JOINT CUSTODY AS A DETERRENT TO PARENTAL ALIENATION AND THE ROLE OF SECOND-LEVEL CONCILIATION AT THE COURT OF JUSTICE OF GOIÁS
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202504301815
Luana Silva Brito
Marcus Coelho
Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar a guarda compartilhada como instrumento jurídico eficaz para inibir a alienação parental, bem como destacar o papel das conciliações em segundo grau no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) como meio de promover a efetividade desse modelo de guarda. A pesquisa apresenta um panorama da evolução legislativa brasileira no que tange à guarda de filhos, enfatizando os marcos da Constituição Federal de 1988, do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Lei nº 13.058/2014. O estudo também aborda os desafios enfrentados na aplicação prática da guarda compartilhada, tais como barreiras culturais, conflitos familiares e dificuldades judiciais. Por fim, evidencia-se a importância da mediação e conciliação como mecanismos de pacificação social e proteção do melhor interesse da criança, com foco na experiência pioneira do TJGO na adoção de audiências conciliatórias em segundo grau. A metodologia empregada é qualitativa e bibliográfica, com análise doutrinária e legislativa. Conclui-se que a guarda compartilhada, quando efetivamente implementada e aliada à atuação conciliadora do Judiciário, representa um importante instrumento de prevenção da alienação parental e de fortalecimento dos vínculos familiares.
Palavras-chave: Guarda compartilhada; Alienação Parental; Direito de Família; Conciliação; Interesse da Criança.
1. INTRODUÇÃO
A guarda de filhos no Brasil passou por significativas transformações jurídicas ao longo do tempo, especialmente a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. Esse documento instituiu a doutrina da proteção integral e o princípio da prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, conferindo-lhes, entre outros direitos, o da convivência familiar saudável e equilibrada. Tais diretrizes promoveram uma mudança no paradigma das relações familiares, deixando para trás o modelo patriarcal centrado na autoridade paterna, em direção à corresponsabilidade parental.
Historicamente, o Código Civil de 1916 atribuía ao pai o poder familiar quase absoluto, marginalizando o papel da mãe nos cuidados e nas decisões sobre a vida dos filhos. Com a Constituição de 1988 e a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, consagrou-se uma nova visão: a da criança como sujeito de direitos e a da guarda como dever de ambos os pais, mesmo após a dissolução da sociedade conjugal. O artigo 227 da Carta Magna reforça a obrigação da família, da sociedade e do Estado de assegurar o direito à convivência familiar, com prioridade absoluta.
A partir dessa base constitucional, a legislação infraconstitucional também foi atualizada. A Lei nº 11.698/2008 introduziu, pela primeira vez, a guarda compartilhada no Código Civil brasileiro, ainda como uma possibilidade facultativa. Porém, foi a Lei nº 13.058/2014 que consolidou essa modalidade como regra, determinando que, na ausência de acordo entre os pais, o juiz deverá instituí-la, salvo quando um dos genitores não apresentar condições para exercer a guarda.
A guarda compartilhada, diferentemente da guarda alternada ou unilateral, não implica necessariamente residência alternada da criança, mas sim a participação ativa e equitativa de ambos os pais nas decisões sobre a vida do filho. Ela promove o equilíbrio de responsabilidades, fortalece o vínculo afetivo com ambos os genitores e busca preservar o melhor interesse da criança.
Nesse cenário, insere-se o presente estudo, cujo objetivo é examinar como a guarda compartilhada pode atuar como ferramenta de prevenção e inibição da alienação parental — prática cada vez mais recorrente e prejudicial, que viola o direito fundamental da criança à convivência com ambos os pais. Ademais, serão analisadas as estratégias adotadas pelo Poder Judiciário, em especial pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), que implementou audiências de conciliação em segundo grau como mecanismo de solução pacífica de conflitos e de efetivação do modelo de guarda compartilhada.
Justifica-se esta pesquisa diante da relevância do tema para o Direito de Família contemporâneo, diante do aumento das demandas judiciais envolvendo disputas de guarda e denúncias de alienação parental, e da necessidade de se buscar alternativas judiciais e extrajudiciais que favoreçam o desenvolvimento saudável da criança. O estudo também visa contribuir para o debate sobre a aplicação prática da legislação, seus entraves e possibilidades, bem como fomentar reflexões sobre políticas públicas voltadas à proteção da infância.
2. INTRODUÇÃOFUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A alienação parental configura-se como uma forma de violência psicológica e jurídica que compromete o direito da criança à convivência familiar plena, estando diretamente relacionada a disputas de guarda entre os genitores. Trata-se de uma interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, com o objetivo de afastá-lo de um dos pais, comprometendo seus vínculos afetivos e emocionais.
