece-se como objetivo geral analisar o papel e a efetividade da mediação judicial como alternativa ao processo judicial tradicional. Os objetivos específicos são: (i) compreender os fundamentos teóricos e legais da mediação judicial no Brasil; (ii) investigar como a mediação contribui para a pacificação social; (iii) avaliar o impacto da mediação na celeridade processual; e (iv) verificar a eficácia jurídica dos acordos resultantes da mediação.

A justificativa deste trabalho reside na relevância da mediação judicial como mecanismo para enfrentar desafios cruciais do sistema judiciário brasileiro, como a lentidão processual e a insatisfação das partes. Além disso, a mediação promove a participação ativa dos envolvidos na construção de soluções, fortalecendo a cidadania e a cultura de paz. Com a promulgação da Lei nº 13.140/2015 e a incorporação da mediação no Novo Código de Processo Civil de 2015, torna-se ainda mais pertinente aprofundar o estudo sobre sua aplicação prática e seus impactos.

A metodologia adotada inclui pesquisa bibliográfica e documental, com análise de doutrinas jurídicas, legislações, artigos acadêmicos e dados estatísticos relevantes. Será realizada uma abordagem qualitativa, buscando compreender os aspectos teóricos e práticos da mediação judicial. Estudos de casos e experiências concretas serão examinados para ilustrar a efetividade e os desafios da mediação no cenário atual.

2  A MEDIAÇÃO JUDICIAL NO CONTEXTO JURÍDICO BRASILEIRO

2.1 CONCEITO E FUNDAMENTOS DA MEDIAÇÃO JUDICIAL

A mediação judicial emerge como um instrumento fundamental no contexto jurídico brasileiro, representando uma mudança paradigmática na forma de resolução de conflitos. Esse método autocompositivo ganhou notável protagonismo com o advento do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) e da Lei nº 13.140/2015, conhecida como Lei de Mediação.

Conceitualmente, a mediação judicial pode ser definida como um procedimento estruturado no qual um terceiro imparcial, denominado mediador, atua como facilitador do diálogo entre as partes envolvidas em um conflito, auxiliando-as na busca de uma solução consensual. Diferentemente da conciliação, a mediação não tem um prazo definido e seu desfecho não necessariamente resulta em um acordo, pois prioriza a autonomia das partes na construção      de     soluções      que     atendam      a     seus      interesses  e necessidades (Cintra; Grinover; Dinamarco, 2015).

Os fundamentos da mediação judicial estão alicerçados em princípios basilares, expressos tanto no CPC/2015 quanto na Lei de Mediação. Entre estes, destacam-se a imparcialidade do mediador, a isonomia entre as partes, a oralidade, a informalidade, a autonomia da vontade das partes, a busca do consenso, a confidencialidade e a boa-fé. Tais princípios visam assegurar um ambiente propício para o diálogo construtivo e a resolução efetiva dos conflitos.

Ademais, a mediação judicial fundamenta-se na premissa de que o Estado deve promover, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, conforme estabelecido no § 2º do art. 3º do CPC/2015. Essa diretriz reflete uma mudança significativa na cultura jurídica brasileira, tradicionalmente marcada pela litigiosidade, em direção a uma cultura de pacificação social.

Um aspecto fundamental da mediação judicial é sua integração ao processo civil brasileiro como uma fase própria, anterior à contestação do réu. Conforme o art. 334 do CPC/2015 e o art. 27 da Lei de Mediação, o juiz, ao receber a petição inicial, deve designar uma audiência de mediação antes mesmo da resposta do réu, desde que preenchidos os requisitos essenciais e não se trate de caso de improcedência liminar do pedido. Essa inovação visa atender aos princípios da economia e da celeridade processual, possibilitando a resolução do litígio antes da estabilização da lide.

Para operacionalizar a mediação judicial, o CPC/2015 determinou a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), estruturas físicas responsáveis pela realização das sessões de mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição. Essa determinação, presente no art. 165 do CPC/2015, incorporou ao ordenamento jurídico as diretrizes já estabelecidas pela Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Portanto, a mediação judicial no Brasil fundamenta-se na busca por um sistema de justiça mais eficiente, célere e humanizado. Ao promover o diálogo e a construção conjunta de soluções, esse instituto não apenas desafoga o Judiciário, mas também proporciona resoluções mais satisfatórias e duradouras para os conflitos, contribuindo para a pacificação social e o fortalecimento da cidadania.

2.2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA MEDIAÇÃO

A mediação, como método autocompositivo de resolução de conflitos, é regida por um conjunto de princípios fundamentais que orientam sua prática e garantem sua eficácia. Esses princípios estão expressamente previstos na legislação brasileira, notadamente no art. 166 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e no art. 2º da Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015). Ademais, são reforçados pela doutrina jurídica e pela prática dos tribunais.

