A IMPORTÂNCIA DA REMIÇÃO DE PENA NA EXECUÇÃO PENAL

THE IMPORTANCE OF REMISSION OF SENTENCE IN PENAL EXECUTION

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410092328


Lilian Frassinetti Correia Cananéa1
Peterson Rodrigues Macêdo Vilar2


RESUMO

O artigo tem como proposta principal ressaltar a importância da remição de pena como instrumento apto a diminuir o tempo de cárcere, benefício ressocializador, com análise dos tipos de remição e os benefícios que o reeducando pode receber. E para conseguir atingir a proposta desejada, segue-se como objetivos específicos: compreender os vários tipos de remição, quer seja pelo trabalho, estudo, leitura e oficinas de arte. 

Palavras-Chave: Remição de pena; trabalho; estudo; leitura.  

ABSTRACT

The main purpose of the article is to highlight the importance of remission of sentence as an instrument capable of reducing the time of imprisonment, resocializing benefit, with analysis of the types of remission and the benefits that the re-educating person can receive. And to achieve the desired proposal, the following are specific objectives: to understand the various types of redemption, whether through work, study, reading and art workshops.

Key words: Remission of sentence; work; study; reading;

INTRODUÇÃO 

Após o processo judicial, com a finalização dada através da sentença condenatória, o indivíduo que foi responsabilizado penalmente, deve seguir para o cumprimento da sentença, conforme diretrizes estabelecidas na sentença tendo sempre como fundamento o sistema legal pátrio para fins de ressocialização.

No âmbito do cumprimento da pena, a Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 estabelece alguns elementos que podem beneficiar o detento, no sentido de abreviar a sua sentença penal. Destaca-se ainda, que este processo se baseia em direito que é constitucionalmente assegurado ao indivíduo condenado penalmente. Nesse sentido, se apresenta a seguinte questão problema: o instituto da remição da pena apresenta uma importância no âmbito da ressocialização do apenado a partir da abreviação da pena?

Para conseguir responder ao presente questionamento, segue como objetivo geral analisar se o instituto da remição da pena apresenta uma importância no âmbito da ressocialização do apenado a partir da abreviação da pena. E para conseguir atingir a proposta desejada, segue-se como objetivos específicos: compreender os vários tipos de remição, quer seja pelo trabalho, estudo, leitura e oficinas de arte.

Através deste artigo, vamos tratar da questão da remição de pena, benefício previsto na Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, em suas várias modalidades, com a finalidade de destacar os avanços que vem tendo ao longo dos anos e o quanto contribui para a ressocialização dos reeducandos durante o cumprimento da pena. 

 Considerações gerais sobre a lei de execução penal – 7.210/84.

Para iniciar o estudo, indica-se como essencial a leitura e reflexão do artigo 1º da Lei 7.210/84 que se encontra disposto da seguinte forma:

Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”  (BRASIL, 1984)

Extrai-se do artigo, a existência de dois objetivos da execução da pena. O primeiro é tornar exequível a sentença penal condenatória e o segundo, e mais importante, a recuperação do reeducando, que deverá ser preparado para o retorno ao convívio social. 

A recuperação do reeducando deve ser não só uma preocupação do Estado, como órgão executivo, responsável pela execução da pena, mas de todos, incluindo-se o Poder Judiciário, o Ministério Público, Defensoria Pública, atores mais presentes na vida carcerária, mas também a sociedade como um todo, através dos clubes de serviços, pastoral carcerária, entre outros, já que não existe no Brasil a prisão perpétua, e um dia o reeducando deverá retornar a sociedade, ao convívio social, e é preciso que esse retorno seja melhor do que quando ingressou no sistema carcerário. E para que isso ocorra de forma positiva, é imprescindível que os mecanismos necessários sejam disponibilizados na unidade prisional. 

Nesse sentido, sobre o tema, indica-se o posicionamento de Mossin et al (2011 p.18) 

“Sem dúvida, se com os mecanismos postos a serviço dos estabelecimentos prisionais o condenado conseguir se ajustar ao meio social em que vive, e se a pena atingir seu fim pedagógico, que compreende sua reintegração social, a “sanção legal” terá atingido sua meta principal. Por conclusão, a pena na sistemática nacional deve ser considerada ponto de vista retributivo, de prevenção especial e social, bem como de reintegração da pessoa que cometeu a infração típica.” 

