REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202505232353
Alice Gruetzmann Dill¹
Marcia Mariza Weigner Grasel²
RESUMO
A estimulação precoce destaca-se como uma prática estratégica na promoção do desenvolvimento integral de crianças na primeira infância, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade ou com deficiências. Este artigo, do tipo revisão bibliográfica, teve como objetivo analisar a importância da intervenção pedagógica nesse processo, mapeando políticas públicas, identificando estratégias eficazes e refletindo sobre o papel docente. A metodologia consistiu em uma revisão qualitativa de produções acadêmicas entre 2015 e 2024, selecionadas em bases científicas reconhecidas. Os resultados evidenciam que a intervenção pedagógica, quando realizada de forma intencional, interdisciplinar e integrada com as áreas da saúde e assistência social, contribui para ganhos significativos nos aspectos motor, cognitivo e socioemocional das crianças. Estratégias como musicalização, uso de recursos sensoriais e atuação docente planejada mostraram-se fundamentais para garantir uma educação inclusiva e equitativa. Conclui-se que a estimulação precoce deve ser entendida como uma política pública articulada, e que a formação e o protagonismo do professor são determinantes para a sua efetivação no ambiente escolar.
Palavras-chave: Estimulação precoce. Educação infantil. Intervenção pedagógica. Inclusão. Desenvolvimento infantil.
ABSTRACT
Early stimulation stands out as a strategic practice in promoting the integral development of children in early childhood, especially those in vulnerable situations or with disabilities. This article, based on a bibliographic review, aimed to analyze the importance of pedagogical intervention in this process by mapping public policies, identifying effective strategies, and reflecting on the role of teachers. The methodology consisted of a qualitative review of academic productions from 2015 to 2024, selected from recognized scientific databases. The results show that pedagogical intervention, when carried out intentionally, interdisciplinarily, and in integration with the fields of health and social assistance, contributes to significant gains in children’s motor, cognitive, and socio-emotional development. Strategies such as musicalization, use of sensory resources, and planned teaching performance proved essential to ensuring inclusive and equitable education. It is concluded that early stimulation should be understood as an articulated public policy, and that teacher training and leadership are crucial for its effective implementation in school settings.
Keywords: Early stimulation. Early childhood education. Pedagogical intervention. Inclusion. Child development.
INTRODUÇÃO
A estimulação precoce configura-se como uma abordagem estratégica e sistematizada voltada ao desenvolvimento integral de crianças na primeira infância, especialmente aquelas com deficiências ou em risco de atraso no desenvolvimento. Trata-se de um conjunto de ações interdisciplinares que visam potencializar habilidades motoras, cognitivas, emocionais e sociais, promovendo o desenvolvimento neuropsicomotor e assegurando melhores condições de aprendizagem e inclusão social (SILVA et al., 2022; GARCIA et al., 2022). Ao longo das últimas décadas, essa prática tem ganhado visibilidade nas políticas públicas e na atuação pedagógica, notadamente no contexto da educação infantil e do atendimento educacional especializado (CAMIZÃO et al., 2023).
Considerando a importância da intervenção precoce para bebês prematuros, crianças com síndrome de Down ou transtorno do espectro autista (TEA), a literatura aponta para a eficácia da atuação integrada de profissionais da educação, saúde e assistência social. A intervenção pedagógica ganha destaque nesse cenário como promotora de experiências significativas, contribuindo para a construção de vínculos afetivos, a adaptação dos ambientes educativos e a mediação de aprendizagens por meio do brincar, da musicalização e de práticas sensoriais (BRANCO et al., 2024; BRUSSOLO et al., 2023; GOMES et al., 2019).
Delimitando o tema, este artigo propõe investigar de que forma a intervenção pedagógica pode favorecer a estimulação precoce em crianças na educação infantil, com foco especial nos sujeitos público-alvo da educação especial. A problemática central consiste em compreender como as práticas pedagógicas podem atuar de maneira eficaz no desenvolvimento das capacidades dessas crianças, promovendo sua inclusão no ambiente escolar regular desde os primeiros anos de vida.