O princípio da imparcialidade do mediador é um dos pilares da mediação. Conforme ensina Fernanda Tartuce (2018), o mediador deve atuar de forma equidistante em relação às partes, sem favorecer ou prejudicar qualquer delas. Esse princípio garante a confiança no processo e a legitimidade do resultado alcançado.

A confidencialidade, por sua vez, assegura que as informações discutidas durante as sessões de mediação não serão divulgadas, salvo se as partes expressamente decidirem o contrário ou quando sua revelação for exigida por lei. Esse princípio é crucial para criar um ambiente seguro, aonde as partes possam se expressar livremente sem receio de que suas declarações sejam usadas contra elas em eventual processo judicial futuro.

O princípio da autonomia da vontade das partes é outro elemento fundamental da mediação. Ele garante que as partes têm o poder de decidir livremente sobre a participação, permanência e interrupção da mediação, bem como sobre o conteúdo do acordo eventualmente celebrado. Como destaca Silva, Rossi e Munhoz (2021), esse princípio reflete o empoderamento das partes na resolução de seus próprios conflitos.

A informalidade e a oralidade são princípios que conferem flexibilidade ao procedimento de mediação. Eles permitem que o processo seja conduzido de forma mais dinâmica e adaptável às necessidades específicas de cada caso, sem as amarras formais do processo judicial tradicional.

O princípio da busca do consenso orienta todo o processo de mediação. Diferentemente da lógica adversarial do processo judicial, a mediação busca construir soluções que atendam aos interesses de todas as partes envolvidas. Nesse sentido, a mediação não visa apenas ao acordo, mas à efetiva pacificação do conflito (Piovezana; Silva; Leite, 2019).

A isonomia entre as partes é outro princípio crucial, garantindo que ambas as partes tenham iguais oportunidades de participação e manifestação durante o processo de mediação. Esse princípio está intimamente ligado à imparcialidade do mediador e à busca do consenso.

O princípio da boa-fé, embora não expressamente mencionado na Lei de Mediação, é considerado implícito e essencial para o sucesso do procedimento. Ele exige que as partes ajam com lealdade e transparência durante todo o processo de mediação.

Além desses, a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido outros princípios importantes, como o da competência do mediador, que exige que o profissional seja devidamente capacitado para exercer sua função, e o da decisão informada, que garante às partes o direito de obter informações suficientes sobre o processo de mediação e suas consequências antes de tomar qualquer decisão.

É importante ressaltar que esses princípios não atuam de forma isolada, mas se interrelacionam e se complementam. A aplicação conjunta desses princípios visa garantir a efetividade da mediação como instrumento de pacificação social e de acesso à justiça.

Portanto, os princípios norteadores da mediação formam a base ética e procedimental desse método de resolução de conflitos. Eles asseguram que a mediação seja conduzida de forma justa, eficaz e respeitosa, promovendo o diálogo construtivo e a busca de soluções consensuais que atendam aos interesses de todas as partes envolvidas.

2.3 LEGISLAÇÃO PERTINENTE: LEI Nº 13.140/2015 E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O marco regulatório da mediação no Brasil foi consolidado com a promulgação de duas importantes leis em 2015: a Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, conhecida como Lei de Mediação, e a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, que instituiu o Novo Código de Processo Civil (NCPC). Essas legislações representam um avanço significativo na promoção dos métodos consensuais de resolução de conflitos no ordenamento jurídico brasileiro.

A Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015) estabelece um marco regulatório abrangente para a mediação entre particulares e no âmbito da administração pública. Conforme destaca Fernanda Tartuce (2018), essa lei trouxe maior segurança jurídica ao instituto da mediação, definindo seus princípios orientadores, o papel do mediador e os procedimentos a serem seguidos.

Entre as principais disposições da Lei de Mediação, destaca-se a definição de mediação como a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que auxilia e estimula as partes a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. Ademais, a lei prevê a possibilidade de mediação sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação, regulamenta a mediação extrajudicial e judicial, estabelece a confidencialidade do procedimento e suas exceções, além de prever a possibilidade de mediação pela internet ou por outro meio de comunicação que permita a transação à distância.

Por sua vez, o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) incorporou a mediação como parte integrante do processo judicial, reforçando sua importância como método de resolução de conflitos. Como observa Humberto Theodoro Júnior (2020), o NCPC adotou uma postura de estímulo à autocomposição, elevando-a à categoria de norma fundamental do processo civil brasileiro.

Assim, o NCPC trouxe inovações significativas em relação à mediação, incluindo a promoção da solução consensual dos conflitos como norma fundamental do processo civil e prevendo a audiência de mediação ou conciliação como etapa obrigatória do processo, antes mesmo da apresentação da contestação pelo réu. Além disso, e importante destacar que o código determinou a criação dos Centros Judiciários de Solução Consensual de Conflitos (CEJUSCs), responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação, regulamentou a atividade dos mediadores judiciais e previu a possibilidade de homologação judicial de acordo extrajudicial de qualquer natureza.

