PATHOLOGICAL GAMBLING AND SELECTIVE TAXATION IN BRAZIL
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202412101905
Júlia Oliveira Freitas1
Lucas Soares de Carvalho2
Luciano Cavalcante de Souza Ferreira3
RESUMO: A Emenda Constitucional nº 132/2023, complementada pelo Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, traz mudanças significativas à tributação de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, autorizando a União a instituir o Imposto Seletivo (IS). Tradicionalmente, a seletividade tributária buscava ajustar alíquotas de acordo com a essencialidade dos produtos, favorecendo itens básicos e onerando os supérfluos, como forma de atender ao princípio da capacidade contributiva. Com a reforma, esse mecanismo assume um novo viés: aplicar alíquotas diferenciadas para desencorajar o consumo de produtos e serviços considerados prejudiciais. Este estudo examina o impacto da nova tributação seletiva, focando nas atividades de jogos de azar, como o Jogo do Tigrinho, abordando seus efeitos sobre o consumo e a saúde pública. A análise visa entender como o IS poderia se tornar uma ferramenta de combate a práticas prejudiciais, gerando receitas que poderiam ser revertidas em políticas de prevenção e tratamento, especialmente no combate à ludopatia e outros problemas sociais relacionados ao vício em jogos.
Palavras-chave: Imposto Seletivo; tributação seletiva; reforma tributária; jogos de azar; ludopatia.
ABSTRACT: Constitutional Amendment No. 132/2023, complemented by Complementary Bill No. 68/2024, brings significant changes to the taxation of goods and services harmful to health and the environment, authorizing the Union to institute the Selective Tax (IS). Traditionally, tax selectivity sought to adjust rates according to the essential nature of products, favoring basic items and burdening superfluous ones, as a way of meeting the principle of contributory capacity. With the reform, this mechanism takes on a new approach: applying different rates to discourage the consumption of products and services considered harmful. This study examines the impact of the new selective taxation, focusing on gambling activities, such as Jogo do Tigrinho, addressing its effects on consumption and public health. The analysis aims to understand how IS could become a tool to combat harmful practices, generating revenue that could be used in prevention and treatment policies, especially in the fight against gambling disorder and other social problems related to gaming addiction.
Keywords: Selective Tax; selective taxation; tax reform; gambling; gambling addiction.
INTRODUÇÃO
A popularização dos jogos de azar online no Brasil, como o conhecido Jogo do Tigrinho, tem suscitado preocupações crescentes em relação aos impactos sociais e econômicos dessas práticas na população. Esses jogos, amplamente acessíveis e divulgados, muitas vezes têm como público-alvo indivíduos em situação de vulnerabilidade, o que favorece o desenvolvimento de comportamentos compulsivos. Tais comportamentos resultam em endividamento, perda de controle financeiro e, em casos mais severos, dependência patológica. Nesse cenário, surge o debate acerca do papel do Estado na regulamentação e no controle dessas atividades, com o objetivo de mitigar os efeitos negativos para os indivíduos e para a economia pública.
Nesse contexto, a investigação reúne informações com a finalidade de responder ao seguinte problema de pesquisa: “Como a implementação do Imposto Seletivo no Brasil poderia interferir na regulamentação e no controle dos jogos de azar online, visando à redução de seus impactos sociais e econômicos?” e “O indivíduo que joga nos cassinos online possui ludopatia?”. A hipótese é a de que a tributação seletiva, ao onerar os jogos de azar online, contribui para reduzir seu consumo e, consequentemente, os efeitos prejudiciais associados, como o endividamento e a ludopatia. O estudo possui como objetivo geral analisar a aplicação do Imposto Seletivo no Brasil como instrumento de controle e mitigação dos impactos sociais e econômicos dos jogos de azar online.
Para tanto, a pesquisa está estruturada em sete capítulos. A primeira é esta introdução. A segunda aborda o conceito de jogo, cassino online e legislação brasileira referente ao jogo de azar. A terceira analisa o papel dos influencers digitais no crescimento dessa prática. A quarta investiga a possibilidade de ludopatia nos indivíduos praticantes do jogos de azar online. A quinta aborda o nexo entre ludopatia e os jogos de azar virtuais. A sexta aborda a introdução do imposto seletivo no Brasil com o advento da reforma tributária de 2024 e suas incidências. A sétima apresenta a forma atual de tributação das casas online de apostas, tanto esportivas, quanto de cassinos. A oitava e última apresenta as considerações finais.
A investigação se justifica pela relevância do tema no contexto atual, em que o crescimento das plataformas de jogos de azar online demanda maior atenção por parte do Estado para assegurar a proteção da saúde pública e do equilíbrio econômico-financeiro. Além disso, a análise da seletividade tributária no âmbito desses jogos permite contribuir para o debate sobre a eficiência das políticas tributárias no Brasil.