A Lei nº 12.318/2010 define a alienação parental como qualquer interferência que vise desqualificar, impedir ou dificultar a convivência da criança com um dos genitores. Essa conduta pode se manifestar de diferentes formas, como a omissão de informações relevantes, a desqualificação constante do outro genitor ou a obstrução do contato direto. O artigo 6º da referida lei prevê medidas judiciais específicas para coibir tais atos, incluindo advertências, multas, alteração da guarda e até a suspensão do poder familiar, quando constatado o prejuízo efetivo ao menor.
A guarda compartilhada, por sua vez, surge como uma alternativa que fortalece a convivência com ambos os pais e impede que um deles detenha o controle unilateral da vida do filho, o que poderia facilitar práticas alienadoras. Prevista no artigo 1.583 do Código Civil, com as alterações trazidas pelas Leis nº 11.698/2008 e nº 13.058/2014, a guarda compartilhada estabelece que os genitores devem participar conjuntamente das decisões sobre a vida da criança, mesmo após a separação conjugal.
Segundo Maria Berenice Dias (2016), a guarda compartilhada não implica divisão igualitária do tempo de convivência, mas sim a repartição equilibrada das responsabilidades parentais. Essa modalidade favorece o desenvolvimento emocional da criança e fortalece os vínculos familiares, reduzindo o impacto da separação dos pais em sua vida.
Diversos autores apontam a guarda compartilhada como instrumento eficaz na prevenção da alienação parental. Ferreira (2018) destaca que o envolvimento ativo de ambos os pais inibe comportamentos possessivos e facilita a comunicação entre as partes, criando um ambiente mais saudável para o menor. Já Oliveira (2020) argumenta que, ao impedir o monopólio das decisões, esse modelo reduz significativamente os conflitos de lealdade impostos à criança.
Contudo, sua implementação não é isenta de dificuldades. Em casos de separações litigiosas ou quando há forte animosidade entre os pais, a guarda compartilhada pode não se mostrar viável. A cooperação, o respeito e a comunicação são pressupostos indispensáveis ao seu sucesso. Por isso, o Poder Judiciário tem papel fundamental na mediação desses conflitos, sendo necessário avaliar, caso a caso, o que melhor atende ao princípio do melhor interesse da criança.
A jurisprudência nacional tem reconhecido a guarda compartilhada como medida adequada para evitar rupturas nos vínculos familiares e impedir práticas de alienação parental. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em diversas decisões, reafirma que a guarda deve priorizar o equilíbrio emocional do menor e a preservação dos laços afetivos com ambos os genitores. Nesse sentido, a guarda compartilhada deixa de ser mera opção dos pais e passa a ser um direito da criança.
Em síntese, a guarda compartilhada representa um avanço no ordenamento jurídico brasileiro, pois além de assegurar o exercício conjunto da autoridade parental, ela atua como medida protetiva contra condutas alienadoras, sendo compatível com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da criança.
3. METODOLOGIA
Este estudo adota uma abordagem qualitativa e exploratória, com método de investigação bibliográfico e documental. O objetivo da pesquisa é compreender, por meio da análise da legislação vigente, doutrinas, jurisprudência e documentos institucionais, a efetividade da guarda compartilhada como instrumento inibidor da alienação parental no ordenamento jurídico brasileiro, com destaque para a atuação do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO).
A pesquisa bibliográfica foi realizada a partir de obras de referência no Direito de Família, artigos científicos, legislação nacional (em especial a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei nº 12.318/2010 e a Lei nº 13.058/2014), bem como resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), especialmente a Resolução nº 125/2010, que trata da política judiciária de tratamento adequado dos conflitos de interesse no âmbito do Poder Judiciário.
No campo documental, foram analisados relatórios e dados institucionais divulgados pelo Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC) e pela Corregedoria-Geral da Justiça do TJGO, com o intuito de verificar o impacto da Central de Conciliação em Segundo Grau na resolução de conflitos envolvendo guarda e alienação parental.
A metodologia qualitativa permite interpretar, de forma crítica e reflexiva, as normas jurídicas, bem como compreender as dificuldades de aplicação da guarda compartilhada no contexto real das famílias brasileiras. Dessa forma, a pesquisa busca não apenas descrever o funcionamento do modelo de guarda, mas propor reflexões e apontar caminhos para sua efetiva implementação, com foco na proteção integral da criança e do adolescente.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A guarda compartilhada, consolidada no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 13.058/2014, representa um importante avanço no campo do Direito de Família ao estabelecer a corresponsabilidade parental como regra, mesmo após a separação conjugal. No entanto, sua implementação encontra diversos obstáculos no contexto jurídico e social brasileiro, que impactam diretamente sua eficácia na prevenção da alienação parental.
