REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7775854
Diego dos Santos da Trindade1
Felipe Eduardo Wrasse2
Felipe Ferreira Saldanha3
Igor dos Santos Gonçalves 4
Maira Sandri do Prado5
Miguel Perin de Figueiredo6
Paulo Ricardo Rodrigues Lazzarotto7
Rodrigo Santos Emanuelle Osório8
RESUMO
O presente trabalho trata sobre o desenvolvimento do crime organizado dentro do sistema prisional do Rio Grande do Sul e o uso do setor de inteligência prisional para o combate de crimes ordenados de dentro das casas prisionais do referido Estado. Também é analisada a legislação correlata e os instrumentos de inteligência usados atualmente para detectar, prevenir e neutralizar o vínculo do comando de organizações criminosas com as ações delitivas ocorridas extramuros do sistema prisional. Baseado em normativas, estudos doutrinários e análise de campo, verificou-se a grande eficiência do uso de estratégias de inteligência prisional para a antecipação de ações e proteção da instituição e seus servidores, respeitado, ainda, todos os institutos e fundamentos dos direitos humanos inerentes a pessoas privadas de liberdade.
PALAVRAS-CHAVE: Crime Organizado. Sistema Prisional. Inteligência Prisional. Direitos Humanos.
ABSTRACT
The present work deals with the development of organized crime within the prison system of Rio Grande do Sul and the use of the prison intelligence sector to combat crimes ordered from within the prisons of the State. It also analyzes the correlative legislation and the intelligence instruments currently used to detect, prevent and neutralize the link of the command of criminal organizations with the delinquent actions occurring outside the prison system. Based on normative, doctrinal studies and field analysis, it was verified the great efficiency of the use of prison intelligence strategies for the anticipation of actions and protection of the institution and its servers, still respecting all the institutes and fundamentals of inherent human rights to persons deprived of liberty.
KEYWORDS: Organized Crime;.Prison system. Prison Intelligence.Human Rights.
1 INTRODUÇÃO
Atualmente, frente aos constantes escândalos e práticas ilícitas veiculadas na mídia e em outros meios de comunicação global, o crime organizado é um dos maiores problemas enfrentados por um Estado Democrático de Direito. Não só para estudiosos, mas é nítido aos olhos de todos que o crime organizado estruturou-se e, para alcançar níveis mais elevados de obtenção de vantagens, atua de forma planejada e eficiente, infiltrando-se em todas as camadas do alicerce social e praticando os delitos mais diversos possíveis. Contudo, devido a tal organização, essas infrações penais tomam proporções imensuravelmente maiores, motivo pelo qual se faz necessário um estudo e difusão de tal conhecimento para a sociedade.
Além disso, é notório que o desenvolvimento e a complexidade do crime organizado desperta interesse dos cientistas sociais e estudiosos, que estudam um campo muito amplo, não se atendo somente aos efeitos negativos que tal criminalidade irá causa às instituições políticas e de Segurança Pública. Frente a isto, é indiscutível que o presente estudo contribui com a legitimidade do Estado em sua capacidade de manter a ordem social, respeitando os Direitos Fundamentais Constitucionais.
Vendo essa crescente perspectiva negativa, o Estado deve/tende a tomar medidas capazes de fazer frente a esse Estado paralelo organizado. Diversas foram as tentativas legislativas objetivando o endurecimento de leis, majoração de sanções em determinadas infrações penais cometidas por organizações criminosas e criação de normas visando a inibição de delitos mais complexos e que causam maior prejuízo e alvoroço social. Todavia, todas essas medidas são aplicáveis após o cometimento do delito, e não antes, fato que, por si só, não diminui ou combate diretamente o problema evolutivo do crime organizado.
Neste diapasão, surge a necessidade de uma abordagem mais contundente, visto que as estratégias até então usadas, não apresentaram um grau de eficiência esperado pelo Poder Público. Portanto, o enfrentamento adequado e que traga resultados positivos deve ser realizado na base estrutural do problema, ou seja, intervenções e ações diretas em figuras de comando e gestão de toda a atividade criminosa de determinado grupo. Emergindo, assim, as agências de inteligência que trazem uma maneira perspicaz para este enfrentamento no ramo da Segurança Pública.
