SHARED CUSTODY AS AN INSTRUMENT TO MITIGATE PARENTAL ALIENATION: REFLECTIONS ON THE INTERESTS OF THE MINOR
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10203575
Isabela Daniely da Silva1
Laura Emilia Meira Lopes2
RESUMO
O presente artigo trata-se dos efeitos decorrentes da dissolução conjugal e a síndrome da alienação parental quando se verifica o instituto da guarda compartilhada, de modo que, pode ser vista como um mecanismo válido para evitar aquela e, por conseguinte, preservar os interesses da criança envolvida. A par disso, toma-se como base o sistema e as estruturas familiares atuais, visto que, as dissoluções conjugais são recorrentes, especialmente pela inexistência de obrigação de perpetuidade matrimonial. Por outro lado, as dissoluções acarretam inúmeros problemas, dentre eles, a guarda do filho do casal, razão pela qual, muitas vezes, o genitor que possui a guarda unilateral, realiza determinadas manobras a fim de afastar o outro genitor da convivência com o filho, o que, por muitas vezes, torna um obstáculo na manutenção de um vínculo afetivo e familiar saudável. Nesse diapasão, referidas manobras utilizadas pelo genitor para afastar o outro são denominadas como síndrome da alienação parental. Assim sendo, conclui-se que o instituto da guarda compartilhada, tem-se como objetivo prevenir, de forma eficaz, a síndrome da alienação parental e, por conseqüência, possibilitando uma convivência harmônica entre a criança e os seus genitores, de modo que, resulta em uma responsabilização conjunta pelos direitos e deveres do filho do casal, preservando, assim, o melhor interesse da criança.
Palavras-chave: Alienação. Criança. Dissolução. Estrutura Familiar. Guarda Compartilhada.
ABSTRACT
This article deals with the effects resulting from marital dissolution and the parental alienation syndrome when the institution of shared custody occurs, so that it can be seen as a valid mechanism to avoid that and, therefore, preserve the interests of the child involved. In addition, the current family system and structures are taken as a basis, since marital dissolutions are recurrent, especially due to the lack of obligation of marital perpetuity. On the other hand, dissolutions cause numerous problems, including custody of the couple’s child, which is why, often, the parent who has unilateral custody carries out certain maneuvers in order to remove the other parent from living with the child. , which often becomes an obstacle to maintaining a healthy emotional and family bond. In this sense, these maneuvers used by the parent to keep the other away are called parental alienation syndrome. Therefore, it is concluded that the institute of shared custody aims to effectively prevent parental alienation syndrome and, consequently, enabling a harmonious coexistence between the child and their parents, so that, results in joint responsibility for the rights and duties of the couple’s child, thus preserving the best interests of the child.
Keywords: Alienation. Kid. Dissolution. Family structure. Shared Guard.
1 INTRODUÇÃO
Sabe-se que no transcorrer dos anos a sociedade passou por transformações e consequentemente, a família também mudou. Com isso, algumas problematizações surgiram. As dissoluções de uniões conjugais, embora seja comum no meio societário, geram uma série de modificações na vida dos indivíduos que integravam o lar familiar, que mantinham laços entre si e obrigações para com o matrimônio.
A alienação parental é um fenômeno que ocorre quando um dos pais tenta minar o relacionamento entre um filho e o outro progenitor. Isto pode assumir muitas formas, incluindo comentários depreciativos, interferência nas visitas e até falsas acusações de abuso. A alienação parental pode ter efeitos devastadores para a criança, para o progenitor alienado e para a família como um todo.
A guarda compartilhada tem sido proposta como uma ferramenta para mitigar a alienação parental e proteger os interesses da criança. Ao permitir que ambos os progenitores tenham tempo igual com a criança, a guarda partilhada pode ajudar a promover uma relação positiva entre a criança e ambos os progenitores, reduzindo a probabilidade de alienação.
Dentro desse contexto, verifica-se que a guarda compartilhada traz diversos benefícios na mitigação da alienação parental. Em primeiro lugar, permite que a criança mantenha uma relação estreita com ambos os progenitores, reduzindo a probabilidade de um dos progenitores se sentir excluído ou excluído.
Além disso, a guarda partilhada pode ajudar a reduzir os conflitos entre os pais, uma vez que ambas as partes têm voz igual na tomada de decisões e nas responsabilidades parentais. Quando implementada adequadamente, a guarda partilhada pode proporcionar um ambiente estável e consistente para a criança, o que pode ser especialmente importante nos casos em que um dos progenitores tenta perturbar a relação da criança com o outro progenitor.
Embora a guarda partilhada possa ser um instrumento eficaz para atenuar a alienação parental, é importante considerar o interesse superior da criança ao implementar tal acordo. A guarda partilhada pode não ser apropriada nos casos em que existe um histórico de abuso ou negligência, ou quando um dos progenitores não é capaz de proporcionar um ambiente seguro e estável à criança. Além disso, é importante garantir que ambos os progenitores estejam empenhados em trabalhar em conjunto no interesse superior da criança, uma vez que a guarda partilhada pode ser difícil de implementar nos casos em que existe um elevado nível de conflito entre os progenitores.
Para alcançar o nosso objetivo, a presente pesquisa foi dividida em tópicos e sub tópicos, para melhor compreender a temática principal e de todos os elementos que norteiam a mesma. No que se refere à metodologia adotada, menciona-se a utilização de mecanismos jurisprudenciais, doutrinários e legais.
Desta feita, inicialmente busca analisar a evolução histórica da família no Brasil, bem como sua previsão na Constituição Federal de 1988. Posteriormente, passa a transcorrer a respeito da alienação parental corroborado ao menor interesse da criança.