A pesquisa é de natureza aplicada, caracterizada por objetivos descritivos e explicativos. Quanto aos procedimentos empregados, o estudo se fundamenta em uma abordagem bibliográfica e documental, analisando a legislação pertinente, como a Emenda Constitucional nº 132/2023, e obras doutrinárias que abordam tributação seletiva e jogos de azar. A compilação de informações será conduzida de maneira qualitativa, utilizando o método dedutivo, para investigar a relação entre a tributação seletiva e seus possíveis efeitos regulatórios no mercado de jogos de azar online.
2. A EVOLUÇÃO DOS JOGOS DE AZAR NO BRASIL
A palavra “jogo” tem sua origem etimológica no latim “ludus”, que fazia referência a movimentos ágeis e dinâmicos, mas também englobava diferentes manifestações culturais, como representações teatrais, rituais de iniciação e até jogos de azar. Esses múltiplos sentidos demonstram como o conceito de “jogo” já carregava uma vasta gama de significados desde as primeiras civilizações.
Os jogos de azar, no âmbito do Direito Civil, estão inseridos na categoria dos contratos de jogo e apostas, classificados como contratos aleatórios. Segundo a explicação de Flávio Tartuce, tais contratos caracterizam-se pela impossibilidade de, ao menos uma das partes, estimar no momento da celebração se a prestação a que se obriga terá um valor correspondente à prestação assumida pela outra parte (Tartuce, Flávio, Código Civil Comentado, p. 268, Forense, 2023).
No contexto atual brasileiro, com o desenvolvimento da tecnologia e o acesso facilitado à internet, especialmente durante a pandemia de Covid-19, os cassinos online e as apostas esportivas conhecidas como “bets” se popularizaram rapidamente. Aliado a isso, a ausência de regulamentação robusta e de ferramentas tecnológicas adequadas permitiu que empresários do setor vissem o Brasil como um novo mercado promissor a ser explorado.
De acordo com Viana e Moura (2023), a pandemia trouxe um impacto diverso para setores econômicos no Brasil, reduzindo a atividade em muitos segmentos devido ao isolamento social. No entanto, as casas de apostas esportivas experimentaram crescimento significativo. Segundo pesquisa da Industry Insights, 59% dos entrevistados iniciaram a prática durante a pandemia, embora o mercado já estivesse em ascensão anteriormente. Entre 2018 e 2020, o segmento teve um aumento de R$ 2 bilhões para R$ 7 bilhões. Em termos regulatórios, esse crescimento foi amparado pela Lei 13.756/2018, que esclareceu a situação jurídica das apostas esportivas, distinguindo-as dos jogos de azar, que eram proibidos desde a década de 1940.
2.1 O QUE É O CASSINO ONLINE?
Além das apostas esportivas, outros tipos de jogos também ganharam popularidade no cenário nacional, como o “tigrinho”. Esse jogo, muito popular entre os cassinos virtuais, simula máquinas de caça-níqueis e envolve a combinação de três figuras iguais em uma linha horizontal ou vertical para garantir a vitória, uma mecânica semelhante à encontrada em cassinos físicos, como os de Las Vegas. Esse tipo de jogo, embora baseado majoritariamente na sorte, vem atraindo um público diverso, ampliando o mercado de entretenimento digital e refletindo o crescimento do setor de jogos de azar e apostas online no Brasil.
O “tigrinho” é, na verdade, um exemplo de aplicativo “whitelabel” — um modelo de software pré-estruturado, que pode ser comprado e customizado pelo operador que o adquire. Essa estrutura permite que múltiplos cassinos virtuais explorem o mesmo formato de jogo, adaptando-o às suas identidades visuais e necessidades comerciais. Esse tipo de aplicação facilita a rápida entrada de novos operadores no mercado, promovendo uma expansão ágil e a proliferação de jogos de azar no ambiente digital, refletindo o crescente interesse dos consumidores e investidores pelo setor de entretenimento online no Brasil.
Nas plataformas dos cassinos online, além do “tigrinho”, são oferecidas diversas modalidades populares, como os jogos “crash” e “mines”, que envolvem um alto grau de interatividade e atenção dos jogadores.
No caso do “crash”, o jogo geralmente exibe um foguete (ou outro gráfico similar) que sobe com o tempo e exibe um multiplicador crescente para o valor apostado. O jogador precisa decidir o momento exato para encerrar a aposta e garantir o ganho multiplicado antes do “crash”, ou seja, o ponto em que o foguete para abruptamente. Esse elemento de risco e timing confere ao jogo uma dinâmica rápida e instigante, que exige agilidade e timing.
Já o “mines” funciona como uma espécie de campo minado virtual, com um tabuleiro de 25 quadrados ou mais. O jogador abre as casas com o objetivo de evitar as que escondem bombas e acumular prêmios progressivos enquanto permanece no jogo. Se o jogador acerta uma bomba, perde a aposta, o que torna a experiência desafiadora e tensa, envolvendo sorte e estratégia.
Essas modalidades de jogos são populares devido ao seu caráter imediato e ao apelo visual, que são altamente atrativos em plataformas de cassinos online.
