A LEI MARIA DA PENHA E OS DESAFIOS POLICIAIS NA PROTEÇÃO DA MULHER

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202408041733


Eleandro Herdman;
Tiago Teixeira;
Orientadora: Paloma Rodrigues.


RESUMO

A violência contra mulher não é algo novo, mas enraizada no sistema histórico-cultural de subordinação feminina, sendo sua proteção abordada de forma detalhada na Lei Maria da Penha. Esta lei surge para proteger também as vítimas de violência doméstica, foco deste artigo, sejam vítimas de violência psicológica, física, patrimonial e moral. Assim, este artigo busca evidenciar a importância e os impactos da atividade policial na proteção da mulher, destacando a Patrulha Maria da Penha, a qual é uma patrulha policial criada para acompanhar as vítimas, suas medidas protetivas e acompanhamentos necessários após denúncia. Com isso, o artigo destaca a importância da denúncia como dever de todas as pessoas, além de demonstrar as dificuldades da polícia na efetivação das medidas protetivas e a insensibilidade das abordagens, destacando a importância do envolvimento comunitário. A morosidade do judiciário deixando as punições prescreverem trazem insegurança as mulheres que evitam as denúncias, a partir disso as pesquisas mostram o aumento do número de feminicídios, devendo ser criadas mais políticas as campanhas de incentivo às denúncias. Para tanto, a metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica secundária de artigos e livros acadêmicos.

Palavras chaves: Violência doméstica; Atividade policial; Maria da Penha; Desafio policial;

ABSTRACT

Violence against women is not something new, but rooted in the historical-cultural system of female subordination, with its protection addressed in detail in the Maria da Penha Law. This law was created to also protect victims of domestic violence, the focus of this article, whether they are victims of psychological, physical, property or moral violence. Thus, this article seeks to highlight the importance and impacts of police activity in protecting women, highlighting the Maria da Penha Patrol, which is a police patrol created to monitor victims, their protective measures and necessary follow-up after a complaint. With this, the article highlights the importance of reporting as a duty of all people, in addition to demonstrating the difficulties faced by the police in implementing protective measures and the insensitivity of approaches, highlighting the importance of community involvement. The slowness of the judiciary allowing punishments to expire brings insecurity to women who avoid reporting. As a result, research shows an increase in the number of femicides, and more policies should be created for campaigns to encourage reporting. To this end, the methodology used was secondary bibliographic research of academic articles and books.

Keywords: Domestic violence; Police activity; Maria da penha; Police challenge;

1. Introdução

A violência faz parte de um sistema histórico-cultural que semeou a soberania masculina condicionando as mulheres a uma posição hierarquicamente inferior e a uma imagem de fragilidade. Posto isto, é neste âmbito que a violência doméstica contra a mulher surge com mais força, entre companheiros, ex-companheiros e parentes, podendo essa violência ser apresentada de maneira física, psicológica, patrimonial e moral.

Diante desse contexto, e em meios a altos índices de violência contra a mulher surge em 2006 a lei 11.340, denominada Lei Maria da Penha, com a promessa de resguardar e proteger as mulheres vítimas da violência.

A Lei Maria da Penha provoca uma boa impressão na sociedade, uma vez que se trata de legislação que expressa de forma detalhada e específica os crimes contra a mulher em meio a violência doméstica e familiar, assunto que fora bastante explorado, discutido e estudado na pandemia, onde os índices subiram estrondosamente. A lei colocou em pauta várias questões de suma importância, como a cultura da subordinação e o machismo enraizado na sociedade brasileira, trouxe classificações e temáticas que nos aprofundaremos neste artigo.

É sabido que a Lei Maria da Penha contempla também casos de violências contra as mulheres no âmbito doméstico, no entanto, é importante evidenciar a quem vale tal lei, uma vez que a desinformação acerca do assunto faz-se presente no Brasil em considerável quantidade.