Um dos pontos principais tratados na Lei de Execução Penal, é o trabalho do preso. Importante ferramenta na vida carcerária, como forma de se investir na ressocialização. Vejamos:

“Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.

§ 1º Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à higiene.

§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

 Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário-mínimo.

§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:

a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;

b) à assistência à família;

c) a pequenas despesas pessoais;

d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.

§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.”

Existe um brocardo popular muito conhecido e que deve ser sempre lembrado: “mente vazia é oficina do diabo.” É fato que qualquer atividade laborativa, quer seja de caráter intelectual ou manual, dignifica o homem, e em relação ao preso não se pode pensar diferente. 

Estando preso, privado da liberdade, tanto o trabalho como o estudo, leitura, oficinas de arte, podem livrá-lo do ócio e contribuir para que possa retornar mais cedo ao convívio social, além de ter uma remuneração paga pelo Estado pelo trabalho desenvolvido, o que na maioria das vezes, ajuda a família a se manter enquanto se encontra recluso, já que são poucos os que estavam trabalhando quando foram presos e terão direito ao auxílio-reclusão. 

Infelizmente as vagas disponibilizadas para que os reeducandos trabalhem de forma remunerada, na unidade prisional, são poucas. Estima-se que pouco mais de 20% da população carcerária exerce atividade remunerada dentro das unidades, e por esse motivo, passou-se a disponibilizar e admitir diversos tipos de trabalhos e estudos, a fim de que os reeducandos possam ter direito a remir a pena e possam abreviar o tempo de cumprimento de pena em regime fechado. 

1 Considerações sobre remição de pena

De acordo com o especificado por Renato Marcão, compreende-se como remição de pena:

“A palavra “remição” vem de redimere, que no latim significa reparar, compensar, ressarcir, É preciso não confundir “remição” com “remissão”, esta, segundo o léxico, significa ação de perdoar” (Marcão, 2024 p.149)

Ainda no mesmo sentido, é possível definir a remição de pena, na lição do Prof. Júlio Fabbrini Mirabete, como sendo:

“…direito do condenado em reduzir pelo trabalho prisional ou pelo estudo o tempo de duração da pena privativa de liberdade.” E nessa Obra, cita Everardo da Cunha Luna, paraibano de Campina Grande: “se o homem não pode extinguir materialmente a má ação que praticou, pode, contudo, espiritualmente, apagá-la em sua maldade, contanto que os atos por ele praticados e a ela posteriores, estejam animados dos valores necessários à sua redenção.” 

É através da remição de pena que o reeducando se preparar para o retorno à sociedade, além de diminuir o tempo de cárcere. Um importante benefício ressocializador. 

A remição de pena foi instituída pela Lei n. 7.210/84, Lei das Execuções Penais, através do art. 126, que de início, apenas previu a remição de pena pelo trabalho, mas doutrinas e jurisprudências já admitiam o estudo como remição, e através da Lei n. 12.433, de 29.06.2011, foi incluído o estudo como forma de remição de pena, e hoje o artigo se encontra assim redigido:

“Art. 126 – O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou estudo, parte do tempo de execução de pena. 

§ 1o  A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:

I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias; 

II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho. 

§ 2o  As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados. 

§ 3o Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem. 

§ 4o O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.

§ 5o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação. 

§ 6o O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.

§ 7o O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar. 

§ 8o A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.”

2 Considerações gerais sobre remição pelo trabalho

A cada 03 (três) dias de trabalho, o reeducando abate 01 (um) dia de pena.

O trabalho interno se desenvolve dentro da unidade prisional, existindo os casos dos que trabalham como auxiliares de serviços, incluindo-se a parte da cozinha, da limpeza, horta, entre outros trabalhos necessários à manutenção da unidade prisional. Vários serviços são realizados com a mão de obra dos detentos, muitos são pedreiros, eletricistas, pintores, utilizando-se uma mão de obra boa e que ajuda o reeducando a remir parte da pena. 

A jornada de trabalho deverá ser no mínimo de 06 (seis) horas e no máximo 08 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados, mas nem sempre é possível, como, por exemplo, nos casos dos reeducandos que prestam serviços na cozinha e na limpeza. São serviços que exigem uma continuidade, não podem parar e a jurisprudência já admite o trabalho de domingo a domingo. Neste sentido:

“HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELO TRABALHO. ARTS. 33 E 126 DA LEP. ATESTADO DO DIRETOR DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL NO SENTIDO DE QUE O PACIENTE TRABALHOU AOS DOMINGOS E FERIADOS. DIREITO AO BENEFÍCIO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM DE OFÍCIO CONCEDIDA. 