O “Fortune Tiger”, que ficou mais conhecido como o jogo do tigrinho no Brasil por possuir como mascote um tigre, é um jogo de apostas que funciona como um cassino online. Nos sites que divulgam o produto, ele é descrito como uma espécie de caça níquel, onde o jogador precisa fazer a combinação de três figuras iguais em três fileiras para ganhar um prêmio em dinheiro. Além disso, o “Fortune Tiger” promete um multiplicador de 10 vezes o valor da aposta em uma rodada bônus ativada de forma aleatória. (Moreira, 2024)
3. A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ACERCA DA CONCEITUAÇÃO DE “JOGOS DE AZAR”
Em outro ponto, a legislação brasileira aborda de forma explícita os jogos de azar. O artigo 50 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 (Lei das Contravenções Penais), em seu § 3º, dispõe o seguinte:
§ 3º Consideram-se, jogos de azar:
a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte;
b) as apostas sobre corrida de cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas;
c) as apostas sobre qualquer outra competição esportiva. (Brasil, 1941, n.p)
Esse dispositivo busca estabelecer parâmetros claros para o que constitui jogo de azar, incluindo atividades em que o resultado depende principalmente da sorte, e ressalta que competições esportivas, quando exploradas de forma não autorizada, também entram na definição legal de contravenção. Tal regulamentação visa proteger o interesse público, inibindo atividades não autorizadas que possam gerar danos sociais e econômicos.
Atualmente, o chamado jogo do tigrinho e outros que utilizam-se da mesma configuração acima conceituada atuam de forma ilegal, fato que culminou na publicação de uma portaria do Ministério da Fazenda, em 31/05/2024, para determinar que modalidades desse tipo, a partir de 1° de janeiro de 2025, deverão ser regularizadas, atendendo a requisitos como, por exemplo, hospedagem de seus sites com o domínio “.bet.br” e com sede empresarial no território brasileiro:
PORTARIA SPA/MF Nº 1.207, DE 29 DE JULHO DE 2024
Estabelece os requisitos técnicos dos jogos on-line e dos estúdios de jogos ao vivo a serem observados por agentes operadores de loteria de apostas de quota fixa, de que tratam o art. 29 da Lei nº 13.756, de 12 de dezembro de 2018, e a Lei nº 14.790, de 29 de dezembro de 2023, e altera a Portaria SPA/MF nº 615, de 16 de abril de 2024.
(…)
Art. 2º Para os fins desta Portaria, considera-se:
I – sistema de apostas: sistema informatizado gerido e disponibilizado pelos agentes operadores de apostas que possibilita o cadastro dos apostadores, o gerenciamento de suas carteiras virtuais e outras funcionalidades necessárias para gerenciamento, operação e comercialização das apostas de quota fixa;
II – jogo on-line: canal eletrônico que viabiliza a aposta virtual em jogo no qual o resultado é determinado pelo desfecho de evento futuro aleatório, a partir de um gerador randômico de números, de símbolos, de figuras ou de objetos definido no sistema de regras.
A conceituação oferecida pela portaria esclarece a ilegalidade de muitas plataformas de apostas, com destaque para os populares caça-níqueis que operam em ambiente virtual, incluindo o Jogo do Tigrinho e suas múltiplas modalidades e sites na internet. Essa regulamentação enfatiza que, embora esses jogos possam parecer inofensivos, quando explorados sem a devida autorização legal, eles infringem normas de ordem pública e expõem jogadores a riscos financeiros e sociais. Dessa forma, a portaria tem o papel de reforçar a necessidade de uma regulamentação mais rígida sobre jogos de azar virtuais, buscando proteger o usuário e conter práticas consideradas prejudiciais e ilegais.
Ainda assim, observa-se uma lacuna na atuação do Estado como regulador dessa atividade. De um lado, as chamadas “bets” – apostas esportivas, distintas do jogo do tigrinho – vêm recebendo mais atenção do Congresso Nacional. Por outro lado, os casinos online continuam a proliferar sem uma regulação efetiva. Embora estejam cobertos por uma legislação antiga que os define como contravenção penal, essa previsão limitada tem se mostrado insuficiente para conter a expansão dessas plataformas, que operam à margem da fiscalização estatal e sem um enquadramento atualizado no ordenamento jurídico.
Sob esse raciocínio, as casas de apostas online, que tem como jogo principal as apostas esportivas, principalmente o futebol, receberam mais atenção do legislativo, fato que pode ser comprovado por uma publicação da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República:
“Desde 2018, as apostas de quota fixa de eventos esportivos são legalizadas por meio da Lei 13.756/2018. Esta legislação determinou a necessidade de regulamentação da atividade num prazo de dois anos prorrogáveis por igual período. A previsão acabou relegada pela gestão anterior, e somente a atual administração federal começou o trabalho de regulamentar as apostas do país.
Em 2023, a Presidência da República enviou uma Medida Provisória ao Congresso Nacional para aprimorar a Lei de 2018. Juntamente com outro projeto de lei que já estava em tramitação, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal incluíram entre as apostas de quota fixa legalizadas no Brasil, os chamados jogos on-line. Foi sancionada então a Lei 14.790/2023.
