REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202412271758
Larissa Alves da Silva de Amorim
RESUMO
O objetivo principal do presente artigo consiste em analisar a possibilidade da fixação de honorários de sucumbência por equidade nas causas de grande valor. Para esse fim, aplica-se o método de revisão bibliográfica de livros e artigos científicos, visando alcançar uma conclusão para essa matéria de grande debate.
Contextualiza-se sobre a remuneração dos advogados e os princípios que norteiam a considerável evolução dos honorários advocatícios de sucumbência no ordenamento jurídico brasileiro, visando realizar um comparativa entre as previsões dos Códigos de Processo Civil.
Apresenta-se, como resultado da presente pesquisa, a possibilidade de fixação e honorários de sucumbência por apreciação equitativa, o que fere, inclusive, diversos princípios constitucionais. Assim, recentemente decidiu o Supremo Tribunal Federal pela proibição da aplicação dos honorários sucumbenciais nas causas de valor expressivo, de modo a afastar qualquer interpretação extensiva que já existiu do §8º do artigo 85 do Código de Processo Civil.
Palavras-chaves: Processo Civil. Honorários Advocatícios. Honorários de Sucumbência. Direito do Advogado. Apreciação Equitativa.
ABSTRACT
The main objective of this article is to analyze the possibility of setting fees for loss of suit for equity in cases of great value. For this purpose, the method of bibliographic review of books and scientific articles is applied, aiming to reach a conclusion for this matter of great debate. It contextualizes on the remuneration of lawyers and the principles that guide them, the considerable evolution of attorney fees for loss of suit in the Brazilian legal system, aiming to make a comparison between the predictions of the Codes of Civil Procedure. It is presented, because of the present research, that there was the possibility of fixing and fees of succumbence for equitable appreciation, which even violates several constitutional principles. Thus, the Federal Supreme Court recently decided to prohibit the application of fees for loss of suit in cases of significant value, to rule out any extensive interpretation that already existed of §8 of article 85 of the Code of Civil Procedure.
Keywords: Civil Procedure. Advocative hours. Succumbence Fees. Lawyer’s Law. Equitable Appreciation.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objeto de pesquisa as diversas questões que envolvem a aplicação dos honorários advocatícios, mais precisamente os honorários sucumbenciais, que são devidos ao advogado da parte vencedora da demanda, bem como sobre a inviabilidade da fixação dos honorários de sucumbência por equidade.
Para tanto, a metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica, utilizando-se da análise de livros e artigos científicos para a construção de um entendimento aprofundado sobre a aplicação dos honorários advocatícios ao longo do tempo até os dias atuais.
Assim, no primeiro capítulo desenvolve o conceito dos honorários de sucumbência como direito autônomo do advogado, versando sobre a concepção de sucumbência ao longo da história até chegar na definição que conhecemos hoje, além das hipóteses de aplicação dos princípios da sucumbência e da causalidade no caso concreto.
Ademais, no segundo capítulo contextualiza a evolução histórica da legislação no que diz respeito aos honorários de sucumbência nos Códigos de Processo Civil, tendo em vista que existiu uma época em que era legalmente proibido o pagamento dos advogados, por ser a advocacia uma função considerada pública. Mas a partir do reconhecimento da advocacia como uma profissão de fato, foram surgindo leis específicas sobre a aplicação dos honorários como um direito do advogado, como é o exemplo do Decreto nº 5.737/1874, que permitiu pela primeira vez a cobrança de valores para exercer a função de advogado.
Por fim, no terceiro capítulo abordei sobre a fixação dos honorários de sucumbência por equidade nas causas de valor expressivo e a recente e acertada decisão do Supremo Tribunal Federal para declarar que, nas causas de grande valor, será aplicado o entendimento do artigo 85 e seguintes do Código de Processo Civil, que prevê o percentual de no mínimo 10% (dez por cento) e no máximo 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.