1. Desafios culturais, psicológicos e jurídicos
Entre os principais entraves, destaca-se a persistência de valores patriarcais que atribuem à mãe a responsabilidade exclusiva pelos cuidados com os filhos, o que ainda influencia decisões judiciais e a percepção social da guarda. Esse modelo tradicional dificulta a adoção da guarda compartilhada, mesmo diante de sua previsão legal.
Além disso, a ausência de uma comunicação eficiente entre os genitores, somada a conflitos mal resolvidos e à imaturidade emocional, compromete a eficácia desse regime. Em situações de separação litigiosa, a guarda compartilhada pode ser aplicada formalmente, mas sem efeitos práticos, tornando-se um instrumento ineficaz diante da ausência de cooperação mútua.
Do ponto de vista psicológico, os filhos de pais em conflito podem vivenciar sentimentos de insegurança, ansiedade e rejeição, especialmente quando expostos à alienação parental. A guarda compartilhada, quando efetiva, tende a amenizar tais danos, pois mantém o vínculo afetivo com ambos os pais e promove um ambiente familiar mais equilibrado.
2. O papel do Judiciário e da mediação na efetivação da guarda compartilhada
O Poder Judiciário desempenha papel fundamental na promoção da guarda compartilhada como medida preventiva da alienação parental. A mediação e a conciliação são instrumentos centrais nesse processo, pois estimulam o diálogo entre os genitores e a construção de soluções consensuais, favorecendo o bem-estar da criança.
A Resolução nº 125/2010 do CNJ instituiu a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesse, promovendo métodos autocompositivos como a mediação familiar. Essa diretriz vem sendo implementada em diversos tribunais do país, com destaque para o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO).
3. A experiência do TJGO com conciliações em segundo grau
O TJGO implantou, de forma pioneira no Brasil, a Central de Conciliação em Segundo Grau, vinculada ao Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC). A iniciativa permite a realização de audiências de conciliação nos próprios gabinetes dos desembargadores, antes do julgamento de recursos, possibilitando a resolução pacífica de conflitos que envolvem guarda de filhos.
Segundo dados do relatório anual do NUPEMEC (2023), foram celebrados mais de 3.200 acordos em segundo grau, com índice de satisfação superior a 85% entre as partes. A atuação articulada entre desembargadores e mediadores tem contribuído para a pacificação social e a efetividade da justiça, além de fortalecer os vínculos familiares e proteger a criança de práticas alienadoras.
A mediação e a conciliação, nesse contexto, tornam-se mecanismos eficientes para consolidar a guarda compartilhada como modelo de convivência familiar saudável. Quando aplicadas em conjunto com políticas públicas de apoio psicológico e capacitação de profissionais, essas ferramentas promovem um ambiente mais colaborativo, que favorece o pleno desenvolvimento da criança e o respeito aos seus direitos.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A guarda compartilhada, como instrumento jurídico e social, representa um importante avanço na proteção dos direitos da criança e do adolescente, especialmente no que diz respeito ao princípio do melhor interesse e à convivência familiar equilibrada. Sua consolidação como regra geral pela Lei nº 13.058/2014 fortaleceu o entendimento de que ambos os genitores devem permanecer ativos na vida dos filhos, mesmo após o rompimento da união conjugal.
No entanto, sua efetiva implementação ainda enfrenta diversos desafios no contexto brasileiro, entre eles: a resistência cultural, a ausência de cooperação entre os pais em situações de separação litigiosa, a falta de estrutura para acompanhamento das famílias e a dificuldade na identificação e comprovação da alienação parental. Tais entraves comprometem a aplicação do modelo e aumentam os riscos de danos emocionais às crianças envolvidas.
Neste cenário, o Poder Judiciário assume papel central. A adoção de práticas autocompositivas, como a mediação e a conciliação, tem se mostrado eficaz na resolução de conflitos familiares, permitindo a construção de acordos mais estáveis e menos traumáticos. A experiência do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, com a criação da Central de Conciliação em Segundo Grau, demonstra que é possível aliar celeridade processual, pacificação social e proteção integral à criança.
Conclui-se, portanto, que a guarda compartilhada, quando aplicada com o apoio de políticas públicas, mediação familiar e acompanhamento psicológico, constitui um mecanismo eficiente para coibir a alienação parental e promover vínculos saudáveis entre pais e filhos. Para isso, é essencial que o sistema de justiça continue a investir em práticas conciliatórias, formação de profissionais especializados e sensibilização da sociedade sobre a importância da corresponsabilidade parental.
REFERÊNCIAS
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10. ed. São Paulo: RT, 2016.
VELOSO, Zeno. Direito Civil: Família. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2019.
GARDNER, Richard. A Síndrome da Alienação Parental. São Paulo: Vetor, 1998.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
BRASIL. Lei nº 13.058, de 22 de dezembro de 2014.
BRASIL. Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008.
BRASIL. Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010.
CNJ. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010.
NUPEMEC. Relatório Anual de Atividades, 2023. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.