Diante dessa questão, parte-se da hipótese de que a mediação pedagógica intencional, pautada em estratégias integradas com as áreas da saúde e da assistência social, pode ampliar as possibilidades de desenvolvimento das crianças com atraso ou deficiência, tornando o processo educativo mais acessível e significativo. A prática docente, portanto, assume papel central na materialização da estimulação precoce em contextos escolares inclusivos.
O objetivo geral deste estudo é analisar a importância da intervenção pedagógica na estimulação precoce no âmbito da educação infantil. Como objetivos específicos, busca-se: mapear as contribuições das políticas públicas sobre o tema; identificar estratégias pedagógicas eficazes na estimulação precoce; e refletir sobre a atuação docente na promoção do desenvolvimento integral e inclusivo de crianças de zero a cinco anos.
A relevância deste trabalho reside na necessidade de fortalecer a integração entre políticas de educação e saúde, valorizando a atuação do professor como agente de transformação nos processos de inclusão e desenvolvimento infantil. A estimulação precoce, quando articulada ao projeto político-pedagógico e às práticas educativas cotidianas, pode representar um diferencial no atendimento às necessidades de crianças em situação de vulnerabilidade ou com deficiências, contribuindo para o avanço da equidade educacional.
A metodologia adotada neste estudo é a pesquisa bibliográfica, de abordagem qualitativa, com base em artigos científicos recentes que discutem práticas de intervenção precoce, políticas públicas para a infância e estratégias pedagógicas inclusivas. Foram utilizadas produções indexadas nas principais bases acadêmicas, priorizando-se estudos publicados entre 2018 e 2024.
MATERIAIS E MÉTODOS
Esta pesquisa caracteriza-se como uma revisão bibliográfica de abordagem qualitativa, com o objetivo de reunir, analisar e interpretar os principais estudos científicos que tratam da importância da intervenção pedagógica na estimulação precoce. A metodologia adotada buscou compreender o estado da arte sobre o tema, identificando contribuições teóricas, práticas e políticas relevantes para o contexto educacional contemporâneo.
A seleção dos materiais foi realizada por meio de busca sistemática em bases de dados acadêmicas reconhecidas, como SciELO, PubMed, BIREME, CAPES Periódicos, Google Acadêmico, entre outras. Foram utilizados descritores controlados e combinados, como: “estimulação precoce”, “intervenção pedagógica”, “educação infantil”, “educação especial”, “desenvolvimento infantil”, “neurodesenvolvimento”, e suas correspondentes em inglês e espanhol, com o objetivo de ampliar o escopo de busca.
Os critérios de inclusão adotados foram: publicações entre os anos de 2015 a 2024, disponíveis na íntegra, escritas em português, inglês ou espanhol, que tratassem da temática da estimulação precoce no contexto educacional ou interdisciplinar (como saúde e assistência social) e que apresentassem embasamento metodológico claro. Excluíram-se artigos duplicados, publicações com abordagem exclusivamente clínica ou médica sem interface com a educação, e trabalhos que não possuíam avaliação por pares.
Ao todo, oito artigos principais foram selecionados para compor o corpo da revisão, após triagem inicial e leitura criteriosa dos títulos, resumos e, posteriormente, dos textos completos. O processo de análise dos dados coletados seguiu uma abordagem qualitativa, com organização por eixos temáticos, respeitando os critérios de rigor científico estabelecidos para pesquisas bibliográficas segundo Gil (2019) e Lakatos e Marconi (2010).
Esta revisão teve como finalidade sistematizar o conhecimento produzido na área, destacando os principais resultados, lacunas e contribuições dos estudos consultados, a fim de oferecer uma compreensão aprofundada sobre a atuação pedagógica na promoção do desenvolvimento infantil por meio da estimulação precoce.