É importante mencionar também a Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que, embora anterior às leis mencionadas, foi pioneira ao instituir a Política

Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Essa resolução, conforme destaca  Carvalho e Borges (2016), lançou as bases para a implementação efetiva da mediação no sistema judicial brasileiro.

A interação entre a Lei de Mediação e o NCPC tem sido objeto de debate na doutrina. Assim, as duas leis se complementam, formando um microssistema de estímulo à autocomposição. No entanto, em caso de conflito entre as normas, prevalece a Lei de Mediação por ser mais específica.

2.4 DIFERENÇAS ENTRE MEDIAÇÃO, CONCILIAÇÃO E ARBITRAGEM

No contexto dos métodos alternativos de resolução de conflitos, a mediação, a conciliação e a arbitragem destacam-se como instrumentos fundamentais para a promoção do acesso à justiça e a pacificação social. Embora compartilhem o objetivo comum de resolver disputas fora do âmbito judicial tradicional, cada um desses métodos possui características próprias que os distinguem entre si.

A mediação, conforme já define Fernanda Tartuce (2018), é um método autocompositivo de resolução de conflitos no qual um terceiro imparcial, sem poder decisório, auxilia as partes a restabelecerem a comunicação e a encontrarem, por si próprias, soluções consensuais para a controvérsia. O mediador atua como um facilitador do diálogo, estimulando a reflexão das partes sobre seus reais interesses e necessidades. A mediação é especialmente indicada para conflitos que envolvem relações continuadas, como questões familiares ou empresariais, onde a preservação do vínculo entre as partes é relevante.

Por sua vez, a conciliação, embora também seja um método autocompositivo, apresenta algumas diferenças em relação à mediação. Como explicam Salles e Faza (2019) , na conciliação, o terceiro imparcial, chamado conciliador, tem uma postura mais ativa, podendo sugerir soluções para o conflito. A conciliação é geralmente utilizada em casos onde não há vínculo anterior entre as partes, como em conflitos de consumo ou acidentes de trânsito. O processo tende a ser mais rápido e focado na obtenção de um acordo.

Já a arbitragem, conforme ensina Sobral (2021), é um método heterocompositivo de resolução de conflitos, no qual as partes elegem um terceiro, o árbitro, para decidir a controvérsia. Diferentemente da mediação e da conciliação, na arbitragem o árbitro tem poder decisório, e sua decisão (sentença arbitral) tem força de título executivo judicial. A arbitragem é comumente utilizada em conflitos comerciais complexos e de alto valor, onde as partes buscam uma decisão técnica e especializada.

Uma diferença fundamental entre esses métodos reside no grau de autonomia das partes na resolução do conflito. Na mediação, as partes têm total controle sobre o resultado, sendo responsáveis por construir a solução. Na conciliação, embora as partes ainda tenham autonomia, há uma maior intervenção do conciliador na proposição de acordos. Já na arbitragem, as partes delegam o poder decisório ao árbitro, submetendo-se à sua decisão.

Quanto à confidencialidade, tanto a mediação quanto a conciliação são processos confidenciais, protegidos pelo princípio do sigilo. A arbitragem, por outro lado, pode ser confidencial ou não, dependendo do que for acordado entre as partes.

No que tange à formalidade, a mediação e a conciliação são processos mais flexíveis e informais, enquanto a arbitragem segue um procedimento mais estruturado, embora ainda mais flexível que o processo judicial tradicional.

A escolha entre esses métodos deve considerar a natureza do conflito, o relacionamento entre as partes e os objetivos que se pretende alcançar. Não há um método superior aos demais, mas sim mais adequado para cada situação específica.

É importante notar que, no sistema jurídico brasileiro, a mediação e a conciliação foram incorporadas ao processo judicial como etapas obrigatórias pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), enquanto a arbitragem é regulada por lei específica (Lei nº 9.307/1996, alterada pela Lei nº 13.129/2015).

Humberto Dalla Bernardina de Pinho (2020) observa que, apesar das diferenças, esses métodos não são mutuamente excludentes. É possível, por exemplo, utilizar técnicas de mediação durante um processo de arbitragem, ou recorrer à arbitragem caso uma mediação não resulte em acordo.

3  A MEDIAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PACIFICAÇÃO SOCIAL

3.1 A CULTURA DO LITÍGIO E SEUS IMPACTOS SOCIAIS

A cultura do litígio, profundamente enraizada na sociedade brasileira, tem gerado impactos significativos no tecido social do país. Essa tendência à judicialização excessiva dos conflitos reflete-se em números alarmantes: anualmente, cerca de 18% da população adulta brasileira recorre ao Poder Judiciário na expectativa de que terceiros resolvam suas contendas  (Felix, 2020). Tal cenário evidencia uma dependência exacerbada do aparato judicial para a resolução de disputas, muitas vezes em detrimento de soluções consensuais e dialogadas.