Primeiramente, definiremos e classificaremos a violência doméstica com base no que traz a lei e a doutrina.  Onde destaca-se a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. A violência doméstica teve crescimento exponencial após a pandemia pelo confinamento com seus agressores, em consequência houve grande diminuição nas denúncias, o que não refletia a realidade. Com isso, a ONU chegou a recomendar que os países investissem em meios de denúncias online, com atenção ao papel da polícia. Atualmente, este número segue em crescimento, mesmo anos após a pandemia.

Para entender suas nuances, primeiramente, abordaremos a Lei Maria da Penha e os impactos da atuação policial, seguindo para os desafios enfrentados pela polícia, finalizando com as perspectivas futuras e algumas recomendações para a efetividade da lei.

2. A Lei Maria da Penha e os Impactos da Atuação Policial

No andar histórico a mulher vem tendo uma figura frágil em relação à figura do homem na sociedade, sendo alvo de várias contradições e conflitos em relação ao homem. A mulher sempre viveu à margem da sociedade e da história, apesar de ter sido e é até os dias atuais um forte sustentáculo no protagonismo social. Desde sempre a mulher foi vista como ser inferior, submisso, indiferente, sem poder de decisão. Especialmente nos longos primeiros séculos, não havia respeito à sua dignidade, aos seus direitos, às suas opiniões e ideias.

Interferindo, assim, na efetividade de direitos, sendo a aplicação das legislações vigentes um dos maiores desafios do Estado, ou seja, a efetividade das leis na prática, principalmente, ao que se refere às garantias de segurança pública quanto aos enfrentamentos de direitos humanos por esta figura que a sociedade imputou a mulher. (SANTOS, 2022)

Com a evolução da sociedade viu-se como essencial renovar estes pensamentos, a par desses conhecimentos, e, pensando em dar mais visibilidade a essas mulheres, trazendo-as à história, começaram a eclodir movimentos feministas, desde a década de 60, que visavam romper com a ausência e o silêncio daquelas no seio social, cessando com a visão androcêntrica. (CARDOSO, 2018)

Com isso, a Lei Maria da Penha entrou em vigor em 2006, ela foi a primeira lei que visou a punição, proteção e prevenção à violência doméstica à mulher. Assim:

A lei surgiu tanto como uma resposta tardia à articulação de diferentes demandas de organizações de defesa dos direitos das mulheres – que havia mais de três décadas reivindicavam medidas mais austeras a violências cometidas em relações de afetividade e proximidade – quanto como uma tentativa do Estado brasileiro de se adequar a convenções e tratados internacionais dos quais é signatário, ampliando o acesso à justiça para suas cidadãs. ( LINS, 2021)

Nesta lei, em seu artigo 7º, a violência é classificada entre psicológica, física, moral, patrimonial e sexual:

A violência psicológica corresponde a qualquer ação que cause um dano, uma lesão emocional na mulher, que diminua a sua autoestima. A física, por sua vez, ofende a saúde ou mesmo a sua integridade corporal, enquanto que, a sexual acontece pelo constrangimento a uma relação sexual não desejada, a comercialização ou utilização de sua própria sexualidade ou restringindo o exercício de seu direito sexual/produtivo. A patrimonial ocorre com a contenção, subtração ou destruição dos seus pertences e valores, ao passo que a moral se refere à conduta que caracterize calúnia, difamação ou injúria (crimes contra a honra). (CARDOSO, 2018)

Antes desta lei, na década de 1980 houve a criação das delegacias da mulher que visavam esta proteção, as DDMs tem como objetivo institucional atuar como dispositivo da Polícia Civil na ampliação do acesso à justiça. (LINS, 2021) Com isso:

Na prática, as DMs foram adquirindo para si a competência de lidar com a violência no âmbito doméstico, e tornaram-se a principal política do Estado para prevenção e punição da violência conjugal, Nota-se que as DDMs surgiram como instituição especializada em lidar com a violência conjugal e familiar contra a mulher anteriormente à elaboração de uma norma jurídica responsável por tipificar tais delitos, e como consequência, em suas primeiras décadas de funcionamento, as ocorrências eram classificadas com base nas representações sociais das profissionais responsáveis pelo registro das ocorrências – delegadas e escrivãs. (LINS, 2021)

Desse modo, a atividade policial teve grande importância nas medidas de proteção da mulher, sua assistência e na investigação criminal. O que ainda ocorre em relação à sociedade é que a polícia ainda é vista como repressão e associação a corrupção, ponto que será destacado mais a frente no tópico dos desafios enfrentados pela polícia.

