REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10183251
Cleide Pinheiro Pantoja1
Ana Carina Ferreira Maia2
Rosane do Socorro Pantoja Rodrigues3
Francinete Souza Rodrigues4
RESUMO
As práticas docentes no ambiente escolar e as observações no cotidiano da comunidade em geral têm mostrado que a sociedade ainda reproduz práticas, condutas e comportamentos que indicam discriminação e preconceitos, inclusive de raça e, portanto, torna-se importante desenvolver reflexões para se elaborar propostas no sentido de superar esse cenário adverso. Este trabalho apresenta fatores e motivos para se qualificar melhor o trabalho dos professores em sala de aula com o intuito de apontar caminhos para a superação dos desafios que a pesquisa apresentou. Tal investigação foi baseada em uma revisão bibliográfica do objeto de estudo do presente artigo aliada à experiência docente da autora para demonstrar a notabilidade dos questionamentos apresentados. Verificou-se que, mesmo com grandes avanços, o debate e a consolidação de uma sociedade equitativa em termos raciais e a alfabetização acompanhada de Letramento, existe necessidade de se materializar mais práticas de combate ao racismo, à discriminação e ao preconceito e o Letramento Racial na Educação Infantil pode oferecer robusta contribuição nessa jornada. A partir dos resultados da pesquisa, constatou-se que existem muitas lacunas no âmbito das investigações acadêmicas no que se refere ao tema em questão e que há a necessidade de se promover formação continuada de professores para se alcançar os objetivos propostos de forma mais abrangente em termos de Letramento Racial na Educação Infantil.
Palavras-chave: Identidade racial; acessibilidade; diversidade; letramento racial; formação de professores; diferenças.
INTRODUÇÃO
O grande propósito dos professores (as) dos anos iniciais do Ensino Fundamental precisa ser, dentro da perspectiva social da escola, alfabetizar de forma que os alunos (as) sejam capazes de adquirir a percepção de sua própria existência, com pensamento lógico e crítico, desenvolvendo habilidades de interação, respeito, decisão e busca incessante de conhecimento. Nossa sociedade experimenta em sua fase contemporânea um conjunto de discursos e debates direcionados para concretizar a igualdade de direitos sociais e, nesse eixo, satisfazer os desígnios das questões raciais. Nesse sentido, abordar as questões raciais é uma prática indissociável das ações pedagógicas, dos planos de aula e do espaço escolar de modo geral. Nesse contexto, existem diversas possibilidades de inserção de comportamentos, condutas e diálogos para se empreender o Letramento Racial na Educação Infantil.
A pluralidade de pessoas que frequentam a escola, desde funcionários do setor administrativo, passando pelo corpo docente e discente, até os trabalhadores de serviços de apoio, faz com que as instituições de ensino convivam em um determinado espaço de tempo com circunstâncias que envolvam preconceito, racismo e discriminação, na medida em que os personagens que transitam pelo ambiente escolar trazem experiências de vida e especificidades culturais de outros círculos de convivência. Não raro registram-se palavras, olhares, práticas e silêncios que evidenciam situações de preconceitos e discriminação em um espaço que deveria primar pelo combate a essas atitudes. Portanto, a escola se apresenta como um ambiente auspicioso para discussões, atitudes, práticas e debates a respeito de identidades sociais de raça, possibilitando prover os alunos de um letramento racial que possibilite não só o reconhecimento de suas próprias identidades como também o respeito e valorização das identidades dos demais. E é o professor, na condição de mediador e proponente de conhecimentos, que precisa se posicionar e atuar no processo de construção de identidades no ambiente escolar.