A partir da lei de 2023, o Ministério da Fazenda recebeu a competência de regular o setor de apostas de quota fixa e criou, em 2024, a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA-MF). Sua prioridade é fazer o setor atuar de forma regulada e controlada. Neste mesmo ano, foram publicadas mais de dez portarias com todas as regras relacionadas às apostas de quota fixa. Essas portarias trazem segurança para empresas de apostas e jogadores.
A política de combate à lavagem de dinheiro, por exemplo, determina que jogadores sejam identificados por documentos e sistema de reconhecimento facial com prova de vida. O apostador também deve cadastrar uma conta bancária ou de pagamento em seu nome, que será a origem e o destino de todos os recursos que enviar ou receber da empresa de apostas, que fica proibida de receber depósitos originários de contas bancárias que não sejam cadastradas. Também é proibida a realização de depósitos ou pagamento de prêmios por meio de dinheiro em espécie ou boleto.”
(GRIFO NOSSO)
Publicado em 30/09/2024 20h54
(…)
No entanto, a regulamentação de jogos de azar ainda enfrenta desafios, especialmente em relação à fiscalização e à necessidade de atualizar a legislação existente. Enquanto o Ministério da Fazenda implementa medidas para monitorar e controlar o setor, diversas plataformas online que operam de forma ilegal ou semi-regulamentada permanecem fora do alcance das autoridades, explorando brechas e limitações no aparato jurídico. Esse cenário evidencia a importância de uma política regulatória mais abrangente e de uma fiscalização robusta que consiga alcançar as atividades realizadas no meio digital, onde a falta de controle pode acarretar graves prejuízos financeiros e sociais para os jogadores e para a sociedade como um todo.
4. OS “INFLUENCERS” DIGITAIS DOS CASINOS ONLINE
Nessa perspectiva, a grande notoriedade do “Fortune Tiger” no Brasil – plataforma “mãe” do chamado jogo do tigrinho – se deu devido a ampla divulgação que envolveu diversos influenciadores digitais e jogadores, que compartilham suas “estratégias” para obterem sucesso em seus ganhos. Diante dessa ampla divulgação, o jogo ganhou mais e mais jogadores com o passar do tempo, fato que resultou em diversos problemas relacionados ao vício em jogo.
Outro evento resultante da escalabilidade dessa modalidade de jogo é que, diversas pessoas que frequentemente publicam links para jogos de apostas em suas redes sociais foram alvo de grandes operações policiais. Essas operações foram motivadas pela crescente inquietação do poder público em relação à propagação dos jogos virtuais, em particular aqueles que funcionam sem regulamentação adequada e que, em várias ocasiões, podem estar ligadas a atividades ilegais.
Durante algumas apurações policiais, notou-se que diversos influenciadores digitais com ampla visibilidade em suas redes sociais faziam parte de esquemas de lavagem de dinheiro, pelo que foram intimados para dar esclarecimentos sobre os fatos e explicar sua participação na promoção de links que levavam os usuários a determinados jogos. A suspeita recai sobre a possibilidade de que essas postagens estivessem associadas a atividades ilícitas.
Em determinadas situações, a circunstância piorou, e alguns foram detidos. A acusação central era relacionada a indícios de delitos financeiros, como crimes contra a ordem tributária, o que intensificou as preocupações acerca da utilização das redes sociais para facilitar atividades ilícitas e os efeitos disso na sociedade. A ligação entre esses crimes e a divulgação de jogos de azar sem controle evidenciou a urgência de uma ação mais contundente por parte das autoridades públicas.
A mania de jogos de azar no Brasil, especialmente relacionada ao Jogo do Tigrinho, trouxe à baila diversas questões problemáticas, principalmente no campo econômico-financeiro, psicológico e médico, não só dos que jogam, mas dos que estão mais próximos, como familiares e amigos.
5. A LUDOPATIA E O JOGO DO TIGRINHO
A ludopatia representa um vício por jogos, agindo com o mesmo mecanismo no cérebro que o vício por álcool e drogas. Este comportamento é prejudicial e perigoso, haja vista que consiste no impulso e na vontade de apostar e jogar de forma descontrolada e irresponsável.
O termo “ludopatia” tem suas raízes etimológicas no Latim: a primeira parte, ludo, deriva de ludus, que significa “jogo”, “divertimento” ou “recreação”. Já a segunda parte, patia, vem de pathe, que se refere a um “estado passivo”, “sofrimento”, “doença” ou “aflição”. Este conceito, conforme a Enciclopédia da Conscienciologia (2023), surgiu no âmbito da Linguagem Científica Internacional durante o século XIX, refletindo a preocupação com os impactos psicológicos e patológicos que o envolvimento compulsivo com jogos pode causar.