“A remição da pena pelo trabalho, nos termos do art. 33, c/c 126, § 1º, da LEP, é realizada à razão de um dia de pena a cada três dias de trabalho, cuja jornada diária não seja inferior a 6 nem superior a 8 horas, o que impõe, para fins de cálculo, a consideração dos dias efetivamente trabalhados, incluídos os domingos e feriados. 

“Na espécie, de acordo com o Relatório emitido pela Diretora do estabelecimento prisional, o paciente trabalhou, ininterruptamente, por 97 (noventa e sete) dias, incluídos os domingos e feriados, fazendo, portanto, jus ao direito à remição da pena pelo trabalho em todo o período assinalado.” Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a decisão do Juízo das Execuções Penais. ((STJ, Quinta Turma, HC 346.948/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2016)”

A Lei de Execução Penal não faz distinção em relação ao tipo de trabalho, e assim vários tipos de trabalho são admitidos para fins de remição de pena, inclusive os manuais. E um dos mais comuns, diante da ausência de políticas públicas dentro da unidade prisional que possibilitem a reintegração social de uma melhor forma, e que a princípio gerou muita controvérsia, foi o artesanato. 

A preocupação da Lei de Execução Penal é de que o reeducando possa trabalhar, e que esse trabalho possa ser útil quando ele sair da unidade prisional, no sentido profissionalizante.

3 A remição pelo trabalho com artesanato

A Lei n. 13.180, de 22.10.2015, conceitua o que vem ser a profissão de artesão e o artesanato. E através da Portaria n.1.007 – SEI, publicada no Diário Oficial da União, de 01.08.2018, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, nos seus art. 8o, e 19o, definem, respectivamente, o que vem a ser artesão e artesanato: 

“Art. 8º Artesão é toda pessoa física que, de forma individual ou coletiva, faz uso de uma ou mais técnicas no exercício de um ofício predominantemente manual, por meio do domínio integral de processos e técnicas, transformando matéria-prima em produto acabado que expresse identidades culturais brasileiras.”

“Art. 19. Artesanato é toda produção resultante da transformação de matérias-primas em estado natural ou manufaturada, através do emprego de técnicas de produção artesanal, que expresse criatividade, identidade cultural, habilidade e qualidade.”

Durante a realização de mutirões carcerários no Estado da Paraíba, é comum encontrar nas unidades prisionais, peças de artesanato produzidas pelos internos. Alguns até participam de feiras de artesanato no Estado. Encontramos reeducandos que são verdadeiros artesãos, com muita habilidade em trabalhos manuais com madeira, palitos de picolé, papel, na arte do origami, entre outros. 

E nada mais justo que seja considerado este tipo de trabalho para fins de remição de pena. As decisões foram evoluindo e hoje na grande maioria das Comarcas, o artesanato já vem sendo aceito para fins de remição. A jurisprudência, a princípio, era tímida, com muitas restrições, mas hoje se encontra mais ampla. Vejamos: 

“AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA. TRABALHO ARTESANAL EM AMBIENTE PRISIONAL. POSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO NESTE STJ. AGRAVO DESPROVIDO. I – Assente nesta Corte que “os sentenciados que cumprem pena no regime semiaberto ou fechado têm direito à remição da pena pelo trabalho, consoante a previsão legal do art. 126 da Lei de Execução Penal . Precedentes” (AgRg no REsp 1.505.182/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 11/5/2018). II – No caso em apreço, observa-se que o reeducando efetivamente exerceu o trabalho artesanal, tendo sido essa tarefa devidamente atestada pela administração carcerária. Por tal motivo, esta Quinta Turma entende que “descabe ao intérprete opor empecilhos praeter legem à remição pela atividade laboral, prevista pelo citado art. 126 da Lei de Execução Penal, uma vez que a finalidade primordial da pena, em fase de execução penal, é a ressocialização do reeducando” (AgRg no REsp 1.720.785/RO , Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 11/5/2018). III – Embora as memoráveis considerações tecidas pelo d. agravante, o entendimento já consagrado pela jurisprudência desta eg. Corte impõe a manutenção do decisum agravado, por seus próprios fundamentos. Agravo regimental desprovido. (STJ – Agravo Regimental no Habeas Corpus 671172 RS 2021/0170673-2 04.11.2022).