Ademais, os custos associados a essa cultura litigiosa são substanciais. Em 2019, as despesas para a manutenção da máquina judiciária ultrapassaram o patamar de R$ 1 bilhão, o que representa aproximadamente um quarto do valor investido em toda a educação básica no mesmo período (Felix, 2020). Esse dado revela um desequilíbrio preocupante na alocação de recursos públicos, priorizando a resolução de conflitos judiciais em detrimento de investimentos em áreas fundamentais para o desenvolvimento social, como a educação.

A cultura do litígio também tem impactos profundos na eficiência e na celeridade do sistema judicial. Apesar da alta produtividade dos magistrados brasileiros, considerados entre os mais produtivos do mundo, o sistema judiciário continua sobrecarregado, resultando em morosidade na prestação jurisdicional (Felix, 2020). Essa situação compromete a efetividade da justiça e pode gerar frustração e descrença no sistema legal por parte dos cidadãos.

Outro aspecto relevante é o impacto dessa cultura na formação de profissionais do direito e na própria concepção de justiça na sociedade. Assim, o conceito de cultura influencia diretamente a forma como os indivíduos e as instituições abordam e resolvem conflitos (Morais, 2018). No caso brasileiro, essa cultura tem fomentado uma visão adversarial das relações sociais, em que o litígio é frequentemente visto como a primeira e principal opção para a resolução de disputas.

Além disso, a judicialização excessiva tem impactos econômicos significativos. Os custos associados a processos judiciais, tanto para o Estado quanto para as partes envolvidas, podem ser substanciais. Isso pode resultar em um ambiente de negócios menos favorável e em um aumento geral dos custos de transação na sociedade.

A cultura do litígio também afeta as relações interpessoais e comunitárias. Ao privilegiar a resolução judicial de conflitos, muitas vezes se perde a oportunidade de fortalecer laços sociais e desenvolver habilidades de negociação e resolução pacífica de disputas. Isso pode levar a um enfraquecimento do tecido social e a uma menor capacidade de resolução autônoma de conflitos por parte dos cidadãos.

Portanto, é crucial reconhecer que, embora o acesso à justiça seja um direito fundamental garantido pela Constituição Federal, é necessário distinguir entre acesso à justiça e acesso ao Judiciário (Felix, 2020). A busca por soluções alternativas de resolução de conflitos, como a mediação e a conciliação, tanto dentro quanto fora do âmbito judicial, pode ser um caminho para mitigar os impactos negativos da cultura do litígio.

3.2 MEDIAÇÃO E A PROMOÇÃO DA CULTURA DE PAZ

A mediação, como método alternativo de resolução de conflitos, desempenha um papel fundamental na promoção da cultura de paz no Brasil. Esse mecanismo não apenas oferece uma alternativa à litigiosidade excessiva, mas também fomenta um ambiente social mais harmonioso e colaborativo.

De acordo com  Cunha e Monteiro (2017), a mediação se alinha com os princípios da cultura de paz ao promover o diálogo, a compreensão mútua e a busca por soluções consensuais. Essa abordagem contrasta com a cultura adversarial predominante no sistema judicial tradicional, onde frequentemente há um “ganhador” e um “perdedor”.

A cultura de paz, conforme definida pela UNESCO, envolve um conjunto de valores, atitudes e comportamentos que rejeitam a violência e previnem conflitos, buscando abordar suas causas para solucionar problemas por meio do diálogo e da negociação entre indivíduos, grupos e nações. Nesse contexto, a mediação surge como uma ferramenta prática para implementar esses princípios no cotidiano das relações sociais e jurídicas (Pedreira, 2019).

Assim, um estudo realizado por Spengler e Spengler Neto (2016) demonstrou que a mediação, ao promover o diálogo e a compreensão mútua, tem o potencial de transformar a percepção das partes sobre o conflito. Isso não apenas facilita a resolução da disputa em questão, mas também previne futuros conflitos, contribuindo para a construção de relações mais harmoniosas a longo prazo.

Entretanto, é importante ressaltar que a transição para uma cultura de paz por meio da mediação enfrenta desafios. A cultura litigiosa ainda está profundamente enraizada na sociedade brasileira, e a mudança para uma abordagem mais colaborativa requer esforços contínuos de educação e conscientização (Azevedo, 2016).

4  CELERIDADE PROCESSUAL POR MEIO DA MEDIAÇÃO

4.1 O PROBLEMA DA MOROSIDADE JUDICIAL NO BRASIL

A morosidade judicial é um dos desafios mais prementes enfrentados pelo sistema de justiça brasileiro. Este problema não apenas compromete a efetividade da prestação jurisdicional, mas também afeta a confiança da sociedade no Poder Judiciário e impacta negativamente o desenvolvimento econômico e social do país.

De acordo com o relatório “Justiça em Números”, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a duração dos processos judiciais no Brasil apresenta uma disparidade significativa entre as fases de conhecimento e execução. Para receber uma sentença, o processo leva, desde a data de ingresso, aproximadamente o triplo de tempo na fase de execução (4 anos) comparada com a fase de conhecimento (1 ano e 6 meses). Essa discrepância é corroborada pela taxa de congestionamento, que atinge 84% na fase de execução e 67% na fase de conhecimento.