Ludopatia trata-se da doença do jogo. O chamado ludopata é alguém que não consegue ficar longe da jogatina, ainda que isso cause o seu prejuízo financeiro, falência nas relações familiares e distanciamento de todas as pessoas do seu convívio social. O agente faz de tudo para estar numa mesa de jogo, passando a reviver as jogadas passadas, o que poderia ter feito, o que deve fazer nas próximas vezes que for jogar, ou seja, passa a viver em função do jogo. É comum que o detentor desse transtorno passe a buscar auxílio financeiro com seus familiares para continuar satisfazendo o seu vício, ainda que isso leva à sua ruína. Quando ele não consegue mais ter apoio financeiro, passa a praticar crimes com o intuito de obter dinheiro e poder estar de novo numa mesa de jogo, que é aquilo que lhe causa excitação e prazer. Na ludopatia, o agente não tem como prioridade obter ganhos financeiros, mas sim estar diuturnamente jogando e satisfazendo a sua vontade de jogar. (Gonzaga, 2023)
O jogo do tigrinho, assim como muitos outros jogos de azar, envolvem os elementos de recompensa. O fator emoção de ganhar pode gerar vício, especialmente se essas vitórias forem frequentes, que geram um ciclo repetitivo podendo levar à ludopatia.
Muitos dos jogadores frequentes acreditam que possuem habilidade ou estratégia, que lhes proporcionam uma certa vantagem, e isso pode levar a uma participação contínua no jogo, mesmo quando as derrotas começam a se acumular e gerar prejuízos financeiros e psicológicos.
A acessibilidade às plataformas é um dos principais fatores que contribuem para desenvolver a doença, haja vista que houve um aumento nas criações de novos recursos para acessá-las, sendo o “jogo do tigrinho” e jogos similares, facilmente disponíveis a qualquer tempo e à qualquer pessoa, o que pode encorajar o jogo frequente.
Outro ponto importante é o “reforço positivo”que configura no design de muitos jogos que são criados para oferecer recompensas frequentemente, mesmo que mínimas, criando um ciclo de gratificação, levando os jogadores a quererem jogar e apostar cada vez mais. Todos estes fatores se envolvem com aspectos emocionais dos apostadores, pois os utilizam como uma forma de escapismo, onde os indivíduos buscam aliviar seus estresses e problemas emocionais, podendo ser muito perigoso e transformar-se em uma compulsão.
O hábito de jogar compulsivamente traz não apenas consequências psicológicas, mas também sociais e principalmente financeiras, que afetam não somente o jogador, mas também as pessoas que o rodeiam. O vício em jogos de azar é classificado pelos CID-10-Z72.6 (mania de jogos e apostas) e CID-10-F63.0 (jogo patológico). O jogo patológico é uma condição neurológica referente ao vício em jogos, e é dado justamente pelo comportamento persistente do apostador.
5.1 A SAÚDE FINANCEIRA DO JOGADOR ONLINE
A ludopatia, também conhecida como transtorno do jogo compulsivo, compromete gravemente a saúde mental ao induzir sentimentos de ansiedade, depressão e culpa nos indivíduos afetados. A compulsão por jogos, alimentada por mecanismos de recompensa e estímulo, leva à perda do controle sobre o comportamento, resultando em isolamento social e dificuldades nas relações pessoais. Em casos extremos, a dependência pode desencadear pensamentos suicidas, destacando a necessidade de intervenção psicológica e estratégias preventivas para mitigar tais impactos.
No aspecto financeiro, as consequências são igualmente devastadoras, uma vez que o jogador compulsivo frequentemente compromete recursos essenciais para sustentar o vício. Dívidas crescentes, perda de bens e a incapacidade de gerenciar finanças pessoais tornam-se uma realidade comum para esses indivíduos. Além disso, o endividamento pode gerar reflexos negativos na estrutura familiar, contribuindo para o agravamento de conflitos domésticos e prejudicando o bem-estar geral de todos os envolvidos. Essas dimensões enfatizam a urgência de políticas públicas que abordem a ludopatia de forma holística, integrando suporte psicológico e educação financeira:
A ludopatia é uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 1980, tendo se agravado nos últimos anos como resultado da popularização das plataformas online de apostas. Ela seria o terceiro vício mais frequente entre os brasileiros, ficando atrás apenas do álcool e do tabagismo. Estimativas apontam que a ludopatia atinge entre 1 e 1,3% da população brasileira, ou seja, entre 2,14 e 2,78 milhões de brasileiros. O número de pessoas prejudicadas pela compulsão em apostas aumenta enormemente ao considerarmos que o vício não afeta só o dependente, pois prejudica todos à sua volta, especialmente sua família. (SENADO FEDERAL, 2023).
Embora o jogo, em si, possa ser uma atividade agradável e amplamente aceita socialmente quando feito de maneira moderada, a ludopatia se manifesta quando essa prática se torna descontrolada, impactando a rotina e o bem-estar do indivíduo, que acaba se tornando um jogador compulsivo.