Com o mesmo intuito de proteção e efetividade a Lei Maria da Penha surge a Patrulha Maria da  Penha, em 2012, criada pela polícia militar como um programa de pleno atendimento ás vítimas de violência doméstica, com policiais militares capacitados especificamente para essa finalidade, ou seja, com treinamentos específicos ao atendimento das vítimas, lidando com as situações de agressões de forma mais efetiva. (GERHARD, 2014)

A Patrulha está vinculada ao Comando de Segurança Comunitária (CSC), um dos grandes comandos da Polícia Militar, que versa sobre as questões comunitárias no Estado, abrangendo ainda a Ronda Escolar e o Programa 43 Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD). (CARDOSO, 2018)

Atualmente, entende-se que o trabalho comunitário é ligado ao trabalho policial e primordial nos impactos da atividade policial em relação a denúncias.

Salta aos olhos que a violência doméstica diz respeito não mais apenas à instância privada da órbita familiar, mas, também e especialmente, às instâncias públicas dotadas de poder para resguardar os direitos fundamentais dos membros da família (DIAS, 2012, p. 43).

A partir disso podemos destacar os impactos da atuação policial no trabalho contra a violência doméstica. Um dos pontos importantes da Patrulha Maria da Penha é o acompanhamento e monitoramento das medidas protetivas deferidas pelo judiciário. (BUENO, 2019) Esta ação tem impacto positivo na realidade de mulheres violentadas, pois ultrapassa o suporte com a denúncia e a medidas, tendo uma atuação direta com a vítima, garantindo que as medidas sejam respeitadas.

Outro impacto importante da atividade policial na vida das mulheres violentadas é a intervenção imediata e rápida a partir da denúncia. Exemplo de caso da ação policial:

O indivíduo foi conduzido à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), onde foi autuado em flagrante. Os policiais penais da Sime foram acionados com base em um pedido de socorro enviado pelo filho da vítima, de 12 anos, por meio do WhatsApp. A mensagem informava que o agressor, que já estava sob ordem de restrição, se encontrava na residência da família. Ele havia, portanto, descumprido medida protetiva imposta. De imediato, os policiais se deslocaram para o local. (GOIÁS, 2024)

Consequentemente, há um impacto principal na aplicação da lei, além de que a presença policial pode dissuadir futuros atos de violência, tanto pelo agressor quanto a potenciais agressores.Neste ponto, em exercício os policiais podem coletar provas de forma adequada e importante e adequada. Ainda, a polícia pode ajudar o público sobre violência doméstica e os recursos disponíveis para as vítimas através de programas comunitários.

Como forma de compreender o papel que é desenvolvido pelas polícias, nos casos relacionados a violências contra a mulher, especialmente aquelas cometidas no âmbito doméstico ou familiar, conforme previsão da Lei Maria da Penha, é necessário entender a estrutura da organização policial no Brasil. (FASCARINI, BARBOSA, 2021)

A estrutura da organização policial no Brasil, que obedece a determinação da forma de Estado mediante determinação Constitucional, que prevê a organização da federação, com reconhecimento de organização (e poderes) distribuídos entre Municípios, Estados e União, relacionando as atribuições das polícias a esses níveis da esfera organizacional política do país. Além disso, a organização da polícia no Brasil apresenta-se dividida entre policia civil e militar. (CHOUKR, apoud. FOSCARINI, 2023)

Portanto, as atribuições policiais vão além de fazer qualquer registro e remeter ao poder judiciário após a investigação, a polícia também recebe atualmente, como supracitado, atribuições típicas de serviço de rede de atendimento de pessoas em situação de violência, devendo o acompanhamento e atendimento às vítimas ter como sua principal atividade de atuação contra a violência doméstica. (FOSCARINI, 2023) Assim, a polícia tem ação direta na efetividade da Lei Maria da Penha, na proteção da mulher e na diminuição da violência contra a mulher.