É extremamente importante que os debates, as atividades e as atitudes referentes às questões raciais comecem já no período da infância nas escolas, promovendo comportamentos para que as crianças consigam identificar suas identidades e iniciem o entendimento do conceito de igualdade racial. Cavalleiro (1998) postula que é perfeitamente possível ver o racismo desde a infância, em especial na educação infantil, posto que pesquisas realizadas por essa referência bibliográfica demonstraram atitudes de discriminação entre crianças em relação à raça negra dos seus colegas de turma. E o mais grave é que “os educadores não perceberam o conflito que se delineava. Talvez por não saberem lidar com tal problema preferiram o silêncio” (CAVALLEIRO, 1998, p.11). Nesse ponto, é importante mencionar que preconceito e discriminação nem sempre têm sua origem no espaço escolar, podendo surgir nos círculos de amizade, no contexto familiar e em diversos setores da sociedade como um todo.
As instituições de ensino, por serem responsáveis pela educação e instruções formais de conhecimento, são uma possibilidade largamente viável de se discutir questões raciais. Todavia, estas precisam, para isso, serem propostas e apresentadas pelo corpo docente, mostrando a extrema importância de se construir e reconhecer novas identidades. Esse processo pode ser iniciado através de uma investigação empírica, no ambiente escolar de modo geral e na sala de aula em particular, dos possíveis contatos que as crianças experimentaram com livros que mostrem desenhos, imagens, fotos ou gravuras de protagonistas negros (as) e se conseguem descrever tais personagens. Tal descrição vai demonstrar como as crianças entendem as questões que envolvem diferenças raciais e, a partir disso, o professor (a) tem a obrigação de se posicionar de forma plural diante do que for exposto.
De acordo com o site da tvunespe, Nelson Mandela, o já falecido ex-presidente da África do Sul, vencedor do Prêmio Nobel da Paz em 1993, tido como o mais proeminente líder das questões raciais em seu país e considerado o fundador da moderna nação sul-africana, certa vez afirmou que “ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar” (tvunespe, 2022). Nesse sentido, a escola, entendida como um espaço social onde ocorrem os processos de ensino e aprendizagem das mais variadas temáticas do conhecimento precisa considerar também seu caráter etnográfico de educação.
Tal perspectiva pode ter um direcionamento por meio do Letramento Racial na Educação Infantil onde, em uma abordagem pedagógica, podem ser analisados livros de literatura infantil contendo meninas (os) negros(as) como protagonistas, de onde se desenvolverão atividades de leitura e escrita. E, em meio às práticas didático-pedagógicas, viabilizar debates que propiciem aos alunos a percepção das mensagens e informações que não são ditas claramente nos textos trabalhados em sala de aula e, assim, motivar os discentes nas práticas de reflexão sobre o que não se percebe abertamente. Por esse motivo (LUCKESI,1994) assevera que a função do professor é fundamental nesse processo para se realizar uma reflexão consciente e estimulante a respeito da importância dos movimentos sociais, manter a contenda pelos direitos de igualdade e, principalmente, sempre questionar as razões de tudo que se escreve nos livros tendo o contexto histórico como mote direcionador.
O estabelecimento e delimitação de escolhas e comportamentos, a maneira como se direciona o “olhar” sobre as pessoas, as crenças em “verdades” e a forma de pensar e agir são ações definidas pelo proceder no contato com o “outro”. E é assim que se constroem as identidades. O termo “identidades”, em sua forma plural, leva em conta a pesquisa desenvolvida por Hall (2011) que considera as relações sociais como o fator de construção das características que distinguem uma pessoa da outra e por meio das quais é possível se fazer individualizações. Todas as situações vivenciadas em sociedade, seja na família, na escola ou em qualquer outro lugar que permita convivências, podem interferir na construção das mais diversas “identidades”. No âmbito escolar, por exemplo, podem ser analisadas obras da Literatura Infantil para se buscar perceber de que maneira o negro é apresentado nas mesmas e assim promover a construção de identidades por meio do Letramento Racial.