Pessoas afetadas pelo jogo patológico frequentemente enfrentam dificuldades em controlar o tempo e o dinheiro dedicados ao jogo. Elas podem sentir uma necessidade crescente de apostar quantias maiores para alcançar a mesma sensação de excitação, um fenômeno conhecido como tolerância. Além disso, é comum que essas pessoas joguem para aliviar sentimentos de desconforto ou para escapar de problemas pessoais
Em suma, pode-se dizer que os jogos online são bem mais perigosos e nocivos aos seus admiradores do que os presenciais, pois estão 24 horas disponíveis ao acesso, dando uma falsa sensação de controle e domínio ao jogador.
O leque de opções das plataformas e a crescente divulgação por parte de influenciadores digitais que prometem ganhos altíssimos e enriquecimento milagroso, atraem os olhos principalmente da classe média e de baixa renda, o que torna ainda mais preocupante, pois na maioria das vezes, depositam grandes quantidades de dinheiro, e que muitas delas, precisam para pagar suas contas e garantir seu sustento.
A falta de controle estatal das empresas de aposta online vem potencialização a manipulação de resultados, tornando evidente a importância de uma fiscalização mais assídua e eficiente no âmbito dessa modalidade, tanto para a prevenção de atos ilícitos, como para eximir qualquer conduta ilegal nos âmbitos esportivos. Importante destacar que os jogos de azar são uma porta de entrada para crimes como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, entre outros.
Portanto, pode-se dizer que a facilidade apresentada pelos jogos de azar pode gerar esse descontrole, sem que se possa medir os riscos e as chances de dependência.
Diante desse cenário, destaca-se o impacto do Jogo do Tigrinho, uma modalidade que tem causado sérios prejuízos à vida de muitos brasileiros. Seus efeitos vão desde a perda de bens até o superendividamento, levando à negativação do CPF em órgãos de proteção ao crédito. Assim, a questão central deste trabalho é: essa forma de jogo online pode ser considerada uma manifestação de ludopatia? A resposta que se busca fundamentar aqui é sim.
Jogar “Tigrinho” ou participar de outras plataformas semelhantes pode, de fato, configurar-se como ludopatia, especialmente quando os comportamentos associados ao jogo se tornam compulsivos e resultam em consequências negativas para o indivíduo. A ludopatia, ou dependência de jogos de azar, é caracterizada pela perda de controle sobre o comportamento de jogo, levando o indivíduo a apostar de maneira constante e crescente, apesar dos prejuízos financeiros, sociais e psicológicos.
Quando esses padrões de comportamento são observados, torna-se evidente que o jogo deixa de ser uma atividade recreativa e passa a ser uma prática prejudicial, comprometendo a qualidade de vida do jogador. As plataformas de jogos online, como o “Tigrinho”, ao estimularem esse tipo de comportamento, acabam contribuindo para o agravamento da ludopatia, especialmente quando não há regulamentação e acompanhamento adequado da atividade. Assim, é fundamental compreender a natureza compulsiva desses jogos e os impactos que podem gerar na saúde mental e financeira dos indivíduos envolvidos.
A ludopatia, explicada anteriormente, que é a mania de jogos e apostas e o jogo patológico, se encaixa perfeitamente nas descrições e características encontradas naqueles que jogam no jogo do Tigrinho. Além de sintomas, como não conseguir parar de jogar, vender bens, pedir dinheiro emprestado com parentes, furtar ou roubar para manter o vício, os efeitos devastadores dessa prática também podem ser vislumbrados na vida do indivíduo, psicologicamente, socialmente e financeiramente.
Sendo assim, é fundamental que estes jogadores estejam cientes dos riscos, e busquem ajuda psicológica caso percebam que esse hábito esteja afetando suas vidas de maneira prejudicial.
6. A TRIBUTAÇÃO DAS OPERAÇÕES NOCIVAS À SAÚDE
De acordo com o artigo 153, inciso VIII, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 132/2023, a União poderá instituir o imposto seletivo (IS) sobre a “produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços que sejam prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, conforme regulamentação por lei complementar” (Vasconcelos, 2024).
O princípio da seletividade tributária possui, atualmente, um objetivo: atender ao interesse do consumidor final, tendo como principal foco a natureza do produto. A seletividade contida no ordenamento jurídico como a conhecemos é a redução ou majoração da alíquota do tributo a fim de alinhar-se com a importância de um produto para a vida do brasileiro. A seletividade, nesse passo, nada mais é do que uma tributação proporcional em função da essencialidade do produto. Significa dizer que, quanto mais essencial for o produto, seja ele abarcado pelo ICMS ou pelo IPI, menor será a tributação que incidirá sobre ele.
Pode-se dizer, na realidade, que a seletividade nasce de outro princípio, o da capacidade contributiva. Este visa identificar qual a capacidade do contribuinte. Para tanto, leva-se em consideração a renda, o patrimônio e o consumo, este último ponto sendo o ponto mais importante para a nossa discussão em questão. A nível de exemplo da seletividade pela legislação tributária, pode-se perceber uma alíquota menor para produtos que integram a cesta básica.