RESULTADOS
A partir da análise dos artigos selecionados, foi possível traçar um panorama abrangente sobre a importância da intervenção pedagógica na estimulação precoce, especialmente no contexto da educação infantil e da educação especial. Os estudos revisados abordam diferentes enfoques — clínico, educacional, social e político — e demonstram que a estimulação precoce, quando aliada a práticas pedagógicas intencionais e interdisciplinares, contribui significativamente para o desenvolvimento global de crianças em situação de vulnerabilidade ou com necessidades específicas.
A tabela a seguir sintetiza as principais informações extraídas dos artigos, incluindo os objetivos, metodologias utilizadas e principais achados de cada estudo analisado, oferecendo uma base comparativa e interpretativa para a discussão dos resultados.
Tabela 1: Principais achados



DISCUSSÃO
A presente revisão bibliográfica permitiu analisar de forma crítica a importância da intervenção pedagógica na estimulação precoce, especialmente no contexto da educação infantil, conforme previsto nos objetivos deste estudo. Os resultados apontam que a estimulação precoce é uma estratégia fundamental para a promoção do desenvolvimento integral de crianças de zero a cinco anos, principalmente aquelas em situação de vulnerabilidade ou que fazem parte do público-alvo da educação especial.
A partir dos estudos analisados, observa-se que há uma concordância entre os autores quanto à eficácia da estimulação precoce no desenvolvimento motor, cognitivo e socioafetivo das crianças. Segundo Branco et al. (2024), a estimulação precoce contribui significativamente para o desenvolvimento motor de prematuros, apresentando resultados favoráveis em quatro dos seis estudos incluídos na revisão sistemática. Esses achados são reforçados por Santos et al. (2023), que destacam a melhora no desenvolvimento neuropsicomotor, redução de estresse hospitalar e melhor adaptação fisiológica em neonatos internados em UTIN. Tais resultados convergem com os de Brussolo et al. (2023), que ressaltam o papel da fisioterapia na melhora dos marcos motores e cognitivos em crianças com síndrome de Down.
Entretanto, não se trata apenas de uma intervenção clínica ou fisioterapêutica. O papel pedagógico também é destacado como essencial no processo de estimulação precoce. Camizão et al. (2023) argumentam que, embora professores de educação especial compreendam a estimulação precoce como parte de suas práticas docentes, muitas vezes deixam de lado a centralidade da função pedagógica. Isso levanta a necessidade de reorientar a atuação dos educadores, para que a estimulação não seja reduzida a um conjunto de técnicas, mas seja integrada ao processo educativo de forma planejada e significativa, respeitando as potencialidades de cada criança.
Nesse sentido, a atuação pedagógica na estimulação precoce deve ser compreendida como parte de um esforço interdisciplinar, que inclui práticas musicais, sensoriais, cognitivas e afetivas. O estudo de Gomes et al. (2019) é exemplar ao apresentar um projeto baseado em neurociência, música e matemática como ferramentas de estimulação precoce, promovendo avanços em múltiplas habilidades, além de fortalecer vínculos afetivos e o processo de socialização.
No campo das políticas públicas, Garcia et al. (2022) e Silva et al. (2022) abordam a importância da institucionalização da intervenção precoce como direito garantido às crianças com deficiências ou atrasos no desenvolvimento. No entanto, ambos os estudos indicam limitações importantes: embora existam diretrizes e marcos legais, a implementação ainda é desigual e concentrada no setor da saúde. Há uma carência de articulação entre as políticas educacionais e os programas de intervenção precoce, o que dificulta a inserção efetiva da estimulação no cotidiano das instituições de educação infantil. Essa lacuna aponta para a urgência de formação continuada dos professores e da criação de protocolos intersetoriais que integrem saúde, educação e assistência social.
Além disso, Silva et al. (2025) contribuem para a discussão ao apresentar um relato de experiência com o uso de chaveiros sensoriais como instrumento pedagógico e terapêutico em unidades de cuidados intermediários. Essa inovação demonstra que é possível integrar práticas de cuidado humanizado à rotina escolar, desde que haja espaço para a criatividade, formação docente adequada e apoio institucional.