Em tópico subsequente, busca explanar acerca do instituto da guarda compartilhada e sua aplicação para fins de mitigação da alienação parental e, por fim, faz menção aos princípios aplicáveis ao caso.
Assim sendo, busca através da presente pesquisa, demonstrar que a guarda partilhada pode ser uma ferramenta valiosa para reduzir os casos de alienação parental e proteger os interesses da criança, mas deve ser implementada cuidadosamente e tendo em consideração as circunstâncias únicas de cada caso.
2 BREVE ANÁLISE DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA “FAMÍLIA” NO BRASIL
Desde os tempos mais remotos, a figura do grupo familiar já existia, sendo inclusive, mais antiga que o próprio Estado. No entanto, a organização primitiva das famílias estava totalmente vinculada a influências externas, quer fossem: econômicas, estatais e/ou religiosas.
Conforme elucida Barros (2002), a família patriarcal, monogâmica e parental esteve presente durante toda a evolução histórica do Brasil, sendo resultado de uma herança deixada pelos antigos patriarcas e senhores medievais.
No entanto, ao longo dos anos, a estrutura familiar sofreu alterações e, consequentemente, os conceitos de amor e afeto tornaram-se requisitos fundamentais para sua configuração.
Consoante Almeida e Júnior (2012), a família é considerada a base, o sustentáculo mais precioso da sociedade. Dessa forma, pode-se dizer que a mesma apresenta uma formação antiga e, concomitantemente, atual, dada à sua essencialidade perante a realidade vivenciada:
A família é considerada a célula, a base fundamental da sociedade. Sua existência é, por isso, secular. Talvez, ela possa ser considerada uma das formações mais antigas. Por outro lado, o que parece um contrassenso, também é possível afirmar ser ela ainda plenamente atual. Transcorridas diferentes épocas, a família persistiu. E, assim, exatamente por acompanhar o desenvolvimento social, a família vai se adequando a ele conforme necessário. Em cada momento histórico, novas necessidades, novos interesses e, consequentemente, uma peculiar estruturação familiar. (ALMEIDA; JÚNIOR, 2012, p.01)
Tendo como base os elementos iniciais expostos, pode-se compreender que a estrutura familiar sofreu diversas alterações ao longo dos séculos. Apesar de tais modificações, a importância da família perante a sociedade permaneceu viva e intacta.
Dentro desse quadro acerca da estrutura familiar, pode-se dizer que o Código Civil de 1916 detinha uma regulação diferenciada, qual seja, pautava-se unicamente pelo matrimônio. Dentro desse âmbito prevalecia a perpetuidade matrimonial e só eram reconhecidos os filhos legítimos (aqueles que provinham do matrimônio constituído):
O antigo Código Civil, que datava de 1916, regulava a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimônio. Em sua versão original, trazia estreita e discriminatória visão da família, limitando-a a o casamento. Impedia sua dissolução, fazia distinções entre seus membros e trazia qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos filhos havidos dessas relações.
As referências feitas aos vínculos extramatrimoniais e aos filhos ilegítimos eram punitivas e serviam exclusivamente para excluir direitos, na vã tentativa da preservação do casamento. (DIAS, 2015,p.32)
A antiga expressão denominada “Pátrio Poder” também era inerente aos ditames previstos no Código Civil de 1916. Consoante Dias (2015), o mencionado termo remonta ao direito romano “pater potestas” (poder análogo ao da propriedade), traduzindo-se como um direito irrefutável, absoluto e ilimitado pertencente ao chefe da família (pai) para com os filhos e os bens pertencentes aos filhos do casal. Ressalta-se ainda que o pátrio poder era destinado exclusivamente ao marido, sendo que a mulher poderia vir a ter tal poder apenas se aquele estivesse ausente ou impedido de exercê-lo:
O Código Civil de 1916 assegurava o pátrio poder exclusivamente ao marido como cabeça elo casal, chefe da sociedade conjugal. Na falta ou impedimento do pai é que a chefia da sociedade conjugal passava à mulher, que assumia o exercício do poder familiar com relação aos filhos. Tão perversa era a discriminação que, vindo a viúva a casar novamente, perdia o pátrio poder com relação aos filhos, independentemente da idade dos mesmos. Só quando enviuvava novamente é que recuperava o pátrio poder (CC/ 1 9 1 6 393). O Estatuto da Mulher Casada (L 4121/62), ao alterar o Código Civil ele 1916, assegurou o pátrio poder a ambos os pais, que era exercido pelo marido com a colaboração da mulher. No caso de divergência entre os genitores, prevalecia a vontade do pai, podendo a mãe socorrer-se da justiça. (DIAS, 2015, p.460)
Observa-se, portanto, que a notável discriminação para com a figura da esposa dentro da estrutura familiar perdurou até o término da vigência do código civilista de 1916. Ademais, em decorrência da urbanização, da industrialização, da modificação dos padrões sociais e em decorrência do princípio de igualdade previsto na Lei Maior, as mulheres passaram a ocupar uma posição diferenciada perante a realidade adjacente e o núcleo familiar:
Com a urbanização, industrialização, a nova posição assumida pela mulher no mundo ocidental, o avanço das telecomunicações e a globalização da sociedade, modificou-se irremediavelmente esse comportamento, fazendo realçar no pátrio poder os deveres dos pais com relação aos filhos, bem como os interesses destes,colocando em plano secundário os respectivos direitos dos pais. O exercício desse poder pressupõe o cuidado do pai e da mãe em relação aos filhos, o dever de criá-los, alimentá-los e educá-los conforme a condição e fortuna da família. (VENOSA,2013,p.312/313).