Atualmente, os alimentos classificados como essenciais, integrantes da cesta básica, são beneficiados com uma tributação reduzida. No nível federal, observa-se, por exemplo, que o PIS e a Cofins têm suas alíquotas zeradas tanto nas importações quanto nas vendas internas de itens como leite, farinha de trigo, café, açúcar, diversos tipos de carne (conforme o art. 1º da Lei nº 10.925/04), além de hortaliças, frutas e ovos (conforme os arts. 8º, § 12, inciso X, e 28, inciso III, da Lei 10.865/04; e a Lei 10.925/04), entre outros produtos (Fiorentino, 2024).
Nessa direção, com o advento do PLP 68/2024, será, muito provavelmente, instituído um outro sentido para a seletividade tributária, qual seja, a de desestimular o consumo de produtos supérfluos que prejudiquem a saúde do indivíduo ou o meio ambiente, com atenção a prejudicialidade.
Se antes o intuito era apenas de direcionar uma alíquota maior em função da essencialidade como o ICMS e IPI já fazem com o cigarro e cerveja, com a nova reforma tributária de 2024, o princípio da seletividade passa a ter outro viés: o de desestimular agentes prejudiciais e nocivos à vida do brasileiro.
Em outros termos, a seletividade atual trata apenas do quanto um produto é ou não essencial, ligado diretamente à superficialidade, ao passo que o IS terá incidência sobre a nocividade.
Conforme explica Vasconcelos (2024) o Imposto Seletivo (IS) será plenamente cobrado a partir de 2027. No entanto, o ICMS, com suas alíquotas seletivas majoradas, começará a ser substituído apenas em 2029, com a transição concluída em 2032. Além disso, o IPI, apesar de ter suas alíquotas reduzidas de forma geral em 2027, continuará sendo aplicado nas operações envolvendo bens que competem com a Zona Franca de Manaus (ZFM).
Isto posto, o Imposto Seletivo terá ligação direta com comportamentos consumeristas deletérios a sua própria saúde, o que poderá, por certo, levar a diminuição de compra ou uso de certo produto.
A seletividade no Direito Tributário, entendida como a aplicação diferenciada de tributos em função da essencialidade ou nocividade de determinados bens e serviços, pode desempenhar um papel crucial no combate aos vícios associados aos jogos de azar, como o Jogo do Tigrinho. Esse princípio se manifesta em dois aspectos principais: a essencialidade, que favorece a tributação reduzida de bens necessários à sobrevivência e ao bem-estar social, e a nocividade, que busca onerar com tributos mais elevados atividades ou produtos prejudiciais à saúde pública ou à ordem social.
No contexto do Jogo do Tigrinho e de outras plataformas semelhantes, a seletividade pode ser utilizada para impor alíquotas mais altas aos cassinos online e aos prêmios atribuídos, com o objetivo de desencorajar o consumo excessivo e mitigar os impactos negativos dessa prática. Isso se justifica pela classificação dos jogos de azar como atividades nocivas, que podem levar ao superendividamento, dependência e outros problemas sociais e psicológicos.
Ao estabelecer alíquotas mais elevadas sobre os cassinos virtuais e os ganhos obtidos nessas plataformas, o Estado não apenas exerce uma função de desincentivo, mas também cria uma fonte de recursos que pode ser direcionada para programas de prevenção e tratamento da ludopatia. Além disso, essa política tributária seletiva pode promover um ambiente mais seguro para o consumidor, ao regulamentar a atividade de forma a reduzir os danos causados pela falta de controle sobre os jogos online.
Portanto, a seletividade, quando aplicada de maneira estratégica e focada na nocividade dos jogos, pode se tornar uma ferramenta eficiente no combate ao vício em jogos, protegendo a saúde pública e incentivando a responsabilidade fiscal e social dos operadores de jogos online.
7. A TRIBUTAÇÃO DAS CASAS DE APOSTAS ONLINE NO BRASIL
Atualmente, as modalidades de apostas como os jogos de azar e apostas esportivas como as BETS estão sendo reguladas pela Lei 14.790/23 sancionada em dezembro de 2023, que tributa as empresas operadoras da modalidade que estiverem operando em território nacional.
Existem três reformas na legislação que irão impactar diretamente este setor, como a reforma regulatória dos sistemas de apostas, que autorizam o mercado das apostas de cota fixa no Brasil, a reforma tributária do setor, e a reforma constitucional ampla da tributação de consumo (IBS e CBS) com regras aplicáveis às apostas online no país.
Conforme artigo do Uol publicado em 2024, para as empresas de apostas ou as operadoras, a taxa aplicada será de 12% sobre a receita bruta, onde do total arrecadado pelas apostas, 88% é destinado ao operador do serviço, 2% destinado à seguridade social e mais 10% destinado a fins diversos como educação, segurança social, turismo etc.
Outro tributo incidente sobre o lucro auferido pelo operador diz respeito à tributação de renda, sendo 25% de IRPJ ( imposto de renda pessoa jurídica) e mais 9% de CSLL (contribuição social sobre o lucro líquido), totalizando 34% de de tributação sobre o lucro das empresas que serão residentes no Brasil.