A CONSTITUIÇÃO DO SER HUMANO É TÃO BIOLÓGICA QUANTO SOCIAL
Por sua complexidade, as noções de vida e ser humano envolvem diversas composições que vão do cunho biológico ao social. Entre moléculas e proteínas, também constituem os seres humanos toda a gama de vivência familiar, cultural e toda difusão de informação midiática experimentada em sociedade. Com isso, uma característica marcante dessa constituição humana é ser um processo infinitamente inacabado e, nesse sentido, faz-se extremamente necessária a constante reflexão a respeito do processo de construção de identidades. Em consonância com a afirmação de Melo (2015) que reconhece a complexidade de se tratar a questão racial no Brasil, pois no senso comum ainda predomina a ideia de sermos apenas seres biológicos, sendo a raça ou cor da pele um prenúncio de quem de fato somos, com o agravante de se basear o acesso a direitos e oportunidades por esse parâmetro, advém a importância de se implementar o Letramento Racial como forma de promoção da equidade das ocupações dos lugares sociais. É essa uma das razões mais preponderantes da necessidade de se ensinar tendo como base o letramento posto que, primordialmente, crianças já possuem seus questionamentos, mesmo na educação infantil, no que se refere ao pertencimento racial e às diferenças percebidas em relação ao outro.
É inegável, entretanto, que a temática das questões sociais avança em seus debates, pavimentando a adesão de defensores com a efetivação legal de políticas de igualdade racial. Com o passar dos anos, algumas políticas foram implementadas, no que se pode mencionar a Lei 10.639/2003 responsável pela instituição da obrigatoriedade do ensino da História e da Cultura Afro-brasileira na Educação Básica, tanto em escolas públicas quanto privadas. Vale lembrar também que o dia 20 de novembro foi incluído no calendário escolar como o Dia Nacional da Consciência Negra. Apesar desses avanços, ainda faltam mais ações de caráter pedagógico, onde didaticamente ocorra a apresentação de livros com personagens negros de forma autêntica e suscetível de aplicações práticas para que a criança negra possa experimentar o sentimento de protagonismo em uma sala de aula, sensação essa que vai se direcionar inevitavelmente para o convívio social. Tal percepção também é possível para a criança branca em relação à criança negra, contribuindo para melhorar a autoestima e assegurar o sentimento de valorização para todos.
Quando se pretende debater sobre raça no ambiente escolar, mais precisamente em sala de aula, a Literatura Infantil é uma aliada valiosa. Visto que, como afirma OLIVEIRA (2019), “a contação de histórias e as práticas de letramento(s) promovem um aprendizado significativo aos educandos, de modo que se tornam críticos e ativos para além do espaço escolar”. E assim, é premente a instituição metódica das discussões sobre questões raciais, onde também se pode incluir às relacionados ao gênero. O envolvimento efetivo da criança negra como protagonista nas representações de datas comemorativas, bem como primar pela presença de personagens negros nas narrativas de histórias, são caminhos para se alcançar bom nível de Letramento Racial na Educação Infantil. Urge a desmitificação do “padrão branco” perpetrado por princesas e príncipes não negros nas histórias infantis que há muito tempo vêm sendo contadas. Não se pode mais falar do negro apenas em abordagens estereotipadas ou somente quando há referências ao período escravocrata.
O LETRAMENTO RACIAL E O PAPEL DA LITERATURA INFANTIL
Em diversos debates e discussões no ambiente escolar, nota-se que o corpo docente reconhece a relevância de se trabalhar o Letramento Racial na Educação Infantil. Os professores (as) estão dispostos a elaborar e desenvolver práticas pedagógicas que promovam e facilitem o tema em questão e se propõem a realizar formação continuada como possibilidade de aperfeiçoamento de suas práticas docentes e, dessa forma, trabalhar com mais respaldo pedagógico conceitos como raça, gênero, diversidade, respeito e acessibilidade, partindo das propostas de letramento.