Com o advento do Código Civil de 2002, bem como as profundas alterações na visão familiar antes adotada, a antiga concepção de pátrio poder cedeu lugar para o denominado “poder familiar” e, posteriormente, para o termo hodierno “autoridade parental”. (BRASIL, 2002).
Ademais, tamanha modificação teve por escopo abranger um sentido familiar que não ensejasse em obrigação, mas sim em uma função inerente aos pais, intimamente ligada ao princípio da proteção integral de crianças e adolescentes:
Ainda que o Código Civil tenha elegido a expressão poder familiar para atender à igualdade entre o homem e a mulher, não agradou. Mantém ênfase no poder, somente deslocando-o elo pai para a família. Crítica Silvio Rodrigues: pecou gravemente ao se preocupar mais em retirar da expressão a palavra “pátrio” do que incluir o seu real conteúdo, que, antes de um poder; representa obrigação dos pais, e não da família, como o nome sugere. O poder familiar, sendo menos um poder e mais um dever, converteu-se em um múnus, e talvez se devesse falar em função familiar ou em dever familiar.
A expressão que goza ela simpatia da doutrina é autoridade parental. Melhor reflete a profunda mudança que resultou ela consagração constitucional elo princípio da proteção integral ele crianças, adolescentes e jovens (CF 227). Destaca que o interesse elos pais está condicionado ao interesse elo filho, ele quem eleve ser haurida a legitimidade que fundamenta a autoridade. Mas já surge movimento indicando como mais apropriado o termo responsabilidade parental. (DIAS, 2015, p.461)
Em sentido complementar, disserta Leite:
O termo ‘autoridade parental’ ao termo ‘pátrio poder’, de conotação romana e que privilegia a ‘potestas’ masculina, é inadmissível no atual estágio de evolução do Direito brasileiro. Na realidade, hoje é unânime o entendimento de que o pátrio poder é muito mais pátrio dever, mas não só ‘pátrio’, na ótica do constituinte de 1988, mas sim ‘parental’, isto é, dos pais, do marido e da mulher, igualados em direitos e deveres, pelo art. 226, par.5º, da nova Constituição. (LEITE, 1994, p.192)
Atualmente pode-se dizer que os direitos e deveres inerentes ao núcleo familiar encontram-se em proporções mais justas. O poder familiar ou autoridade parental já não significam um encargo, nem tampouco refletem uma situação de supremacia dos pais em detrimento dos filhos. Há, na realidade, um conjunto de direitos e deveres dos pais em relação aos filhos que ainda necessitam de cuidados, buscando uma verdadeira relação familiar baseada em valores éticos, morais e sociais. (VENOSA, 2013).
Entende-se, portanto, que a família representa o núcleo essencial do Estado, as bases, o fundamento mais precípuo da sociedade adjacente. Em razão de tamanha importância e por apresentar estruturas diferenciadas, denota-se impossível traduzir tal instituto em um conceito único. Para o Direito, demonstra-se como uma estrutura importante, composta por membros ligados pelo vínculo de sangue, por parentes afins e aqueles provenientes de um processo de adoção. Ademais, denota-se como um instituto de importância ímpar, com grande influência no mundo jurídico.
2.1 A previsão da família na Constituição Federal de 1988
É certo que o conceito de família sofreu muitas alterações no transcorrer do tempo, o que representou a evolução, o crescimento e a organização da sociedade atual, conforme já abordado no tópico anterior. Em que pese a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não abordar todos os tipos de instituições familiares existentes, tal fato não constitui óbice para concluir quanto à importância das mudanças trazidas na Carta Magna de 1988, acerca da evolução do mencionado conceito de família. (BRASIL, 1988).
O texto constitucional dedicou o Capítulo VII, notadamente o artigo 226, para tratar o assunto família, conferindo a esta proteção estatal. Cabe aqui mencionar, no entanto, que a diversidade familiar está muito à frente das características abordadas pelo artigo abaixo transcrito:
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 66, de 2010) § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. ( grifo nosso).”( BRASIL, 1988)
O artigo 227 da CRFB/1988 também se mostra como importante dispositivo acerca do tema “família” veja o seu teor:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”(BRASIL, 1988)
Compreende-se da leitura de tal artigo que as crianças e adolescentes possuem direito ao convívio familiar além de serem protegidos de toda forma de discriminação. Pois bem. As crianças e adolescentes não podem ser privados do contato com seus parentes, sejam aqueles formados pelo laço biológico ou pelo afetivo.
Ao analisar os mencionados dispositivos constitucionais, é possível notar a forte influência do princípio da dignidade da pessoa humana nos artigos que se referem à família. Isso se deve ao fato de que as famílias não são mais as mesmas de muitos anos atrás, como já narrado anteriormente. No curso da evolução da humanidade, as famílias também evoluíram e seus objetivos e finalidades evoluíram juntos.
3 COMPREENDENDO A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL
Apesar de o sistema civilista determinar que a guarda da criança ou adolescente deva ser concedida para um dos cônjuges, visando à prevalência do princípio do melhor interesse, compreende-se que mesmo que tais medidas sejam observadas, tal situação poderá gerar certos óbices para a relação e convivência da criança com o genitor (a) que não detiver a guarda da mesma:
Pode haver, por parte de um dos pais, a tentativa de desacreditar o outro perante o filho com o intuito deliberado de inviabilizar a relação parental deles. Muitas vezes isso ocorre como uma alternativa vingativa propositada em função do término da relação afetiva, familiar ou não, antes estabelecida pelo casal genitor. Vale-se da criança ou adolescente para, provocando nela sentimentos de recusa e aversão ao outro ascendente, aplicar a este uma penalização pelo vínculo amoroso desfeito. (ALMEIDA, JUNIOR, 2012, p.472).