1. OS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA COMO DIREITO AUTÔNOMO DO ADVOGADO
O conceito de remuneração para os advogados nem sempre existiu, isso porque, inicialmente, a profissão era exercida por pessoas que não precisavam receber salário para tanto e praticavam a advocacia por honra, o que deu origem ao termo honorarius1.
O Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil preceitua em seu artigo 22 que é assegurado a todos os advogados o direito de honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência2.
Do ponto de vista de Oliveira, a sucumbência “[…] é o ônus imposto ao vencido para pagamento das custas e despesas processuais, dos honorários e de outras combinações como juros e correção monetária.”3
Os honorários de sucumbência são todo valor remuneratório pago pela parte vencida ao patrono da parte vencedora que atuou na demanda judicial, ou seja, além do valor pago a título de condenação da lide, a parte vencida, podendo ser autor ou réu, será compelida ao pagamento de honorário de sucumbência e essa obrigação é uma previsão legal do direito do advogado garantido pelo Estatuto que rege as garantias e prerrogativas da advocacia.
Apesar de fazer parte da condenação, os honorários de sucumbência pertencem exclusivamente ao advogado, que possui absoluta legitimidade para executá-los, de modo que o cliente, ora parte da demanda, não possui direito algum sobre ele, isto é, ainda que já fossem acordados o pagamento de honorários contratuais.
A sucumbência sofreu diversas transformações até chegar no conceito que é conhecido hoje, no qual a parte vencedora tem o direito adquirido de reparação integral dos danos causados pela parte perdedora, inclusive os gastos com o advogado contratado para defender a lide. Antes desse conceito, aplicava-se a Teoria da Pena, cuja justificativa se dava pelo fato de o vencido ter demandado ou simplesmente resistido à demanda e, consequentemente, apenas aqueles que tinham plena certeza do seu direito entrar em litígio para tanto.
Em que pese essa ideia de reparação dos danos sofridos pela parte vencedora, os valores pagos a título de sucumbência eram destinados aos sacerdotes ou ao erário.4
No mais, a ideia de ressarcir o advogado representante da parte vencedora pelas despesas com o processo teve início com a Teoria do Ressarcimento, que pacificou o entendimento de que os honorários de sucumbência, que não eram chamados assim à época, não eram de responsabilidade do causídico, mas da parte perdedora na lide.
Esse entendimento só foi afastado pelo Princípio da Sucumbência, que trouxe a ideia de que, ainda que o vencido tenha agido de boa-fé no litígio, por acreditar que de fato era detentor de determinado direito, irá responder pelas despesas do pleito, pois foi vencido, o que proporciona ao vencedor da lide reintegração completa ao seu direito infringido. Atualmente, o Supremo Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a condenação em honorários advocatícios é pautada nesse princípio, isto é, “somente a parte vencida ou aquele que deu causa à demanda ou ao incidente processual é quem deve arcar com as despesas deles decorrentes”.5
Desse modo, hoje tem-se que “os honorários de sucumbência são aqueles que transcorrem diretamente do êxito do trabalho que o advogado proporcionou ao seu cliente na demanda”6. Assim, nesse contexto, é pertinente afirmar que, de acordo com o princípio da sucumbência, a responsabilidade pelo pagamento das obrigações decorrentes da demanda advém do fato objetivo do detrimento processual.
Entretanto, importante ressaltar que o princípio da sucumbência pode se mostrar insatisfatório, como é a circunstância dos casos de não resolução de mérito, cujo princípio que deverá ser aplicado é o da causalidade, afastando o princípio da sucumbência mínima. Nesse sentido, pontuam Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello:
O princípio da causalidade é aplicável às hipóteses em que não houver resolução do mérito, incidindo a verba de sucumbência sobre quem, provavelmente, seria o vencido na demanda. É, também, comumente visto na ação de exibição de documentos, quando a parte oferece resistência. Incide, ainda, quando houver perda do objeto.7
Assim, pode-se afirmar que o princípio da causalidade é aplicado subsidiariamente nos casos em que o critério principal não se mostra suficiente para decidir qual das partes perdeu a demanda, como por exemplo, nos processos extintos sem que haja resolução do mérito.