Ao discutir a questão-problema desta pesquisa — qual a importância da intervenção pedagógica na estimulação precoce no contexto da educação infantil — fica evidente que essa prática é essencial para garantir o direito à aprendizagem, ao desenvolvimento e à inclusão das crianças pequenas. A literatura revela que a estimulação precoce não apenas favorece ganhos neuropsicomotores, como também amplia as possibilidades de participação social e escolar das crianças com deficiência, transtornos do desenvolvimento ou em situação de risco.
Com relação aos objetivos específicos, foi possível mapear contribuições relevantes das políticas públicas, sobretudo no campo da saúde e da educação especial; identificar estratégias pedagógicas eficazes como a musicalização, a fisioterapia integrada e o uso de recursos sensoriais; e refletir criticamente sobre o papel do professor, que deve assumir uma postura ativa e reflexiva, planejando intervenções intencionais que respeitem o tempo, a linguagem e os modos de ser da infância.
Entre as limitações deste estudo, destaca-se a ausência de dados empíricos primários, uma vez que se trata de uma revisão bibliográfica. Além disso, muitas das publicações analisadas focam em aspectos clínicos, deixando lacunas no que diz respeito à prática pedagógica cotidiana nos ambientes escolares. Dessa forma, sugere-se que futuras pesquisas avancem na realização de estudos de campo que acompanhem práticas reais de estimulação precoce em instituições de educação infantil, possibilitando avaliações mais detalhadas dos impactos das intervenções pedagógicas.
Por fim, reforça-se a necessidade de que a estimulação precoce seja entendida como uma política pública articulada, com base na equidade e na inclusão, e que contemple a diversidade infantil em todas as suas formas de existência. O protagonismo do professor, a formação continuada e o trabalho intersetorial são elementos fundamentais para que a estimulação precoce deixe de ser apenas uma diretriz legal e passe a ser uma prática concreta, transformadora e efetivamente inclusiva.
CONCLUSÃO
A presente revisão bibliográfica permitiu constatar que a intervenção pedagógica na estimulação precoce configura-se como uma prática essencial para o desenvolvimento integral e inclusivo de crianças na primeira infância, especialmente aquelas que pertencem ao público-alvo da educação especial. Os dados analisados revelam que a estimulação precoce, quando realizada por meio de ações pedagógicas planejadas e interdisciplinares, é capaz de promover ganhos significativos nas áreas motora, cognitiva, social e emocional, contribuindo para a inserção efetiva dessas crianças nos espaços educativos regulares.
Com base nos objetivos propostos, foi possível mapear políticas públicas que reconhecem a importância da intervenção precoce, embora sua implementação ainda apresente limitações relacionadas à articulação entre os setores da saúde e da educação. Também se evidenciaram estratégias pedagógicas eficazes, como o uso de recursos sensoriais, a musicalização e o trabalho colaborativo com famílias e profissionais da saúde, que devem ser fortalecidas no cotidiano das instituições educacionais. A atuação docente mostrou-se um ponto central para a efetivação dessas práticas, reforçando a necessidade de formação contínua e apoio institucional para os professores da educação infantil.
Conclui-se, portanto, que a estimulação precoce deve ser entendida como uma política pública integrada e uma prática pedagógica fundamentada no respeito à diversidade, à equidade e ao direito ao desenvolvimento. Futuras pesquisas poderão aprofundar a análise da implementação prática dessas intervenções em diferentes contextos educacionais, contribuindo para a consolidação de políticas efetivas e inovadoras que garantam o pleno desenvolvimento das crianças desde os seus primeiros anos de vida.
REFERÊNCIAS
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¹Mestranda em Intervenção Psicológica no Desenvolvimento e na Educação. Especialista em Educação Especial, Educação e Inclusão, e Psicopedagogia Institucional. E-mail: alicegruetzmann@hotmail.com
²Mestranda em Intervenção Psicológica no Desenvolvimento e na Educação. Pedagoga com habilitação em Séries Iniciais, Orientação Educacional e Educação Especial. Pós-graduada em Educação e em Psicopedagogia Institucional e Clínica. E-mail: marcia_weigner@yahoo.com.br