  A princípio muito se discutiu sobre a necessidade do artesanato possuir expressão econômica, já que a intenção do trabalho do reeducando também é prepará-lo para a vida quando sair da unidade prisional. Entende-se, assim, que o trabalho do preso deve ser útil a ponto de garantir o aspecto de ocupação diária, tirando-o do ócio, mas também e sobretudo, para prepará-lo para o mercado de trabalho. Então, ainda existem muitos doutrinadores que não aceitam qualquer tipo de trabalho de artesanato. Vejamos a lição de Rafael de Souza Miranda:

“Na designação do trabalho, deverá ser limitado, tanto quanto possível, o artesanato sem expressão econômica, salvo nas regiões de turismo. A razão reside na necessidade de se atribuir ao sentenciado atividades laborais que realmente impliquem em abertura de campo de trabalho futuro, reinserindo-o no mercado de trabalho. Trabalhos artesanais sem expressão econômica não têm o viés de qualificação profissional que se espera. (Manual de Execução Penal, 7a. Edição, 2024, p. 65)

A Lei de Execução Penal está certa quando exige que o trabalho do preso deve ter duplo aspecto, manter o preso ocupado durante os dias úteis, e ao sair, ter uma profissão que o permita se manter de forma lícita, e que seja remunerado – art. 29 e 32, ambos da LEP. O trabalho do artesanato sem o viés financeiro, será apenas uma distração, no entanto, já se passou a admitir a aceitação do artesanato sem a expressão econômica, desde que o preso se submeta a jornada de trabalho, de 06 a 08 horas, controlado, e atestado pela direção da unidade prisional, como uma forma de ajudá-lo na ressocialização e na diminuição da pena. E assim foi preciso agir em razão da falta de projetos que proporcionem trabalho remunerado. 

A dificuldade de controlar a frequência e o trabalho feito pelos reeducandos foi outro problema que surgiu, pois muitos faziam na própria cela, o que ficava inviável se atestar quem realmente teria feito a peça, mas já existem unidades prisionais no País, notadamente no Estado da Paraíba, que dão o devido valor ao artesanato, colocando-os para que façam o trabalho em celas específicas, onde trabalham durante o dia, e a noite se recolhem na cela de morada. Sabemos das dificuldades de se colocar em cela separada, em razão da situação da superlotação carcerária, mas onde é possível ser feito, é o ideal. 

“REMIÇÃO. TRABALHO ARTESANAL EM CIDADE NÃO TURÍSTICA. IRRELEVÂNCIA. ART. 32, §1º, DA LEP, QUE NÃO REPRESENTA VEDAÇÃO INCONTORNÁVEL. Inadmissibilidade de interpretação restritiva de trabalho. Cumprimento de pena em estabelecimento inadequado. Local que não lhe permitia outro tipo de trabalho. Impossibilidade, ademais, de se abusar da boa-fé do preso que se dispõe a trabalhar. Benefício mantido. Recurso não provido. Se o trabalho não tivesse valor para fins de remição, deveria o condenado ter sido lembrado previamente a respeito. Não há como abusar da boa-fé do preso que, colaborando na própria reeducação, se dispõe a trabalhar. Ademais, deve ser permitido o trabalho artesanal se não for possível a execução de outras tarefas diante da impossibilidade de recursos materiais da administração. (Agravo 216.450-3, Caçapava/SP – 2ª CCrim. Rel. Des. Silva Pinto – j. em 02/12/1996, v.u. Boletim do IBCrim53/Jurisprudência, abr. 1997,189.) 31 AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA. TRABALHO ARTESANAL. VALIDADE. FOLHA DE FREQUÊNCIA REGULARMENTE ASSINADA. 1. O desempenho de atividade de artesanato é válido para fins de remição da pena, quando o estabelecimento penitenciário não oferece ao reeducando a realização de outro tipo de labor. 2. os relatórios de frequência ao serviço, devidamente assinados pelo coordenador da unidade prisional, são idôneos para a comprovação dos dias efetivamente trabalhados, não podendo ser imputado ao agravado a responsabilidade por eventual deficiência e precariedade no controle e supervisionamento da carga horária laborada, no entendimento da súmula n 10 deste Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. Agravo conhecido e desprovido. (TJGO, Agravo em Execução Penal 204310-20.2015 .8.09.0000, rel. Des. Itaney Francisco Campos, 1a Câmara Criminal, julgado em 18/08/2015, DJE 1868 de 14/09/2015). 