As causas da morosidade judicial no Brasil são múltiplas e complexas. Segundo Sadek (2014), alguns dos fatores que contribuem para esse cenário incluem o excesso de litigiosidade, a complexidade do sistema processual, a insuficiência de recursos humanos e materiais, a gestão ineficiente em algumas unidades judiciárias e a litigância de má-fé. O Brasil possui uma cultura jurídica que favorece a judicialização de conflitos, resultando em um volume desproporcional de processos em relação à capacidade do sistema judicial. Além disso, o ordenamento jurídico brasileiro é conhecido por sua complexidade e pelo excesso de possibilidades recursais, o que muitas vezes prolonga desnecessariamente a duração dos processos.

Os impactos da morosidade judicial são significativos e abrangentes. No âmbito econômico, um estudo estimou que a morosidade judicial custa ao Brasil cerca de 1,5% do PIB anualmente. Isso se deve, em parte, à insegurança jurídica gerada pela demora na resolução de conflitos, que desencoraja investimentos e prejudica o ambiente de negócios (Cruz; Gabriel; Oliveira, 2024).

No aspecto social, a morosidade judicial afeta diretamente o acesso à justiça e a efetivação de direitos. Pinheiro (2003) argumenta que a demora na prestação jurisdicional pode resultar em situações de injustiça, especialmente para grupos socialmente vulneráveis que dependem da intervenção judicial para a garantia de seus direitos fundamentais.

Além disso, a morosidade judicial tem um impacto psicológico significativo sobre as partes envolvidas nos processos. Segundo Tartuce (2018), a prolongada espera por uma decisão judicial pode gerar ansiedade, estresse e frustração, além de perpetuar conflitos que poderiam ser resolvidos de forma mais célere e satisfatória.

Diante desse cenário, o Poder Judiciário brasileiro tem buscado implementar medidas para enfrentar o problema da morosidade. Entre essas iniciativas, destacam-se a adoção de metas de produtividade pelo CNJ, visando aumentar a eficiência dos tribunais; o investimento em tecnologia, com a implementação de sistemas de processo eletrônico e inteligência artificial para auxiliar na gestão processual; o incentivo aos métodos alternativos de resolução de conflitos, como a mediação e a conciliação; a realização de mutirões judiciais para reduzir o acervo de processos acumulados; e a implementação de programas de desjudicialização, transferindo para a esfera administrativa a resolução de determinados tipos de conflitos.

Apesar dessas iniciativas, o problema da morosidade judicial persiste como um dos principais desafios do sistema de justiça brasileiro. Nesse contexto, a mediação judicial emerge como uma alternativa promissora para promover a celeridade processual e contribuir para a construção de um sistema de justiça mais eficiente e efetivo.

4.2 A MEDIAÇÃO COMO FERRAMENTA PARA A DESCONGESTÃO DO JUDICIÁRIO

A mediação tem se revelado uma ferramenta eficaz para a descongestão do Poder Judiciário brasileiro, apresentando-se como uma alternativa promissora para enfrentar o desafio da sobrecarga processual. Esse método alternativo de resolução de conflitos vem ganhando destaque no cenário jurídico nacional, especialmente após a implementação de marcos legais significativos, como a Resolução CNJ n. 125/2010, o Código de Processo Civil de 2015 e a Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015).

Ademais, a mediação se destaca como um instrumento capaz de proporcionar soluções mais céleres e satisfatórias para as partes envolvidas, contribuindo diretamente para a redução do volume de processos que chegam ao Judiciário. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a adoção de métodos consensuais de resolução de conflitos tem apresentado resultados positivos na diminuição do acervo processual dos tribunais brasileiros  (Martins et al., 2020).

Assim, a eficácia da mediação na descongestão do Judiciário pode ser atribuída a diversos fatores. Primeiramente, ao promover o diálogo e o entendimento entre as partes, a mediação possibilita a resolução de conflitos de forma mais rápida e eficiente, evitando que disputas se prolonguem por anos nos tribunais. Além disso, as soluções alcançadas por meio da mediação tendem a ser mais duradouras e satisfatórias para ambas as partes, reduzindo a probabilidade de recursos e novas ações judiciais relacionadas ao mesmo conflito.

Dessa forma, a mediação atua não apenas na resolução de conflitos já judicializados, mas também na prevenção de novas demandas, contribuindo para a construção de uma cultura de pacificação social. (CNJ, 2021). Como ressaltam Caroline Somesom Tauk e Clarissa Somesom Tauk, “uma mudança sincera de cultura exige que as pessoas, as sociedades empresárias e a Administração Pública adotem o compromisso de tentar resolver de forma amigável os conflitos que se originaram de relações jurídicas de que façam parte”(JOTA, 2021).