O Brasil ainda convive com um desafio em seu cotidiano em plena contemporaneidade: ser chamado de negro gera situações de embaraço e dificuldades em muitos locais como a escola e locais de trabalho ou mesmo círculos sociais e de amizades. Chega a ser desestimulante imaginar que pessoas com “feições brancas” conseguem os melhores empregos em função disso e, nas escolas, nota-se a ausência do protagonismo negro em datas comemorativas. Daí a urgente necessidade de se promover mais ainda o debate e as práticas de letramento racial nas escolas para a descoberta de possibilidades sociais por meio dos processos de ensino para combater o preconceito e a discriminação, visando a materialização dos preceitos de igualdade.
A Literatura Infantil tem um poder muito grande em relação às crianças no que se refere à fantasia e à imaginação. Dessa forma, os alunos (as) dos anos iniciais do ensino fundamental podem reconhecer seu pertencimento racial por meio da referida literatura e, fundamentalmente, construir identidades raciais positivas e, desde a infância, começar a construção de mecanismo emocionais e cognitivos de combate ao racismo. É sob essa perspectiva que Santiago (2015) aborda o papel indelével da educação para se atingir tais objetivos: O papel primordial da educação no que tange às relações étnico-raciais é tornar visíveis as diferenças, fazendo da educação infantil um espaço privilegiado de encontros de culturas, saberes, etnias e sujeitos, afirmando a pedagogia da infância como um instrumento para além da lógica única do colonialismo (SANTIAGO, 2015, p. 52). É perceptível que, para se buscar promover a igualdade, o processo educacional precisa enxergar as “diferenças”, na medida em que a educação que visa alcançar todos tem que levar em consideração as particularidades.
Em uma sala de aula de Educação Infantil, a utilização dos livros de literatura da referida faixa etária contribui de forma valiosa para a noção de identidade racial. Se faz necessário, entretanto, ir muito além disso e explorar as percepções dos alunos (as) após a leitura das histórias infantis contidas nos livros para, assim, desenvolver estratégias pedagógicas que promovam a construção de identidades raciais nas crianças, base para o Letramento Racial.
A IDENTIDADE RACIAL DAS CRIANÇAS E OS LETRAMENTOS
O universo conceitual onde o presente artigo se insere é muito vasto. Os sujeitos que compõem a estratificação social podem ser identificados por diversos termos que geram sua identidade como raça, cor, gênero, classe social, nível de ensino, profissão, habilidades, competências e tantos outros. E é exatamente o contato existente entre esses sujeitos que promove as transformações, posto que todo ser humano em convivência transforma e é transformado, apresentando vínculos criados pela socialização e jamais pelo isolamento. Esse processo é iniciado na infância, nas interações familiares para, em seguida, se prolongar para o espaço educacional nas escolas e para os ambientes de trabalho.
Referindo-se especificamente às interações ocorridas na escola, das quais os personagens são o professor (a), os colegas de turma e comunidade escolar de modo geral, nota-se uma oportunidade de se construir as identidades tanto das crianças brancas como das negras, na medida em que a identidade negra normalmente é percebida dentro de “uma construção social, histórica, plural e cultural” (GOMES, 2005, p.43). Depreende-se daí duas assertivas fundamentais que consistem em reconhecer o pertencimento à raça negra e valorização e aceitação do negro como conduta desenvolvida pelo branco.
Todo conceito construído de forma histórica, cultural e social precisa ser objeto de debates e discussões em um espaço formal de educação. Com o termo raça o processo não difere, pois é na escola que os alunos se “(re) conhecem positivamente como sujeitos pertencentes à determinada raça, inclusive, de modo mais específico, a raça negra” (OLIVEIRA, 2019, p. 62). Dessa forma, é necessário prover o conceito de raça de uma dimensão social e política para dar maior alcance perceptivo ao racismo, deixando, assim, bem explícito que ele existe e que jamais pode ser visto como alguma coisa “normal” e muito menos como algo cultural.