Tal assunto é complementado por Maria Berenice Dias:
Muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, se um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, com o sentimento de rejeição, ou a raiva pela traição, surge o desejo de vingança que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. Sentir-se vencido, rejeitado, preterido, desqualificado como objeto de amor, pode fazer emergir impulsos destrutivos que ensejaram desejo de vingança, dinâmica que fará com que muitos pais se utilizem de seus filhos para o acerto de contas do débito conjugal. Conforme Viviane Ciambelli, ferida em seu narcisismo, um genitor sente-se no direito de anular o outro e, a partir daí, ou ocupa onipotentemente o lugar do pai deposto junto à criança ou o substitui por uma pessoa idealizada, tornando-a mais valiosa. Dessa forma, entre relações falseadas, sobrecarregadas de imagens parentais distorcidas e memórias inventadas, a alienação parental vai se desenhando: pais riscam, rabiscam e apagam a imagem do outro genitor na mente da criança. (DIAS, 2015, p.445)
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um fenômeno que ocorre quando um dos pais ou ambos se envolvem na programação de um filho para virá-lo contra o outro genitor, de modo que, esta programação pode se manifestar em vários sintomas, incluindo: – Rejeição do pai alvo – Recusa em passar tempo com o pai-alvo – Falta de empatia para com o pai alvo – Expressar medo ou ódio em relação ao progenitor visado.
Estes sintomas podem ser observados em crianças de várias idades e podem ter um impacto significativo no seu bem-estar emocional e psicológico. É importante notar que a SAP não é reconhecida como um transtorno psiquiátrico formal pelo DSM-5, mas sim como um termo usado para descrever um conjunto de comportamentos.
As causas e os fatores de risco da SAP podem variar, mas muitas vezes resultam de um divórcio ou separação de alto conflito. O progenitor que se envolve em comportamentos alienantes pode procurar vingar-se do ex-cônjuge ou tentar obter a custódia da criança, voltando-o contra o outro progenitor, sendo que pode levar ao rompimento de relacionamentos, ao aumento de conflitos e até mesmo a batalhas jurídicas.
Os efeitos do SAP nas crianças e nas famílias podem ser profundos. As crianças que sofrem de SAP podem ter dificuldades com a regulação emocional, ter dificuldade em formar relacionamentos saudáveis e podem sofrer de depressão ou ansiedade.
O pai alienado pode experimentar uma sensação de perda, tristeza e raiva, bem como uma perda de relacionamento com o filho. A SAP também pode ter um efeito cascata sobre familiares e amigos, levando a uma propagação de animosidade e relacionamentos tensos.
É fundamental reconhecer os efeitos psicológicos gerados na tríade familiar pela síndrome. A intervenção precoce, incluindo aconselhamento e apoio jurídico, pode ajudar a mitigar os efeitos negativos da SAP e promover relações saudáveis entre as crianças e ambos os pais.
Entende-se que tais atos praticados pelo genitor que detém a guarda da criança, são denominados pela doutrina como “síndrome da alienação parental” (SAP) ou implantação de falsas memórias, sendo uma temática inicialmente estudada por psicólogos e psiquiatras:
Nomina-se alienação parental este ato de programar o filho para que odeie o outro genitor. Noutras palavras, trata-se da conduta de desacreditar e desgastar, de maneira infundada, a imagem do pai ou da mãe a fim de provocar no filho a anulação da figura deste, o seu falecimento simbólico.
Essa ocorrência há tempos é alvo de estudos da psicologia e da psiquiatria. A expressão síndrome de alienação parental, inclusive, tem por autor Richard Gardner, psiquiatra norte-americano estudioso da temática. O Direito, por sua vez, apenas recentemente assumiu o assunto como alvo de sua real preocupação. Mais precisamente, somente a partir do ano de 2008 é que as discussões atinentes e as iniciativas à normatização e ao solucionamento jurídico do problema disseminaram se no Brasil. Finalmente, em 26 de agosto de 2010, foi publicada a Lei nº 12.318, que dispõe sobre a alienação parental. (ALMEIDA, JÚNIOR, 2012, p. 472).
Trata-se, na realidade, de um abuso emocional por parte do genitor que é detentor da guarda da criança/adolescente, onde se cria um verdadeiro mecanismo de vingança em desfavor do outro genitor, em virtudes de mágoas e ressentimentos pelo término do relacionamento conjugal. Malgrado tal conduta geralmente tenha início por parte de um dos genitores da criança (principalmente da mãe, em virtude desta ser mais indicada para exercer a guarda), também poderá partir de outros cuidadores daquela:
Este fenômeno manifesta-se principalmente no ambiente da mãe, devido à tradição de que a mulher seria mais indicada para exercer a guarda dos filhos, notadamente quando ainda pequenos. Entretanto, pode incidir em qualquer um dos genitores e, num sentido mais amplo, pode ser identificado até mesmo em outros cuidadores. Assim, o alienador pode ser o pai, em relação à mãe ou ao seu companheiro. Pode ser levado a efeito frente aos avós, tios ou padrinhos e até entre irmãos. Muitas vezes ocorre quando ainda o casal vive sob o mesmo teto. Certas condutas, ainda que teoricamente protegidas sob o manto da licitude e das “boas intenções”, podem ocultar verdadeiros indícios de tentativa de denegrir a imagem de um dos genitores ou membros de sua família. (DIAS, 2015, p.546).