3. Desafios Enfrentados pela Polícia

Para falarmos em desafio da polícia precisamos lembrar que a sociedade ainda ver a polícia associada a repressão e associação a corrupção:

As pessoas ainda associam a polícia à repressão, à ditadura militar, à corrupção, a tudo que é ruim na sociedade. De certo modo, não deixa de ser. Nós lidamos com a banda podre mesmo, com criminosos, seja o traficante ou o aliciador de menores, é isso que você vê como polícia. Só que elas acabam nos culpando pela impunidade, pela não resolução de um caso, não entendem que não somos nós que decidimos, não somos nós que fazemos o sistema e as leis, ou que são eles próprios que contam versões que se desencontram, não contribuem com a investigação. É muito difícil trabalhar tanto, ganhar pouco e sempre ser malvisto. (LINS, 2021)

Os policiais não se comportam da forma como o fazem puramente por causa de seus traços psicológicos ou qualidades mo suas ações dependem em grande medida de sua história pessoa treinamento a que foram submetidos, da supervisão que recebem, condições de trabalho que lhes são impostas, das atribuições oriunda políticas governamentais e das representações do mundo social que a sociedade produz. (LINS, 2021)

Dessa forma, há uma certa necessidade de repreensão mais severa da polícia em relação a indivíduos infratores, isto, pois não há o respeito devido aos mesmos, o que chega a ser um desafio na efetividade e leis como a Maria da Penha, onde infratores querem confrontar as autoridades policiais.

Outra dificuldade é a efetivação das medidas protetivas, as medidas são mecanismos criados pela lei para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar acompanhadas pela Patrulha Maria da Penha.

A PMP é um programa executado pelo Comando de Segurança Comunitária (CSC) da Polícia Militar do Maranhão (PMMA), que tem por objetivo o acompanhamento e atendimento das mulheres em situação de vulnerabilidade, vítimas de violência doméstica e familiar, e, a fiscalização do cumprimento das medidas protetivas de urgência. (CARDOSO, 2018)

Antes da implementação da Lei Maria da penha crimes com um potencial ofensivo menor, sob comando e responsabilidade dos Juizados Especiais Criminais, a pena atribuída ao agressor não era tão rigorosa, sendo ele condenado ao cumprimento de penas alternativas, como, por exemplo, pagamento de cestas básicas, prestação de serviços comunitários, pagamento de multas, o que contribui, de certo modo, para a impunidade. (CARDOSO, 2018) Sem qualquer prisão em flagrante ou mesmo medida preventiva, o que foi alterado abrindo um leque para o exercício da polícia, podendo esta prender em flagrante e acompanhar as medidas protetivas diretamente.

Uma dificuldade e desafio inicial é a denúncia, para que a polícia tome maiores providências é necessário esta ter conhecimento inicial dos fatos ou do ocorrido. Atualmente o 180 e os sites de delegacias policiais são formas práticas de denúncias, porém, como e quem fará tais denúncias levando em conta que muitas mulheres são repreendidas em casa a cada passo.

Para tanto, é dever de todos, especialmente dos mais próximos, que acompanham o sofrimento da vítima, denunciar o caso à polícia, ao Ministério Público, à Justiça ou outro órgão de proteção às mulheres. (TJMG, 2024) Com isso devemos ressaltar que a fala de engajamento comunitário é um dos desafios que mais pesam na punição dos agressores, isto pois muitas pessoas entender não ter dever ou responsabilidade de se meter situações de casais e ou familiares onde esteja presente a violência, um pensamento errôneo que facilitaria a atividade policial. As ações penais referentes a violência são públicas incondicionadas, ou seja, independente de representação das vítimas são prosseguidas pelo Ministério Público como forma de facilitar a punição dos agressores e proteger a vida da mulher.