Já para o apostador ou pessoa física, a taxa será de 15% sobre o prêmio líquido da pessoa, sendo o prêmio líquido o resultado positivo obtido a cada ano. Estarão isentos os prêmios de até R$2.100 reais, que seria o primeiro nível da tabela progressiva do IRPF, ficando desobrigados os apostadores de pagar imposto.
Sendo assim, verifica-se que a tributação atual referente às casas de apostas online no Brasil não é seletiva, sendo apenas uma tributação comum.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O progresso no sistema tributário do Brasil e suas reformas de 2024 geraram discussões fundamentais sobre o papel dos impostos como ferramenta de regulação social. Neste contexto, o imposto seletivo (IS) surgiu como uma inovação, mas o seu âmbito de aplicação limita-se a bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, ignorando atividades como o jogo online. Este trabalho apresenta perspectivas críticas e propositivas sugerindo que o IS pode ser uma ferramenta eficaz na mitigação dos impactos negativos do jogo na saúde mental familiar, no bem-estar social e na estabilidade financeira.
As apostas, enquanto atividade reconhecidamente nociva, compartilham características de outros produtos já contemplados pelo princípio da seletividade, como bebidas alcoólicas e cigarros. Assim como esses itens, os jogos de azar podem gerar dependência, transtornos psicológicos, superendividamento e colapsos familiares, agravando problemas sociais e econômicos. No entanto, a ausência de uma tributação seletiva para esse setor evidencia uma lacuna regulatória que pode comprometer os objetivos de justiça fiscal e proteção social.
Por meio do presente estudo, foi demonstrado que a aplicação do IS às casas de apostas online poderia não apenas desestimular comportamentos de risco, mas também viabilizar a criação de recursos para programas de conscientização, prevenção e tratamento de transtornos relacionados à ludopatia. Além disso, essa medida tributária poderia incentivar práticas mais responsáveis por parte das operadoras, garantindo maior segurança para os consumidores e mitigando os impactos negativos dessa atividade sobre a sociedade.
A inclusão das apostas online no escopo do Imposto Seletivo, portanto, é uma proposta coerente com os objetivos da reforma tributária e com o princípio da seletividade em sua dimensão de nocividade. Trata-se de uma medida que transcende o caráter arrecadatório, promovendo um sistema tributário mais justo e alinhado às necessidades da sociedade contemporânea.
Em síntese, este trabalho reafirma que o uso estratégico da tributação, como no caso do IS, pode transformar a política fiscal em um poderoso aliado no combate às externalidades negativas associadas às apostas. Essa abordagem não apenas reforça o papel regulatório do Estado, mas também promove o desenvolvimento social sustentável, protegendo os indivíduos e as famílias dos efeitos deletérios dessa prática.
A proposta de incluir as apostas online no âmbito do Imposto Seletivo não se resume apenas a uma questão técnica ou econômica, mas reflete uma preocupação genuína com os danos sociais que essas práticas podem causar. O que está em jogo não é só a arrecadação, mas a responsabilidade do Estado em proteger seus cidadãos dos efeitos prejudiciais de atividades que geram vícios, endividamento e uma série de consequências negativas para a saúde mental e a estrutura familiar. Assim como o álcool e o tabaco, as apostas online devem ser vistas como uma atividade potencialmente destrutiva, e sua tributação seletiva surge como uma medida de prevenção e controle.
Ao propor essa inclusão, reconhecemos que a tributação pode ser um instrumento de mudança, capaz de gerar não apenas recursos, mas também conscientização. Pensar em como o Estado pode atuar de forma preventiva é essencial para garantir que as futuras gerações não carreguem o peso das escolhas destrutivas feitas no presente. Ao direcionar os recursos arrecadados para programas de apoio e tratamento para a ludopatia, o Estado pode não só corrigir uma distorção no sistema tributário, mas também oferecer aos cidadãos a chance de reverter os danos causados por esses vícios, algo que é de suma importância para a construção de uma sociedade mais saudável e equilibrada.
É certo que a reforma tributária de 2024 abre portas para novas formas de regulação e ação fiscal, mas também nos desafia a refletir sobre o que queremos para o futuro. Este estudo busca não só analisar um problema, mas também sugerir soluções que tragam benefícios reais e tangíveis à sociedade. Com isso, fica claro que a tributação seletiva não é apenas uma medida fiscal, mas um ato de responsabilidade social que visa a melhoria da qualidade de vida e a redução das desigualdades geradas pelas externalidades negativas das apostas. A verdadeira eficácia de um sistema tributário está em sua capacidade de proteger, educar e promover a justiça social, princípios que este trabalho procura destacar.
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1 Bacharelanda em Direito do Centro Universitário do Estado do Pará – CESUPA. E-mai: julia20060178@aluno.cesupa.br
2 Bacharelando em Direito do Centro Universitário do Estado do Pará – CESUPA. E-mai: lucas21060214@aluno.cesupa.br
3 Orientador. Mestre em Direito, Políticas Públicas e Desenvolvimento Regional (Centro Universitário do Estado do Pará – CESUPA). E-mail: luciano.ferreira@prof.cesupa.br