O presente estudo, juntamente, utiliza do conhecimento/citações de autores representativos da área de Segurança Pública, especificamente os direcionados aos ramos do desenvolvimento da atividade de inteligência, que em um viés mais restrito e direcionado, nos encaminha à inteligência penitenciária, ramo no qual exerço atividades laborais, e por conhecimento prático, verifico ser uma das principais raízes do tema abordado, qual seja, o crime organizado.
2 SETOR DE INTELIGÊNCIA
A atividade de inteligência, em sua acepção histórica, possuía apenas a função específica de dar suporte em estratégias militares. Hodiernamente, o conhecimento é o patrimônio maior das instituições, sendo isso visível pelo investimento cada vez maior em tecnologia. Nesse rumo, quem detém conhecimento certamente obterá vantagem competitiva.
Necessário frisar que em nosso ordenamento jurídico, o legitimador da atividade do profissional da inteligência está no art. 5 da Constituição Federal de 1988, especificamente em seu inciso XXXIII, o qual alude que “a segurança do Estado e da Sociedade é o valor que legitima a existência de informações sigilosas”. Portanto, o princípio que norteia a atividade de inteligência é o sigilo, para com a segurança do Estado e da Sociedade, justificando-se juridicamente o uso de técnicas e meios sigilosos para a produção e a salvaguarda de conhecimento.
Destarte, na atividade de inteligência destaca-se uma dupla importância de ações conjuntas, visto que ao mesmo tempo em que se procura obter informações de outros comandos/organizações, precisa-se proteger e neutralizar as capacidades destes em relação às suas próprias informações. Cotejando o conceito da atividade de inteligência, de acordo com Shulsky, uma vez que o governo tem que estar rotineiramente processando informações, é exatamente a necessidade de tal proteção que definem o que deve e o que não deve ser considerado um produto de inteligência.
Consoante art. 1ª, § 2º, do Decreto 4376/02, que regulamentou a Lei 9.883/99:
A Inteligência é a obtenção, análise de dados e informações e de produção e difusão de conhecimentos, dentro e fora do território nacional, relativos a fatos e situações de imediata ou potencial influência sobre o processo decisório, a ação governamental, a salvaguarda e segurança da sociedade e do Estado.
Ainda, acrescendo ao conceito da atividade, DeLadurantey (1995, p. 383, apud Dantas; Souza, 2004, p. 1, trad. livre) define a expressão inteligência da seguinte maneira:
É o conhecimento das condições passadas, presentes e projetadas para o futuro de uma comunidade, em relação aos seus problemas potenciais e atividades criminais. Assim como a inteligência pode não ser nada mais que uma informação confiável que alerta para um perigo potencial, também pode ser o produto de um processo complexo envolvendo um julgamento bem informado, um estado de coisas, ou um fato singular. O ‘processo de Inteligência’ descreve o tratamento dado a uma informação para que ela passe a ser útil para a atividade policial.
Desta feita, denota-se que a expressão inteligência é muito ampla em seu conceito, mas todos os estudiosos seguem a mesma linha quando referem sobre a necessidade de
criação de um processo de defesa e conhecimento do seu “adversário”. Assim, juridicamente, para a Política Nacional de Inteligência, tal atividade se divide em duas frentes, quais sejam: a Inteligência e a Contrainteligência.
A primeira, em uma visão generalizada, possui o objetivo vital da produção do conhecimento sobre fatos que acontecem dentro e fora do Brasil, levando esses dados às autoridades competentes como influência nas decisões para a ação governamental e a salvaguarda da sociedade e do Estado. Em suma, tratam-se de informações para decidir bem, sendo geralmente destinado a produção de um documento que oriente para a melhor medida, sem influência política ou outro meio indireto. Não se trata, aqui, de uma determinação ou uma sugestão, mas sim uma orientação.
Já a contrainteligência tem como objetivo “prevenir, detectar, obstruir e neutralizar” uma inteligência contrária, juntamente com as ações que criam ameaças à salvaguarda de dados, pessoas, áreas e instalações de interesse da sociedade e do Estado.