Tal possibilidade também está expressa no artigo 2º da Lei 12.318/10:
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (BRASIL, 2010, grifo nosso).
Nesse âmbito conturbado e confuso, onde a criança ou adolescente alienado vêem em meio a um conflito pessoal entre seus genitores, as sequelas advindas podem ser preocupantes:
Os resultados são perversos. Pessoas submetidas à alienação mostram-se propensas a atitudes antissociais, violentas ou criminosas; depressão, suicídio e, na maturidade – quando atingida -, revela-se o remorso de ter alienado e desprezado um genitor ou parente, assim padecendo de forma crônica de desvio comportamental ou moléstia mental, por ambivalência de afetos. (DIAS, 2015, p.547).
O Poder Judiciário, frente a tal questão, muitas vezes deve-se posicionar de forma mais rápida, haja vista tratar-se do bem-estar físico e psicológico de crianças e adolescentes. Em razão disso, muitas vezes optam por reverter à guarda ou suspender as visitas, apesar do receio de que tal denúncia seja irreal:
Essa notícia, levada ao Poder judiciário, gera situação das mais delicadas. De um lado, há o dever do magistrado de tomar imediatamente uma atitude e, de outro, o receio de que, se a denúncia não for verdadeira, traumática a situação em que a criança estará envolvida, pois ficará privada do convívio com o genitor que, eventualmente, não lhe causou qualquer mal e com quem mantém excelente convívio. Mas, como o juiz tem a obrigação ele assegurar proteção integral, de modo frequente reverter a guarda ou suspende as visitas, determinando a realização ele estudos sociais e psicológicos. E, durante este período, cessa a convivência entre ambos.
[…] É difícil a identificação da existência ou não dos episódios denunciados. Complicado reconhecer que se está diante ele uma alienação parental e que a denúncia do abuso foi levada a efeito por espírito de vingança, como meio de acabar com o relacionamento do filho com o genitor. Muitas vezes, nem psicólogos conseguem identificar que se trata de sentimento ele ódio exacerbado que leva ao desejo ele vingança, a ponto ele programar o filho para reproduzir falsas denúncias, com o só intuito de afastá-lo do genitor. (DIAS, 2015, p.547).
A título explicativo, cumpre ressaltar que a alienação parental pode ocorrer além dos genitores da criança, eis que, sabe-se a possibilidade de conceder a guarda de uma criança além dos pais, o que, por si só, pode ser o alienador.
Desse modo, tem-se que qualquer ente familiar, apesar de ter a guarda ou não da criança, pode realizar a alienação parental, acarretando, portanto, a síndrome da alienação parental na criança.
4 A GUARDA COMPARTILHADA COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL: REFLEXÕES ACERCA DOS INTERESSES DO MENOR
Como sabido, a legislação busca resguardar a proteção da criação e do adolescente, de modo que se compreende com o divórcio não se divide a parentalidade, mantendo intactos os poderes e deveres ao poder familiar.
Nesse aspecto, dentre os mecanismos jurídicos propostos pela doutrina majoritária, salienta-se a instituição da guarda compartilhada, onde, ambos os genitores, participarão por igual da vida da criança/ adolescente, inibindo ou dificultando quaisquer condutas ligadas à alienação parental:
Filho precisa de pai e mãe para estruturar a sua personalidade dignamente e a guarda compartilhada é o mecanismo mais eficaz para inibir a alienação parental no seio de um núcleo familiar, quando da ocorrência da ruptura conjugal, com má elaboração da nova situação por parte de um dos cônjuges / conviventes.
Desta forma, a possibilidade de convívio com o filho para os pais separados, deixará de ser arma de vingança, pois ambos terão igualdade de contato e vivência, com a aplicação da guarda compartilhada, fato que impedirá que o acesso ao filho seja moeda de troca ou de desforra. (FONTELES, 2014, p.5).
Em caráter complementar disserta Levy:
Guarda conjunta, ou compartilhada, não se refere apenas à tutela física ou custódia material, mas todos outros atributos da autoridade parental são exercidos em comum, assim, o genitor que não detém a guarda material não se limitará a supervisionar a educação dos filhos, mas ambos os pais terão efetiva e equivalente autoridade parental para tomarem decisões importantes ao bem estar de seus filhos.
Todavia, essa nova modalidade de guarda deve ser compreendida como aquela forma de custódia em que o menor tem uma residência fixa (na casa do pai, na casa mãe ou de terceiros) – única e não alternada, muitas vezes próxima ao seu colégio, aos vizinhos, ao clube, à pracinha, onde desenvolve suas atividades habituais e onde, é lógico, têm seus amigos.
Assim, o menor precisa contar com a estabilidade de um domicílio, um ponto de referência e um centro de apoio para suas atividades no mundo exterior, enfim, de uma continuidade espacial (além da afetiva) e social, onde finque suas raízes físicas e sociais, com o qual ele sinta uma relação de interesse e onde desenvolva uma aprendizagem doméstica, diária, da vida.(LEVY, 2007, P.15)
Compreende-se, portanto, que a guarda compartilhada possibilita um contato efetivo e amplo de ambos os genitores para com a criança/adolescente, gerando obrigações e autoridade parental para tomada de decisões de maneira igualitária. Em que pese tais possibilidades, ressalta-se que o menor deverá ter um domicílio fixo, para fins de estabilidade e para que o mesmo possa ter uma referência imutável e segura.