Ainda se discute muito a forma como a remição deverá ser contabilizada para os fins do artesanato. Existem comarcas que disciplinam através de Portaria, pelo número de peças, e até pela confecção de número de bolas, tendo em vista alguns convênios com indústria de material esportivo, como temos no Estado da Paraíba, o que termina por ser um critério injusto, tendo em vista a dificuldade que alguns reeducandos têm para a confecção das peças ou das bolas, diferente de outros que tem mais habilidades. O critério mais justo, sem dúvida, é considerar como um trabalho comum, com 08 (oito) horas diárias, excluindo-se o final de semana e feriados. Vejamos as seguintes decisões:

“Agravo em execução. Remição. Comprovação de dias trabalhados. Costura de bolas. 1. Para fins de comprovação do efetivo trabalho é suficiente o atestado emitido pela casa prisional. Ademais, não encontra qualquer amparo legal a exigência de um número mínimo de bolas costuradas para que sejam declarados remidos os dias trabalhados. Exigência que, além de desprovida de amparo legal, mostra-se irrelevante diante da complexidade típica da sociedade contemporânea, marcada principalmente pelo avanço tecnológico (por colagem térmica) e pela consequente atribuição de tarefas braçais a máquinas e robôs de última geração. Atividade que não agrega nada ao detento e não o qualifica para o desempenho de atividades típicas da sociedade contemporânea. A remição dos dias trabalhados independe de quantas bolas foram efetivamente costuradas. Depende, sim, de verificar se os apenados realmente trabalharam nesses dias, o que, segundo a LEP, compete à casa prisional, não podendo, eventual deficiência de pessoal – ou mesmo organizacional – justificar a estipulação de critérios outros, em nítido prejuízo dos apenados que levam mais tempo para costurar as bolas. 3. Trabalhos como a costura de bolas por detentos são absolutamente obsoletos, característicos do medievo, típicos de um tempo que não é o nosso e que não vão inserir os detentos, de forma importante, no mercado de trabalho. Situação reveladora da parada temporal do sistema penitenciário. Recurso desprovido.” (AE n. 70036991826, j, em 29.07.2010 – RJTERSGS 278/139). 

“O sentenciado José Mauro Diniz cumpre pena de 06 anos e 06 meses de reclusão, em regime fechado, por infração ao art. 213, parágrafo único, combinado com o art. 224, alínea a, ambos do Código Penal, e o MM. Juiz das Execuções Criminais de Caçapava lhe remiu 131 dias da pena pelo trabalho executado na Cadeia Pública local. Os documentos que instruem o agravo revelam que o sentenciado executava, com regularidade, trabalhos manuais, fabricando casinhas, barcos, porta-retratos, porta-isqueiros, porta-joias, cadernos, etc, observando uma jornada de 8 horas – das 7:00 às 9:00 e das 12:00 às 18:00 horas. O trabalho desenvolvido pelo sentenciado pode ser considerado manual-artesanal, que não é totalmente vedado, para fins de remição de pena, pelo art. 32, parágrafo 1o, da Lei de Execução Penal. O dispositivo apenas manda limitar, o máximo possível, o artesanato sem expressão econômica, ressalvando nas regiões de turismo, onde não se exige essa limitação. Mas a limitação, evidentemente, está endereçada aos estabelecimentos penais dotados de recursos materiais, capazes de possibilitarem ao preso, atividades laborativas diversificadas e de relevância econômica. Não é o caso dos autos, onde o trabalho manual-artesanal é o único possível, dada à notória falta de meios materiais da Cadeia Pública. A circunstância de o sentenciado está cumprindo pena em Cadeia Pública, reservada a presos provisórios, e, não, em estabelecimento penal adequando, não se deve à vontade dele, e, sim, à desídia da Administração Pública, não sendo, pois, de justiça, que se penalize aquele por tal circunstância. Não se pode, assim, deixar de acolher a remição em casos como este, pois atende ao escopo de incentivar o preso a trabalhar, a evitar a ociosidade, mãe de todos os vícios, ao mesmo tempo em que se desenvolve uma terapêutica penal.” (AE 219.139.3.7 – TJ – SP – Rel. Hélio de Freitas). (Execução Penal, Julio Fabbrini Mirabete, Editora Atlas, 12a edição, pág. 566). 