Além disso, em relação à remuneração dos advogados, o art. 133 da Constituição Federal prevê a atuação do advogado como indispensável para a administração da justiça, assim e, seguindo o entendimento do princípio da justa remuneração dos advogados, os honorários de sucumbência não podem ser reduzidos e devem ser pagos respeitando os limites previstos na legislação, para que o dispositivo mencionado possa ser efetivado com magnitude.
2. A EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DOS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
No direito brasileiro, logo no início das atividades de advocacia, os advogados exerciam função pública e eram proibidos de cobrar qualquer tipo de valor dos seus clientes8 e apenas após o Decreto nº 5.737/1874 houve a permissão de cobrança de honorários advocatícios.
Mais à frente, no Código de Processo Civil de 1939, verificou-se uma perspectiva para os critérios de fixação de honorários relacionados à condenação do vencido na lide, isto é, o referido código trouxe a possibilidade de responsabilizar a parte perdedora da demanda pelo pagamento dos honorários do advogado da parte vencedora.
Contudo, em que pese esse avanço trazido pelo Código de Processo Civil de 1939, não foi acolhido, de primórdio, o princípio da sucumbência, de modo que o responsável pelos emolumentos de custas e honorários estava condicionado à constatação de dolo ou culpa do vencido. Assim, embora a parte tenha sido vencida da demanda, seria analisado se houve dolo ou culpa nas suas ações para só então incidir a condenação às custas processuais e honorários sucumbenciais, pois eram aplicados como medida disciplinar.
À vista disso, o Código de Processo Civil de 1939, em seus artigos 63 e 64 in verbis, prévia:
Art. 63. Sem prejuízo do disposto no art. 3º, a parte vencida, que tiver alterado, intencionalmente, a verdade, ou se houver conduzido de modo temerário no curso da lide, provocando incidentes manifestamente infundados, será condenada a reembolsar à vencedora as custas do processo e os honorários do advogado.
Art. 64 Quando a ação resultar de dolo ou culpa, contratual ou extracontratual, a sentença que julgar procedente condenará o réu ao pagamento dos honorários do advogado da parte contrária.
Além disso, o primeiro parágrafo do artigo 64 do Código de Processo Civil de 1939, trazia critérios para fixar os honorários de sucumbência, consolidando que eles seriam definidos de forma moderada e motivada9. Todavia, a Lei nº 4.632/65 alterou o mencionado artigo, determinando que “a sentença final na causa condenará a parte vencida ao pagamento dos honorários do advogado da parte vencedora10”, independente da incidência de dolo ou culpa.
Esse entendimento da fixação dos honorários sem especificação expressa pelo Código de Processo Civil de 1939 sofreu uma considerável mudança com a chegada do Código de Processo Civil de 197311, que no §3º do seu artigo 20 estabeleceu o limite mínimo de 10% (dez por cento) e máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa para a fixação dos honorários, mas manteve a possibilidade de aplicação dos honorários de forma equitativa, restringindo suas hipóteses que antes eram amplas.
Ademais, o Código de Processo Civil de 1973 conservou a aplicação do princípio da sucumbência para a fixação de honorários, como se vê também no artigo 20, in verbis:
Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria. (Redação dada pela Lei nº 6.355, de 1976)
Assim, nota-se que o critério de culpa aplicado anteriormente não foi mantido, uma vez que naquele momento passou a valer o fundamento do risco processual, no qual o vencido seria responsabilizado pelo pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, não mais por uma questão de dolo ou culpa, mas de ônus de sucumbência.