Acerca dos benefícios da guarda compartilhada sob um enfoque familiar, ilustra-se tendo como subsídio à decisão recente proferida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
DIREITO DE FAMÍLIA – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE GUARDA – PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DA IGUALDADE ENTRE OS CÔNJUGES – GUARDA COMPARTILHADA – CUSTÓDIA FÍSICA CONJUNTA – CRIAÇÃO SOB O INFLUXO DE AMBOS OS PAIS – FIXAÇÃO DE RESIDÊNCIA – MUDANÇA QUE TRAGA BENEFÍCIOS PARA O MENOR – ALIENAÇÃO PARENTAL –
O instituto da guarda foi criado com o objetivo de proteger o menor, salvaguardando seus interesses em relação aos pais que disputam o direito de acompanhar de forma mais efetiva e próxima seu desenvolvimento, ou mesmo no caso de não haver interessados em desempenhar esse múnus. – As mudanças impostas pela sociedade atual, tais como inserção da mulher no mercado de trabalho e a existência de uma geração de pais mais participativos e conscientes de seu papel na vida dos filhos, vêm dando a ambos os genitores a oportunidade de exercerem, em condições de igualdade, a guarda dos filhos comuns. Além disso, com a nova tendência de constitucionalização do direito de família, da criança e do adolescente, a questão da guarda deve ser analisada atualmente com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, igualdade entre homens e mulheres e supremacia do melhor interesse do menor. – Na guarda compartilhada pai e mãe participam efetivamente da educação e formação de seus filhos. Considerando que no caso em apreço ambos os genitores são aptos ao exercício da guarda, e que a divisão de decisões e tarefas entre eles possibilitará um melhor aporte de estrutura para a criação do infante, impõe-se como melhor solução não o deferimento de guarda unilateral, mas da guarda compartilhada. – Para sua efetiva expressão, a guarda compartilhada exige a custódia física conjunta, que se configura como situação ideal para quebrar a monoparentalidade na criação dos filhos. – Se um dos genitores quer mudar de cidade ou de Estado, para atender a interesse próprio e privado, não poderá tal desiderato sobrepujar o interesse do menor. Só se poderia admitir tal fato, se o interesse do genitor for de tal monta e sobrepujar o interesse da criança. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação cível nº 10210110071441003/ MG. Relator: Desembargador Dárcio Lopardi Mendes. Diário Judicial-DJ, 05. ago.2015).
O próprio Superior Tribunal de Justiça, através do Recurso Especial nº 1251.000/MG, também retratou que a guarda compartilhada possibilita o exercício conjunto do Poder Familiar e pode ser concedido mesmo que não haja um consenso entre os genitores da criança ou adolescente, levando-se em conta o princípio do melhor interesse:
Conclui-se, assim, que a guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial.
[…]A continuidade do convívio da criança com ambos os pais é indispensável para o saudável desenvolvimento psicoemocional da criança, constituindo-se a guarda responsável em um direito fundamental dos filhos menores e incapazes, que não pode ficar ao livre , insano e injustificado arbítrio de pais disfuncionais. A súbita e indesejada perda do convívio com os filhos não pode depender exclusivamente da decisão ou do conforto psicológico do genitor guardião, lembrando-se que qualquer modalidade de guarda tem como escopo o interesse dos filhos e não o conforto ou a satisfação de um dos pais que fica com este poderoso poder de veto. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso especial nº 1251000 /MG 2011/0084897-5. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Diário Judicial Eletrônico-DJE, 31. ago.2011).
Em razão da prevalência do princípio do melhor interesse, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e da prevalência de todos os direitos e garantias expressos no artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, devem-se buscar medidas e mecanismos legais que interrompam ou impeçam quaisquer traços de alienação parental, ou seja, medidas que visem uma convivência harmônica entre os genitores e sua prole e proporcionando um ambiente familiar sadio, mesmo que haja uma ruptura da sociedade conjugal antes firmada entre os cônjuges.
De igual modo, a aplicação do instituto da guarda compartilhada como forma de mitigar a alienação parental, sabe-se que a alienação parental é um fenômeno em que um dos progenitores manipula a relação da criança com o outro progenitor, resultando muitas vezes na rejeição do progenitor visado pela criança. Isso pode ocorrer por vários motivos, incluindo desejo de vingança, ciúme ou controle sobre a criança.
Desse modo, os efeitos da alienação parental podem ser devastadores tanto para a criança como para o progenitor alienado, levando a sofrimento psicológico, relacionamentos prejudicados e danos emocionais a longo prazo. Os acordos de guarda compartilhada têm sido propostos como uma solução potencial para mitigar os efeitos da alienação parental, permitindo que ambos os pais mantenham um relacionamento significativo com a criança.
A guarda compartilhada pode oferecer diversos benefícios na mitigação da alienação parental. Ao proporcionar a ambos os progenitores igualdade de acesso à criança, a guarda partilhada pode reduzir a probabilidade de um dos progenitores manipular a relação da criança com o outro.
Isto pode ajudar a promover uma relação saudável e positiva entre a criança e ambos os pais, reduzindo o risco de alienação e as consequências negativas associadas. Além disso, a guarda partilhada pode ajudar a promover a cooperação e a comunicação parental, o que pode ser fundamental para prevenir ou resolver conflitos que possam contribuir para a alienação parental.
Embora a guarda partilhada possa ser uma solução eficaz para mitigar a alienação parental, também existem desafios e considerações que devem ser tidos em conta. Por exemplo, a guarda partilhada pode não ser apropriada nos casos em que um dos progenitores tem um historial de abuso ou negligência.
Além disso, os acordos de guarda partilhada exigem um elevado nível de cooperação e comunicação parental, o que pode ser difícil de alcançar em situações de elevado conflito. É também importante ter em conta o interesse superior da criança e as necessidades individuais ao determinar a adequação da guarda partilhada.