4 Considerações sobre remição pelo estudo

Como já mencionado, a Lei de Execução Penal (7.210/84) não previu, de início a remição pelo estudo, apesar de prevê que o direito à educação do preso, era dever do Estado, prevendo apenas a remição pelo trabalho. 

Ocorre que, os Tribunais passaram a entender que não só o trabalho, esforço manual, mas também, o intelectual, deveria contar para fins de remição, aplicando-se, ao art. 126, caput, da Lei n. 7.210/84, redação anterior, a possibilidade de remição pelo estudo. E a interpretação jurisprudencial foi formalizada através da Lei n. 12.245, de 25.05.2010, tornando obrigatória a instalação de salas de aulas nas unidades prisionais, destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante. 

E a Lei n. 13.163/2015 introduziu o ensino médio, regular ou supletivo. E definitivamente resolvido através da Lei n. 12.433/2011, que alterou o art. 126, da LEP incluir a normatização pelo estudo. Atualmente, a formação vai desde o ensino fundamental e médio até o profissionalizante, superior, podendo ser, inclusive, a distância. Foi uma grande evolução. E a cada 12 horas de estudos, o reeducando poderá remir 01 dia de pena. 

O Conselho Nacional de Justiça, através da Recomendação n. 44/2013, de 26.11.2013, disciplinou a remição pelo estudo nas unidades prisionais, além de admitir a leitura. E através dessa recomendação, também disciplinou o parágrafo 5o, do art. 126, que prevê o acréscimo de 1/3 às remissões, em caso de conclusão de cursos fundamental, médio e superior. 

Durante a realização de um dos mutirões carcerários, no Presídio da Comarca de Sapé, Paraíba, no ano de 2015, foi muito gratificante presenciar um grupo de reeducandos que assistiam filmes educativos, motivacionais, e ao final, debatiam e faziam um resumo sobre o filme assistido, em torno de 04 horas por semana. 

Também na mesma unidade prisional, existia um grupo musical de pagode, que se reuniam uma a duas vezes por semana, para estudar música. E na época, foi considerado como “oficina de arte” e concedido remição de pena por entender que não apenas o estudo regular seria possível a concessão da remição, mas também práticas sociais não escolares. Posteriormente foram reconhecidas como práticas sociais educativas. 

 Atualmente essas práticas sociais educativas se encontram em várias unidades prisionais da Paraíba, e assim são considerados, o coral, grupo musical, grupos de teatros, muito válido para a ressocialização dos reeducandos e válidos para fins de remição de pena, o que no caso, a contagem é por hora, e a cada 12 horas, 01 dia de remição de pena. Sobre o assunto observa-se que:

“Ainda como resultado dessa interpretação analógica in bonam partem da norma prevista no art. 126 da LEP, e partindo da premissa de que o rol das atividades aí listadas não é taxativo, pois não descreve todas as atividades que poderão auxiliar no abreviamento da reprimenda, há precedentes do STJ admitindo o direito à remição inclusive em virtude de atividades realizadas em coral. Isso porque, além do aprimoramento cultural proporcionado ao apenado, o meio musical também promove sua formação profissional nos âmbitos cultural e artístico, é dizer, trata-se de atividade que profissionaliza, qualifica, capacita o apenado, afastando-o do ócio e da prática de novos crimes, enfim, reintegrando-o à sociedade, assemelhando-se, sob esse ponto de vista, ao trabalho e ao estudo.” (Renato Brasileiro de Lima, Manual de Execução Penal – Volume único, Editora Jus PODIVM, 3a. Edição, 2024, pág. 382).

Posteriormente, atualizando a Recomendação anterior, o CNJ – Conselho Nacional de Justiça, editou a Resolução n. 391, de 10 de maio de 2021 e disciplinou três tipos de atividades educacionais que podem ser realizadas durante o encarceramento: educação regular, práticas educativas não escolares e leitura. 

A EDUCAÇÃO REGULAR ou PRÁTICA SOCIAL EDUCATIVA ESCOLAR se dá por meio das escolas que são instaladas nas unidades prisionais, organizadas pelo sistema oficial de ensino, que ocorrem de modo presencial, mas também pode ocorrer on line, como na época da PANDEMIA COVID-19, com monitoramento e acompanhamento da frequência. 