Seu principal objetivo é tornar o mais difícil possível às ações adversas, tomando medidas de segurança que garantam o impedimento ao acesso a tudo que se quer manter em sigilo, identificando as agressões para assim proteger as pessoas e as instalações. (GONÇALVES, 2017, p. 89).
Todavia, tal atividade desenvolveu-se em passos pequenos, haja vista o atraso legislativo para a normatização efetiva e, em se tratando de uma evolução histórica, vê-se poucos estudos no Brasil sobre inteligência que detalham com precisão o uso da contrainteligência na realidade fática de uma penitenciária.
Nesse sentir, Gonçalves (2010, p. 05) relata que:
[…] a atividade de inteligência é muito pouco estudada no Brasil, praticamente inexistindo linhas de pesquisa sobre o assunto nos meios acadêmicos. Entre as razões dessa lacuna está a aura de repúdio, desconhecimento e preconceito que envolve a percepção da opinião pública – e, portanto, da academia – sobre os serviços secretos. Geralmente, os órgãos e a atividade de Inteligência são vistos com desconfiança pela sociedade.
Ademais, em se tratando de estudos voltados ao sistema penitenciário, especificamente, existem diversos autores com discursos quanto à falência do sistema prisional e seu sucateamento, pois sabe-se que a estrutura carcerária nacional apresenta um déficit, tanto de efetivo funcional, quanto o de estabelecimento, inexistindo estrutura que proporcione melhores condições e estejam em poder e controle da administração penitenciária.
A atividade de inteligência, sendo utilizada como um instrumento de trabalho habitual, estará sempre ao lado das tomadas de decisões e baseando-as, visando auxiliar no conhecimento necessário e adequado para que sejam as mais acertadas possíveis, visto tratar-se sempre de uma coletividade que será afetada por elas.
Na área aqui analisada, inteligência aplicada ao meio criminal carcerário, percebe-se que as ações não se detêm tão-somente ao acúmulo de dados advindos de fontes ocultas, ou ainda, de fontes abertas de pesquisa (internet, arquivos, inquéritos etc;), mas de uma coleta de todos os dados brutos, para após sua lapidação, direcionar ações planejadas.
Além do mais, a integração e o compartilhamento destes conhecimentos entre todas as instituições da Segurança Pública, muito acresce e facilitaria operações policiais e produção probatória judicial, tendo em vista que a nítida falta de comunicação faz com que o crime organizado carcerário toma força contra tal despreparo estatal. Questão que prontamente poderia ser solucionada com uma integração efetiva de um bom setor de inteligência com ação ativa de neutralização.
Assim, referindo-se ao campo da produção de conhecimento, Mingardi (2007 p. 54) cita um modelo simples e básico de processamento de dados, sendo adaptado, após, por cada força de segurança visando sua finalidade específica:
A primeira fase é a coleta do informe, ou dado bruto. A segunda é a análise do material, separando o joio do trigo e agregando dados pertinentes, o que, aos poucos, vai transformando o dado bruto em informação. A partir da informação, ou de um conjunto delas, o analista entra na terceira fase, a síntese, e produz uma apreciação, que já é uma forma de conhecimento. A quarta e última fase é a da estimativa, elaborada a partir de um conhecimento consolidado.
No meio carcerário a atividade de inteligência é geralmente empregada para a coleta de informações sobre crimes mais complexos, como o tráfico de entorpecentes, contrabando, prostituição, exploração de jogos e pessoas, além de outros delitos que, por si só, geram uma grande lucratividade, visto que é possível identificar os passos futuros que essas organizações pretendem tomar, prevenindo esses desdobramentos, conforme palavras do ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, José Vicente de Paula:
É impossível impedir a formação de grupos em presídios, pelas condições de contato e ócio dos presos, o ideal é controlar esses grupos para que não entrem em confronto com outros grupos, não submetam os grupos a violências nem articulem ações criminosas, como motins, ingressos de drogas, articulação com criminosos soltos, etc. esse controle depende das condições da administração dos presídios e de instrumentos de disciplina, como separação de grupos, de isolamento de líderes em outras unidades, por exemplo. Hoje estão sendo viabilizados novos instrumentos de controle, denominados de inteligência prisional, destinados a registrar todas as pessoas e fatos (ficha de cada preso, colega de cela, funcionário de serviços em cada dia, entradas de visitas e fornecedores etc.) de cada unidade em um sistema capaz de combinar as informações e indicar problemas.