A chegada do atual Código de Processo Civil de 201512 trouxe ajustes para que a regra de fixação de honorários advocatícios fosse utilizada de forma mais precisa e conceituou a aplicação dos honorários de forma mais abrangente para evitar a utilização de normas por presunção ou analogia. Exemplo disso é o artigo 85, §2º13, que manteve os percentuais mínimos e máximos aplicados pelo antigo código e estendeu o entendimento, afirmando que a fixação seria sobre o valor da condenação, do proveito econômico ou ainda do valor atualizado da causa, com base nos critérios também trazidos nos incisos seguintes do mesmo artigo.
Assim, a nova regra trazida pelo atual Código de Processo Civil leva os futuros demandantes a analisarem o risco daquele litígio, tendo em vista que, caso o magistrado julgue a causa improcedente, além do custo com os pedidos da parte contrária, seria condenado a arcar com a despesas processuais e honorários sucumbenciais do advogado da parte vendedora. Nesse sentido, pontuam Mauro Pedroso Gonçalves e Daniela Peretti D’Ávila14:
[…]antes de decidir pelo ajuizamento de uma demanda ou mesmo pela interposição ou não de um recurso, os agentes racionais sopesam a expectativa de ganho perante os custos e riscos envolvidos. Contabilizam, portanto, despesas com taxas judiciárias, contratação de advogados, eventual sucumbência etc., comparando-se com as chances de êxito do resultado final esperado.
Portanto, como se vê, a remuneração dos advogados no que diz respeitos aos honorários de sucumbência também atuam como fator limitante para ingressar com uma ação na justiça comum, além dos demais custos com as despesas processuais, o que, consequentemente, pode provocar desestímulo para as partes litigarem no judiciário a depender da causa e gera a responsabilidade para o advogado de avaliar de forma precisa os riscos com a demanda e orientar seus clientes.
3. A APLICAÇÃO DOS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA POR EQUIDADE NAS CAUSAS DE GRANDE VALOR
Não obstante o artigo 85 do Código de Processo Civil ser preciso quanto à aplicação dos honorários advocatícios, ainda existia a dúvida sobre a aplicação do dispositivo nas causas de valor expressivo, uma vez que o parágrafo 8º do artigo não citou expressamente sobre a hipótese:
Art. 85 § 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
Essa omissão por parte do Código de Processo Civil foi motivo de muita discussão no judiciário no que diz respeito às demandas cujo valor da causa era mais alto, pois alguns tribunais passaram a aplicar o §8º do artigo 85 também nesses processos, mesmo sem haver qualquer previsão expressa nesse sentido. É o que comprova o trecho de um acórdão de apelação julgada pela Primeira Turma15, in verbis:
Sobre os honorários advocatícios, o seu arbitramento pelo magistrado fundamenta-se no princípio da razoabilidade, devendo, como tal, pautar-se em uma apreciação equitativa dos critérios contidos no § 2.º do artigo 85 do Código de Processo Civil, evitando-se que sejam estipulados em valor irrisório ou excessivo. Os honorários devem ser fixados em quantia que valorize a atividade profissional advocatícia, homenageando-se o grau de zelo, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, tudo visto de modo equitativo. Sendo assim, a verba honorária deve ser reduzida ao patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais).
Esse entendimento perdurou por certo período, mas foi alterado quando recentemente a Corte Especial do Supremo Tribunal de Justiça decidiu que a fixação de honorários por equidade não seria mais permitida nos casos de demandas com valor da causa excessivo, devendo, a partir de então, serem observados os percentuais previstos no artigo 85, §2º do Código de Processo Civil.
Entende-se que a aplicação dos honorários por equidade nas causas de alto valor não é prevista em dispositivo legal propositalmente, uma vez que, se fosse do desejo do legislador, teria incluído também essa hipótese, assim como fez com as causas de valor inestimável, irrisório ou muito baixo, no qual abrangeu no artigo de forma expressa.