5 DOS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO CASO
É sabido que os princípios constitucionais se constituem como as entrelinhas das normas jurídicas, ou seja, são elementos norteadores precípuos, sendo imprescindíveis à configuração do Estado Democrático de Direito. Nesse mesmo contexto, também se salienta que os princípios são denominados “mandados de otimização”, podendo efetivar diferentes graus e possibilidades jurídicas:
Princípios são, por conseguinte, mandados de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. “O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes”. (ALEXY, 2008, p. 90)
Nessa esteira, sabe-se que os princípios podem se subdividir em gerais e fundamentais.
Dessa forma, pode-se dizer que os princípios gerais se encontram aleatoriamente previstos na Magna Carta de 1988, traduzindo-se como elementos norteadores para as demais leis e os princípios fundamentais, por outro lado, encontram destinação específica, constituindo-se como a pedra de toque da seara constitucional:
Princípios fundamentais são diretrizes imprescindíveis à configuração do Estado, determinando-lhe o modo e a forma de ser.
Refletem os valores abrigados pelo ordenamento jurídico, espelhando a ideologia do constituinte, os postulados básicos e os fins da sociedade.
[…] São qualificados de fundamentais, porquanto constituem o alicerce, a base, o suporte, a pedra de toque do suntuoso edifício constitucional. Em nossa Constituição, vêm localizados no Título I, artigos 1º a 4º. Tais princípios possuem força expressiva, agregando em torno de si, direitos inalienáveis, básicos e imprescritíveis, como a dignidade humana, a cidadania, o pluralismo político, etc. (BULOS,2011, p. 496)
O princípio da proteção integral provém do artigo 227 da Constituição da República de 1988 e também do ECA, estabelecendo que, as crianças e adolescentes são consideradas pessoas em desenvolvimento, ou seja, pessoas que necessitam de total amparo pelo ente estatal, pela família e pela sociedade. Nesse contexto, dissertam Cury, Garrido e Maçura:
A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a idéia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento (CURY; GARRIDO; MAÇURA, 2002, p. 21)
Compreende-se, portanto, que o princípio da proteção integral constitui-se em uma série de direitos inerentes às pessoas em desenvolvimento, ou seja, aquelas que necessitam de amparo legal e social. Observa-se, ademais, que as crianças e adolescentes são verdadeiros titulares de direitos, contudo, não poderão reivindicá-los sozinhos, sendo necessário o auxílio por parte de seus responsáveis legais e das entidades públicas. (CURY; GARRIDO; MAÇURA, 2002).
Sob o mesmo contexto, tem-se o princípio da prioridade absoluta, que, na realidade, funciona como complemento do princípio acima realçado. Diante disso, pode-se dizer que o princípio da prioridade absoluta encontra-se disposto no artigo 227 da Constituição da República de 1988 e também no artigo 4º do ECA, onde estabelecem que é dever do Estado, da família, da comunidade e da sociedade em geral, assegurar e priorizar a efetivação dos direitos fundamentais inerentes às crianças e adolescentes:
O princípio da Prioridade Absoluta é um princípio constitucional previsto no artigo 227 da CF e também com previsão no artigo 4º. Da Lei 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Assim encontramos no artigo 227 da CF que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
No art. 4º da Lei 8.069/90 temos que é dever da família, comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Sabemos que o problema da criança e do adolescente, antes de estar centradas neles, encontra-se centrado na família. Assim, a família deve ser fortalecida. E com isso acontecendo os seus membros menores não serão privados da assistência que lhes é devida. ( VILAS-BÔAS, 2011, p.7)
Diante de tais dizeres, pode-se compreender que, a criança e o adolescente, tendo em vista que se tratam de pessoas em desenvolvimento, merecem maior atenção por parte dos entes públicos, da família, da comunidade e da sociedade adjacente.
Por outro lado, o princípio denominado de melhor interesse da criança e do adolescente representa um grande avanço dentro do âmbito jurídico, uma vez que agregam em seu bojo todos os demais princípios tratados. Dessa forma, o interesse da criança e do adolescente será levado em consideração, haja vista que essa pessoa em desenvolvimento é também titular de direitos, merecendo total proteção do ordenamento jurídico pátrio:
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente representa importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais, em que o filho deixa de ser considerado objeto para ser alçado a sujeito de direito, ou seja, a pessoa humana merecedora de tutela do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da família de que ele participa. Cuida-se, assim, de reparar um grave equivoco na história da civilização humana em que o menor era relegado a plano inferior, ao não titularizar ou exercer qualquer função na família e na sociedade, ao menos para o direito. (GAMA, 2008, p. 80)
Consoante Gama (2008) o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente passou a ter natureza principiológica a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente de 1989 (através do artigo 3º da mencionada Convenção).
Nesse contexto, também se passou a questionar acerca do bem-estar das crianças e adolescentes, ou seja, que tal preocupação deveria se sobrepor às demais situações provenientes da estrutura familiar.
Acerca desse assunto, preconiza Leite (1994) sobre o que vem a ser o interesse da criança e do adolescente:
Segundo Eduardo de Oliveira Leite, a jurisprudência tem permitido precisar algumas tendências: o desenvolvimento físico e moral da criança, a qualidade de suas relações afetivas e sua inserção no grupo social, a idade, o sexo, a irmandade, o apego ou a indiferença manifestada pela criança a um dos seus pais, a estabilidade da criança, como também pelas condições que cercam os pais, materiais ou morais. Todos esses elementos são caminhos que servem ao juiz para descobrir, caso a caso, o que lhe parece ser o interesse do menor.