À vista disto, Hoffman e Hammerschmidt (2012, p. 150), já anteviam a importância deste ramo de atividade:
Ao se pensar em atividade de inteligência como resultado do processamento inicial de dados e sua transformação em conhecimento, remete-se imediatamente à ideia da capacidade das organizações em monitorar informações do ambiente para responder aos problemas, vencer desafios e identificar as oportunidades que continuamente se apresentam.
Logo, o Estado se posicionando como um antecipador de ações criminosas, quer para diminuir a incidência delitiva, quer para salvaguardar dados e atividades fundamentais, faz da atividade de inteligência uma ferramenta fundamental para o primeiro contato com o planejamento criminal, principalmente quando focada no setor penitenciário, visto que é sabido o local, e de quem saem as ordens para atividades ilícitas.
3 INTELIGÊNCIA PRISIONAL E O USO DA CONTRAINTELIGÊNCIA DENTRO DO SERVIÇO PENITENCIÁRIO DO RIO GRANDE DO SUL.
A contrainteligência (CI) é o ramo da atividade de IPEN que se destina a produzir conhecimentos e adotar medidas para proteger a atividade de inteligência e a instituição a que pertence, de modo a salvaguardar dados e conhecimentos sigilosos e identificar e neutralizar ações adversas de qualquer natureza.
A CI implementa-se por meio de adoção de ações, normas, medidas e procedimentos voltados para a prevenção, a detecção, a obstrução e a neutralização de ações adversas, bem como, realizar as ações necessárias para regular os acessos aos dados e conhecimentos, de modo a prevenir e evitar possíveis comprometimentos e vazamentos sendo que sua responsabilidade consiste em uma obrigação legal, individual e coletiva, em relação à preservação da segurança, haja vista a importância em defender a integridade e os pontos vulneráveis da instituição.
No meio prisional, após o produto gerado pela inteligência, surge o imperativo de salvaguardar tal conhecimento sensível, o qual, se divulgado a terceiros, causará alvoroço e risco a incolumidade pública. Diversas são as formas de distanciar esses terceiros de conseguir acesso às informações. Exemplo disto é a desinformação, que consiste na realização intencional de alguma ação para induzir alvos a erros de apreciação, levando-os a executar um comportamento determinado e previamente esperado.
Tendo conhecimento da rápida comunicação paralela que existe no sistema carcerário, onde informes soltos, em instantes, chegam ao conhecimento de chefes de facções e outros operadores, que de posse de tal conhecimento, facilmente conseguem frustrar ações estatais, muito se utiliza a desinformação, visto sua eficiência em frustrar ações criminosas, ou, ao menos, desorientar sua execução. Exemplo disto é o informe de revista geral em determinada casa prisional. Mesmo não ocorrendo tal operação, detentos, muitas vezes, se desfazem de instrumentos de infrações administrativas (serras, armas brancas, celulares, drogas) unicamente para não terem por barradas suas progressões e benefícios na execução da pena.
A Superintendência dos Serviços Penitenciários de Rio Grande do Sul, com seu setor de inteligência especializado na área, debruça-se em formular diagramas com vínculos, relações interpessoais, alvos e eventos, informações estas de maior coleta no interior das casas prisionais. Já informações como recursos utilizados, além do fluxo de dinheiro, padrões, modus operandi, geralmente surgem com a contribuição e o trabalho conjunto com a polícia judiciária.