Importante destacar que a denúncia não precisa ser de efetiva violência, mas em iminência de possível violência doméstica, seja ameaças, violências psicológicas, sexuais e afins. Com esse contato inicial a polícia deve garantir proteção da vítima; comunicar o fato ao Ministério Público; encaminhar a vítima ao hospital, posto de saúde, ou IML; fornecer transporte e abrigo à vítima e seus dependentes, facilitando assim o trabalho policial em uma de suas maiores dificuldades que é o conhecimento dos fatos. (DISTRITO FEDERAL, 2000) Outros meios de denúncia é o aplicativo Direitos Humanos Brasil e na página da Ouvidoria Nacional de Diretos Humanos (ONDH) do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), além do App Telegram buscando por “DireitosHumanosBrasil”. (GOV, 2020)

Importante mencionar que a insensibilidade policial nas abordagens de proteção a mulher era um dos desafios da prática efetiva da lei maria da penha, entretanto a criação da Patrulha Maria da Penha veio para oferecer treinamento específico e cuidados mais sensibilizados aos olhares de cuidado para com a mulher. Entretanto, um desafio que prevalece é a escassez dessas delegacias, poucas são as patrulhas para tanto aumento da violência supracitado.

Para entender isso, em 2023 o Instituto Datafolha, realizou pesquisa em todo o brasil, a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma ONG sem fins lucrativos que reúne especialistas no assunto para elaborar estudos e proporcionar cooperação técnica a governos e demais interessados, e atestaram que a média é de mais de 50 mil vítimas por dia até 2023. (TRT 4º, 2023) Em contrapartida a estes 50 mil vítimas por dia, só no rio grande do sul a Brigada Militar conta com mais de 2664 (dois mil seiscentos e sessenta e quatro) policiais militares estaduais capacitados com curso de, no mínimo, 30 horas, sendo que, destes, apenas 250 (duzentos e cinquenta) estão em atuação, compondo 62 Patrulhas no Estado do Rio Grande do Sul, com mais de mil vítimas por dia. Desse modo, percebe-se que há um desafio em acompanhar o crescimento dos números de vítimas com o número de profissionais qualificados para tanto. (BRIGADA MILITAR, 2023)

A demora nos julgamentos em âmbito judiciário também desanima as denúncias das vítimas que entendem que os agressores ficarão livres e impunes até que seja decidido algo ou mesmo prescreva o tempo de punição do estado, a prescrição, nesse caso, se dá quando o Estado perde o direito de punir quando não realiza suas obrigações legais dentro do tempo estipulado, permitindo que o agressor tenha a liberdade de agredir novamente. (MELO, SANTOS, 2020)

Por fim, o machismo estrutural é uma dificuldade na efetiva proteção da mulher, tanto na sua imagem de inferioridade comentada anteriormente, como no reconhecimento dos agressores de que a violência contra a mulher a opressão é algo errôneo e do passado por falta de informações. Seguindo a percepção de que parte do povo brasileiro ainda vê a violência como um fator de “merecimento” ou “busca de atenção”, nota-se que tais direções do imaginário cultural arraigado pela cultura patriarcal não faz menos que atrasar a igualdade de gênero; pelo contrário, reforça pensamentos misóginos que reduzem a mulher à quase completa dependência e vulnerabilidade. Acerca do pensamento tendencioso social, para além da culpa individualizada no agressor, cita-se Dias (2008, p. 15):

“A sociedade ainda cultiva valores que incentiva a violência, o que impõe a necessidade de se tomar consciência de que a culpa é de todos. O fundamento é cultural e decorre da desigualdade no exercício de poder e que leva a uma relação de dominante e dominado. Essas posturas acabam sendo referendadas pelo Estado. Daí o absoluto descaso de que sempre foi alvo a violência doméstica.”