Muito utilizado nas unidades prisionais é o EJA – Ensino para Jovens e Adultos, voltado para a alfabetização. PRÁTICA SOCIAL EDUCATIVA NÃO ESCOLARES – são atividades desenvolvidas de autoaprendizagem ou de aprendizagem coletiva, de natureza cultural, esportiva, capacitação profissional, entre outros. Entre essa prática podemos destacar a remição pela aprovação no ENEM – Exame Nacional de Ensino Médio e o ENCCEJA – Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos que muito reeducandos vem se submetendo nas unidades prisionais, e podem remir pela aprovação total ou parcial. Vários reeducandos do Estado da Paraíba estão cursando o curso superior, através de Ensino a Distância, após aprovação no ENEM. 

5 Considerações sobre a remição pela leitura

A remição pela leitura merece um destaque especial. A muito tempo que a jurisprudência já admitia, e terminou que o CNJ, inicialmente, através da Recomendação n. 44/2013, disciplinou, e posteriormente, pela Resolução n. 391/2021. E hoje, a maioria dos Presídios contam com bibliotecas, disponibilizando livros, na maioria, da nossa literatura brasileira, bem como de autoajuda, aos reeducandos para que possam fazer uma leitura e em seguida um resumo. O reeducando é orientado através de uma comissão, formada pelo juiz da execução penal. 

Os livros, geralmente, de poucas páginas, ficam com os reeducandos por prazo de 15 a 20 dias, e após o término da leitura, fazem um pequeno resumo do que entenderam. O resumo é corrigido pela comissão e vai para o Juiz da Execução Penal, que após o parecer do Promotor de Justiça, poderá conceder 04 dias de remição pelo resumo, podendo, durante o ano, fazer a leitura de um livro por mês ao final do ano, remir 48 dias. 

Considerações finais

O estudo compreendeu a análise das remições de pena, instituto ressocializador dos mais eficientes, implantados na execução penal. E como se viu, não existe um rol taxativo, pode e deve surgir outros tipos de remição de pena a fim de proporcionar mais dignidade aos reclusos do regime fechado e semiaberto. 

E uma ação que deve ser pensada e colocada em prática deve ser a doação de sangue e de medula óssea pelo reeducando do sistema prisional. Tramitaram alguns projetos de lei, mas não lograram êxito até o momento. Ajudaria a resolver uma questão crítica que existe com falta nos bancos de sangue, inclusive com a situação de plaquetas, e daria ao reeducando, o direito não só a remição, bem como a praticar uma ação nobre. Muito ainda a se fazer. Muito ainda a se construir. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

BRASIL – TJGO – Agravo em execução penal n. 204310.20.2015.8.09.0000, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, julgado em 18.08.2015.

BRASIL – TJRS – AGV n. 7003691826, julgado em 20.08.2010.

BRASIL – TJSP – AE n. 219.139.2.7 – Caçapava, Relator Des. Hélio de Freitas (extraída do livro Execução Penal, Julio Fabbrini Mirabete, 12a edição, pág.566).

BRASIL – Lei n. 7.210/84.

BRASIL – Portaria 1.007-SEI

BRASIL – STJ – Agravo Regimental no HC 671172, 04.11.2022.

BRASIL – STJ – Quinta Turma, HC 346.948/RS, Relator Ministro Reynaldo Soares Fonseca, julgado em 21.06.2016.

LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Execução Penal, Editora Jus PODIVM, 2024, pág. 382.

MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal, 21a edição, 2024, Editora Saraiva, pág. 149.

MIRABETE.  Júlio Fabbrini, Execução Penal, Editora Atlas, 15a. Edição, pág. 371/372.

MIRANDA.  Rafael de Souza, Manual de Execução Penal, 7a edição, 2024, pág. 65.

MOSSIN, Heráclito Antônio. Execução Penal, Aspectos Processuais, pág. 18, Editora Mizuno, 2011.


1Juíza de Direito da 1ª Vara de Santa Rita/PB, Coordenadora dos Mutirões Carcerários – GMF/PB e pós-graduada pela Faculdade Legale em Direito Público.
2 Mestre em Gestão em Organização Aprendentes pela Universidade Federal da Paraíba.