Em se tratando de contrainteligencia aplicada nos estabelecimentos prisionais gaúchos, verifica-se uma divisão em dois segmentos: O primeiro baseia-se na Segurança Orgânica (SEGOR), sendo ela um conjunto de medidas de caráter eminentemente defensivo, destinado a garantir o funcionamento da instituição, de modo a prevenir e obstruir as ações adversas de qualquer natureza. A segurança pessoal, de documentos, instalações, materiais e comunicações telemáticas e informáticas são priorizadas nesta seção, pois integram um plano de segurança, procedimentos executados desde a entrada do servidor penitenciário no estabelecimento.
De outra banda, a Segurança Ativa (SEGAT), trata-se de um conjunto de medidas de caráter eminentemente ofensivo, de ações destinadas a detectar, identificar, avaliar, analisar e neutralizar as ações adversas de elementos ou grupos de qualquer natureza, dirigidas contra o Sistema Penitenciário.
Tais meios de Segurança Ativa – contrapropaganda, contraespionagem e contrasabotagem – são avaliados e entram em ação quando os meios de Segurança Orgânica já foram ultrapassados, tornando uma ameaça potencial à segurança local.
Já Gonçalves (2017, p. 90-91), não tão distante da noção aplicada ao sistema carcerário do Rio Grande do Sul, apresenta uma divisão elaborada por Lowenthal, em que a contrainteligência divide-se em três tipos:
Contrainteligência para reunião (coleta/busca): tem por objetivo obter e produzir informações sobre as capacidades de oponentes de reunir informações que possam interessar ou constituir-se em ameaça a quem ou o que é protegido pela contrainteligência:
Contrainteligência defensiva: sua missão é frustrar os esforços de pessoas ou organizações adversas que tenham interesse em ter acesso às informações protegidas ou desenvolvam ações intrusivas;
Contrainteligência ofensiva: uma vez identificada à tentativa de um oponente contra seu sistema de inteligência, a contrainteligência ofensiva buscará neutralizar esse ataque, por exemplo, tentando recrutar o agente adverso e convertê-lo em agente duplo ou fornecendo informações falas para nutrir a inteligência adversa.
Assim, evidencia-se uma crescente importância voltada ao setor de inteligência penitenciária, especialmente no Estado do Rio Grande do Sul, visto que após investimentos em tal ramo de atuação, resultados significativos surgiram, mostrando, ainda, a necessidade de cada vez ser implementado mecanismos novos para o desenvolvimento da atividade.
Do mesmo modo, Tuma (2013) ressalta que entre os muros de uma casa prisional, existem muitas informações sobre crimes que já ocorreram e que irão acontecer, sobre a estrutura das organizações criminosas, contas bancárias, comparsas e tudo que circunda a indústria do crime. Logo, inúmeros esclarecimentos de casos poderiam surgir como resultado de um efetivo uso da inteligência. Resultado estes, que em outros tempos somente eram obtidos usando meios tortuosos, que manifestamente feriam os direitos humanos de pessoas privadas de liberdade.
4 O INSTRUMENTO DE INTELIGÊNCIA PENITENCIÁRIA CORRELACIONADO À PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
Ante ao estudo do meio de desenvolvimento de obtenção de informações, especificamente, oriundas de casa prisionais do Estado do Rio Grande do Sul, faz-se necessário uma análise da evolução histórica deste meio de obtenção de provas, que outrora, somente era possível mediante negociações irregulares (entre agentes estatais e pessoas privadas de liberdade) frente às normativas estatais, ou, ainda, através de meios ainda mais irregulares e ofensivos à dignidade da pessoa humana.
Sabe-se que desde a sua formação, o Estado brasileiro, como um todo, tem empregado sua violência institucional para a exploração territorial e para a exploração dos homens. A tortura, como uma cicatriz profunda desses abusos, teve sua origem durante o processo de colonização e, posteriormente “passando pelo Império, Independência, República, ditaduras e imperfeitos Estados de Direito, com governos de todos os tipos” (BENEVIDES, 2010, p. 21).