Portanto, a implementação e o fortalecimento da mediação como ferramenta para a descongestão do Judiciário têm se mostrado uma estratégia eficaz. O Conselho Nacional de Justiça, reconhecendo esse potencial, tem incentivado e regulamentado a prática da mediação nos tribunais brasileiros, inclusive por meio de plataformas online, como evidenciado pela Resolução n. 358/2020, que regulamenta a conciliação e a mediação realizadas por meio eletrônico (JOTA, 2021).

Assim, a mediação se consolida como um instrumento fundamental para a modernização e eficiência do sistema judicial brasileiro, oferecendo uma alternativa viável para a resolução de conflitos e contribuindo significativamente para a descongestão do Poder Judiciário. À medida que essa prática se fortalece e se expande, espera-se uma redução gradual do volume de processos e uma melhoria na prestação jurisdicional como um todo.

À medida que essa prática se fortalece e se expande, espera-se uma redução gradual do volume de processos e uma melhoria na prestação jurisdicional como um todo. A mediação online, em particular, oferece vantagens adicionais, como acessibilidade, baixo custo para as partes e a possibilidade de utilizar dados para prevenir conflitos futuros, contribuindo ainda mais para a descongestão do Poder Judiciário.

4.3 IMPACTOS DA MEDIAÇÃO NA EFICIÊNCIA DO SISTEMA JUDICIAL

A implementação da mediação como método alternativo de resolução de conflitos tem gerado impactos significativos na eficiência do sistema judicial brasileiro. Essa ferramenta, ao proporcionar uma abordagem mais célere e consensual para a resolução de litígios, tem contribuído de maneira expressiva para a otimização dos recursos judiciários e para a melhoria da prestação jurisdicional como um todo.

Ademais, estudos recentes conduzidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam dados expressivos sobre a eficácia da mediação no contexto jurídico nacional. Conforme apontado pela pesquisa, realizada em 2022, os tribunais que adotaram de maneira mais efetiva os métodos consensuais de resolução de conflitos apresentaram resultados superiores em termos de produtividade e celeridade processual.

Um caso emblemático é o do município de Primavera do Leste, no Mato Grosso, onde as audiências de conciliação e mediação realizadas na etapa pré-processual apresentaram resultados expressivos. Conforme dados de 2018, quando as técnicas de resolução autocompositivas são utilizadas em sessões pré-processuais, o índice de acordo alcança 77,4%. Ademais, nas sessões que empregam especificamente a técnica da mediação préprocessual, esse índice é ainda mais elevado, chegando a 85%(CNJ, 2022).

Além disso, a pesquisa evidenciou que a mediação tem um impacto positivo na taxa de congestionamento dos tribunais. Assim, os dados indicam que, nos locais onde a prática da mediação foi amplamente adotada, houve uma redução média no acúmulo de processos pendentes. Esse decréscimo é particularmente relevante em áreas como direito de família e questões cíveis de menor complexidade, nas quais a mediação tem se mostrado especialmente eficaz(CNJ, 2022).

Dessa forma, a eficácia das soluções consensuais na fase pré-processual demonstra ser uma ferramenta valiosa para a redução da sobrecarga do Judiciário. Marina Soares Vital Borges, gestora do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), ressalta que essas ferramentas têm contribuído significativamente para diminuir a sobrecarga processual e resolver conflitos de maneira mais eficiente (CNJ, 2022).

Entretanto, é importante notar que a eficácia da mediação e conciliação varia conforme o momento de sua aplicação e a natureza dos casos. Por exemplo, quando as conciliações ocorrem após o início do processo judicial, o índice de acordo é consideravelmente menor. Em Primavera do Leste, das 444 sessões de conciliação realizadas no Cejusc após o início do processo, houve acordo em apenas 11% dos casos(CNJ, 2022).

A pesquisa “Conciliação e mediação no âmbito dos processos das varas cíveis do TJPE”, apresentada por Adriano Marcos Barreto da Costa, servidor do Tribunal de Justiça de Pernambuco, revela dados que corroboram essa tendência. Entre novembro de 2018 e outubro de 2019, dos 13 mil processos cíveis submetidos à sessão prévia de conciliação, apenas 6.300 audiências foram efetivamente realizadas, com apenas 386 acordos (6% das audiências realizadas ou 2,9% das audiências designadas)(CNJ, 2022).

Esses dados evidenciam que, embora a mediação e a conciliação tenham potencial para melhorar a eficiência do sistema judicial, sua eficácia pode variar significativamente dependendo do contexto e da disposição das partes envolvidas. O estudo do TJPE mostrou que o índice de acordo entre os grandes demandados – que representam mais da metade dos processos (57%) – foi de apenas 3,4%, com algumas empresas apresentando índices ainda mais baixos(CNJ, 2022).

Portanto, para maximizar o impacto positivo da mediação na eficiência do sistema judicial, é crucial investir em estratégias que aumentem a eficácia dessas práticas. Isso inclui o incentivo à utilização de sessões pré-processuais, a intensificação dos cursos de formação em mediação, e o desenvolvimento de políticas públicas baseadas em evidências empíricas.