É certo que não há qualquer semelhança entre “valor inestimável” e “valor elevado”, pois o valor ainda que elevado, pode ser estimável e o entendimento do §8º do artigo 85 é concludente ao afirmar que a regra seria aplicada para as demandas em que não seria possível lhe atribuir valor patrimonial, o que, novamente, não se estender – ou não deveria se estender – às causas de grande valor.
Assim, o relator do REsp nº 1.877.833, OG Fernandes, ao fixar sua tese, propôs que a “a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou o proveito econômico da demanda, forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.16”
Logo, restou conclusivo que o arbitramento de honorários de modo equitativo só seria permitido quando o proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou nas causas em que o valor for muito baixo.
Como se vê, a atual decisão do Supremo Tribunal de Justiça foi acertada, tendo em vista que a aplicação dos honorários por equidade nas causas de valor exorbitante descumpre expressamente os §§ 2º, 3º, 5º e 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil. Além disso, importante destacar que estender o entendimento do §8º do artigo 85 do Código de Processo Civil para as causas de grande valor, que – frise-se – são estimáveis, há a expressa violação do princípio constitucional da separação de poderes17, da legalidade18, da segurança jurídica19 e da justa remuneração dos advogados20.
Em razão disso, a Lei 14.365/2022, introduziu o §8º-A no artigo 85, com o objetivo de orientar o arbitramento de honorários advocatícios com base em parâmetros mais objetivos. Essa mudança buscou assegurar maior previsibilidade e justiça na fixação de valores, especialmente em causas em que a remuneração se dá por equidade, oferecendo respaldo à atuação digna e proporcional dos advogados.
Todavia, atualmente, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado uma postura restritiva na aplicação do referido artigo em demandas de baixo valor econômico. Entre os fundamentos apresentados estão a necessidade de evitar desproporcionalidades, a não obrigatoriedade de seguir a tabela da OAB e a prevenção de eventuais abusos que possam beneficiar indevidamente o advogado.
Isto é, a inclusão do artigo 85, §8-A no CPC foi uma vitória legislativa destinada a trazer objetividade ao arbitramento de honorários. No entanto, sua efetividade tem sido minada pela jurisprudência, que frequentemente fixa honorários irrisórios, o que pode desvalorizar o trabalho da advocacia e comprometendo sua dignidade profissional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A discussão que norteou a presente pesquisa diz respeito aos questionamentos sobre eventuais critérios para a fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais, principalmente em relação à aplicação dos referidos honorários por apreciação equitativa.
Na legislação brasileira, o legislador se empenhou em fixar percentuais mínimos e máximos para a fixação dos honorários, de modo que também cuidou em trazer hipóteses específicas em que os percentuais não seriam aplicados. Contudo, dentre tais eventualidades, nunca foram mencionadas as causas de valor considerado expressivo, o que se presume que se enquadraria na norma dos percentuais específicos, uma vez que, se o legislador infraconstitucional quisesse estender a regra da fixação por equidade, teria, espontaneamente, incluído também as causas de grande valor.
Assim, a exceção a respeito da apreciação equitativa a que se refere o artigo 85, §8º do Código de Processo Civil abrange, expressamente, apenas as demandas cujo valor da causa for inestimável, irrisório ou muito baixo. Logo, por se tratar de uma excepcionalidade, não deveria esse entendimento ser aplicado por interpretação analógica ou ainda extensiva, como aconteceu em alguns tribunais antes do julgamento do Supremo Tribunal de Justiça sobre o tema.
Ademais, o argumento de violação ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade trazidos pelo artigo 8º do Código de Processo Civil, que foi usado para defender a fixação dos honorários de sucumbência por equidade, não deve de forma alguma ser usado para ferir as normas legais e princípios constitucionais, sendo que a exceção trazida pelo código visa impedir a desvalorização dos honorários advocatícios, de modo a amparar a remuneração dos advogados.