Muitos são os relatos de agressões físicas e/ou psicológicas, com a intenção de obter confissões, ou meramente informações privilegiadas de pessoas em cárcere que compunham grupos criminosos. Informações estas que até poderiam prevenir a ocorrência de delitos posteriormente perpetrados extra muros, contudo, ante a seu meio de obtenção irregular, a torna totalmente ilegítima. Ora, uma ação do Estado, por maiores que sejam os benefícios preventivos do resultado, nunca deve usar mecanismos e instrumentos que desrespeitem o ordenamento jurídico por ele afirmado, ainda mais em se tratando e violando os Direitos Humanos Fundamentais.
Consoante a este entendimento, Renato Marcão (2014, p. 116), muito bem elucida da necessidade do respeito às integridades Constitucionais garantidas a pessoas inseridas no sistema penitenciário, vejamos:
Dignidade Humana: O fato de encontrar-se submetido ao cumprimento momentâneo de pena criminal não retira do executado seu status constitucional de pessoa de direito, impregnada de dignidade, e disso resulta o dever de respeito que a lei impõe a todas as autoridades. Respeito a integridade física e moral, que alcança não apenas os presos provisórios, mas também os condenados definitivos e aqueles submetidos à medida de segurança.
Em suma, é visível que a evolução do pensamento, quer do legislador, quer do agente estatal que trabalha diretamente no sistema prisional, se coaduna diretamente ao ordenamento jurídico, respeitado completamente os direitos de privados de liberdade, dado que ações tecnológicas do implemento da inteligência penitenciária demonstram-se muito mais eficientes e nada lesivas às garantias constitucionais da pessoa humana.
5 CONCLUSÃO
Desta feita, tendo por base o estudo aqui em pauta, primeiramente foi apresentada a relação entre o crime organizado e seu aprofundamento no sistema carcerário, local do qual se consegue facilmente montar uma espécie de centro de comando para ações criminosas em tempo real. Após, frente a tal constante, passou-se a vincular a necessidade de estratégias de busca, coleta, infiltração e ampliação da ação estatal com um setor de inteligência habilitado a estudar e antecipar ações, não de inimigos do Estado, visto que todo cidadão segregado faz parte do próprio conceito de Estado, mas sim de indivíduos que objetivam atentar contra a segurança social e ao regime democrático de um Estado pautado na busca do bem social.
Consoante ao apresentado referente à conceituação e atribuição da atividade de um setor de inteligência, especificamente voltado ao ramo penitenciário, verificou-se o grande recurso que o aparato estatal possui em suas mãos, dado a eficiência de resultados que direcionam a tomadas de decisões/atitudes e a prevenção de ações criminosas adversas.
Ações criminosas estas que, atualmente, são coordenadas diretamente por grupos criminosos inseridos no sistema carcerário, ocorrendo isto não somente no Estado do Rio Grande do Sul, mas em todo território nacional, no qual se percebe a influência destes delitos nas classes menos privilegiadas – na qual predomina a violência – como também nos alicerces políticos elitizados, exemplificado com os conhecidos crimes de colarinho branco.
Destarte, a atividade de inteligência, voltada ao setor penitenciário do Rio Grande do
Sul, vem desenvolvendo-se – em passos pequenos – juntamente com a Superintendência dos Serviços Penitenciários para utilizar esta maneira nada ofensiva aos direitos humanos fundamentais, e muito mais eficiente na tentativa de desmantelar o crime organizado que toma conta dos presídios estaduais.
Por fim, concluiu-se que o ramo desenvolve-se juntamente com a legislação estruturante, em passos mais diligentes que outros meios repressivos violentos já usados, sendo um artifício vantajoso do Estado contra o crime organizado que arrebata a maioria dos presídios estaduais.
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1Graduado em Engenharia Civil/Pós Graduado em Gestão de Segurança Pública.
2Bacharel em Ciências Contábeis/Pós Graduado em Gestão de Segurança Pública.
3Bacharel em Direito/Pós Graduado em Gestão Prisional.
4Bacharel em Direito/Pós Graduado em Direito Penal.
5Bacharel em Direito/Pós Graduada em Direitos Humanos e Segurança Pública.
6Bacharel em Direito/Pós Graduado em Ciências Criminais.
7Graduado em Engenharia Civil/Pós Graduado em Gestão em Segurança Pública.
8Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais/Pós Graduado em Gestão Prisional.