Em suma, enquanto a mediação demonstra potencial significativo para melhorar a eficiência do sistema judicial, especialmente quando aplicada na fase pré-processual, sua implementação eficaz requer um esforço contínuo de pesquisa, planejamento e adaptação às especificidades de cada contexto jurídico.

4.4 ESTATÍSTICAS E INDICADORES DE DESEMPENHO NO TJRJ

O artigo de  Bragança e Fpg Bragança (2019)  menciona que o TJRJ ocupou a terceira posição no ranking de conciliação dos tribunais estaduais do país, segundo o Relatório Justiça em Números de 2018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esse dado sugere um desempenho relativamente positivo do TJRJ em comparação com outros tribunais estaduais no que se refere à utilização de métodos consensuais de resolução de conflitos.

Além disso, analisando dados mais recentes, observa-se que a pandemia de COVID-19 teve um impacto significativo nas atividades de mediação do TJRJ. Conforme estatísticas apresentadas, em março de 2020, das 1.991 sessões agendadas, apenas 765 foram realizadas. Em abril do mesmo ano, logo após a suspensão das atividades, das 933 sessões agendadas, somente 45 foram efetivadas. O equilíbrio entre agendamentos e realização de sessões só começou a se restabelecer a partir de agosto de 2020 (Souza; Salles, 2022).

Ao final de 2020, o TJRJ conseguiu realizar 3.793 sessões de mediação, alcançando um índice de acordos de 30,69%. Esse dado demonstra a capacidade de adaptação do tribunal frente aos desafios impostos pela pandemia, bem como a eficácia da mediação mesmo em um contexto de crise (Souza; Salles, 2022).

Além disso, durante o período emergencial, foram realizadas 151 mediações entre empresários e credores, com a negociação de dívidas no valor de R$ 6.913.457,74. Esse dado evidencia a importância da mediação não apenas para conflitos interpessoais, mas também para questões empresariais e econômicas (Souza; Salles, 2022).

É importante ressaltar que, apesar desses dados positivos, o Relatório CNJ Justiça em Números 2021 apontou uma redução de 12,3% na demanda da população pelos serviços da justiça e das concessões de assistência judiciária gratuita durante a pandemia. Isso indica que, embora a mediação tenha se mostrado uma ferramenta eficaz, o acesso à justiça como um todo foi impactado negativamente nesse período (Souza; Salles, 2022).

Assim, se destaca a efetividade da mediação judicial, como método alternativo de resolução de conflitos, se mostrando uma ferramenta eficaz na promoção de soluções consensuais no âmbito do sistema jurídico brasileiro. A efetividade dessas soluções é evidenciada por diversos fatores que contribuem para a pacificação social e a satisfação das partes envolvidas.

Primeiramente, é importante ressaltar que as soluções consensuais obtidas por meio da mediação tendem a ser mais duradouras e satisfatórias para as partes. Conforme apontam Sales e Andrade (2011), isso ocorre porque as próprias partes são protagonistas na construção do acordo, o que aumenta o comprometimento com o cumprimento do que foi pactuado. Dessa forma, a mediação proporciona um ambiente propício para que os envolvidos encontrem soluções que atendam aos seus reais interesses e necessidades.

5   EFICÁCIA JURÍDICA ALCANÇADA PELA MEDIAÇÃO

5.1 SEGURANÇA JURÍDICA E CUMPRIMENTO VOLUNTÁRIO DOS ACORDOS

A mediação judicial, como método autocompositivo de resolução de conflitos, tem se destacado por proporcionar elevados níveis de segurança jurídica e cumprimento voluntário dos acordos firmados entre as partes. Esse fenômeno está intrinsecamente ligado à natureza consensual e participativa do processo de mediação.

Ademais, a segurança jurídica na mediação é reforçada pela legislação vigente. A Lei nº 13.140/2015, conhecida como Lei de Mediação, estabelece em seu artigo 2º que o procedimento de mediação será orientado, entre outros princípios, pela autonomia da vontade das partes. Essa autonomia se manifesta não apenas na decisão de participar da mediação, mas também na liberdade de construir conjuntamente as soluções para o conflito.

Dessa forma, os acordos resultantes da mediação tendem a refletir genuinamente os interesses e necessidades das partes envolvidas. Como ressalta Fernanda Tartuce, renomada especialista em mediação, “a conversação só pode ocorrer se houver concordância das partes” (TARTUCE, 2018). Essa característica fundamental da mediação contribui significativamente para a efetividade e o cumprimento voluntário dos acordos alcançados.

5.2 AUTONOMIA DA VONTADE E SATISFAÇÃO DAS PARTES ENVOLVIDAS

A autonomia da vontade das partes é um dos princípios fundamentais que norteiam o processo de mediação judicial no Brasil. Esse princípio está consagrado no artigo 166 do Código de Processo Civil, no artigo 2º, inciso V, da Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015), e na Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça. Sua aplicação efetiva tem demonstrado ser um fator crucial para a satisfação das partes envolvidas e para o sucesso do procedimento mediativo.