Nossa sociedade, de modo geral, de um “mal” hábito de fazer correlações entre os aspectos físicos visíveis na estética do corpo humano e os direitos, oportunidades e equidade social. Nesse sentido, “raça” precisa ser entendida como uma palavra de combate ao racismo, jamais vinculada exclusivamente à raça negra, na medida em que ela representa muito mais do que a cor, traços estéticos ou fenótipos. Como a inferência de Gomes (2005) aponta, falar de “raça”, no Brasil, ainda é de uma complexidade conceitual muito grande no que tange à “raça negra”, fundamentalmente quando o referido termo visa identificar ou fazem referência somente a indivíduos negros (GOMES, 2005, p. 44-45).
É inegável que os debates nos espaços educacionais acadêmicos e no âmbito dos movimentos sociais no que se refere à luta pela igualdade social e pelo o reconhecimento racial dos negros (as), têm construído caminhos significativamente positivos para a identidade racial dos agentes dessa luta. Em que pese esses avanços, ainda se faz necessário um alcance maior nas discussões a ponto de possibilitarem o respeito e valorização racial dos negros, não apenas por eles mesmos, mas também por parte dos brancos. Infelizmente, quando se fala em “raça” o imaginário popular remete a racismo, discriminação, tráfico negreiro, castigos e senzala. Dito de outra maneira, o indivíduo branco não faz reflexões a respeito da essência de seu grupo étnico e com isso tende a racionalizar os outros de forma negativa. É nesse ponto que emerge a necessidade de negros e brancos refletirem de forma conjunta sobre a ideia de raça.
Quando direcionamos esse debate para as crianças, tendo em vista que estas têm como essência a curiosidade, o cuidado e a necessidade de um esclarecimento mais abrangente são muito maiores. O entendimento da criança e pela criança de sua identidade racial e da identidade de seus semelhantes requer a conscientização por parte de pais, responsáveis e professores (as) de que na fase inicial de seu desenvolvimento o ser humano precisa aprender que não se pode ter preconceitos de nenhuma natureza e o ambiente escolar precisa criar condições propícias de ensino referentes às crianças viverem harmonicamente umas com as outras, sem considerar cor da pele, raça ou classe social.
Para que a identidade racial das crianças seja edificada de forma contundente, primordialmente a criança negra, o processo inerente a esse objetivo precisa ser ininterrupto porque a referida edificação é norteada a partir do que a criança vivencia, do que ela ouve e do que ela vê. Reside aí a necessidade de os professores (as) incluírem em suas estratégias pedagógicas práticas de combate ao racismo. Mesmo havendo normatização legal que garantam o trabalho didático em sala de aula a respeito de questões raciais, ainda há dúvidas, incertezas e receios no que diz respeito a como desenvolver esse trabalho docente. Surge então a necessidade da formação continuada de professores (as), além de uma formação acadêmica de qualidade, por meio de palestras, seminários e oficinas que trabalham pedagogicamente as questões raciais a fim de que os docentes adquiram condições e preparo para fazer com que as crianças negras, por meio do trabalho em sala de aula e pelo processo de ensino e aprendizagem, se vejam representadas de forma positiva nos meandros literários, na escola na sociedade e na mídia. Dessa forma, o Letramento Racial pode ser trabalhado em meio ao processo de alfabetização, onde a aquisição das habilidades do código escrito será acompanhada de oportunidades de interação entre as crianças, baseadas em leitura e escrita, o que implica em Letramento.
O conceito de letramento apareceu, no Brasil, na década de 1980, indicando o “despertar para a importância e necessidade de habilidades para o uso competente da leitura e da escrita” (SOARES, 2004, p. 7). Expandindo seu entendimento, o letramento, se apresenta como “(re)construir o sistema de representação, interagindo com a língua escrita e seus usos e práticas sociais” (SOARES, 2004, p. 11). Por seu turno, por “alfabetizar” entende-se apenas o desenvolvimento do aprendizado de leitura e escrita. Permitir que as práticas sociais sejam experimentadas pelos discentes, traz ao letramento um entendimento e significado mais abrangente. E o Letramento Racial aponta para um processo de ensino que envolva as questões raciais nas práticas docentes e estratégias pedagógicas desenvolvidas em sala de aula.