Por fim, englobando todos esses desafios, a efetividade da Lei Maria da Penha de maneira geral é o maior desafio enfrentado pela polícia, pelo Estado e pelos legisladores, sendo a proteção da mulher um de seus maiores problemas. Isto, pois o número de violência doméstica segue em crescimento a cada ano, incluindo violência contra meninas menores. Segundo o Instituto econômico de Pesquisa Aplicada, em pesquisa feita em 2024, aponta que meninas de 14 anos são as maiores vítimas de abuso pelo Atlas da Violência, publicado pelo Laboratório de Estudos de Feminicídio – LESFEM. (LESFEM, 2024)

4. Perspectivas Futuras e Recomendações;

As perspectivas da violência doméstica não são as melhores, nas últimas pesquisas retratam cada vez mais aumento de feminicídios.

O Monitor da Violência traz, mais uma vez, os dados sobre violência de gênero no Brasil, mostrando que os casos de feminicídio e de homicídio de mulheres continuam aumentando na maior parte dos estados brasileiros. Olhando para a série histórica, desde a promulgação da Lei nº 13.104/15, que qualifica como feminicídio o homicídio de mulheres devido a sua condição de gênero, os registros aumentam ano a ano, indo na contramão da tendência de queda dos homicídios em geral.

Entre 2017 e 2022, a queda do número de homicídios (geral) no Brasil foi da ordem de 31%, segundo os dados do Monitor da Violência recentemente divulgados. Uma redução sem precedentes na história do país, cujas explicações são múltiplas e variadas, perpassando as mudanças nas dinâmicas das organizações criminais, mudanças demográficas e até a implementação de políticas públicas de prevenção à violência. No entanto, no mesmo período, o registro dos crimes de feminicídios aumentou 37% no Brasil. (PICCIRILLO, SILVESTRE, 2023)

Enquanto isso, há um aumento também nos processos judiciais, inclusive, sem resolução de mérito, o que apenas corrobora a falta de punição e demora do judiciário, assim aponta as próprias pesquisas do Conselho Nacional de Justiça quanto a aplicação da Maria da Penha.

Dados que integram o relatório “O Poder Judiciário na Aplicação da Lei Maria da Penha: ano 2022”, que abrange a atuação do Poder Judiciário na aplicação da Lei Maria da Penha, revelam que ingressaram no Poder Judiciário 640.867 mil processos de violência doméstica e familiar e/ou feminicídio em 2022. No mesmo período, foram proferidas 399.228 mil sentenças, com ou sem resolução de mérito.

A falta de campanhas educativas e de conscientização pode resultar em uma comunidade menos envolvida e menos disposta a denunciar e apoiar as vítimas. Sendo uma necessidade a participação da sociedade civil e o maior engajamento de ONGs e outras entidades na prevenção e combate à violência doméstica, sendo esta uma das recomendações.

Dado os desafios e impactos da atividade policial supracitados torna-se crucial que a comunidade tenha a consciência da sua contribuição ao denunciar, pois, todos têm o dever de denunciar, embora profissionais como psicólogos, médicos, condomínios e outros tenham políticas específicas, falta mais conscientização da população leiga em geral que ainda tem o pensamento patriarcal em que em situações violentas de casais não devem intrometer-se, isto facilita e diminui os desafios policiais.

Conclusão

Este trabalho buscou demonstrar os impactos da atividade policial na proteção da violência contra a mulher no que se refere à Lei Maria da Penha, apontando o histórico da lei e sua evolução, onde ficou claro a importância do surgimento das Delegacias da Mulher, DDMs. Em um primeiro momento foi destacado os impactos da atividade policial, momento em que se percebe como a polícia tem formas diretas de atuar e proteger a mulher.

Em contrapartida, percebe-se que para o trabalho policial ser efetivo, precisa-se de mais engajamento social nas denúncias, sendo este dever social das pessoas, além de percebermos o aumento da violência como perspectiva futura, onde vem tendo um aumento no número de feminicídios. Outros desafios detalhados foram a morosidade do judiciário que invalida o trabalho policial e leva a ter menos denúncias devido ao sentimento de impunidade. Em um terceiro momento foram apresentadas as perspectivas futuras para a violência doméstica, onde a tendência é de aumento, também com recomendações quanto a conscientização das pessoas leigas e aumento de profissionais nas patrulhas de defesa à mulher vítima.

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