Conclui-se, portanto, que a fixação de honorários por equidade deve ser restrita às hipóteses previstas no artigo 85, §8º, do CPC, não se aplicando às causas de alto valor. A decisão do Superior Tribunal de Justiça reforça essa interpretação, garantindo a observância dos percentuais previstos no §2º e evitando desvirtuamentos que prejudiquem a justa remuneração dos advogados.
A inclusão do §8º-A no artigo 85 representa um avanço ao estabelecer critérios mais objetivos para o arbitramento de honorários. No entanto, a eficácia deste dispositivo depende de sua aplicação consistente pelos tribunais, de modo a assegurar previsibilidade, proporcionalidade e a valorização do trabalho da advocacia.
1O que é feito ou dado por honra por serviços prestados.
2BRASIL. Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994. Brasília, Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8906.htm. Acesso em: 26 mar. 2022
3OLIVEIRA, Antônio José Xavier. Linhas gerais acerca dos honorários advocatícios: generalidade, natureza alimentar, espécies e novo Código Civil. Jus Navigandi. Teresina, ano 12, n. 1288, 10 jan. 2007. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/9378>. Acesso em 26 mar. 2022
4CAHALI, Yussef Said. Honorários advocatícios. 3. ed. rev. amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 24
5BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agint no Resp nº 1.824.644. Relator: Ministro Herman Benjamin. Rio de Janeiro, RJ, 18 de outubro de 2019. 18/10/2019. Rio de Janeiro
6FERREIRA, Fabiane Maria Zarth. Honorários Advocatícios e o Princípio da Sucumbência na Justiça do Trabalho. 2012. 142 f. TCC (Graduação) – Curso de Direito, Centro Universitário Univates, Leajeado, 2012. Cap. 2. Disponível em: https://www.univates.br/bdu/bitstream/10737/432/1/FabianeFerreira.pdf. Acesso em: 24 abr. 2022
7WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MELLO, Rogério Licastro Torres de; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. 2524 p.
8SANTOS FILHO, Orlando Venâncio dos. O ônus do pagamento dos honorários advocatícios e o princípio da causalidade. Revista de Informação Legislativa, v. 35, n. 137, p. 31-39, jan./mar. de 1998. Disponível em: <https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/330/r137-04.pdf?sequence=4>. Acesso em 26 abr 2022.
9§ 1º Os honorários serão fixados na própria sentença, que os arbitrará com moderação e motivadamente. (Incluído pela Lei nº 4.632, de 1965).
10BRASIL. Lei nº 4.632, de 18 de maio de 1965. Brasília, DF, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4632.htm>. Acesso em: 26 abr. 2022.
11BRASIL. Lei nº 5.689, de 11 de janeiro de 1973. Brasília, DF, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869impressao.htm>. Acesso em: 26 abr. 2022.
12BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Brasília, DF, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 26 abr. 2022.
13Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa;
IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
14D’ÁVILA, Daniela Peretti; GONÇALVES, Mauro Pedroso. A relevância dos precedentes vinculantes do CPC/15 sob a ótica da Análise Econômica do Direito. Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 288, fev. 2019. p. 385
15BRASIL. Trf 3ª Região. Decisão nº Apelação Cível nº 0013979-81.2016.4.03.6100/SP. Relator: Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS. São Paulo, 20 maio 2019. Disponível em: https://trf-3.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/710014258/apelacao-civel-ap-139798120164036100-sp. Acesso em: 27 abr. 2022.
16BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp nº 1.877.883. Relator: Ministro OG Fernandes. Diário de Justiça Eletrônico. Brasília, 16 dez. 2021. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1342240688/recurso-especial-resp-1877883-sp-2020-0132871-0. Acesso em: 27 abr. 2022.
17Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
18Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
19XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
20Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 4.632, de 18 de maio de 1965. Brasília, DF, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4632.htm>. Acesso em: 26 abr. 2022.
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