[…]Para nós, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente (favor minoris), expressão colhida dos textos originais da Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959), cumpre relevante papel transformador plasmado no caput do art. 227 da CF/88: dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, com absoluta prioridade, todos os direitos fundamentais não só a todo ser humano, mas, em especial, à criança e ao adolescente como pessoa em desenvolvimento, dotada de dignidade. (LEITE apud FILHO, 2013, p. 79).
Compreende-se, dessa forma, que a determinação precisa acerca dos interesses da criança e do adolescente dependerá de inúmeros fatores, haja vista as diversas situações familiares que são apresentadas no contexto social atual.
Contudo, na visão de Filho (2013), o mencionado princípio denota um conjunto de bens responsáveis pelo desenvolvimento integral e pela proteção da pessoa em desenvolvimento, tendo em vista os critérios hermenêuticos provenientes da Convenção Sobre os Direitos da Criança:
A Convenção sobre os direitos da criança encarregou-se de fixar critérios hermenêuticos próprios, ‘ o interesse maior da criança’ como consideração prioritária em todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos (CDC, art. 3.1).Sem revelar pautas que permitam inferir o verdadeiro significado e a extensão do princípio, na prática, obriga aqueles órgãos a efetuar uma aplicação concreta em dada situação que envolva seus destinatários.
Será razoável, então, conceituar o melhor interesse da criança como um conjunto de bens necessários para assegurar o desenvolvimento integral e proteção da pessoa em desenvolvimento, no que resultar de maior benefício para ele. (FILHO, 2013, p. 80).
Vislumbra-se, portanto, que o interesse da criança e do adolescente deve ser buscado e priorizado pela família, pelos órgãos e entidades públicas, pela comunidade e pela sociedade, haja vista tratar-se de pessoas em desenvolvimento que são titulares de inúmeros direitos perante a ordem jurídica. (ALMEIDA; JÚNIOR, 2012).
Nesse sentido, é o entendimento do nosso Tribunal de Justiça, senão vejamos:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA. INCIDENTE DE ALIENAÇÃO PARENTAL. PROCESSAMENTO NOS MESMOS AUTOS. POSSIBILIDADE. INDÍCIOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL PRATICADA PELO GENITOR. DECISÃO QUE DEFERIU A GUARDA PROVISÓRIA PARA AVÓ MATERNA. OBSERVÂNCIA DO MELHOR INTERESSE DO MENOR. MANUTENÇÃO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. A alienação parental é instituto regulamentado pela Lei nº 12.318/10 que não determinar que a autuação do incidente seja realizada em apartado.
2. No que tange ao mérito, sempre que se tratar de interesse relativo à criança e adolescente, incluindo aí a questão da guarda, o magistrado deve se ater ao interesse do menor, considerando, para tanto, primordialmente, seu bem-estar.
3. À míngua de maiores elementos de convencimento, deve ser mantida a decisão que deferiu a guarda provisória do infante para avó materna, tendo em vista haver indícios de ocorrência de alienação parental por parte do genitor, comprometendo o desenvolvimento psicológico e moral do menor. (TJMG – Agravo de InstrumentoCv 1.0000.21.028872-6/002, Relator(a): Des.(a) Bitencourt Marcondes , 19ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 02/09/2021, publicação da súmula em 09/09/2021)
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo observou a problemática: o instituto da guarda compartilhada face a síndrome da alienação parental, podendo concluir que o instituto da guarda compartilhada (arts. 1.583/1.584 CC) é um mecanismo válido para coibir ou enfraquecer a denominada “síndrome da alienação parental”, possibilitando a preservação de direitos e deveres de ambos os genitores e, até mesmo de qualquer ente familiar que possua a guarda ou não da criança, contribuindo para a manutenção dos interesses da criança ou adolescente afetados por tal conduta do alienador.
Vale ressaltar que esse tipo de tutela pode equilibrar melhor o poder familiar, interromper ou fragilizar o comportamento de alienígenas e ajudar a manter a saúde emocional das crianças ou adolescentes envolvidos.
A legislação que estabelece esta forma de tutela parece proteger os melhores interesses das crianças.
Além disso, deve-se notar que, ao contrário da tutela conjunta, a tutela unilateral acaba por prejudicar a vida harmoniosa da criança e de ambos os pais, e apenas uma pessoa é responsável pelas questões relacionadas com os menores.
A guarda compartilhada é baseada na ordem constitucional, permitindo que os pais decidam em conjunto sobre as questões de seus filhos, como a escola ou viagens de férias que a criança deve frequentar.
A convivência dos pais e do filho permite que o filho se desenvolva bem, até mesmo em questões psicológicas, pois finalmente aprendeu que a separação dos pais não o impedia de morar com os pais ao mesmo tempo.
Ressalte-se que, nessa forma de tutela, as responsabilidades e responsabilidades dos pais e dos filhos são compartilhadas, ou seja, o pai ou a mãe não podem tomar nenhuma decisão sobre as questões relacionadas ao filho sem se consultar.
O objetivo da tutela conjunta é permitir que os pais participem ativamente na vida de seus filhos, compartilhem as obrigações e responsabilidades dos menores e tornem a relação entre eles harmoniosa.
A finalidade da guarda compartilhada é fazer com que os pais ou qualquer outro ente familiar participem ativamente da vida da criança dividindo deveres e responsabilidades sobre o menor, possibilitando um convívio harmônico entre eles.
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1,2 Bacharelandas no curso de graduação em Direito, do Centro Universitário UNA- Campus Bom Despacho/MG, Isabeladaniely0@gmail.com; lauralopes-lp@hotmail.com. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de graduação em direito, do Centro Universitário UNA- Campus Bom Despacho/MG.