Fazendo da sala de aula um ambiente propício para as discussões a respeito das identidades sociais e raciais, os (as) professores (as) criam condições para o sentimento de pertencimento étnico-racial, permitindo uma reflexão cada vez mais crítica por parte dos alunos (as), onde o contexto existencial é o ponto de partida para se perceber de que maneira se pode reivindicar direitos e conquistar as condições aceitáveis de aceitabilidade social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O termo “considerações finais” não é muito adequado para o tema do presente artigo, posto que, nesse caso, a importância do Letramento Racial na Educação Infantil necessita de mais pesquisas e investigações de cunho acadêmico e científico. Além disso, na condição de permanentes pesquisadores em busca de um aprendizado que se mostra sempre incompleto, chegar a este ponto indica apenas que temos muito que aprender, debater e refletir sobre nossas práticas pedagógicas de letramento. Ainda que se tenha feito vários esforços no sentido de vincular a compreensão de alfabetização tendo como base o letramento, faz-se necessário ainda uma maior correlação das habilidades de manusear fonemas e letras com compreensão e participação dos alunos (as).
Mesmo com todas as limitações inerentes a esta pesquisa, entende-se que por meio do Letramento Racial na Educação Infantil podem-se formar alunos cidadãos preparados para interagir criticamente, com respeito às diferenças e harmonia nas convivências de toda forma, inclusive as de raça. A atuação politica e social tem embasamento no desenvolvimento do ensino da leitura e escrita em uma perspectiva abrangente em termos sociais, com consciência e respeito às identidades do “outro”, a fim de se atingir os mais elevados patamares da justiça e do igualitarismo em nossa sociedade.
Promover o Letramento Racial nas séries iniciais do ensino fundamental envolve grande relevância no direcionamento do trabalho do professor (a) em sala de aula, com o objetivo de refletir sobre racismo e sobre as raças negra e branca com o intento de se incluir, no contexto dos processos de ensino e aprendizagem o Letramento Racial na maioria das disciplinas do currículo escolar. Portanto, o professor (a) precisa se deparar, nos livros de literatura e materiais didáticos em geral, com protagonistas negros (as) para ter condições de construir uma representatividade racial positiva para o aluno negro. Ressaltamos que os indivíduos de raça negra precisam dessa representação, pois ao notar que as histórias da Literatura Infantil possuem personagens que se assemelham a ele (a), o aluno (a) negro (a), identifica elementos positivos que o fazem sentir confiante para se identificar perante seus colegas de turma e a sociedade em geral.
Algumas lacunas indicam os limites desta pesquisa e geram questionamentos que podem ser a motivação para futuras investigações acadêmico-científicas: A formação continuada de professores (as) se materializa na atualidade no que se refere a capacitações para se atuar de forma mais qualificada em sala de aula as questões raciais? As escolas estão desenvolvimento de maneira satisfatória planos de ensino que contemplem os letramentos raciais? Tais questionamentos mostram que ainda há muito que se refletir e pesquisar e o presente artigo representa uma pequena contribuição para a dinamização desse debate.
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1 Mestranda em Ciências em Educação na FACULTAD INTERAMERICANA DE CIENCIAS SOCIALES, Cametá, Pará, Brasil
2 Mestranda em Ciências em Educação na FACULTAD INTERAMERICANA DE CIENCIAS SOCIALES, Cametá, Pará, Brasil
3 Mestranda em Ciências em Educação na FACULTAD INTERAMERICANA DE CIENCIAS SOCIALES, Cametá, Pará, Brasil
4 Mestranda em Ciências em Educação na FACULTAD INTERAMERICANA DE CIENCIAS SOCIALES, Cametá, Pará, Brasil