Ademais, a autonomia da vontade se manifesta em diversos aspectos do processo de mediação. Primeiramente, as partes têm a liberdade de optar pela participação no procedimento, podendo inclusive decidir não permanecer nele, conforme estabelece o § 2º do artigo 2º da Lei de Mediação. Essa voluntariedade é essencial para criar um ambiente propício ao diálogo e à construção conjunta de soluções.

Além disso, a autonomia se estende à definição das regras procedimentais da mediação. O § 4º do artigo 166 do Código de Processo Civil estabelece que “a mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais”. Essa flexibilidade permite que o processo seja adaptado às necessidades específicas de cada caso, aumentando assim as chances de um desfecho satisfatório para todos os envolvidos.

Portanto, a liberdade de escolha do mediador, prevista no artigo 168 do Código de Processo Civil, é outro aspecto importante da autonomia das partes. Ao permitir que os envolvidos selecionem um profissional de sua confiança, o sistema judicial brasileiro reconhece a importância do vínculo de confiança para o sucesso da mediação.

6      CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mediação judicial emerge como um instrumento fundamental para a modernização e eficiência do sistema de justiça brasileiro, oferecendo uma alternativa viável e eficaz para a resolução de conflitos. Ao longo deste estudo, foram analisados diversos aspectos que evidenciam o potencial transformador da mediação no contexto jurídico nacional.

Primeiramente, observou-se que a mediação judicial contribui significativamente para a pacificação social, promovendo uma cultura de diálogo e entendimento mútuo. Ao privilegiar a autonomia das partes e a construção conjunta de soluções, a mediação não apenas resolve conflitos específicos, mas também fortalece os laços sociais e previne futuras disputas. Ademais, a mediação demonstrou ser uma ferramenta eficaz para a descongestão do Poder Judiciário. Os dados analisados indicam que, especialmente quando aplicada na fase pré-processual, a mediação tem o potencial de reduzir significativamente o volume de processos que chegam aos tribunais. Isso não apenas alivia a sobrecarga do sistema judicial, mas também proporciona soluções mais céleres e satisfatórias para as partes envolvidas.

A eficácia jurídica dos acordos resultantes da mediação também se mostrou um ponto forte desse método. A alta taxa de cumprimento voluntário dos acordos e a segurança jurídica proporcionada pelo processo de mediação evidenciam sua capacidade de gerar soluções duradouras e efetivas.

Diante desses resultados, é imperativo que o sistema de justiça brasileiro continue a investir no fortalecimento e na expansão da mediação judicial. Para tanto, recomenda-se intensificar os programas de capacitação de mediadores, garantindo a formação de profissionais qualificados em número suficiente para atender à demanda crescente. É crucial ampliar a infraestrutura dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), assegurando que esses espaços estejam adequadamente equipados e acessíveis à população. Paralelamente, o desenvolvimento de campanhas de conscientização pública sobre os benefícios da mediação é essencial para promover uma mudança cultural em direção à resolução consensual de conflitos.

O aprimoramento dos mecanismos de coleta e análise de dados sobre a mediação judicial permitirá uma avaliação contínua de sua eficácia e a identificação de áreas de melhoria. Ademais, o incentivo à adoção de tecnologias que facilitem a realização de mediações online ampliará o acesso a esse serviço e sua eficiência.

Para o avanço do conhecimento nessa área, pesquisas futuras poderiam investigar o impacto a longo prazo da mediação na redução da litigiosidade e na promoção de uma cultura de paz. Seria valioso analisar comparativamente a eficácia da mediação em diferentes áreas do direito, identificando as especificidades de cada campo. O estudo do papel da mediação na promoção do acesso à justiça para grupos socialmente vulneráveis também se mostra relevante. Examinar a interação entre a mediação judicial e outros métodos alternativos de resolução de conflitos, como a conciliação e a arbitragem, poderia trazer descobertas importantes. Por fim, avaliar o impacto econômico da mediação no sistema de justiça, considerando a redução de custos e a otimização de recursos, seria de grande valia para a formulação de políticas públicas nessa área.

Em conclusão, a mediação judicial se apresenta como um caminho promissor para um sistema de justiça mais eficiente, humanizado e alinhado com as necessidades da sociedade contemporânea. Seu fortalecimento e expansão são essenciais para a construção de um Judiciário mais célere, eficaz e capaz de promover a verdadeira pacificação social. À medida que avançamos na implementação e aperfeiçoamento desse método, caminhamos em direção a uma justiça mais acessível, participativa e satisfatória para todos os cidadãos.

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[1] Doutorando em Direito pela FICS – Facultad Interamericana de Ciencias Sociales, Rosario – Asunción. Dr. em Educação pela FUUSA – Florida University. Mediador Judicial no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro -TJRJ –RJ. http://lattes.cnpq.br/1955889659861068  – https://orcid.org/0000-0002-9137-220X. Email: janthonius@uol.com.br